•Capítulo Seis•
Quando abri os olhos naquela manhã não fui atingida pelo desespero cru, não estava com a respiração ofegante como nos últimos anos. Fui tomada por uma estranha sensação, não sabia dizer ao certo se era medo, ansiedade, pavor, ou entusiasmo, talvez um pouco de cada. Me levantei e fui preparar um bom café da manhã, um que me deixaria ativa até a hora do almoço. Precisaria de todas as minhas energias, estar disposta, até que chegasse à noite para o jantar com Luke.
Estava novamente sentada à grande mesa da cozinha pensando naquele homem loiro, era quase como se eu pudesse vê-lo ali na minha frente, com aquele olhar avaliador e curioso concentrado em mim. Seria assim essa noite? Ele me olharia durante todo o jantar, ou tentaria conversar?
Eu não me importaria se ele fizesse qualquer um dos dois, queria que aquele gelo dentro de mim fosse quebrado, estilhaçado, e sentia que ele poderia fazer isso. Pela primeira vez em mais de dois anos eu estava me sentindo algo mais que uma casca oca, sentia uma faísca acendendo-se dentro de mim quando ele estava por perto.
Depois de tomar café da manhã, subi para o andar de cima e dei uma leve arrumada no meu quarto. Iria até o centro de Manhattan e tentaria restaurar a imagem daquela menina de dois anos atrás, tentaria ser a Julia de antes, a menina que era forte e sensual, a mulher que atraía a todos em seu caminho, a mulher verdadeira dentro de mim.
O centro de Manhattan estava, como sempre, movimentado. Andava no meio das pessoas com o queixo erguido, lembrando-me das palavras que Maggie costumava me falar depois de Walter. Eu nunca segui as suas regras, nunca lhe dei muita atenção depois daquilo. Agora me arrependia amargamente de ter feito o que fiz, Maggie estava em coma a mais de um mês e não tinha nada que eu pudesse fazer. Lembrei-me de que em poucas semanas estaria na Itália com a minha irmã, esperando que ela acordasse. Pensava seriamente em me mudar para lá nesse período, assim ficaria perto de Maggie e quando ela acordasse, veria que eu estava ali com ela.
Pisquei algumas vezes, parando no meio do passeio movimentado, e olhei para a loja de roupas na minha frente. Começaria por ali.
Não tinha percebido que sentia falta das minhas compras com Maggie até estar parada no meio da loja, um pouco perdida naquela imensidão de cabides cheios de roupas, algumas iguais, mas com tonalidades diferentes, outras um pouco espalhafatosas demais.
— Como posso ajudá-la? — uma das atendentes perguntou atrás de mim, me fazendo dar um pulo de susto.
Corei vergonhosamente quando encontrei olhos castanhos, escuros como a noite me olhando divertidos. Engoli em seco e me virei completamente para a mulher, que era mais baixa que eu, mas parecia mais velha. Ela mexeu no aro preto do óculos e voltou a sorrir para mim, piscando algumas vezes como se tivesse algo em seu olho.
— Eu preciso de um vestido para um... — olhei para o lado e para a rua através da vitrine, como se Luke soubesse que eu estava ali e o que estava fazendo. — ...encontro.
— Um encontro?
Olhei de volta para a mulher, não sabia se era pavor ou outra expressão em meu rosto, mas a mulher se prontificou em me atender. Ela me levou pela loja, falando a maior parte do tempo dos vestidos novos que tinham chegado na loja do dia anterior.
— Você está com sorte, os vestidos com o tecido suficiente para cobrir toda a sua altura estavam em falta.
Corei diante do seu comentário, sabia que era um pouco grande para os padrões femininos, mas sempre que alguém dizia eu ficava um pouco desconcertada.
— Sabe, eu queria ter uma altura igual a sua, acho tão elegante. Vocês, mulheres altas, tem uma postura tão refinada. — continuou tagarelando enquanto me levava para uma área mais fechada, um pouco para os fundos da loja.
— Bem, obrigada.
Ela abriu uma cortina vermelha, revelando uma área ampla com pequenos sofás e alguns espelhos dispostos perto dos trocadores de cortina. Algumas mulheres andavam pelo espaço, conversando com as atendentes que lhes mostravam roupas finas e outras se olhavam nos espelhos, avaliando o vestido em seu corpo.
— Bem, vejamos este. — cantarolou a mulher, parada ao lado de um longo cabideiro, esse que estava cheio de vestidos de tecido liso e leve. — Me diga, que tipo de vestido você prefere?
Fui para o lado dela e toquei alguns vestidos.
— Algo simples, não muito espalhafatoso.
— Que tal esse? — perguntou, estendendo o vestido na minha frente. — Ele é tão refinado, e com a sua altura a deixará ainda mais elegante.
Toquei o tecido, maravilhada.
O vestido era de um vermelho escuro, bonina mesmo, era sustentado por alças e as costas dele caía levemente em uma dobra que, podia apostar, mostraria aqueles ossos salientes que eu tinha. A frente por outro lado, tinha uma caída tão baixa quanto as costas, idêntica, que mostraria o meu busto de modo sensual e nada revelador. Toquei a saia, que caía suavemente até embaixo, apostaria que chegaria até embaixo do joelho, e tinha uma abertura que ficaria escondida entre as ondas suaves da saia.
Sorri para a mulher, acenando afirmativamente.
— Vou experimentá-lo.
Sorria em frente ao espelho, o vestido ficara exatamente como eu o imaginara, acentuava o meu quadril largo e suas alças pendiam em meus ombros, onde tinham algumas sardas.
— Ficou espetacular! — falou a atendente atrás de mim e concordei com um aceno firme de cabeça.
— Vou levá-lo.
A atendente se aproximou de mim por trás, olhando para o meu reflexo no espelho e disse: — Seja quem for ele, irá ficar louco por você esta noite.
Estava quase pronta e ainda não tinha recebido nenhuma mensagem de Luke avisando que horas ele viria me buscar ou se havia desistido do jantar. Me sentei na penteadeira escura e olhei para o meu reflexo no espelho, vendo as olheiras um pouco escuras embaixo dos meus olhos, minha boca um pouco rosada, mas ainda assim, seca, e os meus olhos ainda pesados e sem vida. Havia aquela pequena faísca ali, mas ela estava se apagando a cada minuto que passava e Luke não dava qualquer sinal de vida.
Suspirei, pensando se me precipitara um pouco ao ir à rua e comprar esse vestido, ou talvez tivesse me arrumando um pouco cedo demais.
Olhei pelo quarto e para a janela, já havia escurecido.
Recostei na cadeira, cruzando os braços e fechei os olhos.
O fixo tocou ao meu lado e eu atendi antes de olhar o número.
— Alô?
— Julia, querida. Você já está pronta? — algo dentro do meu peito se aquietou quando ouvi a voz grave de Luke, suspirei aliviada.
— Sim, estou quase pronta. Você quer o meu endereço?
Luke
Fiquei calado por alguns segundos, considerando a minha resposta a pergunta de Julia. Se eu dissesse que não precisava, ela me chamaria de louco e pervertido, pois podia vê-la de onde estava, sentada em frente a uma penteadeira, olhando pela janela vez ou outra com um olhar ansioso. Estava linda, nada parecida com a menina que eu vira no café nas últimas semanas.
— Tudo bem, pode falar. — escutei atentamente e depois que ela terminou e desligou o celular, voltei a me recostar no banco e esperei, observando ela se apressar e sumir do quarto, para logo voltar e passar algo no rosto, e logo depois, batom. Não consegui ver a cor em meio a penumbra do seu quarto, mas depois de um tempo resolvi parar com o meu teatro e ir pegá-la.
Liguei os faróis do carro e dirigi a curta distância até a frente da casa dela, quase que no momento que estacionei em frente a casa de Julia, ela abriu a porta da frente e saiu. Foi preciso tudo de mim para manter a compostura enquanto ela trancava a porta, virada de costas para mim. O que estava acontecendo? Estava me transformando no adolescente louco por sexo que um dia fora.
Balancei a cabeça, me amaldiçoando internamente enquanto Julia se virava e andava até o carro, os olhos concentrados na tranca da porta, era mais como se ela estivesse me ignorando.
Saí do carro e dei a volta no mesmo quando ela se aproximou, finalmente levantando seu olhar esverdeado para mim. Sorri para ela enquanto abria a porta do carro e, antes que ela entrasse no mesmo, elogiei:
— Você está deslumbrante. — suas bochechas tomaram um lindo tom avemelhado, fazendo-me ter alguns pensamentos inapropiados para o momento.
Tinha percebido a muito tempo, desde aqueles primeiros dias em que ficavamos apenas nos observando no café, que Julia não lidava bem com muita atenção.
— Obrigado.
Não tentei falar nada enquanto ela se sentava, visivelmente tensa.
Dei a volta no carro, ciente dos seus olhos em mim, da sua curiosidade. Quando me sentei ao seu lado e girei a chave na ignição, toda a sua atenção saiu de mim e foi para a minha mão, que acabara de travar as portas do carro. Mesmo de esguelha, vi quando ela retesou o corpo, muito tensa, e não pude evitar olhá-la e nem o estreitar de olhos ao ver o quanto parecia vidrada.
— Você está bem? — ela continuou olhando para a minha mão, como se ela fosse a mão de um fantasma. — Julia!
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