Capítulo LXXII
Aquele lugar sagrado exalava a paz de sempre, dias já tinham se passado, Frieda retornava de mais uma de suas corridas com o coelho, agora já conseguia acompanhá-lo sem dificuldade. Fazia algum tempo desde a última visita do ser divino, o coelho acalmava seus ânimos dizendo-lhe que tudo ocorreria no tempo certo e que ela deveria se ater a seu treinamento e preocupa-se apenas em pensar como faria para superar as criaturas que desafiaria a seguir.
– Diga-me coelho, qual deles você acha que devo enfrentar? – Inquiriu Frieda.
O coelho pensou por um momento.
– Imagino que você deverá superar todas as oito bestas cardeais. Eu diria que você deve enfrentar o chefe da área sudeste, ele é forte, porém é o mais lento e isso lhe dará alguma vantagem. – Informou. – Felizmente estamos na zona neutra, uma vez que fica no centro da grande floresta sagrada, desta forma você não teve e nem terá que lidar com um chefe de área daqui. Mas que fique claro que isso não exclui a possibilidade de alguém dentre as oito bestas cardeais vir te desafiar. – Disse o coelho.
– Eu espero que não venham, não sei quão fortes são, porém, uma vez que eles têm a vantagem de sempre ter vivido nesse ambiente, tenho certeza de que vou acabar em dificuldade.
– De fato. – Concordou. – Contudo, considerando que as oito criaturas cardeais são seres bem orgulhosos, dificilmente farão isso, mas não descartamos a possibilidade. Vai saber? – Considerou. – Caso tenha êxito em derrotar um ou mais deles, existem pelo menos três possibilidade: a primeira é a de que achem que você deu um golpe de sorte, a segunda é a de que achem que você usou algum truque sujo e que isso não vai acontecer com eles e a terceira é a de que talvez comecem a te levar a sério por te considerarem uma ameaça. Ao meu ver, só viriam aqui lhe desafiar se ocorrer o terceiro caso.
– Então posso começar a me preocupar com ataques surpresas após derrotar um ou dois deles? – Perguntou Frieda.
– Não, como eu disse, eles são criaturas orgulhosas e adiciono que possuem um forte senso de nobreza, não consigo imaginá-los atacando sem aviso prévio. – Articulou com clareza. – É mais provável que enviem um mensageiro ou venham até aqui em pessoa dar o aviso.
– Se você diz. – Falou. – Qual deles é o mais forte?
– Eu diria que são os chefes da área norte e nordeste. – Falou. – Dentre esses dois, aconselho que enfrente a besta cardeal norte por último, apesar de não saber definir quem venceria em uma luta de um contra um entre norte e nordeste, posso dizer que a besta cardeal norte possui certas complicações no enfrentamento.
O coelho terminava de falar quando uma voz surgiu sobrepondo a sua, todo ambiente fez silêncio, parecia que até mesmo a água corrente já não produzia mais som. Era sempre assim quando a divindade resolvia aparecer.
– Vejo que houve alguma melhora, humana. – Disse a voz.
– É Frieda. – Corrigiu. Não demonstrava incômodo ou descontentamento, seguia com o semblante morno de sempre. – Não é como se eu tivesse outra opção além de melhorar o mais rápido possível. Não tenho todo o tempo do mundo. – Comentou com fria naturalidade
– Por falar em tempo... - Dizia o ser divino. – É tempo de desafiar um adversário mais poderoso. Não se tornará mais forte apenas correndo por aí com um coelho.
– Ela não quis dizer isso. – Frieda murmurou para a criatura que trazia em sua face expressões de descontentamento. – Tem em mente alguém em especial? – perguntou para a divindade.
– Por enquanto fica a seu critério escolher os seus oponentes. – Respondeu. – Deste modo amaldiçoará não outro além de si mesma se for derrotada ou acabar por perder a vida.
– Encorajador... – Resmungou Frieda.
– Sua personalidade segue adorável como sempre, já não há vestígios daquela que rastejava fraca pelo chão a alguns dias atrás. – Havia certo desdém em seu tom.
– Muito engraçado. – Rebateu. – Decido por enfrentar a besta cardeal sudeste.
– Vejo o por quê a escolheu. – Disse a voz.
– Imagino que esteja sempre atenta a tudo. – Falou Frieda.
– Comum engano. – Afirmou a divindade. – Ainda que possua de fato certo grau de onisciência, nada neste vasto universo é absoluto. Nem mesmo o Caos reina absoluto, ainda que dele tenham se originado todas as coisas. – Expôs. – Contudo, é verdade que tenho quem tudo me informe a partir de perspectivas e olhares diferentes. – Disse. – Em todo caso, devo lhe dizer que sua missão é meramente derrotar as bestas, não é matá-las. Talvez tenha êxito contra a besta cardeal sudeste, mas recomendo que, antes de lutar contra ela e as demais, tome da seiva da Paradiesbaum. Devo lhe advertir de que não tome mais que uma gota até segunda ordem, seu corpo ainda não é capaz de suportar os efeitos colaterais imediatos.
Ela se foi.
– Vem e vai quando quer. – Disse Frieda.
– Você se acostuma. – Falou o coelho.
– Fala como se tivesse experiência.
O coelho olhou para ela por um momento, então começou a caminhar para mais perto da árvore e a contemplou em silêncio por alguns instantes. Está decidindo se falaria sobre o passado ou deixaria a conversa morrer.
– Ouvi dizer que lá fora, no mundo humano, tudo que é vivo um dia morrerá. – Iniciou a fala com um olhar distante. – Mas aqui dentro não é assim.
– Está dizendo que não morrem? Não morrem mesmo que alguém os mate também?
– Sua surpresa é compreensível uma vez que, apesar de apartados do mundo de fora, nós parecemos estar tão perto de vocês. Como poderíamos possuir realidades tão distintas? – Disse ele. – Entretanto essa é a nossa verdade.
– Desde quando? – Frieda se aproximou um pouco.
– Desde o princípio? – Sua resposta soou interrogativa. – Eu não me lembro, estou vivo a tanto tempo que as vezes sinto como se tudo estivesse igual desde sempre. Como se ninguém tivesse nascido ou morrido desde o começo.
– Não vi humanos por aqui, mas vi estátuas, templos e ruínas, coisas que pareciam feitas por mãos humanas. – Expôs a mulher. Frieda o encorajava a revelar mais, a lhe dar informações que poderiam tornar suas deduções ainda mais concretas.
– De fato, outrora houveram humanos e deuses aqui, viveram em harmonia por muito tempo. E lá fora... – Ele forçava a mente a recordar, um vinco surgiu entre seus olhos. – Sim... Como fui esquecer? Lá fora viviam os Haidu.
Frieda se surpreendeu com tal informação.
– Os Haidu viviam no mundo humano e nós vivíamos aqui? Então como as coisas acabaram da forma que conheço?
O coelho tomou o seu tempo para pensar.
– Eu me lembro que a humanidade queria ir lá fora.
– Por que fariam isso? Ficar aqui não era mais vantajoso?
– Sim. Aqui eles viviam por tempo indeterminado, não adoeciam, não travavam guerras, estavam protegidos pelos deuses. Sua relação com as divindades era forte, os Haidu não invadiram uma vez que eles eram mais fracos, os deuses eram mais fortes. – Falou o coelho. – A humanidade não possuía muitos medos.
– Então... por quê?
– Os humanos queriam mais. – Pontuou. – Eles queriam exercer o controle sobre suas próprias vidas e fazer o que quisessem, foi assim que o cosmo os criou. Essa era sua natureza. – Disse a criatura. – Talvez, para eles, o que vemos como proteção e demais vantagens, não fosse nada além de amarras. Uma corrente que lhes prendia as escolhas e decisões que não foram tomadas por eles. – Externou. – Eles almejavam... – Procurou pela palavra, uma que ouviu a muito tempo, aquela que saiu dos lábios dos humanos que ali viviam. Qual era mesmo? – Liberdade.
– Liberdade... – Frieda experimentou a palavra, degustou tentando sentir o seu sabor. Aquela palavra lhe aqueceu momentaneamente, lhe fez sentir como se tivesse descoberto algo que procurava há muito tempo.
– Eles ansiavam por essa tal liberdade. – Prosseguiu o coelho. – Me recordo de que os deuses lhes disseram que buscavam algo que não havia sido concedido a nenhuma espécie. Tentaram dissuadi-los, avisaram que se fossem lá fora à procura da liberdade acabariam encontrando nada além de desgraça. Até mesmo lhes informaram de que perderiam a graça concedida pela Paradiesbaum, uma das criações do cosmo, lhes disse que teriam de colher o fruto dela, fragmentá-lo e reparti-lo entre si, que teriam de comê-lo e como consequência... – O coelho transmitiu suas palavras de maneira mais baixa, quase como um sussurro. – iriam perder sua amortalidade, teriam sua expectativa de vida gradativamente reduzida até que não fosse nada além de um efêmero sopro.
O coelho parecia triste, talvez ele acabara de se lembrar de humanos que estimava.
– Por que fazer isso? – Indagava mais para si mesmo. – Se o preço, o custo, o valor pago em troca dessa tal liberdade era tão elevado, por que se dispor a pagá-lo? Diga-me, Frieda. – Ele olhava para ela com olhos marejados. – Por que fizeram algo como isso a si mesmos? Ou melhor, por que nos abandonaram? O amor que demos a vocês não era o suficiente para superar seu anseio por essa tal liberdade? Por que tinham que ser tão gananciosos?
Frieda não tinha resposta, sendo humana, não sentia que a humanidade tinha cometido um erro em sua escolha. Sequer poderia dizer com confiança que não teria deixado aquele lugar em busca da liberdade junto aos outros.
– Vocês se afastaram dos deuses, muitos deles se ressentem e já não confiam mais em quem conviviam como se fossem amigos, como irmãos de fato. Os Haidu se tornaram mais poderosos, se tornaram ainda mais gananciosos, cederam por completo a sua sede de conquista. E vocês... – Falava o animalzinho. – Não somente foram embora, como nos esqueceram, nos transformaram em lendas em meros mitos. Negaram tanto aos deuses e Haidu que até mesmo forçaram um fenômeno que criou uma nova realidade, não seria falho dizer que vocês podem ter condenado não só os Haidu, mas também aos deuses a um exílio em outro plano ao tentarem nos esquecer. – Externou. – Por que fizeram algo tão cruel? Será que o fizeram para aplacar a culpa ou a saudade?
Ele encostou a fronte na árvore e buscou se acalmar.
– Toda aquela dor e peso que sentiu quando chegou aqui, não foi porque esse lugar estava lhe rejeitando, foram vocês quem nos rejeitaram primeiro. – Disse com um tom mais baixo de voz. – Liberdade é algo tão importante assim?
Frieda assimilou aquelas palavras, ela compreendia a validade por trás dos questionamentos e da tristeza de seu amigo.
– Eu não sei responder às suas perguntas. – Disse a mulher. – Como disse, nosso tempo de vida foi reduzido a um sopro, muita coisa não foi repassada para próximas gerações, muita coisa se perdeu no tempo, que outrora era irrelevante e agora é uma das coisas que mais tememos ou apreciamos. – Comentou. – Eu sei como doi ser abandonado, então entendo o seu descontentamento, mas não posso deixar de te falar que considere a possibilidade de simplesmente não o termos esquecido de propósito.
– Está dizendo que não nos esqueceram conscientemente? Que o fizeram de forma natural em decorrência do tempo? – Havia certa medida de incredulidade, baseado em sua realidade aquilo era no mínimo incomum.
– Você já foi lá fora mesmo que apenas um pouco? – Perguntou serenamente.
– O que há para ver lá? – Disse como se fosse óbvio, ainda soava triste.
– Medo. – Respondeu ela. – Medo é o que há. Essa é a única coisa que a humanidade nunca esquece. Entenda que não é pessoal, vocês não foram os únicos esquecidos. Com o tempo tendemos a esquecer de tudo, tudo menos o medo. Contudo, ainda que não consigamos esquecer o medo, nós o enfrentamos. Sabe por que?
O coelho ponderou.
– Ele ameaça a liberdade? – Respondeu.
– Sim, ele ameaça a liberdade. A tal liberdade que escolhemos perseguir. – Falou para ele.
– E se liberdade realmente for algo que nenhuma espécie possa ter? – Indagou após um suspiro.
– Não é óbvio? A humanidade já decidiu pagar o preço, não? Somos cabeça dura, gananciosos e persistentes, e ainda que eu não saiba ao certo o que é essa tal liberdade, posso lhe dizer que a humanidade irá seguir usando suas vidas curtas para persegui-la pela eternidade. – Expressou. – Talvez essa seja realmente a nossa natureza.
O coelho se afastou da árvore, então olhou para o chão como se pensasse profundamente no que fazer.
– Vou continuar te ajudando como posso, não dá para perseguir nada pela eternidade se sua espécie for extinta. – Disse ele. – Não posso falar pelos demais residentes desse lugar, é provável que as bestas cardeais também se ressentem. – Externou. – É provavel que você deva derrotá-las, mas seria bem melhor se conseguisse aprender com elas antes disso.
– Aprender com elas?
– Sim, as bestas são, acima de tudo, detentoras de certos conhecimentos. – Expressou o coelho.
– A julgar pelas coisas que você me contou, o potencial ressentimento, eu não acho que estarão dispostas a compartilhar quaisquer que sejam esses conhecimentos. – Pontuou.
– Se não lhe ensinarem nada, então você terá que absorver esse conhecimento durante os embates. – Disse o coelho. – Fique de olhos bem abertos, não deixe nada passar, aproveite a situação e absorva. Como nada aqui dentro morre, é provável que você também não morra, apesar de ainda ser capaz de sentir dores excruciantes, então pode usar isso ao seu favor e levar o seu tempo para discernir as coisas. Se não derrotá-las na primeira vez, se recupere e tente de novo depois.
– "Provável". – Frieda murmurou. Aquilo não era nada encorajador, principalmente porque mesmo que não morresse teria que vivenciar experiências bem dolorosas. Ela fechou os olhos por um instante. – É melhor acabarmos logo com isso. Pode me levar até o lugar em que encontrarei a primeira besta?
– Sim, e posso fazer mais que isso. – Falou ele. – Eu me disponho a ser o seu mensageiro, levarei o seu desafio até as bestas.
– Você não tem medo? E se elas ficarem ofendidas? – Inquiriu.
– Elas não vão me ferir. Além disso, serei apenas o mensageiro, vou levar mensagens, não sou eu quem as está desafiando. – Disse o coelho. Ele parou de falar, mas encarava Frieda como se quisesse revelar algum de seus pensamentos.
– Diga logo. – A mulher o incentivou.
– Frieda, eu sei que disse que lhe ajudaria como pudesse para que se tornasse forte e protegesse os humanos...
– Mas? – Instigou.
– Você não precisa passar por isso se não quiser. – Externou. – Você é apenas uma dentre muitos outros humanos, ninguém poderia te culpar se decidisse tentar algum acordo para conseguir se manter aqui, onde é seguro, mesmo que o mundo humano lá fora viesse a ruir.
Frieda desviou o olhar e então fitou a árvore.
– Sabe coelho, eu perdi muita coisa. – Falou. – Então eu ganhei muito e voltei a perder e quando perdi senti o forte desejo de me rebelar contra esse mundo, de abandonar tudo e todos, de me escolder em uma caverna e passar o resto dos meus dias lá ou simplesmente me livrar do fardo que o ato de estar vivo se tonou, indo contra aquilo que meu pai me ensinou, indo contra o "senso do dever".
– "Senso do dever"? – Perguntou o coelho.
– Aquele senso que nos leva a proteger, com nossas vidas, crianças que sequer conhecemos, por exemplo. Uma parte de nossa consciência que nos obriga a fazer o que é considerado certo ainda que custoso e muitas vezes sem qualquer benefícios para nós. – Tentou explicar. – O ponto é que eu não me rebelei, em vez disso cedi ao completo desespero e experimentei o ápice da desesperança. Desci ao fundo do poço e escavei para um lugar ainda mais profundo.
– E o que encontrou lá?
– Ódio e uma sede incontrolável por vingança. A mesma vingança que tinha me condenado a perder tudo o que havia me restado anteriormente, mas eu já não me importava. – Confessou. – Então, sr. coelho, a princípio eu não decidi arriscar a minha vida em busca de poder por uma razão nobre como "salvar a humanidade". Eu só queria me vingar.
– Mas não acho que ainda seja apenas por vingança. – Olhava para ela com certo otimismo.
– Ainda quero e vou me vingar, talvez a vingança também faça parte da natureza humana ou eu apenas esteja dando desculpas para validar a escuridão em minha alma. – Falou ela. – Contudo, o fato é que encontrei pessoas que quero proteger, ainda que já não me importe mais comigo mesma. – Expôs Frieda. – Quero dar a essas pessoas alguma esperança, para que elas não se afoguem em desespero e desesperança. Desejo que vivam, ainda que a vida humana seja ínfima, e encontrem elas mesmas a coisa que eu não fui capaz de manter para mim.
– Que seria?
– Eu não sei. – Respondeu. –Talvez... Felicidade? – Pesou aquela palavra. Voltou a encarar o coelho. – Vamos começar. – Mudou de assunto. – Por favor, vá na frente e envie uma mensagem para a besta cardeal sudeste, diga a ela que uma desafiante apareceu e que deve vir me encontrar no caminho. Eu vou tomar da seiva da Paradiesbaum e então irei logo depois de você.
– Não sabe os efeitos da seiva da Paradiesbaum, considerando que você possui um corpo mortal, é provável que sinta efeitos adversos de imediato e só depois que passar por isso é que sentirá os benefícios. – Informou.
– Eu imagino, mas tenho que suportar, me erguer e lutar. Essas são as minhas únicas opções. – Disse ela.
– Vou na frente então. – Falou o coelho. – Não esqueça de que deve tomar apenas uma gota. Não dá para saber o que acontece se tomar mais que isso, apesar de está em um ambiente onde nada morre você ainda é uma humana e como sua raça foi exilada, também é uma forasteira. Mesmo que seja uma convidada.
– Eu vou ficar bem, não se preocupe tanto comigo. – Provocou ela.
O coelho ficou sem graça.
– Quem está se preocupando com você? – Disse sem jeito e foi embora.
– Podia experimentar ser mais honesto. – Murmurou, mas logo sentiu que aquelas palavras combinavam consigo e se arrependeu de tê-las dito. – E então, Paradiesbaum? – Caminhou até a árvore com sua Guan Dao em mãos, colocou a lâmina contra o tronco e fez pressão para que sangrasse. Nada aconteceu. – É dura demais. – Olhou para um galho mais fino, subiu na árvore para alcançá-lo e após certo grau de esforço finalmente conseguiu a seiva. Contudo, cometeu o erro de consumir a gota antes de descer.
No instante em que a seiva entrou em seu organismo foi rapidamente absorvida, um calor escaldante surgiu em seu anterior, uma onda indescritível de dor lhe atingiu e Frieda ficou paralisada, seu corpo perdeu o apoio e ela despencou nove metros até o chão. Apesar de ter resistido bem a queda sem preparo, ela ainda se viu sem ar como se estivesse morrendo por conta da seiva. Estava completamente vulnerável. Seu coração batia como o de um cavalo, suava frio, suas veias estavam saltadas e ela sentia que seus olhos abandonariam as órbitas. O desespero se tornou ainda maior quando o núcleo finalmente foi alcançado, Frieda sentia que seu núcleo de heilig estava sendo atacado, ela precisava fazer algo ou ele ia ser destruído. Se isso acontecesse, na melhor das hipóteses, ela nunca mais seria capaz de conjurar nada, o que seria bem pior que a morte. A mulher tentou usar o que sobrou de sua sanidade frente a toda aquela dor para controlar o fluxo de heilig e blindar o núcleo, nesse momento percebeu que, o que quer que tivesse naquela seiva, não estava atacando seu núcleo e sim sendo absorvida por ele. Frieda mudou a abordagem, em vez de blindar teve que fortalecê-lo para evitar o colapso.
Aquilo não era fácil, a mulher levou todos aqueles anos para dominar o fortalecimento e evolução do núcleo de heilig através da meditação, mas era praticamente impossível se concentrar naquele estado. Além disso, ainda que fosse considerada um gênio, ela levou anos para conseguir alcançar aquele nível de núcleo fortalecido, uma vez que era extremamente perigoso acelerar o processo, no menor dos deslizes era provável que sua vida se esvaísse. Mas ela não tinha escolha agora, teria que apostar que suas chances de morrer estando naquele lugar eram menores e acelerar as coisas, mandou toda a energia para o núcleo a fim de evitar seu rompimento, perdeu e recobrou a consciência várias vezes e a cada vez que ficava inconsciente ficou mais claro que deveria evitar o desmaio o máximo possível, já que tinha que gastar muito para se recuperar a ponto de retomar o fortalecimento.
Quanto tempo se passou? Horas? Minutos? Frieda não soube dizer, aquilo a teria destruído se estivesse no mundo humano, disso ela tinha certeza e o que mais lhe chocava era que tinha sofrido tudo aquilo após consumir uma única gota.
A dor passou e ela já respirava sem dificuldade, se colocou de pé e sentiu-se extremamente leve. Caminhou até o rio e lavou o suor de seu rosto e braços. Era hora de ir atrás do coelho.
– Será que eles já estão vindo? – Perguntou a si mesma.
O coelho era bem veloz, Frieda começava a se questionar se teria feito certo em mandá-lo tão antecipadamente. O fato é que ela não esperava que tomar da seiva da Paradiesbaum fosse tão terrível. Agora era tarde demais para lamentar, teria que correr e chegar em um local propício ao combate. A mulher pegou sua Guan Dao, apanhou um punhado de frutas pequenas em um sexto e começou a correr. No primeiro momento foi tão rápido que quase perdeu o equilíbrio, ela parou e se analisou, era evidente que estava bem mais rápida, a leveza que estava sentindo certamente vinha do fato de seus atributos terem se elevado.
Frieda voltou a correr, comia das frutas enquanto avançava, quase não sentia desgaste físico, sentia que poderia até mesmo voar se desejasse, saltava de arvore em arvore sem dificuldades, deslizava nas ladeiras e serpenteava com maestria mesmo em terreno adverso. Em pouquíssimo tempo já estava bem longe do centro, pisando em terras do território sudeste, enquanto corria se experimentava, testava-se em busca de seus novos limites, até que finalmente se viu em um local descampado. Por que parou de correr? Bom... primeiro, ela sentiu uma presença forte e por instinto se deixou frear, então viu se aproximar um brilho ofuscante do outro lado da campina.
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Então galera, peço desculpas por demorar tanto. Aconteceram umas coisas bem chatas. Agradeço pela paciência.
Espero que tenha aproveitado o capítulo. Deixo de spoiller que apartir de agora vou tentar incluir algumas criaturas do folclore brasileiro, é claro que nada será 100% igual até porque até nos repasses dessas lendas para as próximas gerações ocorrem variações. Me pergunto se algum de vocês será capaz de identificar todas as criaturas mitólogicas. bjs no coração <3
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