Capítulo 10 - Código Vivian
Minha mente ficou um pouco confusa com o último comentário de Lucas. Senti uma pontada de decepção por ouvi-lo dizer que apenas recentemente nos tornamos "algo" real para ele. Desde que me envolvi com aquele homem misterioso, lindo e complicado pela internet, sentia-me completamente envolvida e realmente dedicada àquele relacionamento. Por que ele não sentia da mesma forma que eu? Por que tantas reservas? Precisava dessas respostas antes de ter um colapso nervoso, e ele explicaria tudo antes de partir novamente, fiz essa promessa para mim mesma naquele instante.
- Não era real antes? - O comentário dele me magoou um pouco.
- A gente pode sair daqui? Estamos de pé no aeroporto, acho que pensam que somos malucos.
- Claro, mas esta conversa não acabou. - Avisei.
- Foi o que pensei.
Encontramos um táxi que nos levou para o hotel onde Lucas havia feito reserva. O lugar era discreto, porém sofisticado. Até ofereci para hospedar-se em minha casa, mas ele recusou, alegando que preferia conhecer meu irmão antes para evitar constrangimentos. Fingi que entendi, e ele deixou o assunto morrer. A suíte que Lucas alugou era espaçosa, com uma cama de casal no centro do quarto, as paredes brancas e os móveis em tom de marrom escuro, poucos detalhes, pouca decoração. Havia uma TV grande, ar condicionado, frigobar, ponto de internet e um banheiro moderno e discreto ao fundo, do lado esquerdo.
- Antes não era real? - Perguntei assim que me livrei dos sapatos e da bolsa.
- Sempre foi real, Clara. Mas não haviam outras pessoas envolvidas nisso. - Ele sentou na cama e bateu levemente no colchão, me chamando para perto.
- Não havia a Vivi? - Questionei logo que me sentei.
- Meu amor, se isso tudo tivesse acontecido sem que minha filha tomasse conhecimento, ou tivesse tentado me convencer a te levar pra morar conosco... - Ele riu da ideia de sua filha. - Com certeza não haveria problema. Eu ficaria um pouco preocupado por você não retornar a mensagem, mas no dia seguinte nos falaríamos e ficaria tudo bem.
- Ela ficou muito chateada?
- Tem um recado muito importante que preciso te dar. - Ele disse num tom de voz sério.
- Qual? - Virei-me na direção dele.
- Vivian Colombo manda avisar que se você não ligar para ela ainda hoje, nunca mais será bem vinda na casinha dela, nunca mais será convidada para brincar de bonecas e ela nunca mais mesmo, mesmo, mesmo... Espera! - Ele fez suspense. - Tem um outro mesmo... vai querer falar com você.
Arregalei os olhos, surpresa.
- Ela disse tudo isso?
- Sim. - Ele assentiu. - Minha filha está muito apaixonada por você.
- Vou ligar agora. - Falei rapidamente. - Ligue para ela. Eu não tenho o número.
Ele sorriu com carinho e fez a ligação. Depois do terceiro toque, a chamada foi atendida.
- Vivi? - Falei com ansiedade.
- Clara? É você? Sério que é você? - A vozinha da menina estava cheia de expectativa.
- Sim, princesinha. - Respondi, já emocionada. - Claro que sou eu.
- Por que você não respondeu a minha mensagem de voz??? - Ela inquiriu aborrecida. - Eu fiquei esperando você responder, você nem ligou.
- Me desculpe, Vivi. - Falei com cuidado. - Olha, eu sei que foi muito feio não ter respondido sua mensagem de voz, que ficou linda, só pra você saber. Mas é que eu estava com alguns problemas com meu irmão.
- Você tem um irmão, Clara? - Ela perguntou, curiosa.
- Sim, eu tenho. E nós dois ficamos um tempão sem conversar, porque ficamos de mal.
Lucas me observava em silêncio enquanto a conversa acontecia. Olhei pra ele e vi um sorriso acolhedor em seus lábios. Sorri de volta para ele enquanto tentava me explicar para a mocinha exigente do outro lado da linha. Ele me puxou para o centro da cama, apoiou as costas na cabeceira e me acomodou em seus braços.
- Você estava de mal com seu irmão? - Ela disparou. - Isso não é legal! Meu papai disse que não podemos ficar sem falar com as pessoas da família, mesmo quando elas são chatas como minha vovó Hilda.
- Seu pai chamou sua vovó Hilda de chata? - Perguntei e Lucas fez cara de espanto, tentou tirar o celular de mim, mas não deixei.
- Não, ele não. Eu chamei. - Ela explicou. - Porque vovó Hilda briga comigo e briga com meu pai.
- Por que ela faz isso?
- Ela diz que ele foi mau pra minha mamãe, mas eu sei que não é verdade.
Engoli em seco com a confidência da menina, mas ela pareceu não se importar com o que havia dito. A inocência daquela menina linda me emocionava a cada dia, e me deixava cada vez mais encantada por ela.
- Eu fiz as pazes com meu irmão, Vivi. Por sua causa. - Confessei. - Porque depois que ficamos amigas e depois que vi a amizade que você tem com seu pai, lembrei que a família é o nosso presente mais legal.
- Quando você voltar, traz seu irmão pra eu conhecer? - Ela pediu.
- Eu vou tentar, bonequinha. - Falei tentando controlar a emoção na minha voz, e ouvi um bocejo. - Você está cansada? Brincou muito na escola?
- Sim! Tivemos aula de educação física. - Ela revelou. - Malhei muito hoje.
- Você malhou na escola? - Perguntei perplexa e Lucas deu uma gargalhada alta do meu lado. - Crianças podem fazer isso?
- Clara... - Ela disse meu nome de um jeito paciente, como se estivesse me ensinando algo óbvio. - São exercícios para crianças, né? Brincadeiras, jogos com bola, corrida e outras coisas.
- Ah, sim... - Sorri pelo jeito adulto que ela tinha. - Você deve estar cansada, né?
- Estou exausta!
- Então é melhor você ir agora, não acha? - Sugeri. - Deve ter que jantar e tomar banho, ver alguns desenhos e depois dormir para recuperar as energias.
- Sim, eu vou precisar recuperar isso tudo mesmo. - Vivi concordou. - Posso falar com meu papai?
- Sim, amor. Vou passar a o celular para ele.
- Clara? - Vivi chamou indecisa.
- Sim. - Estava sorrindo feito boba.
- Eu estou sentindo saudades de você. - Ela disse. - Eu te amo, tá bom?
- Também sinto saudades e também te amo, pequena. - Respondi com um nó na garganta. - Vou colocar seu pai na linha agora. Um beijo.
Lucas pegou o celular, já com o modo papai superprotetor e superpreocupado ativado, e começou a falar com Vivi, dando instruções sobre o jantar, horário de ir para a cama, sobre como se comportar, respeitar os mais velhos, não ser malcriada e outros assuntos de pai e filha. Fiquei observando por alguns momentos a forma como ele a tratava, todo sério e controlado, mas sem nunca deixar de ser gentil e carinhoso.
Corri para o banheiro para me recompor, pois a conversa com a menina me deixou muito emotiva. O amor daquela menina tão pequena e inteligente me comovia muito, à ponto de me fazer chorar feito uma boba.
O mundo daqueles dois começava a mostrar-se de um jeito intenso para mim, o que me fazia pensar sobre como todas as coisas se encaixariam da melhor forma para todos. Na contramão de todas as improbabilidades havia a certeza de que queria continuar com Lucas, queria continuar na vida daquela menina linda e me permitir ter uma experiência completamente nova e enriquecedora. Toda aquela novidade de vida cobraria seu preço em algum momento, mas estava decidida a correr todos os riscos, abraçando com alegria as situações que viessem.
A emoção de encontrar o homem que eu amava naquele aeroporto no meio da tarde de sexta-feira me fez enxergar ainda mais o quanto ele era especial para mim. Lucas passou uma semana planejando uma viagem surpresa só para me dizer que valia a pena investir nele, isso devia valer algo. Fiquei muito orgulhosa e consternada porque ele estava apostando tudo na nossa relação, finalmente sentia que aquele moreno incrível estava inteiro naquela relação, assim como eu.
- Posso entrar? - A voz de Lucas soou atrás da porta.
- Sim, claro. - Respondi enquanto tentava me recompor e ajeitar a maquiagem com um lencinho.
- Por que você está chorando? - Ele perguntou enquanto estreitava os braços em minha cintura.
- A Vivi... - Respondi enquanto observava nosso reflexo no espelho. - Ela é tão cativante. É linda e maravilhosa.
Ele beijou meu ombro e depois o meu pescoço, provocando-me cócegas por causa da barba.
- Acho que o amor de vocês é correspondido. - Ele pontuou. - Ela está louca por você também.
Demos risada e ele me levou de volta para o quarto, me acomodando na cama e ligando o ar condicionado com o controle remoto. Em seguida pegou o telefone e acionou o serviço de quarto, pedindo nosso jantar. Aproveitei a distração dele e puxei o edredom que estava dobrado no aparador ao lado da cama, estendendo-o sobre o colchão e me enfiando debaixo dele. Ele contornou o quarto, e desabotoou a camisa, pendurando-a sobre uma cadeira, tirou as meias e as colocou dentro do sapato antes de subir na cama e deitar-se ao meu lado, olhando distraidamente para a TV enquanto eu procurava algum canal de filmes.
- Quando você vai embora? - Perguntei tentando parecer natural.
- Amanhã à noite. - Ele disse e eu podia sentir seus olhos sobre mim, encarando por algum tempo.
- Tão cedo. - Comentei tentando empurrar a decepção para longe de mim. - Você acabou de chegar.
- Vem cá. - Ele chamou e me apressei para entrar no abraço que Lucas oferecia. - Eu não posso deixar a Vivi por muito tempo. Odeio essa situação, mas é a realidade que vivemos.
Não respondi. Apenas enfiei o nariz no peito nu dele querendo sentir seu perfume. Lucas me apertou mais entre seus braços e permanecemos assim, sentindo um ao outro, conscientes demais do pouco tempo que tínhamos para ficar juntos. Alguns momentos depois o serviço que quarto chamou na porta.
- Não vai, não. - Resmunguei em meio ao cochilo que havia dado.
- É rápido. - Lucas tentou sair da cama, mas não deixei, mantendo-me presa a ele.
- Clara, para de ser teimosa. - Ele deu risada e fez cócegas na minha costela para me fazer soltá-lo.
- Trapaceiro! - Ralhei enquanto virava para o outro lado.
Ele correu para a porta e se desculpou com o camareiro pela demora, recebeu a comida e fechou a porta atrás de si. Em seguida arrumou a bandeja e trouxe-a para cama, tirando-me do estado letárgico para apreciar a comida, que estava incrível. Depois de estarmos satisfeitos, tirei a bandeja da cama e a coloquei sobre a mesa que havia no outro compartimento do quarto.
Apesar de já estar satisfeita pela excelente refeição, algo dentro de mim parecia não encaixar-se. Sentia certa inquietação crescente em meu íntimo, esfreguei meu pescoço com a mão livre e massageei minha nuca, numa tentativa débil de manter a tranquilidade. Sim, algo estava tirando minha paz de espírito e não poderia esperar pelo dia seguinte, sentia que não poderia esperar nem mesmo pelo próximo segundo, então era necessário resolver mais este conflito.
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