Capítulo 33 - O amante - Jodi Ellen - Releitura
É vodka... ou era. A garrafa está totalmente vazia.
Uma onda de inquietação me invade, um milhão de pensamentos assola minha mente. Nunca vi Jesse beber - jamais. Ele disse que bebia, mas nunca o vi bebendo.
Todas as vezes em que se ofereceu álcool ele recusou, pedindo água. Nunca me ocorreu perguntar por quê. Mas agora, pensando em como a garrafa foi largada no chão, percebo que algo não está certo. A insistência dele para que eu não bebesse na sexta-feira bate na minha cabeça como uma onda, e aquela vez no Blue Bar, quando ele estava tão determinado em me oferecer água, de repente não parece mais tão incomum, nem irracional.
Ouço algo se quebrando e meus olhos vão da garrafa vazia para o terraço.
— Ah, não, por favor — sussurro comigo mesma.
Sinto a brisa fria passar no meu rosto como um aviso do que algo desagradável está me esperando lá fora. Corro até o fim das escadas, atravesso a sala e paro de repente na porta, meu corpo o sente, antes mesmo dos meus olhos o enxergarem. Jesse está lutando para se levantar, ele tenta se equilibrar na espreguiçadeira, seu corpo está visivelmente mais magro, seus músculos não estão como eu guardei na memória. Sinto pena e preocupação ao mesmo tempo, será que me encontro que nem ele? Será que meu estado é tão melancólico quanto o dele? Ele está com uma toalha ao redor na cintura, e com uma mão tenta levantar seu corpo da espreguiçadeira, com a outra segura uma garrafa de vodka pela metade. Não, está além da metade, está quase no fim. Meu estômago embrulha no mesmo instante, como ele conseguiu beber tanto assim? Como pode fazer isso com o próprio corpo?
Meu corpo congela assim que seu olhos nublados devido o álcool recaem sobre mim, parece que seus olhos não conseguem realmente me olhar. Ele pisca, parecendo não acreditar que sou eu, ou talvez ele nem me reconheça, talvez esteja me confundindo com outra mulher que esteve aqui nos últimos dias. Uma ira me sobe quando penso nessa possibilidade, porque consigo imaginar como Jesse gosta de curtir quando o álcool entra no seu organismo. Beber e foder estão de mãos dadas na vida dele, Sarah mesmo falou isso pra mim, outra verdade que eu tive que ficar sabendo pela sua "melhor amiga". Continuo olhando pra ele, pasma. Esse não é o homem por quem eu me apaixonei, esse não é o homem que me fez rir até chorar semanas atrás, não é mesmo. Ele consegue finalmente se levantar e se manter em pé, visivelmente tonto. Seus olhos encontraram os meus, sombrios, enevoados pelo álcool quando ele diz.
— Tarde demais, você chegou tarde demais, amor. — sua voz é carregada de raiva e, principalmente, rancor.
Nunca ouvi sua voz desse jeito, nunca. Me concentro nos seus olhos, levanto meu queixo e tento responder da melhor maneira que consigo.
— Você está bêbado, podre de bêbado. — cuspo as palavras e agradeço a Deus por minha voz não falhar, continuo. — Desde quando você bebe assim, Jesse?
Ele levanta a garrafa em minha direção como se fizesse um brinde, e entorna o resto da vodka do litro.
— Como você é observadora, amor. — joga a garrafa na parede mais próxima, o som do vidro se estilhaçando faz meu corpo travar no lugar e meus olhos começam a lacrimejar, ele prossegue. — Infelizmente não estou bêbado o suficiente, se estivesse não estaria vendo você aqui.
Suas palavras continuam tão ríspidas, arranham minha pele como espinhos invisíveis. Ele anda em minha direção, como se quisesse passar através de mim. Dou um pulo pro lado com medo de ele esbarrar no meu corpo, passa por mim sem ao menos percebe o meu susto.
— Onde você vai? — minha voz está testa, quase engasgo com o medo.
— O que você tem com isso? — ele dispara sem nem ao menos olhar pra mim, suas costas parecem machucadas, eu reparo.
Ele vai até a cozinha e eu sigo atrás, mas mantendo uma distância segura, meu coração dói ao perceber que eu não confio em Jesse bêbado. Está procurando algo, suas mãos vasculham todo o armário, todas as portas são fechadas com força desnecessária, ele grunhe de raiva, quando não acha o que procura. Ele quer a vodca meu cérebro alerta.
— PORCARIA! — ele continua com desespero.
Vou até o armário mais próximo pra tentar ajuda-lo, ele parece prestes a perder o controle quando eu acho a maldita garrafa, pego ela, rapidamente coloco ela no balcão que está entre ele e eu. Volto pro meu lugar seguro e cruzo os braços com os meus olhos fixos nas suas costas machucadas.
— Está ai, Jesse, o vodca está aí! — Chamo sua atenção.
Ele se vira e logo agarra a garrafa, tenta abrir mais grunhe de dor, logo percebo que sua mão está cortada, um corte inchado e com sangue seco, quase por toda sua mão. Me aproximo sem perceber, olhando fixamente sua mão.
— Sua mão precisa de cuidados, Jesse.
Ele me mostra a mão, bebendo um grande gole da sua garrafa, seus olhos grudados em mim com desdém.
— Cuide dela, então. Mas um estrago que você causou — ele diz. Que eu causei? — É, fique aí... fique aí toda desnorteada... e... e... confusa. — Ele ofega. — EU AVISEI, PORRA! — ele grita. — Não avisei? Eu... eu avisei! — ele está histérico, apontando pro seu próprio peito.
Eu causei? Eu sou a culpa? Eu enfiei litros de vodka garganta a baixo do Jesse? Por que ele me culpa? Ódio queima no meu peito, eu não sou culpada.
— Me avisou do quê? Você não me avisou que era a porra de um alcoólatra. — minhas respiração está irregular, meu corpo queima e sinto que o pior ainda está por vir. — Eu não sou culpada por você beber descontroladamente, não ouse jogar a culpa em cima de mim.
Me viro e saio da cozinha em direção a sala, vou pegar minha bolsa e sair desse inferno particular do Jesse, estou ferida e sofrendo por perder ele mas não o culpo, mesmo ele sendo o culpado. Ele mentiu, enganou e manipulou. Estou prestes a pegar minha bolsa quando o ouço se aproximar e seu grito vem logo em seguida.
— Tão típico! — ele grita nas minhas costas, pega meu braço e me virar para encará-lo, o fedor de vodca me atinge forte, sua mão machucada aperta meu braço com força o que faz seu rosto contrair de dor. Tento empurrar seu peito com as mãos e ele ri com desdém.
— Me solta, porra. — falo ainda tentando empurrá-lo. — Eu não sabia, não me culpe. — as últimas palavras saem como um sussurro quando paro de tentar me soltar de Jesse.
Ele se aproxima ainda mais, sua mão folga ao redor do meu braço, mas não o suficiente pra eu me soltar, ele fala próximo do meu rosto.
— Não sabia? Você não sabia? — ele leva a garrafa a boca e dá alguns goles. Como alguém consegue beber assim? Consigo ouvir o líquido descer pela sua garganta.
Assim que para de beber volta a me encarar. Droga, o hálito de álcool aumentou, estou enjoada. Ele joga a garrafa pra longe e não consigo ver onde ela cai, só escuto o barulho, meus olhos estão encarando seu peito. Minha culpa? Minha? — Eu disse que você causaria mais estragos se me deixasse, mas você me deixou mesmo assim. Agora olhe pro meu estado. — Ele agarra meu outro braço me apertando e me aproximando mais de si, enquanto grita. — OLHA PRA MIM, PORRA. — suas mãos estão me segurando forte.
Merda. Merda. Merda, esse não é o Jesse. Merda. Merda. Merda, ele está me machucando. MERDA, será que esse sempre foi o Jesse, e eu nunca percebi?
Meu corpo treme, seu hálito quente bate no meu rosto, estou tremendo de medo, ele vai me machucar? Eu sou culpada? Lágrimas escorrem pelo meu rosto e eu encaro ele.
Quando nossos olhos se encontram, ele parece pela primeira vez desde que eu entrei aqui, o homem que eu me apaixonei. Sua expressão parece de arrependimento, suas mãos se afrouxam nos meus braços, elas não me machucam, só me seguram no lugar. Sua voz sai como um choramingo quando diz.
— Você tá com medo de mim? — eu confirmo com a cabeça, enquanto ele se afasta de mim tremendo. — Eu nunca te machucaria, amor.
Quando ele finalmente me solta eu dou passos rápidos pra trás, seus olhos se arregalam.
— Ava, não me olhe assim, eu não te machucaria. — Sua voz está culpada.
Eu vou em direção a porta, minhas mãos tremem, eu não preciso desse homem, eu não conheço esse homem, estou com medo dele. Estou com medo do homem que eu me apaixonei. Ele continua me encarando, mas sua expressão fica decepcionado quando boto minhas mãos na maçaneta da porta, viro meu corpo pra ir embora.
— Isso mesmo, fuja. — Ele fala nas minhas costas e eu fico tensa, com a mão congelada na maçaneta. — Você gosta de provocar e me deixar na mão, Ava. Posso ficar com você e depois não posso mais, depois posso de novo, você fode comigo hoje e no dia seguinte me ignora. Decida!
— Me deixe em paz e vá para o inferno, você mentiu pra mim, você me escondeu coisas. — O medo vai embora e a raiva toma de conta do meu corpo outra vez, me viro de volta pra ele, minhas mãos continuam na maçaneta. — Eu fujo de você porque eu sempre soube que você era um grande mentiroso manipulador.
— E mesmo assim você implorava por mim. — sua risada é sarcástica.
— Porque não disse que era alcoólatra? — Porque eu me importo com isso agora? Mais uma coisa que ele escondeu de mim.
— E te dar mais um motivo pra fugir de mim? — Ele dispara.
— Eu poderia ter te ajudado. — Eu poderia? — Você precisa de ajuda, Jesse.
Ele se aproxima o suficiente pra eu ver seus olhos verdes, como eu amava seus olhos, porque ele fez isso? Porque ele me culpa?
— Eu preciso de você... você... você me deixou, Ava. — Ele se aproxima mais um pouco, mais dois passos e vou poder tocá-lo. O cheiro da vodca volta a me sufocar. Ele se aproxima mais um pouco, e espalmo as mãos no seu peito. Isso ainda é igual, tocá-lo ainda é igual. — Desculpa, estou invadindo seu espaço pessoal? — Ele dá outro passo, com os olhos fixos no meu. — Isso nunca incomodou você antes.
— Antes você não estava bêbado. — rebato.
Odeio sua risada seguinte, debochando de mim.
— Não, não estava. Estava ocupado demais trepando com você pra sequer pensar em beber. — Ele dá um passo pra trás e rasteja seus olhos pelo meu corpo. — Estava ocupado demais pra pensar em qualquer coisa. E você amava. — Ele volta a ficar perto novamente, mas dessa vez não consigo pará-lo com as mãos, ele coloca as suas mãos ao lado da minha cabeça, abaixa seu rosto até fica de frente ao meu. — Você era boa, na verdade, você foi a melhor que eu já tive. — Sua boca se puxa num sorriso pro lado irônico e nojento.
A raiva que me consome é sem igual, no momento seguinte minha mão ganhou vida própria, acerto sua cara, logo sinto o formigamento na minha palma. Seu rosto se volta de imediato pra mim, seu sorriso nojento está maior e agora ele mostra os dentes. Eu estapeio de novo, só que agora do outro lado, não quero que seu lindo rosto idiota fique com marcas vermelhas desiguais.
— Não fale comigo como se eu fosse uma de suas vagabundas.
Sua cabeça fica virada por algum tempo antes de voltar pra mim.
— Divertido, não é? — seu sorriso é quase diabólico agora.
Estou com raiva, magoada e poderia facilmente matá-lo, como eu me apaixonei por esse homem? Se ele quer magoar e ofender, vamos lá então, eu sei jogar baixo.
— Você é um merda! — seu rosto se contorce.
— Olha a boca!
— Você não me diz o que fazer, você não me diz o que eu posso ou não fazer, vá se foder. — eu o empurro com toda raiva que eu tenho, e ele cambaleia pra trás, a única vantagem de ele estar bêbado. — Você está bêbado porque quer estar bêbado, eu passei os últimos dias sofrendo por ter deixado você, mas agora te olhando eu vejo que estava certa. — seu rosto expressa mais dor do que quando eu o estapeei. — Eu quero que você vá pro inferno, e nunca mais me procure, se um dia eu te amei, esse dia foi uma mentira, tudo foi mentira.
— Não. — ele tenta se aproximar, mas eu abro a porta, minha fuga está pronta. — Por favor, Ava. Eu queria te contar, mas era sempre tão difícil, sempre com medo de você me deixar, sempre com medo de te perder, eu não consigo viver se não for com você amor, eu te amo. — Seu olhar de súplica me impede de continua andando porta a fora do apartamento.
— Se isso é o seu amor. — suspiro decepcionada. — Fique com ele. Adeus.
É isso, quando dou por mim já estou saindo do elevador e entrando no meu carro, acabou. Eu amava o Jesse, disso nunca tive dúvidas, mas são mentiras demais, dificuldades demais. Estou cansada. Chego em casa e vou direto pro meu quarto, deito na minha cama, me encolho me abraçando. Estou na minha cama, mas não está confortável, Jesse não está aqui. Não estou realmente em casa, nunca vou voltar a me sentir em casa, então desabo.
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