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Rachaduras no espelho

Rachaduras no espelho

Pricila Elspeth

Aviso de gatilho: tentativa de suicídio, pensamentos suicídas.

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Raquel adentou ao banheiro coxeando e fechou a porta logo atrás de si. Caminhou devagar com seus passos mancos até o lavatório, apoiou sobre a borda de louça fria uma das mãos, a outra, que segurava um bisturi que pegara das coisas do pai, apoiou sobre a torneira e acionou-a.

Seus olhos castanhos escuros fitaram o espelho manchado e ela encarou a menina maltratada, indefesa e assustada refletida na superfície prateada. Sentiu o coração disparar, a respiração ficar pesada e o suor frio escorrer da testa e das axilas. Engoliu em seco e olhou para a prótese metálica que substituía sua perna direita, perdida num acidente de carro ainda na infância e sentiu os olhos queimarem e umedecerem em seguida.

Ás lágrimas quentes escorriam pela face gélida e pingavam na porcelana branca manchada de amarelo. Ela colocou o bisturi sobre o pulso esquerdo e fechou os olhos.

Seus pensamentos mórbidos e conflitantes circulavam sua mente trazendo-lhe os conceitos de liberdade, sofrimento, paz, angústia e dor. Ela via nuvens azuis e roxas girarem ao seu redor e se fundirem num turbilhão de pensamentos há muito esquecidos e oprimidos.

Raquel não estava mais no banheiro, estava na escola, ainda aprendendo a se equilibrar com a nova perna artificial, sendo caçoada pelos colegas e objeto de pena dos professores. Muitos lhe diziam que ela era bonita e não precisava se importar com aquilo, como se a beleza fosse a única característica que possuísse. Ela olhava ao redor e via olhos julgadores sobre seu semblante, ouvia murmúrios e cochichos sobre sua depreciável situação, como se ela fosse digna de pena.

Em seu quarto todas as noites ela encharcava o travesseiro com lágrimas salgadas e pesadas. Sentia ódio da prótese, detestava tecnologias de condução automática e sobretudo, execrava sua própria pessoa, quebrada, defeituosa, imperfeita, feia, inútil e incapaz... Adjetivos esses, sempre citados por outras bocas, mas coletados por sua mente.

Todo dia a dor e o incomodo crescia de maneiras insuportáveis e inimagináveis. Por incontáveis vezes ela pensou em atirar a prótese pela janela de seu quarto, mas sempre detinha-se quando pensava que uma perna artificial era menos humilhante que perna alguma. As zombarias na escola seriam infernalmente insuportáveis.

A pequena Raquel aos poucos esqueceu-se de como sorrir, mas aprimorou-se em como chorar e depois, como sofrer calada. O pai não era alguém que compreendesse seus sentimentos, apesar de ser um excelente cirurgião, não pudera salvar a perna da filha e esse fato não parecia lhe ferir a alma, aos poucos ele passou a se acostumar com a filha usando prótese, ela não. Jorge era um entusiasta e apostava tudo num clone de perna que ele e uma equipe planejavam fazer. No entanto, a teoria se mostrava mais palpável que a prática, depois da décima sexta tentativa Raquel desistiu, ele não.

A mãe lecionava engenharia de fusão na academia aeroespacial e tudo o que estava ao seu alcance tecnológico foi disponibilizado para a menina, mas ela não parecia feliz. Todas as próteses que construía para a filha pareciam estranhas e falhas quando conectadas ao corpo da mesma, talvez o problema não fosse de rejeição física, mas mental. Porém, Raquel se recusava a falar sobre o assunto. Com o passar do tempo, falar foi algo que Raquel passou a evitar.

Enquanto adolescentes de sua idade viajavam pelo mundo para concluir suas atividades extracurriculares, Raquel se trancava em seu escuro e silencioso quarto, com suas mágoas, angústias e dores. Os outros adolescentes desenvolviam habilidades de socialização, Raquel alimentava seu ódio por tecnologia e aversão pela socialização.

A situação ficou ainda mais complexa quando todos os alunos do colégio conseguiram um par para dançar no dia da formatura, exceto ela. A primeira tentativa de suicídio foi com medicamentos furtados da mala do pai; acordou do coma três semanas depois e teve de frequentar sessões de terapia por dois longos anos, e por mais que tentasse, a psicóloga não conseguia fazê-la falar sobre seus sentimentos, por fim, a garota abandonou as sessões.

O pai mudou drasticamente após a tentativa de suicídio. A tratava com desdém, sempre com rancor e a mantinha sob vigilância o quanto podia. Dizia a ela que enquanto ele tentava ela desistia, a chamava de covarde, de egoísta e fraca. Ao contrário do que imaginava, isso não a ajudava.

Jorge e Francisca combinaram que seria melhor para todos se ele arrumasse um estágio para ela no hospital onde ele trabalhava. E assim foi feito, com muito custo ela aceitou deixar as dependências trevosas e caóticas, porém, seguras, de seu quarto.

Seis meses de convivência com todas aquelas pessoas felizes e perfeitas foi o suficiente para minar toda a autoestima que havia construído com muito pesar e então, veio a segunda tentativa. Ela regulou os aparelhos médicos enquanto estava sozinha e se eletrocutou após injetar no corpo uma dose alta de morfina. Acordou semanas depois.

Apesar de tratarem-na bem, ela se recusava a falar, e não pensava mais em continuar vivendo. Um insistente enfermeiro a visitava regularmente e conversava com ela sobre assuntos aleatórios, mas ela nunca respondia. Ele dizia que as pessoas como ela podiam se curar, podiam ter uma vida normal, bastava permitir que outras pessoas entrassem em suas vidas e em seus corações. Todos os dias ele trazia doces, flores, vídeos engraçados, mas nada surtia efeito, porém um dia, quando ele entrou no quarto vestido de flamingo e segurando um iguana nos braços como se fosse um bebê, ela sorriu lentamente, e aos poucos a emoção tomou conta de seu coração e como fogo sobre a palha, alastrou-se e ela explodiu em gargalhadas.

Ao sair do hospital Raquel foi procurada por Sandro e este a convidou inúmeras vezes para sair, até que um dia ela aceitou devida a tanta insistência. O primeiro encontro foi morno como o previsto, o décimo também. Um ano depois, o rapaz visitou sua casa com uma proposta inusitada. Queria que Raquel fosse morar com ele num apartamento no centro da cidade. O pai aprovou de imediato, a mãe não demonstrava insatisfação, mas também não expressava felicidade. Pesando todas as consequências e apresentando vários argumentos, Jorge convenceu afilha de que era o melhor para ela.

Quatro meses se passaram e cada dia era menos intenso que o anterior. Sandro não apresentava a mesma alegria em estar ao lado da moça, cada vez menos suas piadas e histórias engraçadas se faziam presentes na mesa do café, a frequência com que não voltava para casa aumentava gradativamente e Raquel sabia que não havia meio de reverter aquilo.

Sandro passou de cavalheiro engraçado a rabugento mandão. Sempre fora de casa, atarefado, e indisponível. A distância entre eles crescia a cada dia, e esse foi um fato determinante para que começassem as agressões, físicas, psicológicas e morais. O rapaz impunha regras para Raquel, e toda vez que ela não as seguia, ele a humilhava com palavras duras e afiadas como facas, sempre evidenciava o fato de ela usar uma prótese e associava isso ao fato do relacionamento estar afundando, ele dizia que ela era infeliz e não lutava pela felicidade deles, as poucas vezes que ela tentou enfrenta-lo em seus momentos de fúria, fora ferida fisicamente.

Raquel visitou os pais e pediu para voltar para casa, mas o pai recusou seu pedido. Dizia que deveria vivem com o esposo, e que ele era a única pessoa que a aceitaria daquele jeito e por isso deveria ser grata e trata-lo como a um príncipe.

Cabisbaixa Raquel voltava para casa, com lágrimas escorrendo pelo rosto, a pele arrepiada por conta do frio e pensando no seu príncipe e no modo como ele a tratava, e consequentemente se questionava se aquela era a vida ideal de uma princesa. A resposta era sempre "não".

Ela parou numa esquina e ficou a observar o caótico transito aéreo da capital, seus pensamentos incertos não a permitiam construir reflexões coerentes, e os ossos da face tilintando por conta do frio a impediam de se concentrar. Ela percebeu uma porta abrir a poucos metros e um burburinho chegou aos seus ouvidos, já imaginava o tipo de coisa que estariam comentando. Mas dessa vez ela havia errado, as pessoas a chamaram para entrar e se aquecer. Sem acreditar no que ouvia ela os encarou e então percebeu que o rapaz possuía um braço só e a garota era cega. Ela aceitou o convite e entrou.

No salão muitas pessoas sentavam-se em círculo e enquanto se protegiam do frio, conversavam sobre suas experiências e suas dificuldades em conviver com as pessoas sem nenhuma diversidade funcional. Ali, pela primeira vez, Raquel sentiu-se acolhida e entre iguais. Apesar de não dizer nada, ouviu muito.

Seguindo orientações do grupo ela passou a pesquisar esportes e atividades desenvolvidas por e para pessoas com diversidades funcionais, e encontrou sua paixão na neurocondução de carros de corrida. Passou a estudar sobre o assunto e frequentar, durante os longos períodos de afastamento de seu esposo, clubes e escolas de neurocondução. Além de divertir-se, percebia sua habilidade em incrível ascensão.

Quando Sandro descobriu a agrediu de forma brutal e impiedosa, mas os socos doeram menos que a revelação que lhe fizera. Toda sua vida com ele era uma mera fraude, ele fora pago por seu pai para conquista-la e casar com ela. Não acreditando em suas palavras, esperou que dormisse e procurou em seus arquivos bancários, e lá estava, depósitos constantes de seu pai para seu esposo, a quantia era sempre alta... Ela mal pode acreditar.

Visitou seu pai para confrontá-lo e ele não negou. Disse que ainda estava tentando criar um clone de perna para ela, pois, assim poderia se livrar dessa dívida fixa e ela poderia encontrar um homem que pudesse amá-la de verdade. Raquel resgatou sua habilidade de frieza e permaneceu implacável diante do pai, quando teve a menor chance, surrupiou de sua bolsa um bisturi e escondeu no bolso. Voltou para casa cabisbaixa, como era esperado Sandro não estava. Os pensamentos giraram em sua cabeça, ela não conseguia equilibrar as emoções e os sentimentos, tudo convergia para um escuro, frio e solitário ponto no meio do caos. Ela caminhou até o banheiro e fechou a porta.

O furacão de pensamentos e emoções a engoliu por inteiro. Ela se viu no pátio do colégio sendo caçoada pelas outras crianças, viu-se isolada e solitária em seu quarto por anos, viu-se fraca e impotente tentando acabar com sua vida, e falhando miseravelmente. Diziam que da terceira vez não passa, e ela esperava mesmo que fosse assim.

Abriu os olhos e pressionou devagar a lâmina contra o pulso. Sentiu uma leve fisgada como da primeira vez que neuropilotou um carro de corrida. Seu peito inflou-se e sua boca soltou o ar junto com um suspiro. A adrenalina correu por suas veias, a sensação de velocidade era libertadora, suas habilidades na competição haviam melhorado muito, e ela quase havia esquecido o quanto se sentia bem enquanto estava treinando e competindo de forma amistosa. Afastou o bisturi do pulso e observou a maquiagem preta borrada em sua face. A menina indefesa refletida no espelho havia desaparecido, ela via uma moça forte, decidida, habilidosa e que acabara de descobrir o amor próprio. Largou o objeto metálico sobre a pia e caminhou para a cozinha, sorrindo, cantarolando e não mais coxeando.

Quando Sandro chegou em casa encontrou a mesa posta e um bilhete sobre a mesa, "Adeus!" era o que dizia o pequeno pedaço de papel dobrado em V.

Jorge e Francisca perderam o contato com sua filha por muitos anos, só voltaram a saber de sua existência quatro anos depois, quando ela, a princesa da velocidade, conquistou a taça do torneio mundial de neurocondução e apareceu em todos os noticiários contando sua história e sendo elogiada por quebrar todos os recordes.

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Olá pessoal, como vão?

Contem-me o que estão achando dos contos.

Deixem votos e comentários para salvar os unicórnios dos maus tratos.

Beijos da Pri ^^

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