Capítulo 25
Quando eu puser meus lábios em você
Você sentirá os arrepios subirem e descerem por sua espinha por mim
Farão você chorar por mim
Quando eu puser meus lábios em você.
(Lips On You – Maroon 5)
Saturn Campbell
O ranger característico da porta de madeira velha estimula a maioria das células nervosas em minha cabeça, fazendo com que os sinais elétricos viajem de neurônio para neurônio, atravessando dendritos, corpos celulares e axônios até alcançarem o tálamo em meu cérebro; onde o som, processado pelo núcleo geniculado medial, finalmente se dirige à região central do meu córtex auditivo, o que me deixa em alerta.
Alguém entrou no quarto 502. Alguém está aqui.
– Oi, Saturn. – A sua voz, completamente distante e abafada, vibra em todos os cantos da minha mente, como um eco insistente. Ao mesmo tempo em que a minha cabeça busca incansavelmente entender o sentido dos sons aleatórios que ecoam dentro de mim, escutar as vibrações da voz de Ocean acalma os turbilhões de sentimentos que sinto em meu peito.
Há muito tempo eu já não sei distinguir o real da fantasia. Os constantes sons e vozes que eu escuto parecem fazer parte de um grande sonho planejado pela minha mente fértil como forma de me manter refém da prisão dos meus pensamentos. Como forma de me manter presa nesta cama de hospital.
– Hoje tive que sair para comer porque todos os meus lanches foram doados para Violet. Eu não sei se ela já falou para você, Saturn, mas Violet não tem mais restrição alimentar.
Há silêncio no quarto 502 e em minha mente. É perturbador.
– Ah, e Miller me ligou na hora do almoço.
Pergunto-me constantemente se Ocean não é apenas um fantasma criado por mim mesma como fuga da realidade assustadora que me cerca. Se as vibrações da voz de Ocean não são meramente fruto da minha imaginação para que eu não perca o pouco de sanidade que me resta depois de seis dias neste lugar.
– E eu tenho novidades, Saturn. A pesquisa de Miller parece finalmente estar saindo como o planejado. Ainda estamos estudando as interações de um sistema binário de estrelas e, aparentemente, já coletamos dados o bastante para planejar uma publicação científica sobre a influência do Gráviton na trajetória elíptica da Estrela Secundária. E bom, isso tudo pode se transformar numa base para o meu futuro projeto de doutorado.
As suas palavras soam completamente confusas para mim, como se o núcleo geniculado medial esquecesse de processar todos aqueles sinais elétricos. Como se alguns dos sinais elétricos se perdessem no longo caminho até o meu córtex auditivo. Compreendo e assimilo somente metade de suas palavras, e me pergunto se isso faz parte do efeito dos medicamentos.
Sinto a confusão rodar todos os cantos da minha mente, sinto a exaustão corroer cada pequeno neurônio em mim. E eu já não sei exatamente se Ocean está realmente do meu lado neste momento ou se ainda estou sonhando.
– Você ainda se lembra da nossa última noite juntos, Saturn? – A sua fala é seguida de uma longa e eterna pausa. – Lembro-me de estar absolutamente apavorado quando caminhei em direção ao seu dormitório naquela noite. Mas, no momento em que a vi parada bem a minha frente, fui tomado pelo medo de perdê-la. E confesso que foi este medo que me fez agir daquela maneira.
Inúmeros sinais elétricos estimulam os neurônios contidos na porção mais medial do córtex do lobo temporal, o meu hipocampo. Antigas ligações entre as minhas células nervosas são ativadas novamente, invocando a reprodução de uma memória declarativa.
Como um pequeno filme rodando a minha mente, sou capaz de visualizar e reviver infinitos e ricos detalhes daquela noite em especial.
Oh! Eu ainda posso me lembrar de tudo o que aconteceu naquela noite. Eu ainda posso me lembrar do exato momento em que eu abri a porta do meu quarto e encontrei Ocean encostado no batente. O seu peito subia e descia com rapidez, como se estivesse andado com pressa para chegar até ali. Os seus olhos continham um brilho triste, e eu posso jurar ter visto uma solitária lágrima escorrendo no canto da sua face.
Lembro de inclinar a minha cabeça para o lado, levemente. Observei-o, prestando atenção em cada mínimo detalhe de Ocean. Por alguns segundos eu esperei ele dizer algo, mas ele continuava em completo e absoluto silêncio, o que era estranho. "Quer o seu suéter de volta, garoto astrônomo?" Perguntei, um pouco confusa com a sua aparição repentina.
Mas, enquanto eu ainda olhava diretamente para ele, esperando alguma resposta, alguma reação da parte dele, Ocean deu um pequeno passo à frente e segurou o meu rosto entre as suas mãos. A sua íris azul flutuava em meio ao seu olho avermelhado por conta da sua lágrima. Era lindo e, ao mesmo tempo, triste
Sem dizer qualquer mínima palavra, Ocean aproximou o seu rosto do meu e me beijou.
Lembro de, por uma curta fração de segundo, ficar sem qualquer reação, estranhando completamente a sua atitude. Ocean nunca foi o tipo de pessoa que age por impulso ou que se deixa levar pelo instinto, pelo contrário, ele sempre foi racional demais, discreto demais. Bom, pelo menos era sem a minha influência ou insistência.
Ocean nunca me beijou como naquela noite. Os seus lábios procuravam pelos meus, desesperadamente. Era bom e eletrizante.
Lembro, também, do modo delicado com que Ocean me empurrou para dentro do quarto, sem ao menos desgrudar os seus lábios dos meus. Escutei a porta se fechar atrás de mim e, no segundo seguinte, pude sentir o meu corpo se chocar contra a madeira quando Ocean me pressionou sobre a parede.
As suas mãos levemente entrelaçaram as minhas, logo acima da minha cabeça. A sua mão estava gelada, como se, minutos antes de me encontrar, Ocean estivesse do lado de fora do prédio do alojamento. E, meu Deus! Eu ainda posso sentir, vividamente, o gosto daquele beijo, ainda posso sentir os arrepios causados pelo contato dos seus lábios quentes na pele fria do meu pescoço.
Os seus lábios desciam cada vez mais em meu pescoço, como se Ocean quisesse beijar e provar cada centímetro do meu corpo. E, da mesma maneira, cada centímetro do meu corpo desejava ser beijada e provada por ele. Ainda posso me lembrar, com clareza, da maneira como eu mordi os meus lábios ao sentir a sua boca descendo, lenta e perigosamente, ao meu ombro.
Ainda posso me lembrar da maneira como o meu coração pareceu saltar de forma irregular sobre o meu peito ao sentir o calor dos seus lábios sobre o decote da camiseta que eu usava naquele noite.
Eu ainda posso me lembrar da maneira como eu chamei o seu nome nos suspiros que insistiam em escapar de mim, totalmente extasiada pelo seu toque e pelo seu desejo. A minha mente estava completamente tomada e entregue a ele, e aquilo era perigoso.
E eu genuinamente não entendia os motivos que o levaram ali, na porta do meu dormitório, eu sequer entendia o que o Ocean estava fazendo. Mas, naquele momento, tudo o que eu queria era provar ainda mais da sua intensidade. Porque era bom e viciante.
Ainda posso me lembrar de como Ocean puxou-me para si, como se os centímetros que separavam os nossos corpos fossem torturantes, ainda posso me lembrar de como ele me guiou timidamente até a cama. A cada curto segundo que passava, ficava mais e mais difícil me manter racional tendo o seu corpo junto ao meu. As suas fortes mãos desciam lentamente pelo meu quadril e pernas.
Lembro-me de ouvi-lo suspirar contra o meu rosto no exato momento em que eu afundei as minhas mãos em seu cabelo escuro e, involuntariamente, mexer o meu quadril sobre o seu. Lembro de sentir, novamente, o sabor dos seus lábios sobre os meus. Era mais calmo.
Eu podia sentir a sanidade evaporar do meu corpo pouco a pouco ao ter as suas mãos subindo lentamente pela lateral da minha coxa. Meu Deus! Ainda posso me lembrar da sensação eletrizante causada em todo o meu corpo ao sentir os seus dedos atravessarem o limite da barra do meu shorts. Posso me lembrar vividamente da maneira como eu suspirei ao sentir as suas mãos apertarem, delicadamente, a minha pele quente. Oh, aquele era o meu ponto fraco.
Lembro-me de retirar a sua camiseta e de tomar a liberdade de passar as minhas mãos em seu peito e ombros, onde pude sentir cada músculo do seu tronco relaxar por completo. Eu estava extasiada pelo seu gosto, pelo seu corpo e pelo seu beijo. Eu sentia um desejo imenso em tocá-lo e um desejo imenso em ser tocada por ele.
Naquele momento, a minha mente ficou em completo estado de alerta. Ao mesmo tempo que aquilo tudo era bom e viciante, eu tinha medo do quão longe estávamos indo. Tinha medo do quão rápido estávamos indo. Eu não podia deixar Ocean ver o meu corpo. Eu não podia deixá-lo ver os ossos aparentes em meu quadril devido a minha perda de peso excessiva, eu não podia deixá-lo ver as inúmeras manchas espalhadas por toda a minha pele ou mesmo as marcas das agulhas do hospital no canto da minha barriga.
E era esse o medo que me afastava de Ocean todas as vezes que ele tocava em minha pele por debaixo da minha camisa. Eu me afastava porque eu simplesmente não podia deixá-lo ver quem eu era de verdade. Porque eu não queria que ele fosse embora depois de descobrir como eu estava, assim como Christopher fez. Depois de descobrir o que o hospital e os medicamentos fizeram comigo.
Eu não podia deixá-lo ir embora. E isso significa que eu precisava me esconder dele.
Mas, então, Ocean afastou o seu rosto do meu, recuperando um pouco do fôlego perdido. Os seus olhos me observavam com atenção, e neles não havia mais lágrimas, apenas desejo. Assim como os meus. "Se realmente vamos fazer isso, eu quero que seja com você de verdade, Saturn." E, após dizer isso, ele ergueu uma de suas mãos para tocar numa mexa do meu cabelo artificial.
Lembro de sentir a minha respiração falhar. O ar ficou preso em meus pulmões, e era sufocante. Pisquei algumas vezes, tentando assimilar o significado daquelas palavras. A minha mente dava incontáveis voltas, e era simplesmente torturante.
Ocean, de alguma forma, sabia sobre a peruca que eu tanto usava para me esconder, sabia sobre a minha perda de cabelo e sabia que eu havia raspado a minha cabeça. Ele sabia. E isso assustava-me de todas as formas possíveis e imagináveis. "Como? Como você...?" Perguntei, gaguejando.
Tudo o que a minha mente pensava naquele momento era que Ocean simplesmente não podia me ver daquela forma. Eu não podia me expor como fiz naquela noite ao lado do meu ex-namorado. Eu não conseguiria aguentar o peso do seu olhar sobre mim, não conseguiria aguentar as suas palavras cortando-me da forma mais cruel possível assim como Christopher olhou e falou para mim.
Eu não podia deixá-lo ir embora.
Ocean novamente segurou o meu rosto entre as suas mãos, fazendo-me olhar para ele. Elas não estavam geladas como minutos antes. "Saturn, eu já a vi sem." Ele falou, simplesmente. Lembro de sentir a minha mente rodar ao ouvi-lo.
Os meus olhos ardiam e queimavam como nunca antes. As lágrimas que desciam pelo meu rosto eram doloridas. O ar era pesado em meus pulmões. Eu abria os meus lábios, mas nenhuma palavra era capaz de atravessar a minha garganta.
Como? Como? Era tudo o que se passava em minha mente. Como e quando ele havia me visto daquela forma? Como eu pude me permitir ser tão descuidada ao ponto de deixá-lo me ver? Por que eu havia feito aquilo? Por que eu a tirava? A culpa era minha. Era totalmente minha.
E por que Ocean nunca me falou nada durante todo esse tempo? Como ele pode me aceitar daquela forma? Mesmo sabendo como eu era de verdade? Como ele ainda pode gostar de mim? Como ele pode continuar falando comigo? Como ele pode continuar me olhando com carinho, com admiração? Como ele pode continuar comigo mesmo me vendo daquela forma? Por que ele não foi embora como Christopher?
Por que eu me escondi por tanto tempo?
Ocean ainda olhava para mim. "Eu não sou como Christopher." Lembro que ele sussurrou perto do meu rosto, acordando-me dos meus pensamentos e me trazendo de volta para a realidade. Ocean sabia o que Christopher havia feito? Ele sabia o que Christopher havia falado para mim? "Por favor, não me compare com ele. Não é justo." Ele pediu, balançando a cabeça disfarçadamente. Ocean sabia.
Mas como ele sabia sobre isso? Eu ainda podia sentir as suas mãos mornas em meu rosto, mas, naquele momento, os meus pensamentos estavam acelerados demais para conseguir dizer algo. "Eu sei de tudo, Saturn." Ocean frisou o 'tudo' em sua frase. E, no mesmo instante, eu finalmente entendi o que ele queria dizer.
Era assustador. Era completamente assustador para mim.
"E eu entendo se não quiser fazer isto agora. Posso esperar por você, Saturn." Ocean sussurrou olhando em meus olhos.
Pisquei algumas vezes, tentando inutilmente organizar os infinitos pensamentos que atormentavam a minha mente naquele segundo. Ocean não foi embora como eu pensei que faria ao descobrir como eu estava de verdade, ao descobrir que eu estava doente. Pelo contrário, ele sempre cuidou de mim, ele sempre esteve ao meu lado. Sempre.
Ele acariciou delicadamente as minhas costas quando me encontrou no chão do banheiro no Ano Novo. Ele me carregava quando eu não tinha mais forças para me manter em pé. Ele me acalmava e dormia ao meu lado. Ele fazia o possível para conter o sangue que insistia em sair pelo meu nariz. Ele corria ao meu encontro quando eu o chamava. E ele sempre me contava algo e me distraia quando a dor se tornava insuportável.
Ocean esticou os braços, tentando alcançar a sua camisa que estava jogada ao nosso lado. Lembro de fechar os meus olhos com força quando segurei uma de suas mãos. Eu respirava profundamente, perguntando-me constantemente se eu realmente estava pronta para o que estava prestes a fazer ali.
Ocean olhou para mim.
Lembro-me de tocar no início da peruca que eu tanto usava. Os seus fios eram finos e, de fato, pareciam naturais. Ele era parecido com o cabelo que eu costumava ter. Eu não conseguia olhar em seus olhos, mas eu sabia que Ocean observava cada movimento com atenção.
Eu ainda posso me lembrar da maneira como eu fechei os meus olhos com força mais uma vez quando eu toquei em sua raiz e a retirei da minha cabeça. Mesmo usando e vestindo o meu pijama rosa em seu colo, ali estava eu: totalmente despida em sua frente. Aquela era a verdadeira Saturn Marie Campbell.
Eu estava me mostrando da maneira mais pura e sincera possível ao Ocean, e ao menos tinha coragem para abrir os meus olhos. Ao menos tinha coragem para encará-lo e ver a sua reação. Ao menos tinha coragem para lidar com aquela realidade.
Lembro de sentir uma de suas mãos tocar a minha cabeça completamente nua, logo acima da minha orelha direita. Pude sentir a ponta dos seus dedos percorrerem cada milímetro da tatuagem que representava eu e as minhas irmãs: o Sol, a Lua e Saturno. A mesma tatuagem que eu tentei esconder dele naquele dia.
"De todos os universos que eu já conheci, Saturn, você é o mais belo." Ocean sussurrou em meu ouvido.
Quando eu finalmente consegui reunir coragem, abri os meus olhos novamente, e encontrei Ocean me olhando com demasiada admiração. O seu olhar era caloroso, sincero e verdadeiro. E ele nunca havia me olhado daquela forma antes. Só então eu soube que ele estava sendo sincero em cada palavra e em cada vírgula. E só naquele momento eu percebi o quão tola eu fui em tentar me esconder por tanto tempo, o quão tola fui em temer a sua reação.
O quão tola eu fui em pensar que todos seriam como Christopher.
E eu ainda posso me lembrar do exato momento em que Ocean tirou a minha roupa. Posso me lembrar da maneira suave como as pontas dos seus dedos contornaram as minúsculas manchas vermelhas e roxas causadas pelas agulhas no canto da minha barriga. "Injeções de Granulokine. Elas melhoram a imunidade." Sussurrei levemente. Ocean ergueu os seus olhos para mim e sorriu fracamente.
E eu ainda posso me lembrar do gosto doce do seu beijo, do toque suave das suas mãos em todo o meu corpo nu. Eu ainda posso me lembrar da sensação quente e viciante dos seus lábios sobre os meus seios, da sensação dos seus dedos no interior das minhas coxas.
Eu ainda posso me lembrar das suas mãos tremulas sobre o meu quadril quando finalmente encaixei-me sobre ele. Ainda posso me lembrar dos tímidos gemidos que escapavam entre os nossos lábios a cada novo movimento que eu fazia em seu colo. Ainda posso me lembrar do quão nervoso e trêmulo Ocean estava, porque eu sabia que aquela era a sua primeira vez.
Ocean proporcionava-me sensações das quais jamais experimentei. Fez-me sentir adorada, respeitou o meu tempo e o meu ritmo, algo que Christopher nunca fez em nosso breve e conturbado relacionamento. Deixou-me guiar cada mínimo movimento.
E eu ainda posso me lembrar da maneira como Ocean segurava e movimentava o meu quadril sobre o seu colo, da maneira como os nossos corpos aumentavam, suavemente, o ritmo entre eles, em completa sintonia.
E eu ainda posso me lembrar do jeito como Ocean levantou o seu rosto. E, meu Deus! Ele ficava tão lindo com o rosto ruborizado. Ficava tão incrivelmente belo com as veias saltadas em seu pescoço quando estava alcançando o seu auge. Tão incrivelmente belo com a boca entreaberta ao se entregar às mistura de prazeres daquele momento.
☆
E eu ainda posso me lembrar do momento em que acordamos na manhã seguinte. A minha cabeça estava apoiada em seu peito nu e, ao notar que eu estava sem a minha peruca, a minha mente me bombardeou de lembranças da noite anterior.
Eu sorri, envergonhada.
Lembrei-me de tudo o que ele havia me dito antes. Lembrei-me que ele disse saber de tudo. "A quanto tempo, Ocean?" Perguntei. Lembro de erguer o meu rosto em sua direção, olhando em seu olhos. As suas sobrancelhas estavam arqueadas para mim, como se ele estivesse confuso. "A quanto tempo você sabe sobre tudo?" Insisti. Eu sabia que ele detestava conversas logo pela manhã, mas eu precisava saber. Eu precisava saber.
Ele piscou algumas vezes e respirou profundamente. "Encontrei Christopher no estacionamento ontem. Ele me contou minutos antes de eu vir para cá." Ocean, então, fechou os seus olhos novamente, imaginando que a conversa se encerrara ali.
Eu abaixei a minha cabeça, encarando a porta do outro lado do dormitório. "Eu não queria que fosse assim." Confessei. Lembro de sentir a minha voz falhar. Ocean resmungou alguma coisa e eu continuei a dizer: "Não queria que você tratasse a noite de ontem como uma despedida."
Pude senti-lo se mexer desconfortavelmente sobre a cama. "O que você está querendo dizer, Saturn?" Ocean recolheu o braço que estava ao redor do meu corpo e voltou a olhar para mim.
Os pensamentos começaram a ficar acelerados e confusos dentro da minha mente. Ele só veio ao meu quarto e fez o que fez depois de Christopher contar sobre a minha doença. "Estou dizendo que a noite de ontem só aconteceu porque você estava com pena de mim, Ocean. Você só estava com pena de mim porque sabe que eu estou morrendo!" Cuspi.
Ocean apertou os olhos e me observou por um momento, como se não pudesse acreditar em minhas próprias palavras. "Você ouviu o que acabou de dizer, Saturn? Caramba, eu não transei com você por dó ou por qualquer outra coisa neste sentido!" Ele se sentou na cama e, então, passou as mãos sobre os cabelos.
Percebi que ele encarava a lista pendurada na minha parede em completo silêncio.
"Ontem, antes da gente dormir, você disse 'obrigada pelo vigésimo sétimo item.'..." Ocean murmurou, pensando alto. Ele sentou-se na beirada da cama e vestiu a sua calça que estava jogada no chão. "Olhe para mim, Saturn." Ocean levantou-se e cruzou as suas mãos sobre o seu peito. "Diga-me que ontem não foi apenas mais um item da sua lista idiota. Que eu não fui apenas mais um item estúpido, Saturn."
Eu estava apavorada. Ocean olhava em meus olhos, esperando pela minha resposta. Mas os meus pensamentos estavam confusos, eu não conseguia pensar com clareza. A única coisa que se passava em minha mente é que eu estava sem a minha peruca. Eu estava sem as minhas roupas tampando as minhas manchas e os meus ossos aparentes. Eu estava totalmente exposta.
As lágrimas caíam pelo meu rosto diante da minha própria vergonha, diante do meu próprio medo e Ocean entendeu aquilo da maneira mais errada possível.
Ele ergueu as sobrancelhas e virou o rosto para o lado. "Eu deveria imaginar." Lembro de vê-lo pegar o seu óculos e o colocar em seu rosto e, então, bater à porta com força atrás de si, deixando-me sozinha naquele dormitório.
– Fim do horário de visitas, Saturn. – Pude ouvi-lo dizer.
O ranger característico da porta envia os últimos sinais elétricos à minha cabeça, deixando-me mais uma vez atenta: Ocean saiu do quarto. O silêncio ensurdecedor que cobre todo o ambiente do quarto 502 não estimula uma célula nervosa sequer, fazendo com que o meu cérebro fique em completo estado de paralisia. É assustador. É perturbador.
Eu não penso. Eu não sinto. Eu não ouço.
E, então, passo a ser somente um corpo morno repousando sobre a cama do hospital.
☆☆☆
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