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Capítulo 14

O clima no escritório real não poderia estar pior. Naquela manhã, Noah surgiu com um relatório enquanto gesticulava totalmente inquieto. Foi preciso um bom chá calmante para que voltasse à neutralidade costumeira.

Não me dei ao trabalho de ler o relatório sozinho. Imediatamente, convoquei Tristan e Letholdus para o meu escritório; onde, juntos, tomávamos a maioria das decisões prudentes, longe da toxicidade do Conselho.

Pela tarde, os dois chegaram e, só então, que leram o tal relatório. Conforme passávamos as páginas de mãos em mãos — já que Noah estava agitado demais para fazer uma cópia para cada — a troca de olhares foi inevitável.

— O reino de Velstand negociou com dois reinos do oriente. — dizia Letholdus. — Logo Mintaka e Alnilan, grandes potências militares.

— Pensei que Velstand não passasse de meras cinzas depois do ataque de Lorcan. — Tristan falava o que todos nós pensávamos.

— Já vi que estávamos enganados. — comento. — Não me importaria em ver esse reino maldito destruído novamente, só que...

— Há muitas pessoas inocentes que não merecem o derramamento de sangue que estamos dispostos a oferecer. — adverte Letholdus.

— Isso mesmo. E eu acho que essa informação seria mais propícia a estar nas mãos do nosso rei.

Noah negava diversas vezes com a cabeça, apontando para mim e traçando a ponta do indicador pelo próprio pescoço em um movimento horizontal.

Sinto calafrios com essa representação.

— Acho que ele quer dizer que é a sua cabeça que está em jogo aqui. — pontua Tristan após observar atentamente os gestos do nosso espião. — Valfem está em uma posição de fragilidade dentre todos os outros reinos. Aryan e Mandrariam quase não sentiram o peso da guerra. Cartelli agora não passa de mais um ducado sob a proteção de Velorum. Ou seja...

— Valfem é o único reino que realmente saiu prejudicado na batalha. — concluo. — E eu sou o alvo mais fácil. Afinal, há menos de dois anos que assumi o trono. Não é à toa que Fausto faz aqueles comentários na reunião, temo que ele esteja cer-...

— Céus, grandão! Nem me fale uma blasfêmia dessas! Fausto nunca estará certo, o que importa é que Noah descobriu que há movimentações por baixo do tapete para tirá-lo do trono.

— Sim, eles querem um sucessor aliado ao inimigo e o meu primo... Bem, já sabemos.

Estava indo tão bem. Aos poucos, adquiria a confiança necessária para gerir meu povo e, em um só momento, sinto como se todo o esforço pudesse ser jogado fora.

— Isso só pode ser uma puta brincadeira de mau gosto! — dizia Tristan dando um leve soco na mesa.

— Bem que eu gostaria, mas é a informação que recebemos. Estávamos suspeitando esses dias e, agora, temos a confirmação. Só nos resta redobrar a segurança.

Infelizmente é a verdade. Desde que Velstand se mostrou em silêncio por tempo demais, sabia que algo estava errado. Por isso, pedi que Noah fizesse uma investigação minuciosa sobre o reino inimigo.

E cá estávamos.

— Temo pela sua segurança, Aloys. — profere o mais velho. — A sua vida corre perigo.

Abro a boca.

A fala não sai, o único som a ecoar é de algo se chocando contra a madeira. De forma imediata, os três olhares presentes se focam na figura franzina e de longos cabelos ruivos jogada no meio do escritório.

— Er... Desculpa, eu... Eu acabei esbarrando e... — Alene se explicava toda atrapalhada. Em um gesto quase necessitado, caminho até a jovem e a ofereço o braço. Acho adorável a sua expressão surpresa, como se qualquer gesto de carinho ainda fosse uma novidade. A ruiva aceita minha ajuda, ficando de pé. — Obrigada, Alteza.

— Posso saber o que é isso aqui? — a voz grossa de Letholdus se sobrepõe aos sons do ambiente. — Ou melhor, quem é ela?

— Alene, esse é Letholdus Bailey, um grande amigo e o melhor conselheiro de todos. E Letholdus, essa é Alene, a minha... — noto como a ruiva se encolhe, esperando aquele termo que já deve ter escutado diversas vezes no castelo. Mas não a deixaria constrangida dessa forma. Nenhuma mulher merece se sentir assim. —... amiga.

Ouço o suspiro de alívio dela. Por outro lado, Tristan está com uma expressão inquisitiva. Provavelmente, lembra muito bem da Alene, mas entrou na onda da mentira também.

O olhar esverdeado da jovem foca, em seguida, na figura no canto da sala que, silenciosamente, participava da reunião.

— Ah! Esse é Noah, um dos meus soldados.

Até porque apresentá-lo como espião seria burrice.

— Prazer, Noah. — ela o cumprimenta com tamanha gentileza que o espião se limita a acenar com a cabeça, todo envergonhado.

— E o que faz aqui, senhorita Alene? — questiona Letholdus. — Duvido muito que escutar conversas sorrateiramente seja algo das damas da corte. Parece-me mais algo que um espião faria.

Ela arregala os olhos diante da acusação. Não é para menos. Ser acusada de espionagem é como colocar uma corda no pescoço — literalmente —, mas Letholdus não a conhece para saber que Alene não é nada disso.

Uma pessoa com sorriso tão gentil não poderia ser uma espiã, onde seus belos lábios se curvam e...

Lembrar do nosso beijo é uma péssima escolha. Mesmo tendo se passado alguns dias, a cena ainda está fresca em minha memória. E quero tanto repeti-la, mas as minhas obrigações me impedem de sair prensando a Alene contra a parede cada vez a cada instante.

Céus, imaginá-la contra a parede também é uma péssima escolha.

— Foi sem querer. Desculpa, senhor. Eu só ouvi que o príncipe corria perigo e... — ela descia o olhar para a barra do vestido lilás, apertando o tecido entre os dedos. — Fiquei preocupada.

Um instante de silêncio para a minha expressão surpresa.

Enquanto as guerras e jogadas políticas aconteciam, o povo normalmente se mantinha alheio aos acontecimentos. Ninguém se importava de verdade se o príncipe estava bem, apenas se Valfem continuaria em pé, dando-lhe prosperidade.

Mas pela forma como Alene falou e como, segundos depois, o seu olhar encontrou o meu, soube que não falava de Valfem.

Ela se importa comigo.

Deixo que essa sensação boa se espalhe pelo meu peito.

Retiro um cabelo bagunçado do rosto da ruiva, colocando-o atrás da sua orelha enquanto recebo um sorriso envergonhado em resposta.

Definitivamente, preciso provar esses lábios mais uma vez.

— Que casal fofinho. Mas acho que já está na hora de se recolher, mocinha. — brinca Tristan. Uma brincadeira com tom de advertência. — Logo o Sol irá se pôr.

Alene concorda, mas lança um olhar profundo para mim. Como se pedisse para que eu ficasse bem e não deixo de sorrir com tal gesto.

— Com licença. — murmura fazendo uma reverência e saindo do escritório.

— Está dormindo com ela? — questiona Letholdus. — Olha, espero que isso não atrapalhe seu discernimento para...

— Céus, não estou! E se estivesse, acho que isso não afetaria em nada minha capacidade para liderar.

— Isso até começar a pensar com a cabeça de baixo. — brinca o ruivo.

Lanço um olhar mortal para ele, só que a voz do outro homem se sobressai.

— Precisa viajar para Canopeia urgentemente. Mesmo não sendo um reino voltado para guerra, os seus vastos conhecimentos serão úteis.

Nem precisava pedir duas vezes. Ter a chance de ver Alyssa de novo é um bônus dessa viagem. Involuntariamente, estou sorrindo ao pensar na minha amiga de longa data.

Do canto da sala, o corpo de Noah se torna rígido.

— E quem irá para essa viagem? — pergunta Tristan.

— Você e o príncipe, apenas.

— O Noah irá comigo. — digo recebendo um olhar confuso de Letholdus.

— Não é uma missão de reconhecimento, Aloys. Os serviços dele não serão necessários.

Como se eu estivesse preocupado com isso...

— Eu sei, mas quero obter mais informações do povo de Canopeia. E estarei ocupado demais com o rei.

— E com a princesa... — murmura Tristan. — Bem, eu também estou de acordo com a ida de Noah. Ele será bem útil.

Nós dois lançamos um olhar cúmplice enquanto, do outro lado da sala, o espião tentava esconder um sorriso.

Letholdus suspira massageando as têmporas.

— Que seja. Vamos planejar a sua viagem para o mais rápido possível. Se uma guerra estiver se aproximando, precisamos estar preparados.

♕♕♕

Encontro Alene na biblioteca, toda encolhida com um longo vestido bege. É impressão minha ou todas as suas roupas são decotadas demais?

Ao notar minha presença, a ruiva deposita o livro no colo abrindo um sorriso gentil. Retribuo o gesto de forma automática, sentando-me ao seu lado logo em seguida.

— Vejo que está desfrutando bem da biblioteca.

Ela assente abraçando afetuosamente o livro.

— Esse lugar é incrível, Alteza. Não tenho vontade de sair daqui. Será uma pena que... — murmura analisando a capa dura do livro. De canto, noto se tratar de um romance que já devo ter lido. — ... precise dar adeus a esse lugar ao final da minha estadia aqui.

Desvio o olhar para a vastidão de estantes e os livros que nos cercavam.

— A biblioteca real não é restrita ao povo do castelo. Como há academias espalhadas por todo o reino e eu não limito o conhecimento do meu povo, poucas pessoas buscam livros aqui. Faço questão de encher as bibliotecas das academias, mas isso não quer dizer que não possa vir ao castelo. Sinta-se livre para pegar um livro sempre que quiser.

Ela morde o lábio de maneira lenta, quase intencional. Então, os olhos esverdeados revestidos pelos longos cílios focam em meu rosto.

— Não acho que sua futura rainha aceitará a presença de uma concubina no castelo. Desculpe a indelicadeza, mas sou vista apenas como a mulher que deve satisfazê-lo na cama... Nada mais do que isso.

É a dura verdade. Lembro-me dos olhares cheios de cobiça e os toques com segundas intenções de algumas mulheres daqui — como a tal da Emma. Ou outras um pouco amedrontadas em minha presença, como se eu fosse violá-las de alguma forma.

Será que o meu pai nunca questionou essa tradição idiota? Alguém romântico como ele não aceitaria algo assim.

— Acho sua companhia satisfatória por si mesma, Alene. Não se prenda ao rótulo desse título e da tradição do reino. Nós dois sabemos que eu nunca a tratei como uma concubina.

Ela passa a língua pelos lábios os umedecendo. E tal gesto me faz respirar fundo, reunindo meu autocontrole.

— Não me importaria se tratasse, não mesmo.

— Já disse para não se sentir obrigada a me servi-... — a minha fala é interrompida quando a ruiva sobe no meu colo. — O que está fazendo, Alene?

— Servi-lo não é algo que eu precise fazer. É algo que eu queira fazer. E deixe-me mostrar o quanto eu quero, Alteza.

Alene dá um breve beijo em meu pescoço, deixando-me arrepiado, e a trilha de seus lábios percorre toda a extensão da minha pele até a mandíbula, terminando com uma mordida. Quando a ruiva olha no fundo dos meus olhos, sei que o brilho na íris verde só pode significar o desejo que tem por mim.

É óbvio que há preocupações sondando a minha mente. Uma ameaça de morte nas costas e a responsabilidade de um reino. Mas com essa mulher em meu colo, só consigo pensar naquela noite onde deixei meus impulsos falarem mais alto.

E novamente, permito que a voz da impulsividade se sobreponha à razão.

Agarro a bunda de Alene com as duas mãos, puxando-a contra mim. Em resposta, ela solta uma exclamação surpresa e o som muda para o gemido arrastado quando avanço contra seus lábios, mordendo-o antes de dar início a um beijo. A boca dela tem gosto de cereja, provavelmente por causa da sobremesa oferecida na refeição instantes atrás.

Ou porque tudo nela é uma tentação.

Alene não deixa barato e, durante o beijo, move o quadril testando o quanto posso me controlar no meio da biblioteca. Por sorte, não há nenhum empregado ou guarda por perto — e se houvesse, não me importaria.

Ela puxa os fios medianos da minha nuca enquanto estou apertando sua pele entre meus dedos. No momento em que Alene roça em minha ereção, gemo contra a sua boca.

A vontade que tenho de fodê-la aqui na biblioteca é quase incontrolável.

Quase.

Separo-me da ruiva, recuperando o fôlego e observo os seus lábios inchados do beijo. Não resisto e desço a boca até o seu pescoço, onde deposito beijos molhados e longos. Alene estremece em cima de mim, apoiando as mãos em meus ombros.

— Alteza, por que resiste tanto?

Subo a trilha de beijos por sua orelha, onde a mordo com suavidade, sussurrando:

— Porque ainda não é o momento certo.

— Não me quer por perto? Porque sempre que penso que estamos nos aproximando, você me afasta. — resmunga com um biquinho fofo.

Sinto vontade de dar outra utilidade para seu bico, os lábios envoltos do meu pau e...

Foco, Aloys!

— Pelo contrário, quero apreciar sua companhia por mais tempo. Por isso, vim aqui para fazer uma proposta.

O bico some dando espaço para uma expressão curiosa. Ela fica tão adorável quando me encara cheia de expectativa, mal sabendo como os seus olhos brilham.

— Que proposta?

— O que me diz de viajar comigo para Canopeia? Tenho que resolver algumas questões e... Uma boa companhia sempre é bem-vinda, certo?

Sei que Letholdus vai me matar quando souber, mas tendo o apoio de Tristan posso lidar com sua fúria. Quando dei a ideia, o meu amigo questionou e expliquei que precisava ter um contato mais próximo de alguma concubina, assim ninguém desconfiaria do meu pouco caso com a tradição. Depois de um sorriso malicioso, o ruivo concordou com a ideia.

Alene parece analisar a situação com uma calmaria estranha. Nunca a vi tão pensativa e distante, até que acenava positivamente com a cabeça.

— Eu aceito!

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