Qi Rong estava no corredor escuro e sujo do lado de fora do apartamento de Guzi, segurando o menino em seu quadril. As luzes amarelas de segurança piscaram e zumbiram devido à fiação ruim. O cheiro azedo de bebida do apartamento era ainda mais forte do que da última vez que Qi Rong esteve aqui. Guzi estava com a cabeça sob o queixo de Qi Rong e os braços em volta do pescoço. A gola do moletom de Qi Rong estava encharcada com as lágrimas de Guzi.

A polícia tinha vindo fazer sua investigação - na verdade, apenas para catalogar a quantidade de álcool que havia naquele apartamento apertado e mofado; porque era óbvio que não havia jogo sujo envolvido. O pai de Guzi tinha bebido até a morte.

Alguns vizinhos colocaram a cabeça para fora da porta para ver o que estava acontecendo, acostumados com sirenes do lado de fora, mas não vendo a polícia em seu próprio corredor. Eles recuaram para dentro quando Qi Rong fez uma careta para eles. Ele ainda podia senti-los observando pelos buracos nas portas, mas pelo menos agora Guzi não podia ver as dezenas de olhos nele.

Os paramédicos puxaram a maca para fora, o corpo coberto com um lençol. Qi Rong segurou a parte de trás da cabeça de Guzi, segurando-o para que ele não pudesse se virar para olhar, não importa que ele já tivesse visto antes, sem a cortesia de um lençol para esconder a pele enrigada e os membros enrijecendo lentamente.

Qi Rong observou os médicos levarem o corpo pelo corredor, amarrado para que não se movesse enquanto subiam as escadas.

Foi assim para-

Ele fechou os olhos com força, tentando parar o pensamento antes que seu estômago revirasse, focando em vez do sorriso caloroso de sua mãe ao invés de imaginar como ela poderia ser sob seu próprio lençol branco.

Ele acariciou o cabelo e as costas de Guzi enquanto o menino soluçava e chorava.

Ele perdeu seus pais na ordem errada , Qi Rong zombou. Ele deveria ter sido criado por uma mãe amorosa, e esse velho de merda estava fora de cena.

Mas talvez houvesse alguma esperança.

"Guzi," Qi Rong sussurrou.

Guzi não respondeu.

"Guzi, você tem tias ou tios? Avós?"

Guzi ainda não disse nada, mas balançou a cabeça 'não' sob o queixo de Qi Rong. O coração de Qi Rong afundou. Oh, Deus, o que vai acontecer com ele-

A polícia saiu do apartamento, fechando a porta atrás dele. Ao mesmo tempo, o senhorio se aproximou, conduzindo uma mulher de terno elegante para o grupo. A polícia chamou o senhorio de lado para discutir os arranjos de limpeza. A mulher de terno se aproximou de Qi Rong e Guzi.

Um assistente social, Qi Rong imaginou. Ela tinha um coque baixo e apertado, e um rosto severo e objetivo.

Ela olhou para Qi Rong, então virou os olhos para Guzi, o rosto suavizando um pouco. Qi Rong cutucou Guzi para chamar sua atenção.

"Qual é o seu nome, querido?" A mulher perguntou.

Guzi escondeu o rosto no pescoço de Qi Rong.

"Este é Guzi," Qi Rong murmurou.

"Oi, Guzi. Meu nome é Zhang Xinyi. Quantos anos você tem?"

Guzi apenas choramingou, curvando-se para chorar novamente.

"Ele tem seis anos", disse Qi Rong.

"E você é?" Zhang Xinyi voltou sua atenção para Qi Rong.

"Eu sou seu... seu vizinho."

"E como você conhece Guzi?"

Qi Rong olhou para ela com olhos estreitos, cabeça inclinada. "Por ser seu vizinho?"

Guzi virou-se então. Seus olhos estavam vermelhos de tanto chorar e o nariz ranhoso. Ele cheirou. "Eu fiquei com gege quando meu pai estava bebendo."

A mulher acenou com a cabeça, o rosto suave novamente enquanto observava Guzi. Suas mãos entrelaçadas na frente de sua cintura. "Então ele é um vizinho muito bom para você, Guzi. Mas agora vamos levá-lo a algum lugar legal e tentar encontrar uma nova família para você morar.

"Não quero uma nova família, quero ficar com gege!" Guzi disse, agarrando-se com mais força a Qi Rong, olhando para ele.

A respiração de Qi Rong ficou presa, e ele enrijeceu. Seus olhos se encheram de lágrimas. Claro, claro que você pode ficar comigo. Vou levá-lo para longe daqui, vamos morar em algum lugar legal, vou rastejar de volta para o tio e a tia de quatro se for preciso. Se dependesse de mim, eu teria tirado você daquele estupido meses atrás.

Mas não dependia dele.

Ele olhou para Zhang Xinyi, questionando. Seu coração batia forte em seu peito, esperando contra a esperança, mas ele sabia qual seria realmente a resposta.

"Sinto muito, Guzi, mas não podemos deixar você ficar com ele só porque ele tomou conta de você algumas vezes-"

Qi Rong sentiu uma onda de raiva com isso. Babá - como se fosse apenas algo que ele fazia algumas horas por noite, uma vez por semana, e era pago.

"Mas não foram apenas algumas vezes!" Guzi chorou, lágrimas frescas e gordas escorrendo pelo rosto. "Ele me comprou roupas para a escola quando as outras crianças eram más comigo! Ele cuidou de mim quando eu fiquei doente! Ele me faz comida boa e lê comigo e assiste desenhos animados comigo e brinca comigo! Eu quero ficar com gege! Eu amo Gege mais do que meu pai de verdade! Por favor, eu quero ficar com gege!" Ele agarrou-se com mais força a Qi Rong, os pequenos dedos cavando em seu peito com tanta força que beliscaram até mesmo através do moletom grosso.

Qi Rong olhou boquiaberto para Guzi, depois para Zhang Xinyi, fechando a boca e se endireitando. As lágrimas em seus olhos ameaçaram derramar, e ele apertou os olhos ligeiramente enquanto tentava lutar contra elas. Não chore, não chore, não chore, não na frente dessas pessoas!

Ele engoliu. Molhe os lábios. Abriu a boca, fechou-a novamente. Respirou fundo. Ele tentou falar.

"Eu- eu posso-" ele murmurou.

Os policiais terminaram com o proprietário e agora se aproximaram alguns metros atrás de Zhang Xinyi, observando.

Zhang Xinyi franziu os lábios, e sua testa franziu um pouco antes de relaxar novamente. Para seu crédito, ela não parecia ter nenhum prazer nisso.

"Infelizmente não. Agradecemos o grande cuidado que você obviamente deu a Guzi, mas nossa primeira preferência em casos como este é encontrar um parente disposto a acolher a criança."

"E se não houver nenhum?" Ele conseguiu sair antes que sua garganta apertasse. Sua cabeça estava doendo.

Zhang Xinyi suspirou. "Se não houver parentes dispostos, levaremos Guzi para um de nossos lares de crianças patrocinados pelo Estado-"

"Uma porra de um orfanato? Mesmo quando há pessoas que ele já conhece dispostas a aceitá-lo?" Sua voz começou a tremer.

"-para que possamos encontrar uma pessoa disposta a acolhê-lo que esteja qualificada para isso."

A boca de Qi Rong se fechou, a mandíbula tremendo atrás de seus lábios franzidos. Ele estava respirando pesadamente pelo nariz. Ele sentiu ranho de choro se movendo, irritando-o ainda mais.

"Quem conta como qualificado, então?"

"Casais casados, com renda substancial. Você pode encontrar outras informações em nosso site", disse Zhang Xinyi, tirando um cartão do bolso e entregando-o a Qi Rong.

"Eu sei que isso é profundamente doloroso, e vocês dois estão sofrendo. Mas fazemos isso com o melhor interesse da criança em mente. Agora, precisamos levar Guzi conosco." Ela acenou para os oficiais atrás dela. Um se colocou entre Qi Rong e Zhang Xinyi, o outro veio e estendeu as mãos para pegar Guzi.

Guzi lamentou quando foi separado de Qi Rong, tentando segurar sua camisa, depois desceu o braço até a mão. O braço de Qi Rong caiu frouxamente quando seu último dedo escorregou pelo aperto de Guzi.

Qi Rong estava no corredor, queixo dobrado no peito enquanto os gritos de Guzi eram cortados pela porta da escada se fechando atrás deles.

Zhang Xinyi tinha acabado de prender Guzi em um assento de carro quando Qi Rong correu para eles. "Esperar! Espere, eu tenho algo - eu quero dar algo a ele!"

Zhang Xinyi o olhou com cautela, mas permitiu.

Qi Rong se inclinou no carro para Guzi. As bochechas de Guzi estavam pegajosas de lágrimas secas, seus olhos vermelhos, mas ele estava sem lágrimas por enquanto. O menino estava exausto, os olhos semicerrados, a respiração lenta e pesada. Qi Rong enxuga o rosto de Guzi com a manga e tentou sorrir para ele, mas tinha certeza de que era mais uma careta torcida. Guzi não retribuiu o sorriso.

"Gege..."

"Oi, Guzi. Eu tenho algo para você. Se... se você quiser.

Ele tirou do bolso do moletom o Tigre de olhos amarelos e barriga espelhada.

A boca de Guzi se curvou em um pequeno sorriso, o maior que ele conseguiu, e um pouco de luz voltou a seus olhos. "Gege, ele é tão legal! Obrigada!" Sua voz estava baixa e rouca de chorar a manhã toda, e ele segurou Tiger suavemente, como se fosse um gatinho frágil em vez de um brinquedo de pelúcia desgastado.

"Você tem que cuidar dele, ok?" Ele é muito importante para mim, você sabe," Qi Rong disse, mais alto que o necessário, enquanto sua voz vacilava. Com o canto do olho ele podia Zhang Xinyi acenar ligeiramente.

"Guzi, seja bom para... para onde quer que você vá. Seja bom para que uma boa família o acolha e o ame, ok?

Não seja como eu, algum incômodo mesquinho e odioso.

Guzi balançou a cabeça e abraçou Tiger apertado contra o peito. "Eu quero ficar com você , gege!" Sua pequena voz falhou, sua garganta muito dolorida para falar claramente.

Qi Rong apertou a mandíbula para tentar conter seus próprios soluços. Em vez disso, um gemido escapou e ele balançou a cabeça. "Eu quero que você fique aqui comigo também, mas você não pode , Guzi. Você precisa de um lar de verdade, com uma família. Eu prometo que você será mais feliz lá."

Em vez de ser encorajado, Guzi começou a fungar, soluçar e chorar novamente.

Atrás dele, Zhang Xinyi limpou a garganta.

Qi Rong cheirou e engoliu, soltando um suspiro abatido. Ele assentiu.

"É hora de ir, Guzi." Ele deu um beijo na testa de Guzi e enxugou as lágrimas do rosto do menino com os polegares, depois saiu do carro e fechou a porta.

Ele colocou a mão sobre os olhos para enxugar o rosto novamente, tentando controlar sua respiração. Ele sentiu uma mão em seu ombro e viu Zhang Xinyi acenar para ele antes de dar a volta para o banco do motorista.

Ele viu Guzi olhar por cima do ombro para Qi Rong, o rosto molhado de lágrimas apesar da tentativa de Qi Rong de enxugá-las.

Ele teve que desviar o olhar. Ele não conseguia olhar para o carro que levava Guzi embora. Não conseguia olhar para Guzi, o garotinho que ele amava e que o amava, cujo mundo inteiro desabou em poucas horas.

Ele deu um passo para trás no meio-fio. O carro se afastou, o cheiro do escapamento fazendo com que a dor de cabeça crescente de Qi Rong piorasse e o deixando enjoado. Ele ficou lá, olhando para o espaço onde o carro tinha estado, até que ele ficou vagamente consciente de suas pernas ficando doloridas, e a dor em sua cabeça e estômago se intensificando. O sol da manhã estava muito brilhante mesmo através da fina cobertura de nuvens, e os olhos de Qi Rong lacrimejaram e se fecharam.

Ele se viu do lado de fora de seu apartamento. Ele empurrou a porta - não se preocupou em fechá-la corretamente em sua pressa de subir as escadas. A chave de Guzi ainda estava na fechadura. Ele fechou a porta atrás dele, ficando de pé e se distanciando novamente. Lentamente, ele se abaixou sobre suas mãos e joelhos. Ele se sentiu doente. Ele começou a vomitar. Ele não tinha comido desde o jantar da noite passada, jantar com...

Ele olhou para seu apartamento, inalterado, mas mais vazio do que nunca.

A roupa que ele e Guzi escolheram para a escola hoje, que não seria usada.

Os lanches que ele havia colocado no balcão - alguns biscoitos embalados e uma garrafa de suco.

A mesa de jantar, e colado na parede acima dela, o desenho de Guzi.

Qi Rong e Guzi. Sorridente. Juntos.

A fita perdeu força e o desenho caiu da parede, contornou a mesa e caiu no chão.

Qi Rong assistiu-o cair, o rosto relaxado. Então ele soluçou, respirou trêmulo e gemeu, os soluços que ele segurou por toda a manhã finalmente se soltaram.

Qi Rong e Guzi não tem um dia de paz.

Agora uma fanart fofa do meus babys, depois de um cap triste.

https://twitter.com/Foxy_joy_/status/1499778620876804101?s=20&t=GXrEnzfKkJlH-eJb-qie-Q