Capítulo 3
Quando pediu por um pouco de emoção na vida, Diana não imaginava que viria na forma de um telefonema aborrecedor.
— Preciso de um mecânico. Meu carro morreu na estrada. — Foi a voz imperiosa e arrogante no outro lado da linha.
— Pode trazê-lo aqui para darmos uma olhada.
— Você não me ouviu? Acabei de dizer que ele morreu.
— Sim. Ouvi, senhor — respondeu com calma na voz, embora por dentro estivesse fervendo de raiva com aquela grosseria.
— Então? O que vai fazer a respeito? — ele indagou com insolência.
— Nada.
— Nada?! Está brincando comigo, mocinha?
Detestava quando a chamavam de "mocinha". Fazia-a parecer ingênua e imatura, como se não soubesse das coisas.
— Não posso fazer nada se seu carro não estiver aqui. Infelizmente não temos serviço de guincho, mas, se quiser, posso lhe passar o contato de um.
Resmungos impróprios soaram na linha antes de o homem ceder e finalmente aceitar o contato.
— Estaremos ao seu aguardo. Obrigada pela preferência. — Em seguida, Diana bateu o telefone. — Idiota! — exclamou.
— Não eu, espero.
Dirigiu o olhar para a porta semiaberta escondendo metade do corpo de Miguel.
— Não você, Miguel... Claro que não! Desculpe meu temperamento. É que acabei de receber uma ligação de um cliente mal-educado.
— Tem pessoas que ficam tão estressadas quando o carro quebra, não é?
— Esse daí parecia desesperado. O carro deu pane na estrada. Se o homem ainda tinha sinal no celular para ligar para a oficina, então calculo que deve estar próximo à entrada da cidade. — Gesticulou para o senhor se aproximar. — Está precisando falar comigo?
Miguel entrou e fechou a porta.
— Vim lembrá-la de encomendar o catalisador do carro de Guilherme.
— Verdade. Tinha me esquecido. — Já puxava o bloco de notas e uma caneta para registrar o afazer. — Obrigada, Miguel.
A testa dele vincou-se de preocupação ao deparar com a bagunça de papéis espalhados sobre a mesa de Diana. Seu ímpeto era oferecer-lhe ajuda... mas como? Se assuntos administrativos estavam além da sua área de domínio.
— Eu já teria ficado louco com essa montanha de papéis.
— Isso foi para me animar? — Ergueu a sobrancelha, olhando-o divertida.
Percebendo ter se expressado mal, ele sorriu de sua gafe. Aquele segundo de distração foi o que bastou para notar o boné enfiado na cabeça de Diana, cobrindo-lhe os cabelos. Ela não o tirara desde que pisou na oficina.
— Qual o motivo do boné? Fabrício andou exercendo influência em você?
Diana sorriu, lembrando-se do estilo "meninão" de Fabrício. Em geral ele sempre estava com um boné na cabeça, virado para trás, mesmo no trabalho.
— Longa história — ela comentou, suspirando, e colocou na mesa a caneta sobre o bloco de notas.
— Faça um resumo.
Diana refletiu, constrangida, sobre o acontecido no fim da tarde anterior. Havia passado na loja de um fornecedor para buscar peças de carro, quando, em um poderoso impulso por mudanças, resolveu fazer uma loucura.
— Ontem fui ao salão de beleza e cometi o erro de dizer ao cabeleireiro que queria inovar fazendo algo diferente em meu cabelo.
Miguel a escutava, atento.
— Não gostou do novo corte?
— Eu não o cortei. Já havia cortado na semana passada.
Curioso, reparou de novo no boné enterrado na cabeça dela até as orelhas.
— Bem, se não é o corte, então o que é?
Não poderia esconder por muito tempo, ela pensou. Por isso, sem dizer nada, levou os dedos até a aba e removeu a cobertura da cabeça.
Mechas da cor de fogo escorregaram por seus ombros, em franco contraste com a pele pálida. A cor era tão intensa e vibrante que Miguel teve de piscar os olhos, a visão ofuscada por alguns segundos.
Chocado com a mudança radical, ele não soube o que dizer.
— O resultado foi esta calamidade — ela falou por ele. Estivera tão perplexa quanto o amigo. Quando o serelepe cabeleireiro girou-a na cadeira para mostrar-lhe sua obra de arte, quase teve um ataque com o que viu refletido no espelho. — Eu sei, está horroroso.
— Não é verdade — opôs-se, depois de refeito do choque.
— Só está dizendo isso porque gosta de mim. Vai negar?
— Olhe, eu... não entendo muito de cabelo feminino... mas...
— Pareço a tocha olímpica — interrompeu-o, lamentosa.
— Quem disse?
— Pessoas com mais experiência em estética do que eu.
Sua madrasta, para ser mais específica. Considerava Elisa uma referência de beleza. Não se recordava de um dia ter topado com a mulher e não tê-la encontrado impecavelmente arrumada e maquiada. Mesmo em casa, Elisa cuidava do visual com rigorosa disciplina. Diana admirava esta qualidade nela.
Assim que viu a filha postiça, como Miguel, também ficou de boca aberta. Mas o risinho inconveniente que deixou escapar foi o suficiente para fazer o mal-estar e o arrependimento crescerem no coração de Diana, dando-lhe a certeza de ter cometido uma falta grave com sua aparência.
Afundou na cadeira do escritório. Não era a primeira vez que sua inexperiência em "coisas de mulher" deixava-a na mão.
Na quarta série, quando mudou de escola e teve problemas para se enturmar, achou que se fosse tão elegante e graciosa quanto Elisa, as garotas não a evitariam como se tivesse uma doença venérea. O desfecho de tentar imitar a madrasta, utilizando sua maquiagem às escondidas, foi sua chegada triunfal na sala de aula aquele dia: o batom rosa borrado até as bochechas; a sombra azul aplicada em exagero nas pálpebras; e, para fechar com chave de ouro, o lápis preto pintado em todo o contorno externo dos olhos, como se houvesse desenhado um óculos no rosto, só que sem a ponte e as hastes.
A turma explodiu em risadas e Diana ficou à beira do choro. Lembrava-se da professora ter corrido em sua direção para levá-la ao banheiro, onde ajudou-a a tirar a maquiagem e deu uma palestra sobre não precisar mudar quem era para ser aceita.
— O cabeleireiro disse que terei de deixar assim por uns três ou quatro dias, talvez até uma semana, antes de pintar novamente, se eu não quiser que meu cabelo fique bastante danificado e caia. Maravilha, não? — ela ironizou.
Enquanto a estudava, Miguel coçou o queixo.
— Tomei um susto quando vi, é verdade. Mas porque não esperava isso de você. — Mais uma vez, mirou as mechas afogueadas. — Depois de olhar por um tempo, a gente até que se acostuma...
— Não tente me consolar. — Reuniu os cabelos em um coque no alto e, apanhando o boné, tornou a enfiá-lo na cabeça. — Usarei isto até resolver o problema — afirmou, decidida.
— Está exagerando, menina.
— Não quero espantar os clientes — justificou-se, acrescentando em seguida, com um encolher de ombros: — Além do mais, ainda não me acostumei...
Ele saiu da sala sacudindo a cabeça. Conhecia Miguel há tempo demais para saber o que aquilo significava.
Não era porque eram amigos e colegas de trabalho que não discordavam. A extensa diferença de idade entre os dois também nunca os impediu de brigar, fosse por coisas sérias ou bobas. Era uma amizade como qualquer outra.
Após discar para o fornecedor e encomendar o catalisador de Guilherme, cuidou um pouco da papelada até decidir dar uma nova olhada no veículo que chegou ontem na oficina.
O que era para ser uma breve vistoria terminou com ela metida debaixo do carro, mexendo ali e aqui. Como Fabrício, teve de virar a aba do boné para trás para não atrapalhá-la.
O suor escorria por seu rosto enquanto executava o trabalho com uma precisão quase cirúrgica, alheia a tudo e todos. A um dado momento sentiu gotas de suor pinicando em sua bochecha e testa. Incomodada, esfregou as costas da mão nos locais que coçavam.
As vozes e o barulho, com os quais antes não se importava, foram ficando cada vez mais altos a ponto de não conseguir se concentrar. Usando os pés, impulsionou-se para fora do carro. Viu Emanuel gritando direções enquanto Lorenzo e Fabrício empurravam um carro esportivo no pátio da oficina.
De onde se encontrava, pôde avistar o amarelo do caminhão guincho juntando-se ao tráfego na rua à frente. Então voltou o olhar para o homem alto e desconhecido conversando com seus homens e imediatamente soube: o cliente presunçoso e mal-educado, que havia ligado mais cedo, chegou.
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