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Capítulo LVII


Aquela amável voz veio e desapareceu rapidamente,  por algum tempo Frieda sentiu toda a dor e tristeza que emanou dela, porém, todos os sentimentos contidos da mulher começaram a enfraquecer e se esvair, e antes que ela se desse conta do se passava consigo já estava se tornando uma com a sua dor e tudo que lhe restava era silêncio e agonia naquele vazio infinito. Frieda não despertou após a partida de Erna, algo nela gritava que estava sozinha agora e sem propósito para ir lá fora, então o pássaro de asas feridas se encolheu e se refugiou naquele lugar sombrio no qual ninguém o poderia entrar. Seu corpo estava curado, mas não há oração que cure os ferimentos presentes na alma, por isso Wanderfalke recolheu suas asas e fugiu da realidade dolorosa, fugiu do mundo que ardia lá fora. Contudo, o mundo não espera por você e enquanto o falcão peregrino se escondia dentro de si mesmo, o caos se instaura.

Devido ao desastre do plano falho, a humanidade se viu forçada a recuar, os Haidu ocuparam solo do reino de Weinrose na fronteira, mas em razão das Irmãs do Inferno terem recuado também, os Haidu não perseguiram seus inimigos e optaram por aguardar as ordens da parte superior da cadeia de comando. Em pensar que houveram aqueles que acreditavam que os Haidu não eram nada além de bestas movidas por seus instintos. Que piada.

A fim de saber o que tinha acontecido o Comandante Axel enviou alguns batedores para Wald von Grenze, dentre eles estava Ignaz, herói de Lichtblick tal qual Frieda e Hansel. O estômago do homem certamente se revirou diante do horror encontrado ali, sangue e vísceras já começavam a atrair moscas aos cadáveres espalhados, ele encontrou e reconheceu os corpos dos Irmãos de Frieda e não pode conter a tristeza por ter perdido pessoas de quem havia se tornado próximo, porém também foi atingido pela aflição ao pensar sobre o quão poderosas eram as criaturas que foram capazes de esmagar o pelotão de elite naquela proporção. Enquanto caminhava pelo que sobrou do campo de batalha, Ignaz encontrou alguém repousando ali alheia ao caos ao seu redor, sua respiração indicava que estava adormecida e não havia nenhum arranhão em seu corpo apesar das roupas em frangalhos e de estar suja de sangue. O Cavaleiro imediatamente chamou por ajuda e não pôde deixar de notar o brinco na mão da mulher, olhando o objeto ele se perguntou como a Cavaleira desacordada teria conseguido sobreviver, se ela havia sido poupada após adormecer ou se tinha caído depois de afastar os inimigos, também não deixou de considerar que Erna tivesse sua mão naquilo tudo, mas não a tinha encontrado nem viva nem morta para perguntar, mais tarde, estranhamente achou apenas suas roupas que haviam sido carregadas pelo vento para um ponto um pouco mais afastado .

Frieda foi movida para o quartel general e permaneceu alí por três dias, mas como não sabiam o que fazer com ela uma vez que não despertou por nada, a enviaram para a base na capital real, onde seria interrogada no momento em que acordasse. Por todo o caminho, na carroça de transporte, Frieda foi alimentada com líquidos na colherada, era limpa e trocada periodicamente por uma mulher não desperta que dedicou sua vida a servir na catedral de Kamelie e se ofereceu voluntariamente para auxiliar no quartel general, tal qual muitos outros não despertos que também se dedicaram ao serviço sagrado.

Durante os muitos dias que durou a viagem, Frieda permaneceu no reino da inconsciência, então ela não presenciou os olhares das pessoas lá fora, a desesperança e o medo que se espalhava. Dizem que boatos viajam mais rápidos que os cavalos mais velozes e certamente foi o que aconteceu, uma vez que uma multidão já aguardava em Kolibri quando o pequeno comboio no qual Frieda estava chegou.

As pessoas abriram espaço para que pudessem passar, mas não deixaram de clamar por informações, por confirmação da situação, seus questionamentos se uniram em uma confusão de vozes e nenhum deles foi respondido pelos Cavaleiros no comboio uma vez que essas eram as ordens a serem seguidas, obviamente se acendeu a ira do povo e os humanos fizeram o que sempre fazem em momentos difíceis: Procuraram a quem culpa. Eles já sabiam que a humanidade havia perdido uma vez mais, contudo, o fato de que o pelotão de elite tinha sido esmagado era o principal motivo de sua preocupação. Fofocas e inverdades foram rapidamente espalhadas acerca dos acontecimentos por trás da sobrevivência de uma única pessoa do pelotão.

As histórias inventadas sobre a mulher adormecida iam desde "ela fugiu e se escondeu para sobreviver" até acusações de traição, muitos eram aqueles que diziam que Frieda vendeu seu pelotão em benefício próprio, outros falavam que ela só era tão forte por ter firmado um pacto com algum Haidu, até mesmo sua origem foi questionada e o nome de Heinrich foi trazido à tona como um desertor, "tal pai tal filha" – Eles diziam. Parentes de membros do pelotão de elite que foram brutalmente assassinados viajaram para Kolibri e gritavam acusações hediondas a medida que Frieda passava, chamavam-na de assassina, traidora e até mesmo de bruxa, suas vozes soavam tão altas que venciam a barreira da escuridão infinita e chegava ao inconsciente de Frieda, local onde sua alma se encolhia agarrada aos joelhos.

Frieda não acordou mesmo após chegar na capital, Heiko foi vê-la logo no momento em que ela chegou, sua face transmitia algo que nenhum de seus colegas jamais tinham visto, extrema preocupação. O rapaz passou a ajudar nos cuidados com a mulher, ele providenciava tudo o que fosse necessário e afastava-se dela somente algumas vezes por dia, sempre vigiando seu sono e conversando na esperança de que ela o ouvisse e acordasse logo. Em alguns dias um pacote pequeno chegou até ele junto com uma carta, a carta informava que os corpos dos irmãos de Frieda tinham sido cremados e que as urnas com suas cinzas foram movidas para Gesteck por enviados da guilda Stachel, a carta redigida por Ignaz também informava sobre o que havia dentro do pacote e instruía Heiko a entregar seu conteúdo para Frieda quando ela acordasse.

Frieda dormiu por quase três meses, nesse tempo ela ficou confinada em um quarto sob total vigilância, um manipulador de heilig de atributo água vinha para cuidar de sua saúde uma vez por semana, ela ainda era alimentada por líquidos e era Heiko quem fazia essa tarefa, ele mesmo pediu por isso e ninguém ousou contestar.

Lá fora tudo ia de mal a pior, ainda que os Haidu não tivessem lançado um ataque massivo contra a humanidade, as nações seguiam reféns do medo, principalmente em Weinrose, o reino mais próximo do exército Haidu e o primeiro que seria dizimado. A fome começou a assolar algumas regiões, isso porque membros do culto Finsternis incendiaram lavouras e reservas de comida em todo o reino. Aproveitando-se da desordem, a nobreza começa a pressionar o rei, pedindo que ele tome alguma atitude, a verdade é que querem que ele renuncie sob a desculpa de que é incapaz de lidar com a crise atual. A notícia do surgimento de um inimigo poderoso o suficiente para esmagar o pelotão de elite se espalhou e ganhou força, o povo está aflito e quer uma resposta. A fim de proteger sua posição o rei escreveu múltiplos decretos e impôs pena de morte até para os crimes mais brandos, sua loucura já não tinha limites ou remédio, servos e guardas no palácio estavam sendo executados de acordo com o humor de sua majestade. Tudo parecia que não tinha como piorar, até que a base em Kolibri, local onde repousava Frieda, recebeu uma carta.

- O que diz? – Indagou a administradora geral da base.

- Sua majestade expressa sua desconfiança quanto a única sobrevivente do pelotão, o rei diz que ela é possivelmente uma traidora e que por isso foi deixada viva pelos Haidu. - Mencionou seu ajudante.

- Não acho que faça sentido, dentre as baixas estavam todos os irmãos dela, mesmo a Cavaleira Erna que foi enviada mais tarde desapareceu, encontramos apenas suas roupas no local. - Respondeu a mulher. - Parece que é verdade o que disseram sobre o rei está louco.

- Modere a fala, vai acabar sendo sentenciada também. - Exortou a ajudante. - O ponto é que o único interessado o suficiente no caso dela é o Inquisidor Klaus, mas ele está defendendo a fronteira agora. Acredito que ninguém em Kamelie irá se mover em favor da mulher, uma vez que o povo também deseja alguém a quem culpar. Certamente vão usar a oportunidade para evitar uma revolta interna que pioraria a crise, a unica noiticia boa é que felizmente seja lá o que aniquilou o pelotão de elite não voltou a aparecer de novo.

- Pobre mulher! - Lamentou.

- Enfim... Logo logo receberemos informações sobre sua sentença.

- Sequer darão a ela o direito de se defender e provar sua inocência? - Indagou escandalizada.

- Já olhou para ela. - O homem apontou. - Ela parece em condições ou parece ter vontade de se defender? Ainda que tenha acordado a dois dias, ainda não nos disse uma palavra sobre o ocorrido, nem mesmo o Cavaleiro Heiko foi capaz de persuadi-la. A mulher parece uma casca desprovida de alma e vontade, é como se já estivesse morta.

- Rezo para que ao menos o seu fim seja rápido e que reencontre aqueles que perdeu no pós vida. - Desejou a administradora. – Mas acho que na situação em que estamos é muito desperdício se desfazer de alguém tão forte, ainda que seu estado esteja deplorável.



❇❇❇



Após sete dias desde que despertou, Frieda recebeu uma visita vinda de Kamelie, a mulher entrou no quarto acompanhada por Heiko e uma criança, as olheiras marcavam seus olhos fundos, Frieda não olhou para ela, sequer pareceu notar sua presença. Ada soltou a mão de Anelie e se aproximou da mulher, ficando na frente dela em silêncio, analisando seu rosto desprovido de sinais de qualquer vivacidade, então chegou mais perto e a abraçou sem dizer nada por um tempo, apenas chorou e soluçou, Anelie foi para junto da mãe e se agarrou a tia também, a criança chorava, ela mal entendia sobre a vida e se viu forçada a entender sobre a complexidade da morte.

– Não foi culpa sua. – Ada disse finalmente. – Não foi culpa sua. – Ela repetiu.

– Ti-tia. – Anelise soluçava. – O pap-pai... O pap-pai... – Ela não conseguia dizer, apenas chorava a plenos pulmões, chorava por ela e pela mulher nem viva e nem morta em seus braços.

Frieda não reagiu por um longo tempo, mas em algum momento ela afastou as duas e se levantou cambaleante, então fez o melhor para ficar ereta como um soldado deveria fazer, com o corpo aprumado era chegada a hora de roboticamente cumprir o seu dever como Cavaleira, o dever destinado para aqueles que sobrevivem, para aqueles em posição de comando. Diante dela não estavam apenas sua sobrinha e cunhada, estavam os familiares de soldados que lutaram, e morreram ao seu lado, seria indigno não prestar as formalidades.

– Johann Falkenberg. – Começou a falar pela primeira vez em meses. – Leon Falkenberg, Leona Falkenberg, Ralf Falkenberg, Hansel Krüger Falkenberg, Felix Falkenberg e Erna Hertz Falkenberg, lutaram bravamente no campo de batalha e pereceram com sua honra mantida. – Certamente doía dizer cada uma daquelas palavras, mas elas precisavam ser ditas. Se ela não fizesse, quem faria? – Sua força, bravura e coragem irão inspirar canções e histórias durante mil anos. Foi um prazer servir ao lado de soldados tão poderosos.

Ada meneou a cabeça em negativa, ver alguém que ela amava naquele estado a fazia sofrer, ela amava Johann com tudo de si, mas sabia que naquele mundo, se havia alguém sofrendo tanto quanto ou até mais que ela, essa pessoa era aquela mulher incapaz de chorar diante dela. Ada se levantou da cama, onde estava sentada, e segurou levemente Frieda pelo pulso, a garota não resistiu, seu trabalho estava feito, então de maneira automática e sem vontade ela voltou a se sentar entre a cunhada e a sobrinha. Enquanto as duas lamentavam a perda, Frieda se manteve fitando a parede em sua frente, Heiko assistia a tudo aquilo e certamente se perguntava acerca do que se passava na mente da mulher, ele não podia ver, mas rente ao rosto de Frieda alguém, uma figura infantil, se encontrava de pé, olhando dentro dos olhos da mulher enquanto ouvia todas as vozes conflitantes que a acusavam de todo tipo de coisa. Frieda não piscava, ela olhava de volta para dentro dos olhos da figura diante dela. Quando o tempo acabou e Ada finalmente partiu, a garota pôde retornar ao completo silêncio.

Dois dias após a reunião de Frieda com Ada e Anelie, um decreto finalmente chegou, ele foi recebido com apatia por Frieda e com ira contida por Heiko.

Como esperado, o rei insensato se aproveitou da insatisfação do povo para com a sobrevivente bem como os boatos amplamente espalhados para coloca a culpa da falha no pelotão de Frieda e como ela foi a única a sobreviver terá que receber a sentença sozinha, condenada a ser queimada viva em praça pública, ele fez isso uma vez que não foi capaz de imputar nela o crime de traição por falta de provas. Como esperado, Kamelie não interviu, sua atenção estava focada demais em defender a humanidade contra os Haidu, uma única vida não era tão significativa para fazê-los se moverem diante os caprichos insanos do rei. Dentro de quatro dias, assim que os preparativos estivessem prontos a mulher iria queimar diante dos olhos do povo, a partir do momento em que recebeu a sentença ela foi movida para uma cela sob protestos do jovem Heiko.

Depois de algumas horas na cela, Frieda tem um momento de consciência, mas suas memórias pareciam confusas, afinal para ela o tempo não passou.

– O que está acontecendo? Porque ainda estou viva? – Disse tocando seu peito.

Sua fala desperta a atenção de Heiko, o rapaz está sentado em uma cadeira do lado de fora da cela, vigiando a mulher. Um guarda está ali também, mas alheio a tudo, apenas cumprindo suas ordens.

De repente as imagens de seus irmãos morrendo invadem sua mente e imediatamente Frieda cai em completo desespero, era como se eles tivessem morrido horas atrás para ela, uma dor latente arranca o ar de seus pulmões e ela tenta se acalmar e buscar racionalidade, nega completamente a possibilidade das suas memórias serem reais. Em algum momento ela se lembra de Erna e lembra de ter ouvido a voz dela.

– Onde está Erna? Por que ela não está aqui? Por favor, alguém chama ela pra mim. – Pediu transtornada. Sua sanidade evidentemente por um fio.

Frieda finalmente ergue o rosto e olha pra quem está diante dela, Heiko tem uma expressão angustiada, parece procurar as palavras pra dizer, não queria que fosse ele a dar a notícia para Frieda. A garota percebeu a resposta para sua pergunta no rosto do garoto, ele não estava fazendo comentários sem filtro, não estava falastrão, estava terrivelmente quieto. O ar voltou a sumir de seus pulmões e o desespero retornou.

- Não! - Bradou ela. - É mentira! Seu mentiroso! - Ela negava a verdade, negava a realidade. - Erna...- Ela começa a proferir o nome gritando, mas no meio dele sua voz vai sumindo.

A mulher tentou se colocar de pé, mas falhou miseravelmente e caiu no colchão de palha no chão onde estava sentada antes, ela sufocava, seus olhos reviraram e seu corpo tremia, ela se jogou de lado. Heiko tomou a chave do guarda e invadiu a cela sob protesto, correu para junto da mulher e a abraçou, pediu ao guarda que fosse chamar um usuário de água e por medo da prisioneira morrer sob sua supervisão ele partiu, um homem em seus quarenta anos chegou e tentou usar orações, mas não teve sucesso, então ele a fez desacordar e acendeu incensos calmantes e velas, moeu algumas ervas e misturou com a água, Heiko a fez ingerir. Frieda dormiu por todo aquele dia e ao despertar passou os próximos dias sem comer ou beber nada, vegetando. Até que Heiko tenta convencê-la a comer na noite antes da execução.

– Você precisa ao menos tentar. – Suas palavras eram quase uma súplica.

Ela não responde e a princípio ele aceita que seria apenas mais um dia em que ela ignora a existência de tudo e se isola dentro de si mesma, ele entra na cela e deposita a bandeja no chão perto do colchão, mas antes que o rapaz possa deixar a cela, a mulher, vestida com vestes brancas e longas de cortes retos e com mangas largas que cobriam todo o braço, finalmente quebra seu silêncio.

- Você não entende! – Ela murmurou. Talvez o fato de que morreria no dia seguinte a motivasse a falar, quem sabe fosse uma demonstração de gratidão pelo zelo que Heiko demonstrou todo esse tempo. Quem sabe uma última conversa com alguém que a chamou de amiga.

Heiko foi para fora e sob o olhar de desaprovação do guarda ele apanhou a cadeira e a levou para dentro, então se sentou frente a ela.

– Me diga o que eu não entendo. – Pediu.

Ela não o olhou, fitava o nada como fez por todo esse tempo.

– Eu já não tenho mais razão ou prudência, já não tolero, não sinto empatia ou alegria, a minha tenacidade se foi e sinto que a bondade também. – Ela falou em um fôlego só. – A muito tempo o amor também morreu. – Ela fez uma pausa tão longa que pareceu que jamais voltaria a falar – Eu seria uma casca vazia agora se não fosse pelo ódio e a sede insaciável de vingança que são as únicas coisas que me sobraram. Esse sentimento aterrador que corre pelas minhas veias e rasteja sob a minha pele como se fosse um agrupamento de vermes e larvas.

– Então era disso que você era feita? De seus irmão? – Frieda não respondeu, mas Heiko não desistiria, ele precisava fazê-la reagir de alguma forma. – Não convivi muito tempo com eles como você, mas acredito que Erna era a razão, acho que Leon era a prudência, Felix obviamente era a alegria, Ralf era o que? Tenacidade combina com ele, imagino que Johann era a tolerância e Leona a empatia, Hansel era a bondade, eu presumo, apesar de toda aquela racionalidade dava para ver seu coração mole. – Analisou ele. – Me diga, quem era esse amor que morreu? – Indagou o jovem.

Mais uma vez o silêncio se abateu sobre eles, Frieda parecia em um dilema sobre responder ou não. No fim decidiu que já não tinha nada a perder.

– O meu pai. – Respondeu ela. – Ele era amor, quando o amor morre nós apegamos aos outros sentimentos para nos mantermos humanos, mas agora todos os meus sentimentos me foram tomados outra vez. Voltei a ser vazia. Me tornei um terreno onde nada de bom cresce, apenas ódio, então terei de me apegar ao ódio para preencher o completo vazio que sou agora. Antes deles eu era nada, antes deles eu não tinha nada e agora voltei a ser o que era.

– Me conte mais sobre o que há aí dentro, me deixe saber. – Pediu. – Somos amigos afinal.

Frieda o olhou com olhos ocos e desviou o olhar a seguir.

– Como lhe disse, eu era vazia, mas Heinrich me encontrou e me deu amor, depois disso eu passei a querer cada vez mais, sempre numa busca incansável para me preencher, quando Erna entrou na família ela contribuiu para esse preenchimento, ela era inteligente e cuidadosa, sempre tentava ver as coisas de forma racional, ela me preencheu com a razão. – Externou pela primeira vez. – De alguma forma, depois dela, eu entendi que dava para me livrar do vazio se me rodeasse de pessoas, então me tornei gananciosa. Quando encontrei Felix sequer hesitei, vi nele algo que me faltava, ainda que sua vida fosse miserável ele não abandonou o desejo de ser feliz e seguia buscando mais e mais fragmentos de alegria. – Falou.

Será que Heinrich percebeu o que ela estava fazendo e permitiu? Quem sabe?

– Depois dele encontrei os gêmeos Leon e Leona, ainda que estivessem em uma situação semelhante a minha eles ainda não tinham desistido, eles não estavam vazios como eu. Leon me preencheu aos poucos com sua prudência e Leona me preencheu com sua empatia. - Prosseguiu. - Nas ruas de Bienenstock encontrei alguém que lutava para sobreviver e se agarrava a vida com todas as forças, Ralf preencheu meu vazio com sua tenacidade. – Ela fez uma pausa, o nome de Ralf amargava em seus lábios, flashs de memórias do dia em que se encontram às escondidas perto dos estábulos vieram e se foram rapidamente. – Nas montanhas de Bergspitze Biene encontrei Johann, um garoto dedicado ao serviço sagrado e ao homem que o salvou e criou, ele me preencheu com sua tolerância, era alguém que aceitava as pessoas como elas eram, perdoava as faltas de todos, relevava o mal que lhe faziam, acreditava que todos mereciam segundas chances e sempre dava o benefício da dúvida. Hansel era gracioso, me preencheu com sua bondade, não se deixou corromper mesmo após vivenciar o pior lado dos humanos e dos Haidu.

Frieda fez outra pausa, lutava contra as vozes que a condenavam a cada fala. Heiko não lhe interrompeu, aguardou pacientemente. A garota se colocou de pé, seus corpo se movia de forma desordenada e seus olhos mexiam olhando para vários lugares e nenhum lugar em especial ao mesmo tempo.

– Cada um deles me preencheu de alguma forma, e os sentimentos que eles me deram era o que eu usava para conseguir me misturar no meio de humanos tão diferentes de mim, por causa deles eu podia ser Tolerante, bondosa, tenaz, arrazoada, prudente, ter empatia, ter alegria e até sorrir de vez em quando. Eles me tornaram no que eu era. O que sou agora que todos os meus sentimentos se foram? – Perguntou em retórica. Estava agitada, falava com certa euforia. – Vazia. – Respondeu, praticamente gritou. – Completamente vazia. – Ela parou de se mover, sua fala foi serena e dolorida.

Heiko aguardou que ela continuasse, mas como ela não o fez sentiu que era hora de intervir. Ele se levantou e se aproximou, não planejava tocá-la, mas queria ficar perto o bastante para dar apoio emocional, só não esperava a reação explosiva dela antes que ele pudesse dizer qualquer coisa.

– Não chegue mais perto de mim! – Ela brada o empurrando. Heiko cambaleia mais não cai, ele está um pouco surpreso. – Você... tudo em você me faz lembrar de pessoas que não vão mais voltar. – Sua voz estremece, ela lamenta, mas ainda não chora.

– Eu não posso simplesmente te deixar sozinha. – Ele responde e tenta soar o mais suave possível.

– Por que não? não vê que é inútil? – Ela se agita ainda mais, sente uma profunda raiva crescer, mas não é raiva para com Heiko e sim para consigo mesma. – De qualquer forma, eu serei executada amanhã. – Disse ela por fim e havia certo grau de alívio em sua fala.

O rapaz apresentou um olhar vago e misterioso.

– Eu vou te ajudar. – Disse ele se aproximando um pouco. – Eu posso te ajudar a fu...

– Não! – Ela o interrompe de maneira abrupta e se afasta dele. – Não vê que não quero fugir?

– Então o quê? – O rapaz se mostra um pouco magoado. – Vai simplesmente morrer? – Ele respirou fundo e buscou alguma calma. – Quando lhe trouxeram você estava desacordada e sem perspectiva de recobrar a consciência, suas roupas estava em frangalhos, cheias de cortes e rasuras, você certamente ficou em um estado deplorável em algum momento e como não encontramos nada além das roupas e objetos pessoais da senhorita Erna, só posso crer que foi ela quem a salvou a custo de um grande sacrifício, afinal eu a vi bisbilhotando na ala proibida mais de uma vez após aquele dia. Pretende deixar que esse sacrifício tenha sido em vão? Devo dizer a todos que ela usou o que não devia ainda que isso manche a memória dela? Sabe que não falei nada por que era o que você iria querer que eu fizesse, mas não vou te deixar morrer. – Se exaltou.

O ambiente pareceu se tornar frio, as verdades proferidas eram dolorosas demais para serem ouvidas por quem já tinha desistido.

– Saia. – Frieda disse friamente.

– Eu não... – Dizia Heiko arrependido.

– Saia!? – Ela vociferou em um som quase gutural. – Não há remédio para mim além da morte, a vingança me trouxe ao ponto em que estou agora e ainda sigo me agarrando a ela. – Disse em baixo tom. – Eu sou uma amaldiçoada, Heiko, se ficar perto de mim você irá morrer também, antes que pudesse me dar conta te deixei chegar perto demais e me arrependo disso. Por favor, se tem um pingo de consideração por mim, apenas se afaste. Tudo que consigo pensar agora é em morrer ou matar da maneira mais brutal. Entenda de uma vez, seja lá o que de bom viu em mim... não existe. – Falou. – Por mais que tente negar, não há erro em dizer que foram as minhas mãos que mataram todo mundo.

Breve silêncio.

– Eu já perdi tudo, Heiko. – Disse ela. – Apenas me deixe descansar. Agora saia de uma vez. – Suas palavras transbordavam com o seu sofrimento e quase sairam aos sussurros.

O rapaz apresentou uma expressão triste antes de se retirar, ele não viria vê-la antes da execução dela na manhã seguinte.



❇❇❇



A manhã daquele dia trazia consigo um clima ameno, o céu desprovido de nuvens parecia tripudiar do que estava para acontecer. Frieda foi transportada em uma gaiola carregada sobre os ombros de soldados, um cortejo a acompanhava e à medida que ela passava o público destilava seu ódio contra ela, sua face indolente apenas os atiçava ainda mais.

– Ouvi dizer que não foram capazes de recuperar o corpo de uma de suas irmãs, disseram que haviam somente roupas. – Ela ouviu um dizer.

– Acha que ela sacrificou a irmã para sobreviver? – Perguntou um ouvinte.

– Bruxa! – Berrou alguém e atirou uma verdura na gaiola.

Motivado pelas ações do anterior alguém atirou algo, a pedra acertou sua cabeça e fez sangrar sua testa, a multidão se silenciou diante daquilo, mas logo voltaram a bradar em hostilidade. Tal cena justificava facilmente os motivos para os deuses sequer se esforçarem para ajudar uma raça tão vil sem pedir nada em troca após serem abandonados.

– Queimem a bruxa! – Diziam.

– Livrem-se da traidora!

– Pensei que não queimariamos mais em fogueiras. – Alguém comentou hesitante diante da barbárie.

– Ela falhou em sua missão sagrada, não há justiça nisso? Não se diz por aí que foi ela aquela a levar todo o pelotão de elite para os braços da morte? – Perguntou quem o acompanhava. – Além disso... dizem que servirá como fumaça sacrificial para os deuses. – Havia tanta naturalidade em tudo o que dizia.

– E eles pediram por isso? – Inquiriu o hesitante.

O outro se calou, não sabia como responder.

Frieda foi levada para a praça onde já tinham montado a fogueira, ali ela foi amarrada na estaca e alguém leu o decreto real em voz alta. Não houve nenhuma resistência da parte da condenada, não se debatia nem implorava por sua vida, enquanto liam sua condenação ela estava alheia à própria situação e ergueu o rosto, olhando para o nada apesar de toda aquela multidão. Ela sequer notou que um grupo de pessoas, vindas de Lichtblick, imploravam pela vida dela, rogavam por misericórdia e rezavam aos deuses para que interviessem.

Ao finalizar a leitura do decreto, o carrasco recebeu autorização para fazer seu trabalho, ele apanhou uma tocha e foi para os pés da grande fogueira, então encostou o fogo no óleo derramado sobre a madeira e viu tudo começar a queimar, neste momento algumas pessoas tentaram desesperadamente furar o bloqueio para ir libertar Frieda, mas os soldados os impediram, alguns ali tinham servido com ela e lamentavam a situação, porém o que o rei ordena é lei.

As chamas fumegavam sob os pés de Frieda, a fumaça subia ao céus e o calor aquecia o ambiente, mas a mulher não esboçou reação, ela seguia olhando para o nada, enquanto se embriagava em sua ávida angústia, até que seis borboletas entram em seu campo de visão e elas seguem voando na direção de um grou* que caminhava solitário em um rio de corrente tranquila que corria ali perto. Aquela imagem lhe trouxe paz e com esse sentimento Frieda estava disposta e pronta a se deixar queimar, mas sua cabeça é tomada pelos risos das vozes que tripudiavam dela, nem agora elas a deixariam em paz, sua mente é invadida pelas memórias de seus irmãos morrendo um a um, ela se enfurece loucamente e começa a se debater como uma ave presa em uma rede, de repente nuvens surgem do nada e o céu se fecha rapidamente, então uma chuva torrencial com raios e trovões cai sobre a cabeça de todos ali presentes, a chuva acalma Frieda, a água é uma lembrança de Erna e por um breve momento a razão retorna a sua mente, aos poucos ela vai parando de se debater, a água se mistura com o sangue em sua testa e escorrem passando sobre os seus olhos enfeitando sua face como que parecem lágrimas de sague, manchando suas vestes brancas. A chuva apagou o fogo e então cessou.

A cena bizarra prendeu a atenção da assistência por tanto tempo que sequer notaram a chegada de quatro cavaleiros montados. Os recém chegados presenciaram o grito em agonia da mulher, a chuva e o apagar do fogo, eles viram as nuvens desaparecerem.

– Aquela por acaso é a única sobrevivente do nosso melhor esquadrão, cujo qual foi massacrado por forças desconhecidas? – Questionou aquele conhecido até então como o príncipe herdeiro, um dos recém chegados.

– De fato ela o é. – Respondeu um soldado.

O homem respirou fundo.

– Fizemos bem em tomar o trono, o rei anterior se encontrava incapaz de fazer qualquer julgamento sensato. – Disse o monarca.

– Vossa alte...

– Majestade. – Corrigiu o monarca. – Enquanto vocês faziam todo esse show barato, o rei de vocês mudou. Imaginei que já tinham tomado conhecimento disso, apesar de que fomos bem discretos no interior dos muros do palácio.

– Majestade. – Um outro soldado se aproximou. – Soube que a tomada foi difícil, mas ainda assim o senhor está aqui quando poderia simplesmente enviar alguém em seu nome. Por quê?

– Alguém que contribuiu muito no processo de destronamento, mal me viu sentar no trono e já veio me implorar pela vida de alguém que chamou de parente. – Respondeu o rei. – Agora tirem ela dali, se ela for capaz de se reerguer lhe dê uma arma e uma posição no exército outra vez, do contrário tentem tratar de seu juízo o suficiente para que seja reinserida na sociedade. Ainda que pensemos friamente, são mulheres como ela que dão à luz aos nossos defensores e defensoras. – Falou ele. – Meu amigo. – O rei chamou pelo rapaz que chegou com ele e o garoto se aproximou. – Esse garoto cuidará dela, o instrua, mas saiba que a ele pertence uma posição mais elevada do que a sua, então tenha respeito.

Heiko prontamente fez uma expressiva reverência ao rei e assentiu olhando-o nos olhos, ser chamado de amigo pelo rei era esquisito até para ele, mas preferiu não tecer comentários e delongar aquela conversa, ele precisava ir ajudar Frieda. Bom, pelo menos agora seus sumiços sem explicação e sua liberdade para ir onde e quando quisesse tinham uma justificativa, tento em vista que merecidamente caiu nas graças de alguém tão poderoso.

– Você ouviu sua majestade, vamos tirar a mulher do poste. – Falou o soldado para Heiko, se dirigindo ao local no qual Frieda se encontrava amarrada.

A mulher estava semi consciente, porém uma fagulha finalmente se acendia em seu interior.



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Eu geralmente não tô colocando os significados das coisas em notas de rodapé nessa obra, mas como essa é uma simbologia muito especifíca eu vou deixar aqui. (se tu ainda não tinha percebido que há muita simbologia nessa obra eu só posso dizer "aí é foda!" kkkkkkk). 

*O grou é um dos símbolos mais tradicionais do Japão, considerado tesouro nacional. Os japoneses acreditam que o grou é uma ave sagrada que simboliza paz e vida longa. Elas também simbolizam o amor conjugal e a fidelidade, porque essas aves são monogâmicas, ou seja, depois que um casal de grous se une, só a morte os separa. (são sete os "irmãos", seis foram  representados por borboletas e um é um grou, ficou meio que na cara quem está sendo representado pelo grou né?)

Quanto a borboleta, em várias cuturas (como na irlandesa e na japonesa) as borboletas estão relacionadas as almas dos falecidos, alguns acreditam que as borboletas são as almas dos que já se foram, esperando para renascer ou passar pelo burgatório. 

P.S Se vocês quiserem muito eu posso voltar colocando o significado de cada simbolo no rodapé dos capítulos. Alguns significados eu incorporei ao texto. 

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