Capítulo 01
O garoto observava enquanto o caixão descia na cova. Alguém lhe tocava o ombro, mas ele não sabia quem. Era como se tudo ao redor não tivesse importância.
As últimas palavras do pai dele não paravam de ecoar nos ouvidos da criança.
"━ Ele nos arruinou... Não esqueça o que ele nos fez!"
"Não vou esquecer, papai", o menino pensou, as lágrimas escorrendo pelo rosto, enquanto terra era jogada no buraco à frente dele. "Vou me vingar! Crescer e limpar a honra da nossa família!".
O vazio no peito do garoto crescia, dando lugar ao ódio.
*** **** **** ***
━ Je n'ai pas demandé ça, monsieur (Eu não pedi isso, senhor) — Isabel falou, olhando para o garçom e de volta para a xícara de café quente em frente a ela.
━ Le monsieur à la table devant était celui qui envoyait, mademoiselle (O senhor da mesa em frente foi quem enviou à senhorita) — o garçom respondeu, sorrindo gentilmente. Isabel olhou para frente e um homem alto de cabelos castanhos e fios dourados, um pouco mais velho do que ela, com um sorriso de lado, a olhava. Ele já estava se aproximando, segurando ele mesmo uma xícara de café.
Ainda que as roupas do homem fossem mais formais e de tecido elegante, era possível perceber que ele com certeza se exercitava. A pele bronzeada contrastava com os olhos muito azuis. Ou seriam verdes? Para Isabel, eram como o reflexo das águas do mar.
━ Bonjour! Ça te dérange si je te tiens compagnie (Olá! A senhorita se importa se eu lhe fizer companhia?)?
━ Oh, bien, oui (Ah, bom, sim) — o telefone dela vibrou e Isabel quase deixou o aparelho cair, ao se assustar. — Droga!
━ Então a senhorita se importa?
Só então Isabel compreendeu que ela havia respondido errado.
━ Não! Eu quero dizer que não me importo e que sim, o senhor pode se sentar — ela balançou a cabeça de um lado para o outro, sorrindo nervosamente.
O homem sentou-se, depositou a xícara de café dele em cima da mesa e estendeu a mão para ela, a fim de que Isabel fizesse o mesmo.
━ Meu nome é Sebastián Alarcón — ele beijou os dedos dela, galantemente. ━ Ao seu dispor.
━ E eu me chamo Maria Isabel Guillén — ela já respondeu e só então se deu conta de que estava falando em espanhol com ele. — Perdão! Eu falei em espanhol Ouvi seu nome e acabei supondo... Me desculpe!
Sebastián balançou a cabeça.
━ Não precisa se desculpar. Estou respondendo em espanhol, não é mesmo? Eu sou mexicano. E... — Sebastián sorriu de lado, passando a língua pelo lábio inferior. — A senhorita já está falando em espanhol há algum tempo. Não percebeu?
Os olhos de Isabel se arregalaram.
━ Minha nossa, não! Que deselegância! — Isabel levou a mão ao rosto, sorrindo envergonhada. — Eu também sou do México! Isso é realmente uma coincidência!
━ Verdade? — ele soltou uma leve gargalhada e Isabel se derreteu um pouco mais por ele. ━ Deve ser o destino! Nos encontrarmos em plena Paris!
Ela concordou com a cabeça.
━ Muito provavelmente.
Após alguns minutos de conversa, eles descobriram que compartilhavam de alguns pontos em comum: eram filhos únicos de famílias empresárias — enquanto a dela era voltada para a indústria têxtil, a dele mexia com vinhos — estudaram o mesmo curso e, claro, a paixão pelo café.
━ Foi uma jogada de sorte enviar o café para a senhorita, afinal de contas, algumas pessoas não gostam dessa bebida dos deuses — Sebastián comentou, olhando para a xícara, agora vazia, dela.
━ Devem ser loucas! Eu não consigo viver sem café!
━ Digo o mesmo.
Isabel sentiu o celular vibrar novamente e era uma mensagem da mãe dela.
━ Senhor Alarcón, foi um prazer conhecê-lo. Agora, eu preciso ir — ela fez sinal para o garçom se aproximar, a fim de pedir que fechasse a conta.
━ Não, por favor, permita-me.
━ Não, eu insisto — ela não gostava que estranhos, por mais bonitos e charmosos que fossem, pagassem qualquer coisa para ela. Sebastián levantou as mãos em rendição e permitiu que ela efetuasse o pagamento dela, depois, ele pagou a parte que lhe competia.
━ Posso ter o seu contato telefônico?
Isabel mordeu o lábio inferior, pensando. Após alguns segundos, ela concordou com a cabeça, permitindo que ele lesse o QR code do celular dela.
━ Nos veremos em algum outro momento — ela disse, já começando a se afastar.
━ Podemos jantar hoje? Se não for inconveniente, claro.
━ Nos falaremos por celular e eu lhe digo se poderemos ou não. Até mais!
Isabel se afastou e ele permaneceu em pé, com as mãos dentro dos bolsos da calça com um sorriso estranho nos lábios.
"Essa mulher é mais bonita ainda, ao vivo. Além de ingênua!", ele pensou e suspirou, satisfeito. "Vai ser mais fácil do que eu imaginei."
Ela chegou ao hotel ainda sorridente e pensando no charmoso estranho. Isabel nunca havia viajado sozinha e, quando finalmente o fez, foi para Paris, a cidade que ela sonhava em conhecer desde que leu Os Miseráveis, de Victor Hugo, quando no início da adolescência.
Antes que Sebastián Alarcón se aproximasse dela, Isabel já havia percebido o homem, e, inclusive, havia comentado por mensagem com a amiga, Noelia. Porém, a mãe, Vega, já estava quase ligando, exigindo que Isabel lhe respondesse.
Como boa romântica que era, Maria Isabel sonhava com o famoso cavaleiro vestido de armadura brilhante, em cima do cavalo branco, para fazê-la viver um grande amor. Isso não aconteceu durante o Ensino Médio, nem durante a faculdade, menos ainda na especialização acadêmica. Porém, algo dentro de Isabel lhe dizia que sua vida estava para mudar após o encontro com o charmoso Sebastián.
— Mas não é por isso que eu vou cair de amores por ele, assim, de cara. Foco, Bel! A vida não é um conto de fadas e os Príncipes Encantados não ficam por aí dando sopa!
Isabel mandou mensagem à mãe e, após tomar banho, as duas iniciaram uma chamada de vídeo.
— Meu amor, você está linda! — Vega falou em tom carinhoso e orgulhoso. — Me diga, como está sendo a sua viagem? Conheceu algum belo francês que lhe arrancou suspiros?
— Hmm, não. Conheci um mexicano!
Isabel contou tudo à mãe, inclusive sobre a proposta do jantar.
— Vá, meu amor. O que custa? Basta não aceitar nenhuma bebida dele e ficar num local público sempre — Vega olhou sonhadora para a filha. — Pode ser mesmo coisa do destino e esse é o homem certo!
— Será, mãe? Já estou desacreditada — ela fez um beicinho.
— Deixe de drama, Isabel! — Apenas a mãe a chamava assim. Todos a conheciam como Bel.
Isabel riu.
— Bom, ele pegou o meu número. Vamos ver se o senhor Alarcón vai me ligar.
Vega sorriu, satisfeita.
— Vai, sim. Agora — ela olhou para o lado. — eu preciso ir, meu amor. Até mais! Aproveite, cuide-se e me conte tudo depois! Beijos, beijos!
Vega, como sempre, não esperou que Isabel se despedisse e encerrou a ligação. A moça se jogou na cama, sorrindo e olhando para o teto.
— Será que ele vai falar comigo? — como se lesse a mente dela, o telefone de Isabel vibrou e era um número estranho enviando mensagem.
NÚMERO DESCONHECIDO: Oi! Aqui é o Sebastián!
Isabel mordeu o lábio e olhou a foto. Ele não estava ali, mas apenas um lindo pôr-do-sol.
ISABEL: Oi, Sebastián! Já salvei seu número!
SEBASTIÁN: E então... Pensou sobre o jantar?
ISABEL: Se puder ser aqui no meu hotel, está aceito o convite!
O coração dela batia loucamente.
SEBASTIÁN: Claro que pode! Oito horas está bom? Me passa o endereço, por favor.
Após confirmar, Isabel deu um pulo da cama. Ela precisava de um vestido!
Foram três horas à procura de um, até que finalmente, Isabel o encontrou: preto, com um corte simples, que beijava suas curvas de maneira sexy, mas não vulgar. As sandálias de salto, pretas, complementavam o look.
Isabel olhou as duas opções de batom que ela tinha. Aquele era um detalhe que ela havia esquecido completamente: a maquiagem! No fim, escolheu o vermelho mais alaranjado e se olhou no espelho. Os olhos verdes estavam com um pouco de sombra marrom e um delineado fino na pálpebra superior. Os cílios com bastante máscara, sem empelotar, como ela amava.
Às oito, ela já estava na entrada do restaurante do hotel. Segundo Sebastián, ele já estava à mesa e ela só precisaria avisar ao recepcionista.
Cada passo lhe fazia sentir o coração na boca. Isabel foi levada até uma mesa ao fundo do restaurante e lá estava ele, levantando-se, sorrindo para ela. A blusa azulada, por baixo do paletó moderno aberto, lhe conferiam um ar jovial e sedutor, realçando a cor dos olhos dele.
— Você está merveilleux (belíssima)! — Sebastián tomou a mão de Isabel e a beijou ali, sem quebrar o contato visual com a loira. — Eu creio que posso afirmar que nunca conheci uma mulher mais bonita do que você, Isabel.
Ela corou e passou a língua pelos lábios. Isabel gostou que ele não a abraçou ou tentou beijar-lhe o rosto de forma muito íntima. Até aquele momento, ele estava sendo extremamente educado e agradável.
— Pode me chamar de Bel — ele a olhou sem entender. — É como todos me chamam. De IsaBEL.
— Para mim, de bela.
Sebastián puxou a cadeira para que Isabel se sentasse e depois ocupou a cadeira em frente a ela.
Eles fizeram o pedido e começaram a conversar. Isabel falou um pouco sobre o que ela fazia da vida e, então, perguntou a ele sobre o trabalho que exercia.
Sebastián estava acostumado a que as mulheres perdessem o interesse logo, afinal, não era o que lhes interessava, de fato. O trabalho. E, quando deu por si, já estava há quase uma hora falando.
— Isabel, digo, Bel, me desculpe! — ele sorriu envergonhado. — Estou aqui a falar como uma vitrola sem controle!
— Não tem problema algum! — Isabel sorriu e bebeu um gole do vinho dela. — Eu adoro vinho e posso ver como você é apaixonado pelo que faz. É muito bom te ouvir falando.
Sebastián piscou algumas vezes, maravilhado. Ele pensou que Maria Isabel Guillén não passava de uma garota mimada e que era mais uma das que se formavam apenas para exibir um diploma, sem exercer ou ao menos gostar do ofício.
Por mais que não quisesse admitir, Sebastián admirou aquilo em Isabel. E em nenhum momento ela tentou cortá-lo e falar sobre ela mesma.
— Sim, eu amo o que faço. Meu bisavô fundou a nossa empresa, bem familiar, e ela prosperou. Porém, há alguns anos, houve um momento mais difícil e as coisas desandaram — o rosto dele escureceu um pouco e, ao notar que o seu humor estava amargando, Sebastián bebeu um gole do vinho. — Assim que pude assumir os negócios, me dediquei a que voltássemos ao nosso lugar. Eu não podia deixar que o Viñedo Alarcón fosse esquecido.
Em mais alguns minutos, eles pediram a conta e Sebastián a acompanhou até o elevador. Isabel estava nervosa, pois ela sabia muito bem que alguns homens estariam esperando ser convidados para o quarto da mulher, após um jantar.
— Bel... — Sebastián começou a falar, num sussurro.
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