.29.
Isabel:
Finalmente!
Minhas pernas se amoleceram, mostrando a falta de equilíbrio, quando pisaram na areia quente. Essa, com certeza era a parte mais chata do final de uma embarcação.
A garganta seca me deixou ansiosa, e não sei por mais quanto tempo meus joelhos aguentariam o meu peso. Eu precisava comer algo também.
Justin parecia conciliar entre insegurança e êxtase, por estar de novo na Ilha. Suas expressões me deixavam confusa e eu não saberia dizer se meu colega de sobrevivência estava amargurado ou rindo da situação. Talvez seja os dois.
Comecei a varrer os olhos ao redor da imensidão de água, areia e árvores, à procura de um coqueiro, já que não aguentaria esperar Justin encontrar um riacho ou algo do tipo.
-- Tem um bem ali. -- Apontou para uma árvore específica, alguns metros à frente. Senti que meus pensamentos estavam sendo invadidos pelos seus olhos curiosos.
Agarrei as bordas do vestido e corri, já sentindo o entusiasmo da minha hidratação tão desejada.
Porém, quanto mais eu me aproximava do coqueiro, mais eu me sentia uma formiga perto dele.
Aquilo era absurdamente grande!
Escutei o suspiro pesado de Justin. Me segurei para não olhar para trás.
O que eu deveria fazer? Eu nunca conseguiria atingir aquele coco com uma pedra...
Contudo, meus pensamentos logo foram iluminados por uma ideia perfeita.
Girei disfarçadamente a pedrinha do meu bracelete, a luminosidade rosa cegaria os meus olhos, se caso eu estivesse tendo contato direto com ela. Dentro de alguns segundos, eu pude ver a sombra das asas na areia.
Animada, dou passos para trás no intuito de pegar um impulso. Meu corpo flutuou, trazendo novamente o meu sorriso entusiasmado.
Agarro o fruto, puxando e derrubando três deles.
Não perdi tempo, sentei no chão, tirei o punhal do vão dos seios e fiz um furo no coco. Virando-o, pronta pra sentir o seu sabor escorrer garganta à dentro.
O alívio começou a me envolver de uma forma que eu não conseguia explicar.
-- Eu não sei qual de nós dois é o mais idiota. -- Justin se aproxima.
-- Hã?
Ele solta um riso. Parecia desacreditado.
-- Você é uma alada. Obviamente tem asas... E durante todo esse tempo... -- Ele parou. Parecia organizar as palavras, presas na garganta. -- Por que não voou para buscar ajuda? Já estaríamos em casa há muito tempo. -- Seus olhos estavam cerrados.
Pois então, Justin... eu me esqueci completamente desse protótipo de asa artificial nas minhas costas, mil perdões. É que as vezes me escapa da memória, o fato de estar incorporando uma personagem, perto de você.
Era evidente que eu trocaria essa explicação, por:
-- Er... olhe só a quantidade de água aqui! Acha mesmo que eu conseguiria viajar até o reino de Espadas? É muito longe. -- Torço para que isso seja suficiente pra deixá-lo sem argumentos.
-- Está brincando comigo, né? -- Claramente, não havia funcionado.
Por que ele está tão furioso?
Levanto-me, batendo as mãos no vestido. Foi em vão, já que a peça estava molhada e a areia passou a grudar em todo lugar.
Olho novamente para Justin, que parecia indignado por perceber que eu estava dividindo minha atenção entre ele e o meu vestido surrado.
-- Eu pareço estar brincando? -- Mentindo, sim, mas brincando (pelo menos por agora) não.
-- Isso é algo irrelevante pra sua espécie, Anastácia, e você sabe disso tão bem quanto eu! -- Justin dizia as palavras com um tom autoritário. Eu era a errada naquela situação? Mas por quê?
-- Pare de dizer coisas sem sentido! -- Gritei, sem paciência.
-- Quem está dizendo coisas sem sentido é você! -- Ele comprime os olhos nas minhas asas -- Anastácia, os alados conseguem carregar uma carga de aproximadamente três vezes maior que o seu próprio peso; suas asas são absurdamente fortes, suficiente o bastante para viajar por meses sem cessar! Não há oceano que te impeça de fazer isso. -- As palavras que saíam de seus lábios vieram de encontro com a minha grande cara de pau.
Okay, Seokjin não me disse nada disso. No fim de tudo, eu continuo inocente!
-- Eu sei disso. Eu... -- Desvio meu olhar do seu. Meu Deus, o que eu falo? -- Eu... -- Vejo pelo canto dos olhos, Justin cruzando os braços. Começo a suar frio e era notório o meu desconforto -- Sou deficiente...?
Sua expressão aos poucos se suaviza.
Dessa vez, o desconforto, que outrora me constrangia, foi totalmente transferido para ele.
Bingo!
-- Minhas asas são frágeis. Elas são... -- (Projetadas por um feiticeiro muito desligado e que não me deu totalidade das informações) -- asas que eu só utilizo quando é realmente necessário, sabe? Se eu me esforçar demasiadamente, acabo sofrendo uma queda, pois ela não aguenta o exercício por muito tempo.
Essa bola de neve - recheada de mentiras - está me causando um nervosismo cáustico, mas eu não tenho outra solução.
Como será que Justin reagiria, se soubesse que durante todo esse tempo, eu não sou quem ele acha que sou? O elfo não merecia isso, porém, infelizmente é minha vida que está em risco.
-- Entendi. Sinto muito por isso. Agora tudo faz sentido... -- Ele deu um tapinha no meu ombro esquerdo. -- Bom, de qualquer forma vamos chegar em casa. Talvez mais tarde do que primordialmente seria, mas chegaremos. -- Sorriu reconfortante.
Aish, ele vai me odiar quando souber da verdade. Isso se eu tiver coragem de contar!
Sorri minimamente para Justin, que se afastou. O mais velho começou a caminhar para debaixo de uma sombra, deitando preguiçosamente pela areia, esticando as pernas e suspirando.
-- Vamos descansar um pouco... -- Deu três batidinhas no espaço vazio ao seu lado.
Mostrei a língua pra ele, que começou a rir. Ele sabe muito bem o que acontece quando eu durmo perto dele, transformando isso num assunto para me irritar.
Mal sabia ele que nesta noite eu teria um plano: ao escurecer, colocaria Mirtilo no meio. Eu abraçaria o meu filho.
Justin fechou os olhos e logo adormeceu.
O tigre, depois de comer o restante da comida no saco de suprimentos, repousa a cabeça sobre minhas coxas e começa a lamber minhas mãos.
Comecei a fazer carinho em seus pêlos, sentindo inveja da maciez daqueles fios.
Ah, se meu cabelo fosse tão sedoso assim...
Com o silêncio dominante no local, volto os meus pensamentos à Jimin e meus amigos.
Será que eles estão em segurança?
Vieram para a ilha também?
Como e porquê paramos aqui?
Sinto falta deles...
Chaerin saberia o que me dizer nessas horas.
Se Taehyung e Yoongi estivessem aqui, o clima seria mais leve...
Jin arrumaria um abrigo decente e, junto com Namjoon, desenvolveríam um mapa desse lugar.
A propósito, eu precisava esclarecer umas coisas com Taehyung.
Ele estava apaixonado por Jimin?
Durante toda essa confusão em que eu me meti, acabei deixando passar esse pequeno detalhe, nem tão pequeno assim.
Como eu pude deixar de notar isso?
Lá no Palácio, era visível sua preocupação - mais que necessária - quando se tratava do Park.
Taehyung não tratava Jimin como um rei, mas sim indiretamente, como um consorte.
O exagero de atenção e carinho... as palavras de duplo sentido e os flertes que eu achei ser alguma piada entre os dois.
Como você é burra, Isabel!
Mas, e agora?
Eu não quero magoá-lo. Tae conhece o Jimin a mais tempo que eu.
Mas Jimin estava apaixonado por mim, certo?
E toda essa história de escolhido... flor dos coadjutores de Medlyn e Riordan... casamento...
Meu Deus, eu não vou conseguir olhar para o meu amigo, quando voltar ao Palácio de Espadas.
Espero que um dia Taehyung me perdoe. Se eu não tivesse seguido a Minah, eu não estaria aqui e nada disso teria acontecido.
Na maioria das vezes, a vida age de maneira injusta conosco. E percebo que esse método também existe em Wonderland.
Se eu pudesse reverter essa situação, colocaria essa marca no pulso do meu amigo. Ele merece a atenção do rei de Espadas, muito mais do que eu.
Taehyung é um ser incrível, sabe muito bem como auxiliar na liderança de um reino inteiro. É prestativo, ponderado e muito humilde. Perfeito para acompanhar Jimin nessa regência.
Ah, se eu pudesse, trocaria meu casamento com Jimin por...
-- Ei! Joga esse coco aí pra mim. Bateu uma sede agora... -- Justin grita do outro lado, me dando um susto.
[...]
Chaerin:
-- Como estão indo as coisas? -- Kwang se escorou na beirada da minha cama.
-- Tirando o fato de estar presa aqui, está tudo fluindo...
-- Sabe o que é isso? -- Ele solta uma risada -- Esse é o lindo Karma, batendo na sua porta!
O híbrido estava se referindo ao fato de estar preso sob minhas ordens, por tempo indeterminado.
Eu agora, também estou presa no Palácio de Jimin, sob um tempo indeterminado...
-- Um dia, o urso pardo come o mel, no outro, as abelhas o enchem de picadas! -- Disse Kwang, avaliando minha expressão tediosa.
-- Você é bem engraçadinho...
-- Por que não conta logo? Pelo menos para o tal Taehyung... Ele anda bem triste, ultimamente. -- Ele muda de assunto.
Não seria má ideia. Mas eu não queria arriscar.
Se caso a rainha Vermelha descobrir a verdade, que não seja pelo deslize do meu amigo.
Quando desse o tempo de descobrir, ela forçaria alguém a falar. Então quanto menos pessoas souberem, menor será seu alvo.
Depois do baile, Vermelha não tinha atacado o reino de Jimin. E eu sabia o porquê:
"Oras, a escolhida deverá ser uma humana e não alguém deste mundo... a transação só funcionará com os representantes de cada lado."
-- Você realmente pensou em tudo, Medlyn... -- Sorri ao pensar alto. Disfarçar Isabel de alada parecia ser uma ideia um tanto idiota de sua parte. Mas agora, tudo isso só dará mais tempo para ela poder aproximar os escolhidos.
-- Falou comigo? -- Kwang se deitou ao meu lado.
-- Hm? -- Desperto dos meus pensamentos.
-- O que? -- Ele pende a cabeça.
-- Eu estava falando sozinha. -- Reviro os olhos.
-- Ah! -- Sorriu -- Você é esquisita, sabia? Gosto de garotas assim...
-- Vai tirando essa hipótese da sua cabeça. Você é mais novo.
Ele apenas murmura um "E daí?", pergunta que eu acabo ignorando.
Três batidas na porta interrompem a nossa conversa, nem tão agradável assim. Kwang se levanta para abrir a porta e vejo Namjoon entrar no quarto.
-- Olá, princesa!
-- Oi, Nam.
-- Eu posso falar com você um minutinho?
-- Claro. -- Levanto da cama para sairmos do quarto.
Sigo ele até a biblioteca. O cheiro dos livros de magia me traziam uma harmonia interior, esse aroma se mesclava com o perfume da neblina que pairava no ar. A biblioteca estava impecavelmente limpa, o que atrapalhava a visão era somente a imensidão de fumaça verde, no local.
-- Você tem estado muito estressado ultimamente, não é?
-- Tenho fumado muito. Me desculpe. -- Ele coçou a nuca.
-- Bom, eu só não reclamo porque a essência é cheirosinha. Mas isso faz mal, Joon. Você devia encontrar outros meios de aliviar o stress.
-- Eu sei, eu sei...
Nos aproximamos da mesa central. O enorme móvel de madeira estava repleto de folhas rabiscadas e de livros espalhados.
Namjoon puxa uma das cadeiras e cede o espaço para eu me sentar.
Ele contorna a mesa e senta de frente.
-- Então...
-- Eu fiz alguns cálculos sobre o atual estado do rei. -- Fez uma breve pausa. -- Eu descobri algo.
-- O quê exatamente? -- Me inclino na mesa.
Namjoon olhou para os lados, com a expressão receosa e confusa. Olhou para trás, analisando se havia mais alguém, para enfim dizer:
-- Jimin não é o verdadeiro escolhido... -- Sussurrou.
-- Oh!
-- Fiz umas anotações aqui -- Ele puxa um dos livros e mostra a parte grifada -- Está vendo? O escolhido não pode ter sangue real... Um herói, deve ser apenas um herói. -- Apontou em outro verso -- Duas pessoas que representem a coragem e que arrisquem suas vidas em prol do amor. Essas são as normas.
-- O que sugere, Nam?
-- Isabel se encaixa nesses padrões, mas Jimin não. -- Namjoon se apoia na mesa e sussurra ainda mais baixo, forçando a atenção dos meus ouvidos -- Cá entre nós, princesa, nosso rei não conseguiria enfrentar a tia, nem que mil "Riordans" o ajudasse! Jimin não conhece nada sobre o reino de Copas, muito menos sabe os pontos fracos da rainha. Sem contar que Park tem indícios de ser frouxo sob pressão...
Segurei meu riso.
-- Namjoon, eu preciso te contar uma coisa, mas me prometa que em hipótese alguma...
Naquela tarde, fiz um pacto com Namjoon.
Seria errado colocar sua vida em jogo, mas minha consciência não está tão pesada, já que ele mesmo afirmou que estava se envolvendo em algo perigoso.
[...]
Narradora:
-- Queria tanto uma taça de hidromel, agora.. -- Jungkook pronunciou -- Já experimentou o licor das tulipas de ouro? Ah, aquilo é muito bom!
-- Poderia andar mais rápido? Precisamos chegar na cachoeira até o anoitecer. -- Disse Isabel, entediada. O garoto tinha tirado a tarde para tagarelar ao seu lado.
Isabel percebeu o quão irritante era isso. Mas quem era ela para reclamar de algo? Havia feito o mesmo, dias antes.
-- Falar sem parar ajuda a passar o tempo. -- Jungkook a cutucou.
-- As vezes eu acho que você pode ler os meus pensamentos... -- Confessou.
-- Ah, como eu queria que isso fosse verdade! Mas eu apenas observo suas expressões. -- Ele abaixa a cabeça -- Sabe, pode não parecer mas você me instiga, Anastácia. Sempre tão misteriosa, falando apenas o necessário...
-- Idem, Justin! Idem...
Jungkook iria oferecer uma proposta, onde trocariam todo tipo de informações e curiosidades pessoais, contudo, lembrou-se de "Justin - O elfo".
Se ele contasse sobre sua vida, desejos e aflições, arrancaria todo o seu disfarce...
Fez uma careta, visivelmente chateado com isso, decidindo abafar dentro de sua mente a vontade gritante que tinha de ouvi-la contar sobre seu passado.
Pensou em como seria a reação dela, se descobrisse estar ao lado do rei de Copas. Ela teria medo dele?
Bom, ele nunca saberia. Pois se dependesse dele, entregaria Isabel nas mãos de Jimin e depois partiria, sem manter nenhum contato.
Voltando para sua vida dolorosa, como um rei sem rosto.
[...]
O som da cachoeira era o único a ser escutado ali.
Isabel dormia tranquilamente, ao lado de Mirtilo.
Jungkook, escorado na pedra de frente à ela, observava a cena da jovem apertando o tigre, como se ele fosse uma grande pelúcia.
Se imaginou ali, novamente.
O corpo do rapaz recebeu as sensações das lembranças de seu corpo sendo abraçado por ela. Do aconchego de sua cabeça em seu pescoço, do cheiro, do formigamento estranho, do frio na barriga, dos lábios chamativos...
Aquilo não poderia ser apenas carência. Tinha algo a mais, ele estava certo de que tinha.
Seu primo já não tinha uma boa visão sobre ele. Se sequer sonhasse que Jeon estava pensando essas coisas, a intriga entre as famílias só aumentaria. -- Pensou.
Deixou o corpo escorregar até o chão, deslizando sobre a pedra. Continuou a manter uma distância da garota.
Apesar disso, seus olhos não conseguiam se desviar para outro lugar que não fosse a expressão angelical dela.
Jeon acabou dormindo, abraçado aos joelhos.
[...]
Como todo início de madrugada, o frio cortante se fazia presente. A escuridão era iluminada apenas por alguns cogumelos nos troncos das árvores. Os passos minimamente chamativos, se aproximavam dos corpos adormecidos. O ser encapuzado observou a garota abraçada ao tigre e o rapaz dormindo sentado.
-- Veja, Lunar. Eles voltaram...
A tigresa que acompanhava o indivíduo de capuz, se aproximou de Mirtilo e o cheirou discretamente.
Eram da mesma raça.
-- Deveríamos levá-lo, dessa vez? -- Perguntou o rosto desconhecido para a fêmea, que encarava o tigre macho, adormecido nos braços de Isabel.
♤♤♤♤♤♤♤♤♤
Quero agradecer a todos vocês, que estão dando amor e carinho a 'Welcome To Wonderland'!
Nunca imaginei que teriam tantas pessoas acompanhando a história...
Vocês são incríveis, sério!
❤❤❤❤
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