Capítulo 12
A inusitada cena deixou Fernando perturbado. Ali na calçada, encolhida como um animal ferido, a moça vertia lágrimas em um jorro. Apesar da confusão na qual ela se envolveu imprudentemente, não sentia raiva dela. Pelo contrário, vendo-a tão fragilizada daquela maneira, teve vontade de beijar-lhe os cabelos e dizer que tudo ficaria bem.
— Não chore, por favor — ele pediu delicadamente.
O que só fez com que ela chorasse ainda mais. Parecia até outra pessoa em vez da jovem valente que conhecera na oficina havia quase uma semana.
Suspirando, foi sentar-se ao lado dela.
— Gosto mais quando você está me desafiando ou brigando comigo.
— Desculpe, eu... me desculpe.
— Pare de se desculpar.
— M-mas eu estraguei nossa noite — lamentou-se. Os lábios tremiam e ela não parava de soluçar.
— Não totalmente.
Diana o mirou, com o rosto inchado e olhos avermelhados refletindo sua dúvida.
— A noite não acabou e você ainda me deve ao menos uma história — explicou Fernando para ela. — A diferença é que não estaremos nos lamuriando à mesa do bar... e sim na calçada, no estilo mais decadente de bebedeira.
— Quer beber aqui fora, sentado nesse chão?
— Por que não? Particularmente, não estou no clima para procurar outro lugar.
— Nem eu. — Ela encarava a frente, o olhar triste.
Sem dizer uma palavra, Fernando entrou no bar para comprar as cervejas, retornando, em seguida, segurando uma sacola e duas garrafas de vidro abertas. Ele passou uma para Diana, que, confusa com os últimos acontecimentos, viu-o tomar o primeiro gole e encará-la com especulação.
— Você pode começar explicando por que deu uma de baderneira. Conheço-a há cinco dias e a última coisa que esperava é que se envolvesse em uma briga de bar. Por falar nisso, foi a primeira vez que testemunhei uma briga de bar entre mulheres — ele destacou, entre humorado e descrente. — Coisas de Pôr do Sol?
O insólito da situação fê-la ruborizar.
— Coincidentemente minha briga com Susan, a mulher à qual eu estava atracada, tem a ver com o meu primeiro ex-noivo, Bruno.
— Ah, finalmente vamos ao que me interessa.
— Depois que Bruno rompeu o noivado comigo, casou-se com Susan no dia que era para ser nosso casamento. Inclusive, fui convidada para a cerimônia — acrescentou ela, virando goela abaixo um longo gole de cerveja, como se para aplacar a mágoa da lembrança do convite.
— E você foi? — Fernando estava perplexo com a audácia do casal.
— Não. Lógico que não. — Exalou vagarosamente, então esclareceu: — Tudo o que sei é que, desde que se casou com Bruno, Susan não perde a oportunidade de me alfinetar e de esfregar na minha cara o casamento maravilhoso que tem. Era isso o que estava fazendo comigo no bar: fazendo suas insinuações perversas e dizendo coisas malvadas a meu respeito. Mas, para o azar dela, me pegou em um dia ruim.
— Esse é o problema das pessoas quietas. Quando perdem o controle, explodem.
— Isso nunca me aconteceu antes. Estou profundamente envergonhada. — Ela esvaziou mais da metade da garrafa, antes de colocar a mão na testa e curvar-se para frente, apoiando o cotovelo na barriga num comportamento que Fernando considerou autocomiseração. — Mas vamos ao ápice desta história... o porquê do rompimento.
Sem saber o que esperar, Fernando conciliou a ansiedade com o álcool.
— Só para deixar claro: todos os meus noivados foram breves. O mais longo durou cinco meses. Eu tinha 20 anos quando fiquei noiva de Bruno... Eu sei, parece precoce, mas você verá que é comum por aqui meninas noivando aos dezessete ou dezoito anos, talvez até mais cedo, e se casando em menos tempo que o meu noivado mais duradouro. — O suspiro que deu foi seguido de outro demorado gole. — Retomando, eu era louca por Bruno desde o ensino médio. Perdi as contas de quantas vezes insisti para sair com ele, todas recusadas. Ele dizia que eu parecia ser problema e que não queria compromisso com nenhuma garota. Somente após a formatura, quando já tínhamos conhecido e nos envolvido com outras pessoas, foi que ele me deu uma chance e começamos a namorar. Cerca de um ano depois, noivamos... mas então...
— Mas então?
— Ele começou a ficar estranho. Distante. Tudo o que eu fazia era motivo de reclamação, até mesmo o meu jeito de se vestir. Ele dizia que o envergonhava e que não passava uma boa impressão eu trabalhar no meio de homens. Que eu não era... feminina... e que isso tirava todo o tesão dele. — As lágrimas suprimidas brilhavam nos olhos castanho-claros. — E que, no final das contas, ele só tinha aceitado ser meu noivo porque eu o havia convencido a fazer isso, depois de muita insistência. Confesso que devo ter forçado um pouco a barra, naquela época, na minha ânsia de... eu não sei... de saber o que é ter alguém? Independente de minhas motivações, ele terminou tudo e apareceu com uma nova mulher poucos dias depois. Esta foi Susan. Do namoro para o casamento, foi um piscar de olhos.
Diana engoliu o choro abaixo com o resto da cerveja. Mas logo Fernando abria e lhe entregava outra garrafa, refletindo que a moça passara por muita coisa com tão pouca idade. Sequer sabia o que dizer para consolá-la! Aquele momento era dela, então talvez o melhor fosse desempenhar seu papel de ouvinte e falar apenas quando julgasse necessário.
— Esta foi a primeira história. Meu segundo noivo foi um homem chamado Enrico. Ele não mora mais aqui.
— Na cidade?
— No país. A razão pela qual ele desfez o noivado é bem simples, até. Por isso acho que essa história será um tanto decepcionante — ela comentou, com um sorriso sem emoção.
— Quero saber mesmo assim.
A verdade é que queria saber tudo sobre ela.
— Eu o conheci na igreja, após a missa. O padre Joaquim conversava comigo, quando Enrico o abordou, e fomos formalmente apresentados. Em Pôr do Sol, todo mundo conhece todo mundo, de modo que já tinha visto Enrico em alguns lugares. Mas, naquele domingo, foi quando nos falamos pela primeira vez. Descobri que era engenheiro civil, que veio de fora para trabalhar na cidade e, até onde eu sei, era excelente no que fazia. Ganhava rios de dinheiro com sua profissão. Eu era apaixonada por sua inteligência e brilhantismo... e ele, bem, era um homem exótico apaixonado por coisas fora do padrão. Ficar comigo significou a manutenção de suas predileções. Era mais uma aventura na qual embarcava... Porém, conforme avançávamos no relacionamento, eu ia acreditando que suas intenções ficavam cada vez mais sérias e que Pôr do Sol seria seu destino final. Doce ilusão.
— O que aconteceu?
— Enrico recebeu uma proposta de emprego irrecusável para trabalhar no exterior. Rompeu o noivado e, no dia seguinte, embarcou em sua nova aventura.
— Não perguntou se você queria ir com ele?
Com as costas da mão, Diana esfregou os lábios depois de sorver o líquido, que agia com efeito relaxante em seu corpo. Embora o álcool fizesse o canto machucado de sua boca arder, não abria mão dele.
— Não. Nada foi conversado sobre esta possibilidade. Foi aí que, para mim, ficou claro que não me amava. Gostava de mim o suficiente para brincarmos de noivos por um tempo, mas não o suficiente para levar o compromisso adiante. — A segunda garrafa foi esvaziada e Diana pousou-a a seu lado. — Tenho a sensação de que, mesmo que não tivesse recebido a proposta, Enrico teria me dado o fora de um jeito ou de outro.
O inconfundível som de tampa de garrafa sendo aberta fez com que prestasse atenção em Fernando, que não tinha passado da primeira cerveja.
— Esta é a terceira cerveja que me dá e você ainda nem saiu da primeira. Está querendo que eu fique bêbada?
— Estou me controlando, porque depois vou dirigir.
— Eu também.
— Nesse estado? Nem pensar! Levarei a moça para casa.
— Não quero ir para casa — ela retrucou, parecendo aborrecida, não perdendo tempo em ingerir mais álcool.
Fernando correu os olhos pelos traços delicados que, mesmo com as desilusões amorosas, não perderam a jovialidade e o encanto. Examinando-a atentamente, tentava encontrar o que não era feminino em Diana Ferreira. Estaria cego? Desatento?, perguntou-se. Tudo o que encontrava era uma mulher doce e formosa que, se não fosse pelo corte no canto do lábio, já teria encostado a boca na dela enquanto confessava, entre um beijo e outro, que ultimamente ela não saía de seus pensamentos e vinha assombrá-lo em seus sonhos.
Também era a primeira vez que a via de vestido, o que foi uma bela surpresa. Teria sido ele a causa da repentina mudança? Nunca quis tanto que fosse isso, por mais presunçoso que pudesse soar.
— Você já amou alguém, Diana? Louca e perdidamente, igual amei Maia? — perguntou Fernando, abstraído em reflexões.
— Já.
— E onde está esse homem?
— Casado com a minha irmã postiça.
Fernando ficou espantado, depois risonho.
— É brincadeira?
— Quem me dera.
Emudecido, contemplou a mão de dedos delgados levar a garrafa na direção dos lábios. Choramingando, ela contou:
— O nome dele é Guilherme e ele foi o meu noivado mais longo. E essa história... é a que mais odeio de todas as três histórias.
Antes mesmo de começar a narração, as lágrimas caíram novamente. Ela chorava e soluçava baixinho. Só de vê-la se retorcendo em sofrimento, Fernando soube que não gostaria do que estava por vir.
Acariciando as costas de Diana, puxou-a até que apoiasse a cabeça em seu ombro.
— Não precisa continuar, se não quiser falar — ele murmurou, rodeando-lhe a cintura com o braço e tirando o cabelo do rosto molhado.
— Não... eu quero contar... Eu nunca tive oportunidade de conversar sobre isso com ninguém.
De algum modo, sentiu-se satisfeito com a confiança que ela tinha nele, a ponto de revelar-lhe a mais aterradora de suas angústias.
— Guilherme trabalha na prefeitura. Eu o conheci quando fui acionada para verificar um dos veículos de lá — ela começou e buscou os olhos de Fernando. — Apesar de me sentir instantaneamente atraída assim que o vi, não falei nada. Não insisti em nada. Fiz o meu trabalho e me retirei. No dia seguinte, para minha surpresa, ele apareceu na oficina alegando que o carro dele estava com problema... — ela se interrompeu por um momento.
— E estava?
— Não. O carro não tinha problema nenhum — ela respondeu, sorrindo consigo própria. — Depois de pegá-lo na mentira, Guilherme me disse que, na verdade, o problema que tinha era comigo: queria que eu saísse com ele. Eu aceitei.
— Que abordagem ridícula — ele redarguiu com ciúme. — O cara te dá trabalho à toa e ainda assim você sai com ele?
— Achei fofo — justificou, dando de ombros.
Fernando soltou um resmungo indicando discordância.
— Certo, Don Juan, o que faria no lugar dele?
Prontamente ele respondeu:
— Esperaria o carro quebrar na estrada e ligaria para o guincho levá-lo direto na sua oficina. Daria a você trabalho de verdade. Chegando lá, eu criaria caso quando percebesse que uma mulher ficaria responsável por consertar meu carro... tudo isso com o objetivo de fazê-la pensar que sou desses homens machistas, que não admitem a interferência feminina nos meus assuntos. Deixaria as faíscas rolarem entre nós por algum tempo, pois brigas são ótimas preliminares. Então, quando a pegasse de guarda baixa, mostraria meu arrependimento e a convenceria a me acompanhar até um lugar paradisíaco, onde eu a faria sentir, em meus braços, toda a paixão que faz meu corpo queimar por você.
Os olhos de Diana se arregalaram ante as semelhanças da história com o que viveu com Fernando até o momento.
— Muito estrategista — ela replicou.
— Não é? — indagou e piscou-lhe, deixando-a com a pulga atrás da orelha.
O desvio no assunto deu tempo para o choro começar a secar no rosto de Diana, que se concentrava no restante a ser contado.
— Eu e Guilherme saímos, nos divertimos e continuamos saindo até ele me pedir em namoro. Em menos de sete meses, disse que não conseguia vislumbrar uma vida sem mim e pediu a minha mão em casamento. Amava-o tanto e me sentia tão amada por ele que a última coisa que eu esperava é que fôssemos infelizes.
— Que droga ele fez? — quis saber Fernando, já sentindo raiva de um homem que nem conhecia.
— E se ele não fez nada? Afinal de contas, eu também posso ser culpada pelo fim do noivado...
— Eu não acreditaria. O que Guilherme fez? — repetiu com ar grave.
Ela suspirou.
— Apaixonou-se por Rafaela, filha da minha madrasta. — As lágrimas renovaram-se com indesejada rapidez e logo deslizavam por suas bochechas. — Eu... entendo perfeitamente. Ela é mesmo bonita.
— Você também é bonita — ele a elogiou com incrível ligeireza.
Diana sacudiu a cabeça com um nó na garganta.
— Não tem comparação. Rafaela é graciosa, tem um corpo escultural, sabe se vestir e se comportar. É delicada, tem bom gosto. Ao que parece, nenhum homem é imune aos seus encantos... nem mesmo um comprometido. Guilherme e ela viveram um caso antes de ele retirar sua proposta de casamento e acabar tudo entre nós para continuar seu romance com Rafaela.
Virando a garrafa até o último gole, ela se questionou em voz alta:
— O quanto de sofrimento um coração é capaz de aguentar? Ainda estou viva e respirando, mas por dentro... por dentro, não tenho certeza se conseguirei passar por isso de novo. Traição, rejeição e abandono: são três coisas que me assustam, porque eu as conheço com muita intimidade.
Embora as histórias tivessem chegado ao fim, continuaram bebendo, em silêncio. Fernando refletia que a versão original, contada por Diana, era triste e angustiante em comparação aos boatos, quase ultrajantes, espalhados de boca em boca em Pôr do Sol. Perguntou-se quem teria sido a alma pútrida que distorceu as histórias, dando início ao que seria a mácula da reputação de Diana e a consequente conversão de sua figura no afamado — mas não menos depreciativo — símbolo da noiva abandonada.
As horas foram passando até que um amontoado de garrafas de vidro brilhavam, sob a luz do poste, próximo ao quadril de Diana, que já com aspecto bêbado, pôs-se a falar das qualidades da irmã postiça.
— Rafaela é uma modelo, de tão linda e elegante. Quando estava solteira, os rapazes da cidade brigavam para sair com ela. Mesmo agora, casada, continuam competindo por sua atenção. Se você a visse, ficaria fascinado por ela também.
— Estou farto de modelos — ele refutou num tom que beirava à grosseria.
— Ela o faria mudar de ideia... sobre qualquer coisa. Até sobre casar-se de novo. Ao contrário de mim, que só sirvo para aventuras ocasionais.
— Entre beleza e caráter, prefiro caráter. Quando vem acompanhado de simpatia e formosura, sinto-me um homem sortudo. Por isso, eu escolheria mil vezes você — ele argumentou, diante do que percebeu ser uma enorme falta de autoestima da mecânica.
Diana deu-lhe um sorriso agradecido, meio lânguido, os olhos marejados de emoção.
— Obrigada. Eu me sinto muito querida quando estou com você.
— Isto não chega a ser nem metade do tratamento que você merece, Diana — ele sussurrou e passou, levemente, uma mão pelo rosto macio. — A única coisa que eu lamento é não termos feito amor ainda, porque tenho a clara sensação de que nós dois teríamos adorado.
Sentindo-se um tanto tonta, ela deitou a cabeça no ombro masculino e colocou a mão no peito largo.
— Não diga essas coisas... não quando acho que estou me apaixonando por você.
— Que engraçado, eu ia dizer algo parecido.
— O quê?
Fernando pegou a mão em seu peito para beijar-lhe a palma. Então, sem pressa, murmurou roucamente:
— Que tenho absoluta certeza de estar me apaixonando por você e isso está me deixando louco.
Com os corpos colados um ao outro, ele pôde senti-la estremecer com o choque da confissão. Em questão de segundos, Diana distanciava o corpo parecendo levemente desesperada, derrubando algumas garrafas no processo.
— Mas eu sei que não seria justo com você, se a incentivasse e a seduzisse para seguir adiante comigo — Fernando disse para acalmá-la.
Em vez de relaxar, observou-a transformar-se em uma pilha de nervos. O rosto empalideceu muito rapidamente enquanto ela, de olhos arregalados, pressionava o estômago com as mãos.
Entre arrependido e preocupado com os impactos de sua declaração, Fernando prosseguiu:
— Não é porque quero fazer amor com você que significa que vamos fazer...
Em seguida, viu-a jogar a cabeça para frente e vomitar em seus caros sapatos. Estarrecido, não conseguia sequer piscar ou falar.
— Oh, meu Deus... eu...
Ele não quis ouvir o resto. Deu a noite por encerrado e ajudou-a a colocar-se sobre os próprios pés.
— Vamos. Levarei você para casa.
— Não! — Diana o empurrou desajeitadamente, quase levando um tombo se não tivesse sido amparada a tempo por Fernando. — Só quero ficar aqui.
— Nem ferrando. Você está péssima.
— Não quero ir para lá... Deixe-me sozinha, por favor — implorou fracamente, exaurida pela emoção. Era por reconhecer estar fragilizada que não tinha a menor vontade de dormir em um lugar impregnado das lembranças maravilhosas com seu pai e das posteriores infelicidades que tivera vivido, sob aquele mesmo teto, nos últimos anos.
— Não me peça uma coisa dessas. Eu não estaria sendo eu mesmo se a abandonasse neste estacionamento, na condição em que se encontra — avaliou Fernando, um tanto rude.
Bêbada e tentando livrar-se das mãos que teimavam em segurá-la, retrucou, desconsolada:
— Já disse que não vou para minha casa! É o último lugar que eu gostaria de ir... Entenda isso...
— Eu entendi, por isso você vai para a minha casa. Meu lar provisório. Muquifo, para os mais chegados.
Ela sorriu ao olhá-lo, o que fez o canto da boca arder, e logo o sorriso transformou-se em uma careta de dor.
— Vamos cuidar desse ferimento. — Havia autorrecriminação em sua fala, por ser algo ao qual não se atentou a fazer antes. Com todas as revelações bombásticas de Diana, entendeu que ela era o tipo que sofria em silêncio, o tipo que poderia estar morrendo de dor e nada diria, o que exigia maior atenção dele. — Venha, moça.
Assim, ela deixou-se ser conduzida até o hotel de Brígida. Uma vez no carro, mergulhou em um cochilo, do qual, nem mesmo quando foi despertada por Fernando, quis abrir os olhos. Foi por estar meio acordada e meio dormindo que alguns detalhes ficaram-lhe obscuros. Por exemplo, o choque de Brígida ao vê-la, da recepção, ser praticamente arrastada por Fernando hotel adentro.
— Bom Deus! O que houve com ela?
— Arrumou confusão, encheu a cara e vomitou nos meus sapatos. Por alguma razão, não queria voltar para casa, então eu a trouxe para cá.
— Precisa de ajuda? — a velha senhora indagou, enquanto ele se encaminhava para a escada.
— Agradeço, mas posso me arranjar sozinho.
— Vai cuidar bem dela?
Fernando ficou satisfeito em saber que não era o único a se preocupar com Diana. Parando diante dos degraus, ergueu o corpo da moça em seus braços e, antes de carregá-la escada acima, virou-se para asseverar:
— Não tenha dúvida. Boa noite... e vá dormir. Está tarde.
— Vou daqui a pouco. Boa noite, querido.
Quando venceu os degraus e entrou no quarto, Fernando colocou-a gentilmente no chão para fechar a porta. Morrendo de sono, Diana deu um passo desequilibrado na direção da cama. Uma mão interrompeu-a.
— Sei que está cansada, mas precisa de um banho.
Ele ouviu grunhidos ininteligíveis.
— Também concordo que este vestido fica bem em você, mas não pode dormir com a roupa suja de vômito. Venha, deixe-me ajudá-la com o banho.
Mãos afastaram seus braços quando ele fez menção de tirar-lhe o vestido.
— Diana — tomou-lhe pacientemente o rosto entre as palmas da mão —, pare de ser tão teimosa. Ajude-me a ajudar você. Quanto mais rápido terminarmos aqui, mais rápido poderá dormir, entendeu?
Sucedeu-se um resmungo, mas, seguindo os comandos da voz mandona, profunda e forte, ela segurou-se nos ombros do homem quando este abaixou-se para deslizar-lhe o vestido pelas pernas.
Para Fernando, olhar para cima foi automático, praticamente inevitável. Quase sem fôlego, constatou que ela estava sem sutiã. Os seios eram adoráveis e pequenos, de aparência macia, com mamilos rosados e incrivelmente eretos naquele instante. A respiração pesou com a vontade de sugá-los.
Entretanto, contendo-se, decidiu beijar carinhosamente a barriga plana, provocando cócegas em Diana, que se curvou e riu feito uma criança. Ainda ajoelhado, aproveitou a distração dela para descalçar-lhe os sapatos, sem poder resistir a outro beijo, agora depositado nas coxas alvas.
Seguiu-se um suspiro, que logo perdeu-se no silêncio do quarto.
Se continuasse naquele ritmo de querer beijar a mulher inteira, ele pensou, não chegariam nunca ao banheiro. Por isso, repreendendo a si mesmo, enganchou os polegares na calcinha e baixou-a depressa. O pequeno monte de pelos apareceu bem diante de seus olhos, porém, antes de o desejo tornar-se incontrolável, Fernando tirou os próprios sapatos e conduziu-a até o banheiro, para o interior do boxe, abrindo o chuveiro para finalmente iniciar o banho.
Ao toque do primeiro jato de água fria, Diana impulsionou o corpo para fora do boxe.
— Volte aqui! — Ele agarrou-lhe os dois cotovelos e segurou-a no lugar, sem se importar que a água molhasse seus antebraços e respingasse nas roupas. — Fique quietinha aí — ordenou com firmeza.
Diana encolheu-se feito um animalzinho recebendo o castigo.
— Deve estar achando que sou muito mau, não é? — ele continuou a falar, contendo o sorriso.
De cara fechada, ela sequer olhava para ele. Pelo menos agora parecia mais desperta, mais consciente, tanto que, quando Fernando não resistiu a admirar-lhe os seios, ela os cobriu instintivamente.
— Tola. Por que os esconde de mim? Já vi tudo o que tinha que ver.
Ou quase tudo, ele refletiu, pensando no ponto doce e sensível de sua essência feminina. Quanto mais divagava, mais perigosos seus pensamentos ficavam. Foi encarando o banho como um dever a ser cumprido rigorosamente que, em menos de quinze minutos, já tinha lavado a ferida com sabão e sentava na cama com Diana, enfiada em uma de suas camisas sociais.
— Estamos quase terminando, minha brava guerreira — avisou enquanto desenroscava a tampa da pomada que Brígida lhe trouxera. — Deixe-me passar um pouco disto em você... — murmurou, aproximando a ponta do dedo indicador do rosto dela.
Sem que precisasse pedir, Diana separou os lábios de modo a facilitar-lhe o acesso ao canto ferido de sua boca.
— Pronto.
Estendendo o braço para a mesa de cabeceira, molhou um pano na tigela de água morna, para em seguida pressioná-lo no local onde se formava um hematoma. Ela nem mesmo gemeu de dor.
— Que mulher corajosa — disse à Diana, que o contemplava com ar ausente.
Bonita também, completou mentalmente, enquanto usava a outra mão para acariciar-lhe o lado não golpeado do rosto. Sensível àquele homem, ela respondeu ao toque fechando as pálpebras e suspirando.
Quando disse mais cedo que tinha a impressão de que ambos adorariam fazer amor um com o outro, Fernando não se referiu unicamente ao prazer que poderiam encontrar juntos, mas, principalmente, à naturalidade que tinham para corresponder aos apelos do outro, como se fossem amantes de muitos séculos, separados pela tragédia, com uma nova chance de se amarem outra vez.
Explorar aquela forte atração era o que mais queria. Entretanto, como poderia ouvir seus desejos, sabendo que a história não teria um final feliz? Sabendo que, ao final, teriam de enfrentar a inevitável despedida?
Ele, um homem do tipo pé no chão, não via problema em viver um romance passageiro, sem apegos, contanto que fosse satisfatório para ambas as partes. Mas, consciente do histórico de abandono de Diana, como poderia pedir-lhe para entregar-se a uma paixão temporária, cujo fim culminaria, para ela, em mais um abandono? De que modo isto seria justo, quando tudo o que a moça parecia almejar é encontrar um amor duradouro?
Com pesar, Fernando compreendeu que faria imenso mal a ela se insistisse no envolvimento.
Quando retornou do banho, contemplou-a dormir serenamente. Ver o objeto de seu desejo e saber que jamais seria dele dava-lhe vontade de socar as paredes de tanta frustração.
Sim, estava enfeitiçado por Diana Ferreira. No entanto, sua atração não era maior que o carinho desenvolvido por ela. Que o benquerer e a afeição que tomou pela moça.
Deitou-se no colchão para enfrentar o que foram quase duas horas de insônia, muito ciente do corpo quente e feminino a poucos centímetros do seu. A aproximação de Diana, que, em meio ao sono, passou o braço em volta dele, piorou-lhe ainda mais o bom senso, e Fernando capturou-a em seu aperto.
— É a última vez — prometeu-lhe Fernando, com um murmúrio, enquanto acarinhava-lhe as costas. — Depois, você estará livre de mim.
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