39 - Narcisista
Enzo estava inconformado com todas as informações que havia recebido. Não conseguia digerir o fato de ter sido traído covardemente pelo seu irmão, justamente aquele com quem dividiu o útero. Esperaria qualquer coisa de Luna, afinal, ela estava revoltada com o par de chifres que havia ganhado, mas ele? Não entrava em sua cabeça.
Voltou à casa de praia transtornado e deu de cara justamente com a última pessoa que gostaria naquele momento: sua mãe, Dona Flávia, a defensora do casamento planejado. Assim que passou pela entrada e seguiu até a sala, avistou a mulher lendo as últimas notícias da região pelo celular. Ao notar a presença do filho, ela levanta o olhar e balança a cabeça negativamente.
— Não imagina a surpresa negativa que tive ao descobrir que nossa família virou alvo dos tabloides assim que acordei. Sinceramente, Enzo. Você e seu irmão estão me saindo muito melhor que a encomenda. — Declara desgostosa.
O rapaz massageou as pálpebras e encarou a mãe de maneira incisiva. Estava cansado dessas cobranças sem sentido. Está certo que Samantha que começou com toda a confusão ao fingir que estava grávida, mas seu plano não teria chegado tão longe se Dona Flávia não o obrigasse a noivar com aquela psicopata. Enzo tinha plena consciência de que possui sua parcela de culpa nessa confusão, mas trata-se de sua vida, ele tem as próprias escolhas. Se ela não tivesse se metido, o caminho trilhado com certeza teria sido diferente.
Estava saturado, a verdade é essa. Sem contar que Dona Flávia decidiu incomodá-lo em um dos piores momentos de sua vida, afinal, a mágoa pelo que o irmão fez estava preenchendo todo o seu coração. Está aí mais uma coisa que Enzo culpa sua mãe: a necessidade de Caio mostrar que é capaz de estar ao lado de alguém advém de suas cobranças ilógicas. O rapaz tem um sonho e é muito talentoso. Talvez se recebesse um pingo de apoio familiar, já teria conquistado parte de seus objetivos.
— Quer saber, Dona Flávia? — Ele encara a mãe com ódio no olhar. Já ela fita-o de volta, como se estivesse ansiosa para saber o que viria a seguir. — Você não passa de uma narcisista barata, que não conquistou nada de interessante na vida e espelha todo esse fracasso em mim e no Caio, achando que somos obrigados a realizar seu sonho de constituir uma família perfeita e ter um emprego perfeito.
Enzo se aproxima da mãe, que encontra-se totalmente chocada com o que acabou de ouvir. Ela sequer conseguiu rebater de imediato, coisa que, em outras circunstâncias, teria feito automaticamente. O Valentine mais velho cruza os braços e continua seu monólogo, que estava mais parecendo para um desabafo sobre os anos que ele e o irmão viveram tendo que aguentar essa relação abusiva com a mãe.
— Lamento lhe dizer, mas filhos não são espelhos. Nós crescemos e vivemos nossas próprias vidas e sonhos. E se essa merda de família perfeita que a senhora construiu falsamente para a mídia e amigos do meu pai foi parar no jornal por conta de uma tentativa de golpe da barriga, é porque não consegue lidar com nossas escolhas, que estão muito distantes das suas. — Esbraveja e passa a mão nos cabelos loiros desgrenhados. — Olhe o exemplo do Caio! Ele é talentoso, poderia estar em um time grande se recebesse seu apoio! Mas não, simplesmente optou por foder a mente dele.
Dona Flávia finalmente reage diante de todas as acusações que lhe foram feitas e levanta em um pulo, parando em frente ao filho.
— Como ousa falar assim comigo, Enzo Valentine? — Questiona em tom de revolta. Suas bochechas ficam vermelhas e é possível notar os olhos marejados. As palavras do filho realmente conseguiram lhe atingir. — Se você e seu irmão estão prestes a se formar em um curso superior, é porque eu e seu pai investimos nisso. É errado desejar o melhor para os meus filhos, as duas pessoas que mais amo no mundo e gerei dentro do meu ventre?
— A senhora tem uma visão muito distorcida de amor, Dona Flávia. — Enzo fala enquanto balança a cabeça negativamente. Neste momento, Maurício chega. — Amar não é impor. Amar é respeitar e apoiar. Quantas vezes declarei que não queria me casar com aquela vadia maluca? Ela simplesmente fingiu a gestação por três meses e ficou tentando me seduzir para engravidá-la. E quase conseguiu, graças a quem? A senhora, que me fez morar debaixo do mesmo teto que ela, dividir a mesma cama e o caralho.
— Não fale assim com a sua mãe, Enzo. — Meu pai se pronuncia. — Se ela errou, foi tentando acertar.
— Sério mesmo, pai? Sério que mais uma vez vai defender a insanidade dessa narcisista? Não vê que ela age da mesma forma com o senhor? — Enzo se dirige ao pai. — Qual foi a última vez que se divertiu tanto com ela como se divertiu ao lado de seus amigos nestas últimas noites? Nunca, não é? Isso porque ela não faz questão de te alegrar, pelo contrário, só pensa em manter a fama de família perfeita e usar seu dinheiro para isso. As vontades dela que são importantes, foda-se o resto.
Maurício engole em seco e encara a esposa, que encara o filho com feição de nojo, apesar dos olhos marejados. Agora, quem chega à casa são Lina e Cora, que também estão transtornadas com tudo o que aconteceu anteriormente.
— Você não tem o direito de falar comigo assim, Enzo Valentine. Não admito que me desrespeite dessa forma dentro da minha casa. — Dona Flávia rebate todas as acusações e aponta o dedo indicador para o filho. — A verdade é que você e o seu irmão são dois ingratos e nunca mereceram nada do que têm. Quero que junte suas coisas e vá embora daqui A-GO-RA. — Ordena incisiva, fazendo com que Enzo, Cora e Lina arregalassem os olhos.
— Negativo, Flávia. — Maurício se pronuncia. — Peguei a discussão pela metade, mas para Enzo estar dizendo essas coisas é porque tem um motivo muito plausível. Dos dois, ele sempre foi o que mais te obedeceu e fez suas vontades. — Declara. — Se alguém precisa sair dessa casa, esse alguém é você.
Dona Flávia arregala os olhos, incrédula, e dirige o olhar para o marido.
— Você ouviu o que acabou de sair da sua boca, Maurício?! Está me mandando embora? Pois saiba que se eu for, não volto mais. E você nunca vai encontrar alguém como eu, uma mulher posturada, que faz de tudo para que essa família fique bem. — Afirma, fazendo com que o homem desse uma risada de escárnio.
— Posturada? Tudo para que essa família fique bem? Não percebeu que todos os barracos que aconteceram nessa casa e nas últimas semanas foram provocados por sua causa? — Maurício declara. — Pelo amor de Deus, vá, saia daqui e reflita sobre suas escolhas. Se não quiser voltar, azar o seu. Caso contrário, estarei disposto a conversar sobre tudo isso.
Assim que Maurício conclui sua fala, Dona Flávia se dirige ao quarto, fazendo questão de bater os pés a cada degrau que subia. Assim que a mulher está distante o suficiente, o Valentine pai encara o trio na sala e questiona.
— Vocês precisam me explicar detalhadamente o que está acontecendo. Espero não ter comprado uma briga da qual na qual os vilões, na verdade, são Enzo e Caio. — Maurício declara.
— É melhor o senhor sentar. A história é longa. — Lina responde pelo rapaz ao seu lado. Em seguida, todos se acomodam na sala e a história começa a ser explicada, detalhadamente, ao mais velho, que escuta tudo atenta e silenciosamente.
Assim que eles terminam, Maurício se pronuncia.
— Quer uma opinião sincera, meu filho? De quem ama você e seu irmão mais que tudo nessa vida? — Ele pergunta, mas não espera resposta alguma. — Assim como você, seu irmão é vítima dessa situação. Caio mesmo disse que sempre foi afim de Luna, não é? Entendo que esteja magoado pela "traição", mas isso seria inevitável. Luna estava obstinada e ele, de qualquer forma, jamais resistiria, afinal, esse sentimento já existia. — Maurício explica enquanto Enzo o encara atentamente. — E sabemos como ela é caótica, tenho certeza que iria até o inferno para conseguir o que quer.
— Isso não muda o fato de estar me sentindo traído. Tudo isso foi muito pesado, pai. É muita coisa para digerir. — Enzo explica enquanto algumas lágrimas escorrem por seu rosto.
— Oh, querido. — Maurício levanta e faz sinal para que o filho faça o mesmo. Assim que Enzo levanta, ele o abraça. — Não estou pedindo para perdoá-lo agora, mas que sim limpe sua mente dessas coisas e viva o agora. Caio terá que lidar com muitas coisas agora, não quero que ser odiado pelo irmão gêmeo seja uma delas.
— Eu vou pensar sobre isso. — Enzo declara e retribui o abraço. — E obrigado por me defender.
Maurício acaricia os cabelos desgrenhados do filho. As coisas estavam difíceis demais para os gêmeos Valentine, o mínimo que poderia fazer pela prole era apoiá-los e trilhar um perdão mútuo.
Teria feito o mesmo com Caio, mas, ao adentrar o cômodo em que o mesmo estava utilizando, viu que seus pertences haviam sido retirados. Em algum momento o rapaz foi até lá e recolheu tudo. A conversa com o mais novo teria que ficar para depois, apenas torcia para que o mesmo não se envolvesse em nenhuma merda enquanto isso.
Ademais, ficou feliz por ter conseguido tranquilizar Enzo. Por fim, passaram o resto do dia conversando sobre tudo. Por sorte, Maurício é um homem calmo e conseguiu passar essa energia para todos ali.
Já Dona Flávia, conforme ordenado pelo marido, pegou suas coisas e foi embora, sabe-se lá para onde. Maurício torcia para que ela colocasse a cabeça no lugar e entendesse que estava errada. Era o que restava.
Nota da autora
Não passou por correção, peço desculpas por possíveis erros ortográficos.
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