•Capítulo Oito•
Julia
Alguns dias depois...
As ruas estavam, como sempre, lotadas. Bares e restaurantes a todo vapor, quando passara pelo parque mais cedo, tudo estava igualmente movimentado, mas não havia qualquer sinal dele. Eu sabia que não estava ficando maluca, sabia que havia algo de errado, aquela sensação de estar sendo observada, vigiada todo o dia e toda a noite, a coceira em meu corpo, como se milhares de germes a muito tempo adormecidos voltassem a vida com a aproximação de seu mestre.
Mesmo tendo certeza do que vira na outra noite, ainda me perguntava se aquilo não era tudo fruto da minha imaginação, se eu não estava ficando paranoica. Mas eu sabia, sabia o que tinha visto.
Quase implorara para Luke ficar noites atrás, mas ainda não confiava nele para chegar a esse ponto, e, mesmo assim, sentia que se eu tivesse chamado ele para entrar e passar a noite, ele aceitaria de bom grado e não esperaria algo como sexo vindo de mim.
Agora, no entanto, enquanto caminhava para o café, sentia uma necessidade tão forte de encontrá-lo e convidá-lo para participar de mais uma refeição comigo.
Assim que entrei no café, fiz o meu pedido e fui para a área externa, e ali estava ele, na nossa mesa teclando em seu notebook e usando óculos de aro preto que o deixavam com um ar mais sério.
Segurei a respiração e andei até a mesa, me sentando na cadeira ao seu lado. Luke levantou o seu olhar para mim, um sorriso preguiçoso tomando os lábios bonitos, inesperadamente me fazendo prender a atenção neles e imaginar como seria beijá-lo.
— Ora, finalmente você deu algum sinal de vida. — O som grave da sua voz percorreu todo o meu corpo, despertando lugares até então adormecidos.
Engoli em seco, tentando não corar sob seu olhar sem escrúpulos.
Por que isso agora?
Por que não sinto nojo quando ele me olha assim?
Por que eu gosto de ver o desejo em seus olhos?
— Precisava resolver alguns assuntos urgentes. — Falei, tomando um gole do meu café para ver se o meu coração acalmava um pouco.
— Certo. — De esguelha, pude vê-lo me encarando.
Será que ele ainda me olharia assim quando descobrisse a mulher suja que sou?
Teria esse desejo em seus olhos, esse brilho, depois que ele soubesse que estou arruinada além do reparo?
Que esses germes ainda se arrastam sob a minha pele?
— Julia? — Olhei para ele ao ouvir o som da sua voz.
— Sim?
— Está tudo bem? — Não.
— Sim, por que não estaria?
Ele me olhou por alguns segundos, como se tentando achar uma brecha em mim, mas mantive a expressão tranquila.
— Por nada.
Luke voltou sua atenção para o notebook e tomamos nosso café em silêncio. Quando Luke fechou o notebook e começou a se levantar, eu me forcei de pé.
— Espere! — O sorriso no rosto de Luke fez os meus ossos rangerem com uma sensação desconhecida, mas ignorei aquilo e falei: — Você estará livre hoje na hora do almoço?
Ele ergueu as sobrancelhas tão levemente que quase não percebi, mas eu podia ver que ficou surpreso com a minha pergunta.
— Estarei, sim.
— Eu... — mordi o lábio inferior e olhei para o chão, vergonhosa agora por ter toda a sua atenção em mim. — Quer dizer. Você gostaria de ir almoçar na minha casa, hoje?
— Ora, — olhei para cima ao som de riso em sua voz. — Eu adoraria.
Suspirei, aliviada e lhe dei um sorriso um pouco tímido.
— As 12:00? — Perguntei.
— As 12:00.
Eram 12:00 horas em ponto quando o carro de Luke parou em frente à minha casa. Sequei as mãos no pano de prato e corri para a porta vendo, enquanto ia até a mesma, pela janela, Luke atravessando o gramado em frente à minha casa. Abri a porta no momento que ele ia bater e parei, prendendo o ar enquanto devolvia a ele o mesmo olhar avaliador que ele estava me lançando.
Estava maravilhada com o quanto ele estava bonito, um casaco cinza pálido e longo por cima do que provavelmente era um terno de três peças, os cabelos um pouco longos estavam caídos desalinhados para o lado, talvez por causa do vento que agora soprava forte, e estava molhado pelo sereno.
— Entre, por favor. — Convidei, me colocando de lado.
— Com licença. — Pediu, passando por mim.
Fechei a porta atrás de mim e me apressei para o seu lado.
— Aqui, me dê o seu casaco.
Luke olhou para, parecia uma pantera ali, com aqueles olhos claros como gelo, contornados por aquele aro preto. Ele enfiou a mão no bolso do casaco e tirou os óculos antes de deixar o casaco deslizar pelos seus braços. Peguei a peça de roupa na minha mão, prendendo a respiração quando vi que ele usava apenas a camisa social branca, e que essa lhe marcava bem os músculos dos braços e... oh! A barriga!
Tentei não derreter ali enquanto Luke dobrava as mangas da camisa até os cotovelos, expondo veias grossas que percorriam todo o centímetro de pele a mostra. O peito forte demarcava sob a camisa, dando a sugestão de mamilos escuros e pequenos por baixo. Me amaldiçoei mentalmente por estar desejando tão arduamente um homem que conhecia a pouco mais de um mês, mas era quase difícil de resistir enquanto o tinha ali na minha frente, me seduzindo descaradamente.
Espere, ele estava me seduzindo?
Balancei a cabeça, espantando esse pensamento e pendurei o casaco dele junto com o meu ao lado da porta.
— O cheiro está divino. — Sorri e lhe lancei uma piscadela enquanto passava por ele, que estava parado sob o arco que separava o pequeno saguão de entrada da sala.
— Obrigado. — Parei em meu caminho, corada de vergonha. — Você pode me seguir.
Ele sorriu, um sorriso encantador, e me seguiu pela sala de estar, que apresentei para ele, e íamos para a sala adjacente, que eu mal usava.
— Eu preparei a mesa na cozinha. — Falei, coloquei a mão no arco que separava a sala de jantar da cozinha e o fitei ali, parado perto de mim.
Olhamos um para o outro e depois para a grande mesa de jantar vazia a nossa frente.
— Tudo bem, — Ele olhou a mesa mais uma vez antes de me dirigir um sorriso. — De todo modo, jantar aqui nos daria um ar muito formal, e não queremos isso, certo?
Concordei rapidamente, me virando para a cozinha, para a mesa disposta ali, menor, mas ainda assim grande demais para uma pessoa sozinha.
— Eu fiz macarrão com queijo, a ideia anterior era macarrão com queijo e lagosta, mas não sabia se você gostava, então substituí por frango. — Olhei para o balde de frango ao lado da travessa de macarrão e depois sobre o ombro, para Luke.
Todo o meu corpo arrepiou sob o seu olhar, ele parecia feroz, determinado até, e isso acendeu aquela centelha, que a cada dia que eu passava com ele, vinha crescendo e tomando o meu corpo. E era em momentos assim que eu me perguntava onde estava a Julia amedrontada, a coceira sob a minha pele. Era como se ele fosse a cura para aquele terror que eu vivi, ele estava acabando com todos os medos, um por um, desfazendo cada nó existente dentro de mim.
— Frango me parece ótimo.
Engoli em seco. Sabia que ele era um homem rico, o dinheiro estava em cada passo arrogante que ele dava, em suas roupas e sapatos caros, em seu perfume enlouquecedor. Ele expirava dinheiro, e naquele momento, ao recordar disso, me senti uma idiota por fazer macarrão com queijo e frango frito para ele comer em nosso segundo "encontro".
— Desculpe, mas estava tão em cima da hora que não tive psicológico para fazer algo mais... Sofisticado.
— Não se preocupe com isso. — Luke falou, um sorriso felino em seus lábios. — Eu particularmente adoro macarrão com queijo e frango frito.
— Tudo bem, então. — Apontei a mesa e ele foi até ela tranquilamente e se sentou.
Fiquei parada na entrada por alguns segundos, segurando a vontade de ir até aquela mesa e me jogar nele. Seria um tanto imprudente e eu tinha quase certeza que teria um surto apenas por sentir o seu corpo embaixo de mim.
Suspirei e fui me sentar, teria que saber administrar a minhas próprias vontades e me preparar para o que ia acontecer, já que era inevitável.
Nesse momento, Luke lambia o indicador, que dissera, ainda estava com um poco de gordura de frango. Tentei ignorar o quão erótico aquilo parecia e me concentrei no meu prato. Por que infernos estava imaginando aquela mesma língua em outros lugares em meu corpo?
Me levantei, arrastando a cadeira para trás com a parte de trás das pernas e comecei a recolher os pratos. Depois que os levei até a pia, ciente de que Luke observava cada movimento meu, fui até a geladeira e peguei a garrafa de vinho que abrira na noite passada.
— Espero que tenha tempo de tomar uma taça de vinho comigo. — Falei com expectativa enquanto pegava duas taças grandes do armário.
— Para você, sempre. — Corei instantaneamente, mas me virei e fui até a mesa em silêncio.
— Eu particularmente amo esse vinho. — Falei, parada ao lado dele enquanto removia a rolha e enchia sua taça até a metade.
Luke olhou para a garrafa em minha mão, então leu em voz alta: — Zinfandel Parducci.
Todo o meu corpo esquentou ao ouvir o seu sotaque, sem dúvida, Italiano.
— Então você fala italiano.
Luke levantou o olhar da garrafa e sorriu.
— Nasci na Sicília. — Arregalei os olhos, surpresa.
— Uau, eu sequer imaginei tal coisa. Você fala o inglês americano tão perfeitamente.
— Anos de prática. — Ele levou a taça de vinho aos lábios e tomou um gole do vinho. Engoli em seco, esperando o veredito. — Nada mal.
Exalei tranquilamente e me servi de um pouco de vinho também.
— Bom, fico aliviada. — O sorriso que Luke me deu foi o suficiente para me fazer suspirar.
Tomei um gole, retribuindo a Luke o olhar que ele estava me lançando naquele momento. Desejo cru.
— Você nunca me falou com o que trabalha. — Puxei assunto, porquê sabia que se aquilo, aqueles olhares nos levassem um passo mais a frente, a intimidade, eu não iria conseguir ir até o fim.
— Sou o dono de uma pequena empresa aqui em Manhattan, mas tenho outros negócios em todo o estado de Nova Iorque.
— Uma empresa de quê? — Luke pensou por alguns segundos, o que me intrigou.
— Metais pesados.
— Certo. — Tomei outro gole do meu vinho, olhando atentamente para ele, que ainda tomava o seu vinho. — E esses outros negócios?
— Casas de show, boates, alguns clubes de strip-tease.
Arregalei os olhos, engasgando com o vinho. Luke levantou rapidamente e veio me acudir, depois que as tosses passaram, ele voltou para o seu lugar e ficou me olhando com um olhar sério.
— P-por que você está saindo comigo? — Perguntei, a ideia de ele estar me seduzindo para me colocar em um de seus clubes de strip-tease me aterrorizando.
— Porque estou interessado em você.
Olhei para ele, um pouco perplexa, e ele falou: — Eu não seduzo mulheres para colocá-las em meus clubes, elas vão por vontade própria.
Assenti, tomando o resto do vinho, afim de me acalmar.
Depois de alguns minutos de silêncio, Luke se levantou, o que me fez levantar também, e veio até mim.
— Chegou a minha hora. — Ele segurou a minha mão na dele, e isso fez um choque de eletricidade percorrer o meu corpo. Sua mão era cheia de calos e cicatrizes, e eu pude ver e sentir isso claramente.
Ele levantou a mão até os lábios bem desenhados e depositou um beijo demorado em minha mão, como um homem das antiguidades.
— O almoço estava ótimo, gostaria de retribuir com um jantar em minha casa no sábado à noite. — Sábado, daqui a quatro dias.
— Eu adoraria. — Minha voz saiu baixa, pois era alucinante tê-lo me tocando, mesmo que de forma tão inocente.
— Está marcado então. — Ele deixou outro beijo na minha mão, o que me fez suspirar, e soltou a minha mão, um sorriso preguiçoso tomando os seus lábios. — Mandarei um carro vir buscá-la as 19:00.
— Okay, as 19:00 está ótimo.
— Alô? — Uma voz feminina muito suave atendeu o telefone, o que me deixou sem jeito.
— É, hum. — Eu respirei fundo e continuei. — Simona está?
— Da parte de quem? — a mulher perguntou, sua voz era puro ácido.
— É a Ju...
— Por que tem uma mulher ligando para você? — Arregalei os olhos quando fui interrompida pela mulher que, obviamente, não estava feliz com a situação.
"Que mulher?" ouvi Simona perguntar ao fundo.
— Uma mulher! — a voz da mulher estava com aquele inconfundível tom de decepção.
"Você está paranoica, mulher?", arregalei os olhos, a pior coisa que um homem pode fazer, é chamar, ou insinuar, que uma mulher está paranoica.
— Paranoica?! — Afastei o celular do ouvido com uma careta. — Eu não acredito.
Ouvi sons do outro lado da linha, então a voz de Simona.
"Antonella? O que você está fazendo?", os sons ficaram mais abafados, então ouve um baque, provavelmente do celular caindo no chão.
"Eu estou saindo, Simona, saindo da sua vida."
A voz da mulher estava embargada pelo choro, e isso me fez me sentir extremamente mal por ela.
"Gatinha, eu não estou traindo você, pelo amor de deus! Antonella! Volte aqui!"
"Vá se danar!"
Então ouve barulhos altos de passos e o barulho de uma porta batendo.
"Merda!", exclamou Simona, e logo a linha ficou muda. Mas, como sempre fui curiosa, não desliguei o celular e fiquei esperando.
Logo, o barulho de uma porta abrindo e batendo de novo preencheu os meus ouvidos, seguido de gritos. E eram de Antonella.
"Me solta, Simona!", outro som, dessa vez um abafado, e então um gritinho de Antonella.
"Não." A voz de Simona era um grunhido, e logo pude ouvir um pequeno gemido.
Arregalei os olhos diante daquilo tudo, sabia o que iria acontecer e, por mais que eu quisesse desligar e dar ao casal, que pelo jeito esqueceram do celular, sua devida privacidade, mas não consegui.
"Me solte, não vou permitir que me toque quando sei que está tocando outra mulher!"
"Eu não estou traindo você, diabos mulher, me escuta!"
Se fez alguns segundos de silêncio antes da linha ser preenchida por barulhos estalados de beijo e grunhidos guturais.
Me sentei a uma cadeira a mesa e fiquei apenas escutando, me sentindo a pior das pervertidas. Que tipo de coisa era aquela, Voyeur?
"Simona...", o gemido foi arrastado, e em resposta, ouve um rosnado da parte de Simona.
Franzi o cenho. Então, casais apaixonados quando fazem sexo tendem imitar animais? Ou é apenas o desejo tão grande que lhes tira a capacidade de produzir uma palavra coerente?
"Ah!", o grito de Antonella foi alto, e logo pude ouvir barulhos de pele contra pele, alto, preenchendo meu ouvido.
A essa altura, eu estava vermelha como um pimentão, mas era incapaz de desligar a chamada.
Estava começando a pensar em Luke, em como seria sentir a sua pele contra a minha, o seu toque, o seu beijo, o calor de seu corpo, qual seria a sensação dele me invadindo.
Aquilo que eu estava ouvindo não se parecia em nada com o que eu sofri com Walter, aqueles barulhos não me davam nojo, os pensamentos que eu estava tendo de Luke e eu não me dava nojo. Era diferente, era um casal aparentemente apaixonados se amando, da maneira deles.
Suspirei, se passaram alguns minutos antes que a linha ficasse muda de novo, e então, a voz de Antonella.
"Quem era ela?"
"Eu não sei, você não me deu a chance de ver."
Ouvi alguns barulhos que eu não soube definir exatamente do que eram e logo depois o barulho alto na linha, seguido por um "merda" de Simona.
— Julia? — engoli em seco, mas respondi, morrendo de vergonha.
— Simona.
— Você está aí a quanto tempo? — ouvi passos suaves do outro lado da linha.
— Desde o início. — Resmunguei.
— Me desculpe por isso.
"Julia?", Antonella perguntou ao fundo.
— Liguei para saber notícias de Maggie.
— Maggie continua na mesma, o médico está fazendo alguns procedimentos para fazer a comida parar em seu estômago.
Suspirei pelo nariz, aflita.
— Vou ir vê-la em algumas semanas.
— Você pode ficar aqui.
— Não, eu fico em um hotel, não se incomode. — Olhei para a janela, tentando conter as lágrimas que ameaçavam sair.
— Tudo bem.
E depois disso, eu desliguei e me permiti chorar pelo resto da noite.
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