90ºCapitulo
"Por cima da lua da meia-noite as coisas pareciam sempre piores."
Os meus olhos estavam pesados mas não ia adormecer, e os gráficos á minha frente estavam demasiado coloridos a vermelho e verde para poder deixar a doce tortura levar-me, seria demasiado fácil fechar os olhos e encostar-me ao corpo feminino ao meu lado.
Fecho a tampa do portátil e aperto a cana do nariz. Não quero adormecer, a Sophia teve um dia nervoso, ela estava mais silenciosa quando se veio deitar meia hora antes de eu escorregar para o quarto para a ver adormecida, pensei que se estivesse a tentar esquivar de mim para não me contar sobre Ted mas ela adormeceu mais rápido do que seria de esperar. Oiço o "ding" no meu computador, é um e-mail, sobre a viagem que fui obrigado a cancelar porque estávamos demasiado assustados e preocupados, estava tudo a acontecer ao mesmo tempo que nem sequer consegui pensar em reagendar a viagem até Londres... há outro email, sobre a consulta da Sophia, os resultados saem depois de amanhã. Merda! Parece que está sempre alguma coisa ao virar da esquina.
Volto a fechar a tampa do computador e desta vez meto-o na mesa-de-cabeceira, deslizo para baixo e a respiração dela bate-me no peito, está agarrada á almofada com os braços, e o cabelo mexe-se de cada vez que respira, é suave e relaxante, mexe os lábios e depois e depois os seus braços largam a almofada, a sua cabeça enterra-se entre o meu braços e as minhas costelas e a respiração dela ali faz-me cócegas. A minha menina corajosa, os meus dedos passeiam pelo cabelo dela e apercebo-me de que gosto de a ver dormir porque posso senti-la dormente, posso imagina-la amanhã, daqui a uma semana, dez anos, cinquenta anos, e ela vai sempre parecer-se com isto, algo intemporal, um amor que voa alto sem asas e esta deve ter sido a merda mais estúpida que já pensei, mas é verdade a maneira como ela dorme é a maneira como ela é, simples, suave e bonita.
Penso nos pais dela, a dizerem-me que confiavam em mim, que estavam fartos de lutar contra a filha e que se eu era o que ela queria eles iam apoiar, mas que assim que eu pisasse o risco novamente as coisas iam ficar feias, e depois? Depois o pai dela virou-se e a mãe disse-me que a maneira como eu entrei naquela tarde no apartamento a divertiu, parece que já nessa altura eu estava a tentar lutar contra alguma coisa. Era verdade, só que não sabia contra o que era, estava tão habituado a lutar contra tudo e todos que não sabia pelo que lutar. Agora sei.
Oiço um gemido baixo e depois um bocejo, é como um gato...depois um ronronar e isso faz-me acordar. Á uma semana que Mr.White sai do seu exilio do escritório dentro de uma gaveta onde coloquei uma almofada e vem pelos nossos pés acima até se aconchegar na Sophia, ela sorri e acaricia o sempre mesmo sabendo que não gosto da ideia do gato demasiado perto de nós na cama. É a nossa cama pelo amor de Deus, num momento posso estar a beijar-lhe o estômago e no outro tenho um pelo branco na boca. Oiço o risinho baixo dela como quem tem medo de ser apanhada mas não se esforça muito para esconder e abro os olhos para ver Mr.White de barriga para cima e com o queixo espetado enquanto Soph lhe acaricia a garganta.
-Gato metediço.- Reviro os olhos e ela assusta-se tapando o gato com o lençol que se espreguiça debaixo e passa pelas nossas pernas antes de se enroscar na carpete perto da janela.
-Ele só quer um pouco de mimo.- Ela levanta um pouco o tronco e ri-se quando vê lamber a pata.
-Bom ele tem a sua dose de mim quando estou a trabalhar.- Baixo-me durante alguns minutos quando estou a trabalhar no escritório e faço-lhe festas.
-Mas agora ele voltou a descobrir as maravilhas de ter uma miúda em casa.
E de repente quando ela solta as palavras lembro-me daquela mulher morena que dormiu lá em casa quando ainda estava em Oxford, não me consigo lembrar dela, foi umas semanas depois da Soph se ter ido embora, lembro-me dela fechar a porta com força e quando saí da cama todo nu, Mr.White estava intratável, eu fiquei com raiva, afastei-o com o pé e ele arranhou-me gritei para ele ir atrás dela...agora que penso nisso é ridículo, estava a mandar o gato fazer algo que eu queria fazer mas estava demasiado zangado para fazer.
Sinto os dedos da Sophia no meu peito a puxar-me para o agora e olho para ela, cuidadosamente enquanto ela está a sorrir, sem conseguir adivinhar a tensão dentro de mim-
-Ele sentiu a tua falta.
-Eu sentia a falta dele também, e a tua.- Agarro-lhe o pulso e beijo-o.
-Não te podes ir embora outra vez, acho que nós os dois não aguentamos.
Não íamos aguentar.
São oito e dez da manhã e a Sophia entra ás nove, ela parece louca a levar as roupas que sujamos no sábado e no domingo para a lavandaria e mexer no seu computador, tento ajudar mas ela diz-me que se conseguir não queimar as torradas está tudo bem. Vejo-a vestida com um vestido branco com um decote retângulas e de meia manga que lhe acaba um pouco depois dos joelhos e ela está sexy mas profissional, mas depois aquela pantufas com guizos idiotas fazem-me rir.
-Harry!- Ela grita e espreito para a lavandaria.
-Sim?
-Quando foi a ultima vez que foste ás compras?- Ela olha para mim zangada e depois perco-me. Não sei...
-Bom eu fui a semana passada para comprar comida Harry e comprei-te aquelas cervejas terríveis mas pensei que eras tu que compravas estas coisa de lavandaria porque sempre houve e agora não há, e agora como é que é suposto eu lavar a roupa Harry? Os teus fatos foram com o Norbert ontem...- Norbert já veio buscar os meus fatos para lavar a seco?- mas as tuas calças de ganga e...- e depois para e encosta-se á parede com o braço por cima dos olhos, penso que vai chorar mas são só soluços secos.
-Hey...- Puxo-a para mim e abraço-a. Porque é que está tão agitada?
-Desculpa...
-Não devias fazer isto agora, vai trabalhar e logo á tarde quando sairmos podemos ir ás compras.- Sussurro. Ela acena com a cabeça e acalma-se sai da lavandaria e olho para o pote onde as pastilhas geralmente está. Está vazio. Não costumo esquecer-me destas coisas, não contratei uma emprega no inicio porque precisava de estar sozinho e depois a Gemma juntou-se a mim com aquela ideia maluca de assistência e do novo curso...será que chegou sequer a terminá-lo?
Quando saio vejo Sophia e levar uma colherada de cerais á boca e a olhar para o computador ao mesmo tempo que a mão dela desenha no papel, como é que ela faz isto? Nem sequer desconfio mas sai tão perfeito que não me atrevo a abrir a boca para a interromper.
-Harry podemos ir agora?- Ela olha para mim com a boca cheia e reviro os olhos enquanto me riu e aceno, agarro no computador e num dossiê importante e estendo-lhe a mão. Ela enfia um monte de coisas na mala incluindo aquele computador incrivelmente pesado na mala.
-Esse computador precisa de uma reforma.- Sugiro quando saímos.
-É um dos bons.- Ela corta-me.
-Tem uns cinco anos, quando te conheci já o tinhas.- Riu-me e entramos no elevador.
-Podes dar-me um novo como prensa de casamento.
Ela não liga ao que diz, limita-se a mexer na mala e vejo-a desajeitada a passar o cabelo para trás da orelha, a tentar lidar com tudo o que envolve ser ela. Acho que vou mesmo dar-lhe o computador novo, e não vai ser uma prensa de casamento. O meu estômago mexe-se e percebo que é a mesma sensação que tinha quando era miúdo e a minha mãe me dizia que o pai Natal estava a chegar. É isso que ela me faz, faz-me sentir sem idade, livre.
-E que tal um carro só para ti?- Sugiro quando estamos a duas avenidas do edifício onde ela trabalha. Ela revira os olhos e mexe os lábios descontente.
-Eu aceitei este anel ridiculamente caro, eu aceitei viver contigo, eu aceitei casar-me contigo, agora até posso aceitar um computador, mas acho que vais ter que fazer melhor para me fazeres aceitar um carro.- Ela ri-se e aperta a minha bochecha ao que franzo a testa.
-Se eu te der a merda de um carro vais ter que ficar com ele.
-Boca suja.- Ela diz-me e volta a concentrar-se na música no rádio. Quase nunca a oiço cantar, está sempre preocupada sobre alguma coisa ou alguém que nunca a vejo perder-se na música. Não é um espetáculo, não canta bem mas também não é terrível, mas canta porque a música fala em como ser-se forte e não querer saber e de lutar e a música é ela, mesmo quando aqueles homens enormes e terríveis a subjugaram ela tinha uma chama dentro dela que nunca se apagou, ela lutou quando eu não estava lá, ela é como uma pequena bola que faz enormes danos na vida das pessoas, ela danificou-me de uma maneira que nunca vou conseguir agradecer-lhe por isso.
-Ficas gira quando cantas.- Digo-lhe e de repente ela entende e cora, muito, de uma cor tão carmesim que me riu.
-Já percebemos Elvis não sou a Madonna.
-Nem gosto da Madonna.- Encolho os ombros.- Gosto de ti.
E agir como um namorado idiota nunca foi a minha cena, mas às vezes saí-me.
Quando chegamos ela abre a porta do carro e depois vira-se para me beijar com força, a sua língua intrometida faz-me agarra-la na cintura e puxa-la mais para mim antes de a libertar. Ela acena-me e depois encontra uma rapariga mais alta que ela, riem-se e depois deixo de a ver, mas posso senti-la, a mulher indomável e a menina tímida que tem o desejo de dominar o mundo.
Quando chego á empresa as coisas estão caos, os gráficos que vi ontem estavam bons mas pequena cede que estamos a tentar inflitrar no méxico está a ter problemas. Reviro os olhos quando Jene me atazana a cabeça com papeis sobre isso e sou obrigado a deixar a minha leveza onde deve estar. Em casa, com a Sophia.
-Eu não quero ouvir mais sobre isso, eu vou reunir-me e quando precisar de si chamo.- Ela deve ter ficado com medo porque a sua cara fica pálida. Chloé está no computador e quando me vê levanta-se com o Ipad na mão.
-O Louis?- Pergunto e olho para o escritório dele vazio, a cara dela está pálida e depois aponta para a sala de reuniões.
-O que se passa?
-Chegou uma notificação do tribunal.- Ela sussurra e o sangue gela-me nas veias, dou-lhe o dossiê que ela me deu ontem para rever e entro na sala. Louis está com o Lewis o advogado e ambos se calam quando entro.
-O que se passou?- Não estou para brincadeira.
-O pai dela deve estar a chegar, ele também foi notificado.
-O que está no envelope? Agarro com força e quando faço força a porta abre-se, Alex está zangado e isso dá-me força para abrir a carta, desdobro o papel e os meus olhos passam sobre as letras sem lhes dar sentido.
-Agressão grave será deliberada com um concelho de doze jurados depois da sessão...
Paro de ler. "Agressão grave?" Aquele filho da puta tentou matá-la duas vezes, esta não foi uma agressão grave, isto foi uma...
Por um momento apenas por um momento lembro do poder que o gatilho descarregou em mim, sentia-me um monstro cruel e vivo quando puxei o gatilho e o senti convulsionar contra mim, naquele momento ele ainda teve um brilho nos olhos, depois sorriu e apeteceu-me disparar a arma outra vez mas a dor na minha perna e adrenalina do tiro começaram a dissipar-se e entrei em pânico, soube naquele momento que ele se tinha ido mas também soube que ele ficou feliz porque levou uma parte de mim com ele. O juiz declarou que foi em defesa, mas na minha cabeça ainda era matar um homem, eu tirei a vida a alguém que estava a tentar matar-me a mim e á minha namorada e mesmo assim o peso ainda estava cá, mas agora com o Matt a tentar acabar o que começou o peso da minha consciência duplica porque quero que ele desapareça e a pressão que aquela arma exerceu sobre mim está a espalhar-se pelos meus dedos.
-Conheço o juiz ele vai apoiar a nossa causa.- Alex diz e riu-me.
-Onde estão os papéis sobre a ultima queixa que apresentei em Inglaterra?- Viro-me para Louis e ele passa a mão pelo cabelo.
-Os Ingleses não querem enviar os papéis a menos que alguém os vá buscar.
As malditas politicas, as papeladas...
-Não há uma maneira de calçar-mos luvas alguém?- Começo a entrar em desespero á medida que olho para os ficheiros com a cara da Sophia em cima da mesa, o pai dela está a olhar para o visto Inglês dela e vejo a fotografia cinzenta pequena dela mais nova a tentar não sorrir.
-Não vamos ultrapassar a lei Harry.- Alex obstina e riu-me.
-Sabe o que é que não vou ultrapassar? Chegar a casa e ter que dizer á sua filha que se calhar só tem meses ou um par de anos de liberdade até que aquele filho da puta saía da cadeia.- E assim que as palavras saem em voz alta ele entende, todos nesta sala, Louis, Chloé, Alex e o assistente que vêm com ele, o meu advogado, toda a gente entende que isto não pode acontecer, que neste momento a lei não está acima de tudo o que ela já lutou pela liberdade dela, a liberdade que já tentei reduzir e não consegui, a liberdade que os seguranças que contratei á anos tentaram reduzir e não conseguiram, a liberdade que nunca ninguém devia ter tentado tirar dela, nem eu.
-Vou viajar para lá.- Digo.- Hoje á noite Chloé, arranja-me uma passagem, aluga-me um avião, um barco...qualquer coisa fodace!
Saiu do escritório e Alex segue-me, passamos por Jene e ela encolhe-se ao olhar para mim, sento uma raiva tão grande dentro de mim, uma raiva que me torna invencível, uma raiva que em tempos me tornou um touro sem a perceção do perigo mas que hoje em dia tem um calcanhar de Aquiles.
Entro no meu escritório e Alex fecha a porta, olha para mim e sinto a minha cara contrair-se. Quero dizer-lhe que temos que mantê-lo lá dentro, que temos que arranjar maneira de resolver esta merda que o sistema está a levar de forma tão leve, mas não me sai nada.
-Obrigado Harry.- Ele diz e sai, e por um momento penso que o homem está louco, mas depois percebo que está agradecer-me por estar a cumprir a minha promessa de tomar conta dela.
Agora, como é que vou dizer á Sophia que vou viajar esta noite sem lhe dizer para onde? Ela vai pensar o mesmo que pensou no aniversário dela, são dez e meia e já sinto que o dia me deu tudo o que podia dar, quero ir para casa, afundar-me na cama com ela e esquecer a merda toda que me rodeia, que nos rodeia.
Pelo meio dia e meio Jene entra no meu escritório meio embaraçada e quando abre a boca para me dizer de forma nervosa que os homens com quem tenho um almoço chegaram ao restaurante em meia hora e que devo ir. Aceno que sim e agarro nas chaves do carro, visto o casaco e meto a carteira no bolso, quando saio sinto o olhar das pessoas em mim como nunca senti, é como se me estivessem a julgar, mas elas não sabem quem eu sou, eu sei quem ela são, mas eles nunca poderão saber quem eu sou, nunca.
Conduzo até ao restaurante para onde o GPS me manda e vejo que na rua oposta ao edifício onde deixei a Sophia esta manhã, nem me apercebi do hotel deste lado da rua, há um rapaz á espera de mim e entrego-lhe as chaves enquanto ele se delicia com o Mercedes, os Americanos sabem o que é bom. Pondero entre entrar para o restaurante do hotel ou avançar a passadeira e perguntar por ela, só para lhe dizer "olá" só para a ouvir ralhar-me enquanto a beijo e penso numa maneira de lhe dizer.
Sou um homem! Vamos seu merdinhas, é a tua noiva não tenhas medo.
Avenço e quando chego ao interior do edifício sou mandado para o segundo andar. Só têm um andar? Ela disse-me? Quando abro a porta pesada do segundo andar sou comprimentado com um homem de cabelo cor de rosa na receção, primeiro fico ligeiramente encandeado pelo rosa mas depois digo-lhe que sou o namorado da Sophia e que queria vê-la ele ri-se.
-Oh querido isso é amoroso! Ela está ali dentro com a Amanda.- Ele aponta para a porta e ando até lá abro-a devagar e depois todo o stress do meu dia vai e vem, colide numa metamorfose enorme e não sei o que sinto para além da paz que ela emana e que não quero tirar-lhe.
Está virada para a janela, tem uma mesa pequenina e consegue ver a cidade lá em baixo enquanto rabisca qualquer coisa com a régua e o esquadro, está embrenhada naquilo, é a batalha dela, prendo o cabelo rapidamente com um lápis e depois continua. Fecho a porta e volto para trás.
-Viste-a?- O rapaz pergunta e aceno.
-Demasiado absorvida, não quero interrompe-la.
Quando me vou embora percebo que a concentração e paz de que ela precisa na vida dela é o que lhe quero dar, embora eu seja muito para ele ás vezes controlar, e ela seja muito para eu controlar eu gosto da maneira como nos desarrumamos mutuamente, mas é isso, nós os dois, Só isso.
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