Capítulo 1
− O que está havendo? − perguntou a garotinha assustada.
− Fique tranquila, Sue − disse Sarah, a irmã mais velha. − Mamãe está cuidando de tudo, não é?
− É claro, queridas. − A jovem mulher tinha lágrimas nos olhos enquanto colocava alguns poucos pertences numa bolsa velha.
Bridget e as três filhas moravam numa cabana afastada do vilarejo de Salem, mas, ainda assim, era possível ouvir gritos e lamúrias vindos de longe.
− Prestem atenção − pediu a mulher com seriedade. – Hoje, vou precisar que fiquem na floresta, não importa o que aconteça ou o que ouvirem. Só me prometam que ficarão lá... escondidas.
− Mas, mamãe... − começou Sarah, mas foi interrompida pela mãe.
− Sarah, querida, eu sinto muito, mas é assim que deve ser. Promete que cuidará das suas irmãs? Elas precisarão muito de você. Tem de ser forte.
− Isso é por causa das coisas que estão acontecendo? Das pessoas que estão morrendo? − A garota esguia, de apenas onze anos, mencionou a última palavra num sussurro.
− É sim, querida.
− É porque você deu aquele remédio para o moço, mamãe? − A pequena Sue indagou.
− Eram apenas ervas para uma infusão − choramingou Bridget.
− A gente conta isso pro padre da igreja, mamãe. Ele é bom, vai entender.
− Não! Vocês não vão falar com ninguém, muito menos alguém da igreja. Vocês entenderam?
Os gritos se tornavam mais audíveis. Eles estavam perto. Bridget não tinha mais tempo. Ela abraçou as filhas, pegou a pequena Susan no colo, que ainda dormia, e beijou-a ternamente. Depois, entregou-a para Sarah.
− Vocês precisam ir. Há alguns mantimentos na mochila. Proteja suas irmãs, Sarah. Eu amo vocês! Agora vão, pelos fundos... rápido! E não olhem para trás!
− Mamãe!
− Por favor, Sue. Vá, agora! Lux spirituum sint vobiscum.
Bridget observou as três crianças sumirem em meio à densa vegetação, não importava mais o que aconteceria com ela, suas meninas estavam seguras, por hora. Porém, o seu coração fora arrancado do peito mesmo antes da sua morte.
Com um simples gesto das mãos, ela incendiou parte dos livros antigos que se mantinham ocultos sob o chão de madeira da casa simples onde vivia. O fogo não se alastrou, queimando apenas o necessário.
Batidas violentas ecoavam pela casa: estavam arremessando pedras. Ela apenas atirou-se ao chão, em meio aos poucos móveis que ela mesma revirou.
− Em nome da Santíssima Igreja, pelo poder de Deus Pai Todo-Poderoso, eu ordeno que saia agora do interior da residência, bruxa! − Bridget conhecia bem aquela voz, era o reverendo Joseph, ele era conhecido na região por praticar exorcismo nos acusados.
A mulher permaneceu no chão, onde estava. Ela precisava fazer com que acreditassem que fora atacada e suas meninas levadas dela. As pequenas não poderiam pagar pelos seus pecados. Um estrondo foi ouvido e a porta foi arremessada para longe, por pouco não lhe acertou.
− Levante-se, maldita! − berrava para ela um dos "soldados de Cristo". Vendo que a mulher não se movia, agarrou-a pelo braço com violência e a fez ficar em pé.
− Tenha cuidado – aconselhou o reverendo. − O demônio está com ela.
− Cadê suas filhas? Onde elas estão? − Bridget era sacudida com tanta violência que mal conseguia ouvir, mesmo o guarda gritando a poucos centímetros de sua face.
− Precisamos voltar! É a mamãe − disse Sue, e embrenhou-se pela mata. Sarah não teve outra alternativa, a não ser seguir a irmã.
Bridget foi acorrentada entre duas estacas de madeira, braços abertos e pés juntos, no formato da santa Cruz. Havia mais quatro mulheres, completamente inertes, rendidas ao inevitável. As marcas violentas impressas nos seus corpos não permitiam a Bridget sentir raiva delas. Tão rápido quanto um piscar de olhos, ela viu o chicote cortar o ar e acertar sua face.
− Você fez um pacto com o demônio, feiticeira? Confesse!
− O único demônio que eu conheço é o senhor, reverendo Joseph!
Mais dez chicotadas. O sangue vertia mesclado à dor. A pequena plateia ao redor assistia a tudo, sem se mover ou pronunciar.
− Onde estão suas filhas?
− Já disse que não sei!
O padre pegou um frasco de água benta e um livro antigo. A capa possuía um símbolo que Bridget conhecia bem: a cruz de São Bento.
− Bridget, acusada de praticar feitiçaria contra seus irmãos, se recusa a falar. Suas obras demoníacas resultaram na morte de um homem, um fiel da nossa igreja... − "Eram só ervas", a mulher falava, enquanto era açoitada novamente. − Diante das acusações já comprovadas, onde a bruxa é incapaz de se defender, pelo poder a mim concedido por Deus, eu a considero culpada!
− Eu sei o que você fez, reverendo. Aquela pobre mulher... Sempre acreditei que padres não cedessem aos impulsos carnais...
− Como pode saber disso? − O padre sussurrou. − Você é o próprio demônio! Tragam a lenha!
− Isso não vai apagar seus pecados! Covarde! − Por mais que se contorcesse e gritasse, ela não conseguia se livrar das correntes.
Crux Sancti Patris Benedicti!
Crux Sacra Sit Mihi Lux!
Non Draco Sit Mihi Lux!
Vade Retro Satana!
Non Suade Mihi Vana!
Sunt Mala Quae Libas!
Ipse Venea Bibas!
Por fim, o fogo foi aceso...
876 palavras
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