Capítulo 06.
30 de Outubro, quarta-feira
Rio de Janeiro/ Ninho do Urubu
Cumprimentei Jorge Jesus formalmente, trocamos um aperto de mão e então dei espaço para que ele entrasse na minha sala, Thiago já tinha voltado do banheiro e estava no colo da jogadora mais uma vez, os dois pareciam concentrados jogando o tal joguinho de futebol que Thiago tinha me atentado para baixar hoje de manhã. Ludmilla levantou o olhar quando percebeu que não estávamos mais a sós.
-Papi. - Disse para o Jorge Jesus. - Espera aí, campeão. - Colocou Thiago no sofá, que também levantou o olhar e arregalou os olhos quando viu o técnico, pelo menos não gritou de novo. Ludmilla e Jorge Jesus se cumprimentaram com um abraço, como se fossem realmente pai e filha.
-Quem é o pequeno? Seu filho? - Perguntou o português com todo aquele sotaque carregado que tinha se virando para o Thiago e estendendo a mão. Os dois trocaram aquele toque, um tapa e um saquinho. - Estás bem vestido.
-É meu sobrinho. - Comentei.
-Lud assinou tua camisa? Pois vou assinar também. - Disse pedindo a caneta que ainda estava na mão da jogadora.
Por dez minutos fiquei quieta observando como Thiago se comportava perto das pessoas que gostava tanto e então eles o deixaram no sofá e sentaram nas cadeiras de frente para minha mesa.
Eu preciso que me conte o que aconteceu. - Digo para o Jorge Jesus, depois de iniciarmos a conversa contando a versão da Ludmilla, que eu já conhecia devido à outra reunião. - Bem, já sabemos que houve algum tipo de confusão que gerou o cartão, então quero que me conte o que exatamente disse ao assistente, se ele pode ter se confundido...
-Eu estava em dúvida se tirava Lud ou se tirava a Andressa, a zagueira. - Ele disse me olhando e eu assenti, ciente de quem ele estava falando. - Cheguei a beira de campo para falar com Andressa e ela já estava lá, com a placa em mãos.
-Ele pode ter cometido algum engano? - Perguntei sentindo o olhar da Ludmilla em mim, que parecia me analisar.
-Acho que cometeu. - Disse o técnico com seu sotaque portunhol. - Perguntei a beira de campo se Andressa conseguia continuar, pois era ela quem sairia e não a Lud, ela respondeu que não sairia, não falei com o assistente, pois ela já tinha levantado a placa.
-Hum... - Anotei tudo aquilo na minha agenda. - Você estaria disposto a depor, caso seja preciso? - Ele Assentiu.
-Vai ser preciso? - Ludmilla perguntou.
-Posso explicar um pouco pra vocês como funciona o processo, se quiserem. - Olho de um para o outro.
-Por favor. - Jorge Jesus pede.
-O processo em si começa quando o clube leva a notícia de infração a procuradoria, a procuradoria analisa e decide se isso pode ser julgado ou não. No caso da Ludmilla, o pedido foi aceito. A primeira parte desse processo é julgada na comissão. - Paro pra pensar na maneira como prosseguir. - Vamos supor que apresentei prova em vídeo e só com essa prova conseguimos ganhar na primeira instância, caso o julgado recorra essa ação o processo será levado para a segunda instância, se isso acontecer, tudo vai ser revisto e então precisaremos de mais provas, é onde você supostamente, entra. - Falo para o Jorge Jesus.
-Esse caso pode ser completado antes da final? - Perguntou. - Preciso me preocupar com a escalação sem ela? - Apontou com o queixo para a jogadora.
-Estou trabalhando para que o caso seja terminado o quanto antes, a primeira sessão está marcada para a semana que vem, então por enquanto preciso focar nas provas que irei apresentar. - Sorri pra ele.
-Se precisares, estou disposto a depor. - Jorge Jesus disse, levantando-se. Também levantei, dando a volta na mesa para cumprimentá-lo.
-Vamos torcer para que não seja. - Sorri. Trocamos um aperto de mão, ele sorri também.
-Tu vens agora? - Perguntou o técnico a Ludmilla.
-Pode ir na frente. - Sorriu a jogadora.
Levei Jorge Jesus até a porta e só então entrei novamente para encarar a jogadora.
-Tenho uma pergunta. - Disse. Ah, então ela queria falar de trabalho... - Eu preciso estar presente? Vou ficar naqueles banquinhos onde ficam os réus nos filmes? - Perguntou, soltei uma risada.
-Não, você não precisa estar presente. Somente eu, que estarei lá para te representar. - Respondi. - Mas você pode ir assistir, caso queira, a sessão é pública.
-Bom saber. - Deu um sorriso. - Topa levar o garoto para conhecer os outros jogadores? Temos uns vinte minutos antes do treino da tarde. - Conferiu mais uma vez a hora no relógio, parecia que adorava fazer isso. Me perguntei porque diabos uma mulher com tanto dinheiro usava um relógio tão feio.
-Claro, vamos nessa, só um momento. - Falei dando a volta na mesa mais uma vez para desligar o notebook. - Thiago já chega de celular, né? - Comentei enquanto guardava meu bloco de anotações e as canetas espalhadas na mesa. Thiago levantou do sofá desligando o celular.
-O que a gente vai fazer agora? - Perguntou o garoto, olhando não pra mim, mas para a jogadora.
-Vamos jogar bola, você quer? - Disse a jogadora, animada.
-Siiiiimmm!! Tia, posso ir? Posso? Posso? Posso? - Deu a volta na mesa e começou a pular nas minhas pernas, como se quisesse que eu o pegasse no colo.
-Vou com você também, bobão. - Sorri pegando sua mão. Nós três saímos da sala com um Thiago ligado nos 220v, logo ele largou minha mão e saiu correndo na nossa frente, nos deixando a sós.
-A quanto tempo trabalha com isso? - Perguntou ela, olhando de lado.
-Quase três anos. - Falei pra ela.
-Já tinha pegado um caso assim? - Questionou colocando as mãos dentro do bolso do short que usava.
-Nessas circunstâncias, não. - Respondi. - Mas já peguei casos muito difíceis e deu tudo certo. - Silêncio. - Eu tenho a sensação de que você está muito preocupada. - Olhei pra ela.
-Não que eu não acredite no seu potencial, longe de mim. Mas estou ansiosa, entende? - Encolheu os ombros.
-Entendo. - Comentei. - Tente não ficar muito preocupada, vamos resolver isso. - Sorri tentando passar confiança, ela retribui. - Obrigada, pelo Thiago. - Falei pra ela, que olhou em direção ao garoto, correndo em círculos esperando que chegássemos até ele.
-Seu sobrinho é lindo. - Ela disse. - É bom saber que as crianças se inspiram em mim, faz eu me tornar uma pessoa melhor. Sei que não tenho nada a ver, mas... Ele falou muito da mãe e do avô, mas não falou do pai.
-Ah... - Minha irmã odiava lembrar do cara que tinha dormido, mas ela não estava aqui agora não é mesmo? - O pai dele não quis assumir a responsabilidade. - Mordi o lábio. - Então a figura paterna é meu pai.
-Vocês também parecem bem próximos. - Comentou apertando os lábios e me olhando de lado.
-É. Inclusive, peço desculpas pela maneira que ele... Nem sei como chamar aquilo. - Soltei uma risada, de nervoso.
-O garoto só quer que a tia seja feliz. - Comentou rindo, claramente zombando de mim.
-Ele podia ser pelo menos um pouquinho mais discreto. - Falei sentindo meu rosto queimar de vergonha.
-Ele faz isso sempre? - Perguntou.
-Não, foi a primeira vez na verdade. - Respondi.
-Então ele deve achar que a situação está mesmo crítica. - Falou, eu sabia que ela estava brincando por conta do sorriso, mas não pude deixar de imaginar se ela pensava isso também.
-É impressão minha ou você acabou de falar que estou encalhada? - Perguntei franzindo o cenho e tentando conter o riso.
-Quem? Eu? Não! - Disse, mas riu e se entregou, soltei uma risada também. - Não foi isso que eu quis dizer, de verdade.
-Sério? Tenho certeza que foi.
-Ele teve um motivo pra me jogar pra cima de você e você sabe qual foi. - Me olhou e piscou um dos olhos.
Ok, tenho que admitir que eu me sentia muito atraída por ela, esse sorriso de cafajeste e essa piscada de olhos quase me fez perder o juízo.
-Claro que tem, ele é fissurado por você. - Falei revirando os olhos.
-Qual é, nós dois sabemos que sou muito linda. - Disse toda convencida, soltei uma risada e fiquei tentada a falar que ela provavelmente tinha ficado bonita porque tinha contraído o ryca vírus. Fiz uma nota mental pra procurar fotos dela antes da grana e a encarei.
-Você é bonitinho. - Brinquei apertando os lábios.
-O que?! O que?! Quanta audácia. - Ela riu também.
-Desculpa, feri seu ego? - Bati as pestanas para dar um ar de inocência, mas a pergunta foi um deboche total, ela riu mais.
-Não vou dormir essa noite pensando nisso, mano. - Levou a mão ao peito para dar ênfase a performance.
-Simples: pede um pouquinho de atenção nas redes sociais, sempre funciona. - Pisquei pra ela, que olhou pra mim parando de andar. - O que? Acabei ferindo seu ego de novo? - Levantei uma das sobrancelhas.
-Nada. - Riu e começou a andar de novo.
-O que foi isso? - Perguntei quase correndo pra alcançá-la. Nossa, estou sedentária, preciso de uma academia.
-Isso foi eu. - Respondeu parando de novo e me encarando mais uma vez. - Conseguindo sua atenção. - Completou me olhando diretamente nos olhos.
-Cara, você é bom. - Soltei uma risada e desviei o rosto, sem querer que ela percebesse que fiquei corada.
-É agora que você me passa seu número pessoal? - Perguntou quando voltamos a andar, ela agora parecia bem mais a vontade, tinha um sorriso sincero nos lábios.
-AAAAAAAAAHHHHHHH!!! - Escutamos o Thiago gritando, tínhamos chegado perto do gramado, onde estava acontecendo a concentração para o treino.
Meu sobrinho tinha encontrado com os jogadores e estava surtando. O garoto podia ter pegado várias das minhas qualidades e resolveu puxar pra mim logo no aspecto surtado.
-É agora... Que vou resgatar meu sobrinho. - Falei para a jogadora. - Quem sabe na próxima. - Sorri vendo a cara dela.
-Isso não vai ficar assim. - Ela respondeu rindo também. Dei as costas pra ela, mas fiquei sorrindo feito uma idiota, coisa que a muito tempo não acontecia.
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