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Capítulo 23

Você vê força em todo movimento
Passos de bebê e respirações curtas
Qualquer coisa é progresso
Você sustenta cada momento meu
Você é meu oxigênio
Você está me fazendo querer viver de novo.
(Oxygen – Steffany Gretzinger)


Lembro de olhar brevemente para o horário que a tela inicial do meu celular marcava. Ainda faltava duas horas para eu finalmente ir ao Departamento de Astronomia e Astrofísica por conta do projeto de Iniciação Científica com Miller, então eu estava tranquilo em relação ao tempo.

Pela primeira vez em muito tempo, Miller e eu estávamos nos dando bem. Recentemente eu havia descoberto um erro na leitura de seus dados, porque ele não havia levado em consideração a distorção da luz causada por corpos de grande massa. Foi um erro amador, então foi simples consertá-lo. Depois disso, Miller passou a ser mais amigável comigo, o que era um alívio.

Estávamos sentados no chão em frente à Biblioteca da universidade, assim como dezenas de outros estudantes que estavam esperando a chuva forte passar. A Biblioteca havia acabado de fechar, mas, por alguma razão, ficamos encurralados naquele pequeno lugar.

"Por que você escolheu Astronomia?" Você tocou em meu braço, chamando a minha atenção. Você inclinou levemente a cabeça para o lado enquanto olhava para mim. "Você disse que desde pequeno era apaixonado pela área, mas como essa paixão surgiu?"

Arrumei a minha postura, procurando desesperadamente alguma posição confortável sobre aquele chão, mas simplesmente não havia. "Você se lembra que há uns doze anos atrás aconteceu um apagão em toda a cidade? Acho que durou umas quatro horas." Comecei a dizer. Direcionei os meus olhos em sua direção, e você balançou a cabeça positivamente. "Eu e o meu pai fomos para o jardim da nossa casa antiga e lá nós deitamos sobre a grama. E eu juro, Saturn, que nunca vi um céu como naquela noite. Havia tantas estrelas!" Apontei para o céu no horizonte. "Tantas estrelas!" Suspirei, lembrando-me daquela noite. "Foi a coisa mais linda que eu já vi em toda a minha vida. E, naquele momento, o meu pai me explicou que algumas delas poderiam estar mortas, mas ainda víamos a sua luz brilhar. Eu fiquei encantado. Simplesmente encantado."

Você sorriu para mim. Os seus olhos ainda estavam fixos nos meus. "Foi então que você se apaixonou pela Astronomia?"

Desviei a minha atenção para o horizonte por um momento, a chuva caia fortemente na nossa frente. Lembro de erguer o meu ombro, discretamente. "Acho que sim." Pisquei algumas vezes enquanto lembrava daquela noite ao lado do meu pai. "Acho que, se eu tivesse que escolher um momento em específico, eu escolheria esse. Sem dúvida alguma."

Você segurou o livro que havia pegado emprestado da Biblioteca com mais força, pressionando-o contra o seu peito. O vento estava carregando alguns pingos gelados aos nossos pés, atravessando a nossa cobertura. Isso me lembrava de quando você me chamou para a casa da senhora Watson.

"E você, Saturn?" Perguntei ao me dar conta de que você, até aquele momento, não havia falado nada sobre a sua paixão pelo seu curso. "Por que biologia?" Indaguei.

Você rapidamente levantou os olhos do livro que estava em suas mãos e, então, inclinou a cabeça para o lado, encarando-me. Eu comecei a explicar: "Eu consigo enxergar perfeitamente você fazendo algo que envolva o serviço e a ajuda comunitária, ou até mesmo algo que envolva o cuidado de crianças, porque você quer sempre ajudar o próximo. E, bom, você ficou bem chateada quando a minha irmã não gostou de você."

Algumas pessoas olharam em nossa direção quando rimos alto.

Ajustei o óculos em meu rosto enquanto concluía a minha linha de pensamento. "E eu consigo vê-la fazer algo relacionado à dança. Digo, é explicito a sua paixão pela dança e pelos palcos. É explicito que você sente falta de tudo isso. E é lindo vê-la dançar."

Você sorriu, completamente envergonhada. E não demorou até você olhar para baixo enquanto pensava em tudo aquilo que eu estava dizendo a você.

Lembro de tocar em seu braço, chamando a sua atenção, assim como você havia feito comigo minutos antes. "O que estou querendo dizer é que você pode ser e fazer o que quiser, Saturn Campbell." Olhei em seus olhos verdes. "Então, por que escolheu cursar Biologia?" Repeti.

Lembro de vê-la sorrir minimamente. "Porque eu amo tudo isso, garoto astrônomo." Você repousou o livro que estava em seus braços em seu colo e, então, apontou para tudo o que havia ao nosso redor. "Eu sou completamente apaixonada por todas as formas de vida.." Você voltou a olhar para mim.

Pelo canto dos olhos, percebi que você mordia o canto da bochecha, mas não parecia estar ansiosa, e sim animada. "Desde pequena eu admiro todas as formas de vida presentes ao nosso redor. Eu amava acompanhar o crescimento de uma flor ou o amadurecimento de algum fruto. E, quando pequena, eu era capaz de passar horas e horas sentada no parque ao lado da escola só para ver um passarinho construir o seu ninho, ou uma lagarta comer uma folha." Você respirou profundamente. "Todas as formas de vida são lindas."

Balancei a cabeça, concordando com você. De fato, todas as formas de vida são lindas. "Cada ser vivo, desde um pequeno vegetal ou até mesmo um grande mamífero, carrega dentro de si um sistema complexo e único. São milhares de sistemas perfeitos que são capazes de gerar uma vida única. E eu sempre achei isso lindo."

Lembro de olhar para frente e de apertar os meus olhos enquanto digeria cada vírgula do que você havia dito. Eu nunca havia pensado naquilo antes, nunca havia parado para pensar no quão incrível era aquilo. No quão perfeita é a harmonia da vida. Céus, eu estava parecido com você!

Um raio clareou o céu no horizonte. Segundos depois ouvimos o som do trovão ecoando ao nosso redor. Alguns estudantes ao nosso redor pareceram se assustar com o som alto, mas você continuou a dizer: "Olhe para o céu, Ocean." Você pediu. No mesmo instante os nossos olhares foram direcionados para o céu escuro repleto de nuvens carregadas de chuva. E, mesmo assim, era possível enxergar quatro pequenas estrelas. "Quantos milhares de planetas há no universo? Quantas infinitas estrelas?"

Abri os meus lábios por um segundo. Há bilhões de estrelas presentes em cada galáxia. E há bilhões e bilhões de galáxias em todo o nosso universo. Isso nos dá, aproximadamente, mais de sextrilhões de estrelas existentes.

E esse é um número que foge completamente do nosso entendimento. Um sextrilhão de segundos correspondem a, aproximadamente, 31 trilhões de anos. E o nosso universo possui apenas alguns bilhões de anos. Então, ironicamente, temos mais estrelas no universo do que segundos na história.

Um sextrilhão é: 1 000 000 000 000 000 000 000.

"E nós, Ocean..." Você continuou a dizer, chamando a minha atenção e acordando-me dos meus pensamentos. "Nós somos um dos únicos, senão o único lugar com vida em meio a essa imensidão negra."

Lembro de balançar levemente a minha cabeça em concordância. Você olhou em minha direção e concluiu: "Nós fomos contra todas as possibilidades possíveis e existentes." E, então, você falou algo que eu jamais esquecerei: "Nós somos a contradição do universo." Ah, Saturn, você sempre encontrou as palavras perfeitas.

Porque nós somos, de fato, a contradição do universo.

Cada minúsculo evento foi fundamental para o surgimento da vida como a conhecemos hoje – até mesmo a catastrófica colisão da Terra com Theia, um antigo planeta que dividia a órbita conosco, a bilhões de anos atrás, o que originou a Lua que conhecemos hoje e que proporcionou o Carbono, Nitrogênio e o Enxofre ao nosso planeta. E isso foi essencial às primeiras formas de vida.

Esta antiga colisão ainda nos afeta, afinal, a Lua regula o ciclo e o nível das marés periodicamente. A Lua regula o eixo de inclinação da Terra, mantendo-a a 23 graus, valor este que estabiliza todos os eventos climáticos. Além disso, a Lua é essencial para os hábitos noturnos de alguns animais, o que colabora para o equilíbrio do ecossistema.

Um evento catastrófico que poderia facilmente destruir a Terra em milhões e milhões de pequenos pedaços pelo espaço foi o responsável por criar milhões e milhões de características favoráveis à nossa vida.

Cada minúsculo detalhe, cada minúscula mutação nas bases nitrogenadas do DNA – que ocorre uma única vez a cada um bilhão de cópias e replicações do material genético – foram cruciais para a vida como a conhecemos hoje. Raras e infinitas mudanças nos genes dos seres vivos foram indispensáveis para a nossa criação.

E milhões de alterações no material genético podem ativar a morte celular através da apoptose. Milhões de alterações no DNA podem ser fatais para o organismo. Milhões de alterações podem destruir a vida. Mas, por alguma razão, contrariamos tudo isso.

Cada minúsculo fenômeno, desde a colisão caótica entre dois planetas a até mesmo um defeito – um erro aleatório – numa sequência de moléculas orgânicas, contrariou a ordem natural do universo.

Nós nascemos do caos e crescemos no caos, Saturn, e isso faz de nós a contradição do universo.

"Sabe..." Ajustei o óculos em meu rosto enquanto pensava sobre o assunto. "A segunda Lei da Termodinâmica diz que a Entropia, que é o grau de desorganização de um sistema, tende a aumentar. Ou seja, o Universo tende a se desorganizar a cada segundo que passa. E nós, Saturn, somos fruto da desorganização do Universo."

Você abriu os olhos em surpresa e sorriu para mim. "A vida, em toda a sua perfeição, nasceu em meio a desorganização e imperfeição do Universo." Você sussurrou ao meu lado.

Respiramos profundamente, contentes com toda a linha de raciocínio que criamos. Outro raio iluminou o horizonte, mas o seu som não foi alto como o anterior. Os alunos ao nosso redor pareciam estar cansados de esperar a chuva passar.

Você olhou brevemente para o livro repousado em seu colo e continuou a dizer: "Eu amo cada vírgula da história que narra a nossa criação. É lindo ver e compreender que cada imperfeição da Terra criou um mundo e um sistema perfeito. É lindo estudar o modo com que cada célula foi minimamente pensada e planejada, o modo com que cada átomo foi perfeitamente colocado em cada lugar do nosso corpo."

E, ah! Eu ainda me lembro do modo discreto como você sorria ao sussurrar tais palavras acima do barulho da chuva.

"Eu amo a vida, Ocean." Você voltou a olhar diretamente para mim. "E não importa qual é a sua religião, não importa qual é a sua crença acerca do surgimento do universo, qual a sua crença acerca do modo com que evoluímos. Porque, seja no surgimento aleatório no caos do Big Bang ou na criação divina, no fim, todas narram de maneira bela a vida que temos hoje. Porque a vida é, de fato, bela."

As suas mãos suavemente tocaram o chão cimentado a nossa volta.

"Acredito que tudo isso foi planejado e criado." Você novamente apontou para as coisas ao nosso redor, mostrando que tudo aquilo havia sido criado. "Acredito que viemos do pó e, como num ciclo de transformação, retornaremos à condição inicial, alimentando a beleza infindável da criação e do universo."

Um sorriso orgulhoso crescia em seu rosto.

"Acredito que temos um motivo real para estar aqui. E eu sou eternamente grata por ter tido a oportunidade de contemplar tudo isso, de participar dessa história incrível que é a vida." Lembro do exato momento que você olhou para a rua e para o gramado a nossa frente, onde a chuva não dava trégua alguma. "E é por isso que eu escolhi biologia, Ocean."

Eu apertei os meus olhos e controlei o sorriso em meu rosto. "Um motivo que você ainda desconhece." Murmurei baixinho.

"Um motivo que eu ainda desconheço." Você murmurou de volta. Os seus olhos encontraram os meus e você riu. "Mas eu ainda acredito que temos um motivo. Não sou cética como você, garoto astrônomo." Você encostou o seu ombro nos meus, delicadamente.

Após longos segundos em silêncio, você respirou profundamente, parecendo estar cansada. "Mas sabe qual foi o meu erro, Ocean?" Você perguntou. Sua atenção era direcionada à rua.

"Qual?"

Você abaixou a cabeça enquanto suspirava demoradamente. "O meu erro foi passar uma vida inteira admirando a vida ao meu redor ao mesmo tempo em que eu esquecia de vive-la de forma intensa." Você balançou a cabeça para os lados, colocando os pensamentos em ordem. "Eu admirava a vida, mas não a aproveitava, entende." Você sussurrou. Então, você apoiou o livro que estava em seu colo no chão, ao meu lado. A sua mochila também foi colocada de lado. "E a maior prova disso é que eu precisei fazer uma maldita lista para aproveitar tudo isso." Você sussurrou e, em seguida, apontou para o gramado que ficava próximo à rua.

Sem ao menos me dar a oportunidade de dizer ou fazer algo, você se levantou com pressa, como se estivesse atrasada para um compromisso importante. Apertei os meus olhos em direção a você e inclinei a minha cabeça para o lado, confuso com o seu movimento repentino. "Onde você vai, Saturn?"

Você revirou os olhos, como se a minha pergunta fosse explicitamente óbvia. Um sorriso nasceu em seu rosto. "A vida é curta demais para fugir da chuva, garoto astrônomo." Você abriu os braços. Alguns pingos de chuva caíram em sua chão.

Balancei a cabeça para o lado enquanto respirava profundamente. "Saturn..." Resmunguei baixinho enquanto fechava os olhos por um breve momento. Eu estava cansado e não queria correr atrás de você debaixo da chuva fria. Ergui o meu braço em sua direção e segurei a sua mão.

E ela estava quente. Muito quente.

E eu sei que você percebeu a cara que eu fiz para você. A preocupação e a surpresa eram evidentes em meu rosto. Mas antes que as palavras alcançassem a minha boca, você deu um passo para trás, entrando debaixo da chuva forte.

E em poucos segundos você começou a caminhar em direção à grama, do outro lado da rua. Em nenhum momento você olhou para os lados para, enfim, atravessar a rua que costumava ser movimentada. Era como se você simplesmente não se importasse com a vinda repentina de um carro em sua direção.

A chuva era forte naquele fim de tarde escuro e, por esse motivo, eu a perdi de vista.

Lembro de fechar os olhos mais uma vez enquanto respirava profundamente, sentindo o ar tocar os meus pulmões, lentamente. Lembrei-me do dia anterior, quando a encontrei sentada no chão do banheiro feminino com o chuveiro frio ligado acima do seu corpo. Lembrei-me de como você não estava bem, de como eu insisti para levá-la ao hospital e de como você se recusou veemente.

Sei que Anne disse que você estava melhor. Mas porque você ainda estava quente como no dia anterior?

Sem ao menos pensar nas possíveis consequências das minhas ações, corri em sua direção, chuva adentro. Os pingos começaram a escorrer pela lente do meu óculos, tornando a minha visão completamente inútil naquele momento. Por isso, decidi guardar o óculos no bolso da minha calça.

Tudo o que eu via era um grande borrão, mas não demorou até eu encontrá-la próxima a uma árvore.

Você estava com os braços abertos ao redor do corpo enquanto rodopiava lentamente. O seu rosto estava erguido em direção ao céu, e os pingos frios caiam suavemente pelo seu rosto. Um sorriso largo preenchia o seu rosto, como se estivesse apreciando cada pequena gota de água que caia das nuvens acima de você.

As folhas verdes da larga árvore balançavam com o vento insistente.

Aquele era o seu vigésimo quarto item. Dançar na chuva.

O clarão de um raio que caiu próximo daquele local iluminou, por um breve e curto segundo, as árvores ao nosso redor. Lembro de sentir um arrepio frio percorrer cada milímetro do meu corpo ao ouvir o alto trovão. "Saturn!" Chamei-a, mas você ao menos me deu atenção. "Você sabe que é errado ficar perto de uma árvore no meio de uma tempestade com raio." Falei um pouco mais alto. Dei um passo em sua direção, e você foi para trás. "É suicídio." Insisti.

Eu estava apavorado por simplesmente estar ali.

Você abaixou os braços e, então, encarou um ponto distante logo atrás de mim. Você parou de rodar. "Eu não tenho nada a perder." Você sussurrou como se estivesse simplesmente pensando alto.

Apertei os meus olhos e inclinei a cabeça levemente para o lado enquanto olhava seriamente para você. A Saturn que eu conhecia até aquele momento jamais falaria aquilo em voz alta. A Saturn que eu conhecia nem mesmo pensaria naquilo. "Como assim não tem nada a perder?" Perguntei. Lembro de rir ironicamente. "Que tal a sua vida?"

Sem ao menos olhar em meus olhos, você deu mais um passo para trás, ficando abaixo da árvore. As suas costas encostaram no largo tronco e, então, você direcionou a sua atenção para cima, esperando algum raio pintar o céu.

"Saturn!" Gritei, completamente furioso com você. Pensei que você estava fazendo alguma brincadeira de mal gosto comigo, ou fazendo alguma brincadeira com o fato de eu estar assustado em estar ali. "Você perdeu o juízo?" Lembro de passar as mãos em meus cabelos, prestes a perder a paciência.

"Eu não aguento mais." Você murmurou. Naquele instante você era apenas um borrão para mim, mas ainda assim eu sabia que, após dizer aquilo, você olhou para mim. Eu podia sentir o seu olhar distante recair sobre mim. "Eu estou cansada, Ocean." Você abraçou a si mesma, encolhendo-se.

Ao longe parecia que você respirava com certa dificuldade.

A minha preocupação com você ultrapassou qualquer medo ou receio que assombrava a minha mente. Você não parecia estar bem. Calmamente eu caminhei até você, e só então eu pude observá-la claramente. E você estava com os olhos vermelhos pelas lágrimas.

Lembro de tocar em seu rosto, delicadamente. Você estava quente. Quente como o dia anterior no banheiro. "Saturn, você está queimando de febre." Sussurrei, olhando em seus olhos.

"É cansativo demais fingir estar bem o tempo inteiro." Você começou a falar, ignorando-me completamente. A sua voz estava levemente trêmula e você soluçava entre uma frase e outra. "E é cansativo demais ser feliz o tempo inteiro." Você abaixou a cabeça. "Eu juro que eu tento aproveitar a vida, mas, às vezes, tudo o que eu consigo pensar é que ela é injusta. Muito injusta."

Naquele momento eu finalmente entendi, Saturn. Entendi que a chuva fria que caía das nuvens no céu era como a água gelada que saia do chuveiro e que foi usada para aliviar a sua temperatura.

Lembro de passar suavemente o meu dedo em sua bochecha e de sentir a sua pele quente abaixo da minha mão. As suas lágrimas eram mornas, diferentemente dos pingos da chuva. "Saturn, você não está bem." Falei. Os meus olhos viajavam preocupados pelo seu rosto.

"Esse é o problema, Ocean!" Você gritou enquanto olhava diretamente para mim. Mas você não parecia estar brava nem nada parecido. "Eu não estou bem!" A sua voz falhou, e mais uma vez você soluçou.

Dei um passo para trás, um pouco assustado com o modo como você havia falado aquilo.

Um clarão iluminou o céu acima de nós por uma fração de segundo. As árvores e as folhas ao nosso redor foram iluminadas com uma luz branca e roxa por conta do raio. Segundos depois, o som ensurdecedor do trovão fez o meu corpo vibrar por completo, sinalizando para nós que o raio havia caído próximo dali.

Lembro de olhar em sua direção. Você continuava parada em frente à árvore, com as costas apoiada sobre ela. Você ao menos se mexeu, Saturn. Você ao menos se importou com o raio. Do mesmo jeito que você ao menos se importou em olhar para os dois lados da rua ao atravessá-la correndo.

Lembrei-me das suas palavras de minutos antes: "Eu não tenho nada a perder." "Eu não aguento mais."

Os meus olhos começaram a arder com as lágrimas que eu mesmo segurava dentro de mim. Eu simplesmente me recusava a acreditar que você estava falando sério, recusava-me a acreditar que você sentia verdadeiramente aquelas palavras. "Saturn, vamos embora. Por favor." Foi tudo o que eu consegui dizer. E aquilo era uma súplica.

Mas as suas palavras ainda ecoavam em minha mente: "Eu não tenho nada a perder." "Eu não aguento mais."

Pelo canto dos olhos eu podia perceber que você estava tremendo. Mas eu não sabia se era por conta do vento frio que nos atingia juntamente com a chuva ou se era por conta das suas lágrimas. "Conte-me alguma coisa. Qualquer coisa." Você pediu. Os seus olhos estavam fixos nos meus.

Lembro de segurar em sua mão, delicadamente, e de trazê-la para perto de mim. Eu envolvi o seu corpo com o meu e a abracei com força, como se eu pudesse protegê-la dos seus próprios pensamentos. "Vamos para o alojamento e eu prometo contar alguma coisa para você. Só vamos sair daqui, Saturn." Sussurrei ao pé do seu ouvido.

Lembro de enviar uma mensagem para Miller dizendo que não estava me sentindo bem e que eu não iria ao estágio.

– Acho que, ao mesmo tempo em que você fingia estar bem, eu fingia acreditar. – Eu digo, sorrindo minimamente. Observo o quarto 502 por um breve momento. Observo, também, a cama que Saturn está repousada. – Esse sempre foi o nosso jogo preferido, não é mesmo?

A minha atenção recai em nossas mãos. Diferentemente das vezes anteriores, Saturn não aperta os meus dedos, nem mesmo por um curto segundo. Nem mesmo com uma força extraordinariamente pequena. E diferentemente de horas atrás, Saturn não tem o seu ritmo cardíaco e nem o respiratório alterado.

Mas, então, quando observo atentamente o seu rosto sereno, percebo que uma pequena lágrima escapou dos seus olhos. Ela atravessa a sua bochecha, lentamente, e, por fim, atinge o seu travesseiro branco.

– Saturn... – Respiro profundamente. O meu coração dói dentro do meu peito, mas eu preciso perguntar algo a ela. Eu preciso e quero saber sobre algo. – Aquela foi a primeira vez que você pensou não ter nada a perder? Aquela foi a primeira vez que você pensou não aguentar mais tudo aquilo, toda aquela dor? – Pergunto.

E eu não faço a mínima ideia de como eu poderia ter a resposta daquela pergunta. Mas eu carrego aquela dúvida comigo a semanas, desde que o episódio da chuva aconteceu. E ter essa questão martelando a minha cabeça todos os dias antes de dormir é, no mínimo, torturante.

É então que eu vejo outra lágrima descer pelo canto dos seus olhos fechados. E outra. E outra.

E aquela era a resposta.

★★★

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