013. Escolha ou Liberdade
— KANG; Seulgi.
O cômodo estava envolto em uma penumbra pesada, iluminado apenas por brasas fracas na lareira ao fundo. As paredes de pedra do castelo pareciam absorver todo o calor. Drácula, sentado em uma cadeira imponente, observava a sala com olhos que já haviam testemunhado séculos de destruição e traição. Alucard estava diante dele, de pé, as feições endurecidas, mas havia uma certa angústia em seus olhos dourados. À sua esquerda, Seulgi permanecia em silêncio, mas a tensão era palpável.
— Vocês sabem o que essa profecia significa, — A voz de Drácula soou profunda, quase um eco. Ele olhou para o filho com uma intensidade que poderia queimar. — Uma guerra inevitável, e uma destruição sem limites. Mas, acima de tudo, o fim da nossa linhagem... e o fim do mundo dos mortais.
— Essa guerra não é inevitável. Ainda podemos impedir, podemos fazer diferente. — Alucard estreitou os olhos, a mandíbula tensa.
— Yeri me contou sobre sentir a criatura, aquela coisa está ganhando força. — Dei um passo à frente, minha voz cortante como uma lâmina. — Alucard tem razão.
— Essa profecia foi prevista há séculos. Você acha que pode evitar seu destino, Alucard? Acha que pode lutar contra a própria essência do que somos? — Drácula se inclinou levemente para frente, os olhos vermelhos brilhando com uma ameaça silenciosa.
— Eu não seguirei o caminho da destruição que você escolheu, pai. Essa guerra não trará a paz que você busca. Apenas mais morte, mais caos. — Alucard sustentou o olhar do pai, suas mãos cerradas ao lado do corpo.
Alucard respirou fundo, o conflito interno quase visível. Ele olhou de relance para mim, seus olhos se suavizando por um instante, antes de voltar a encarar seu pai. O meu silêncio não era significativo, mas assistir o peso dos dois é incerto, a balança da primeira linhagem vampírica continua se distorcer como uma imagem em um espelho. Encarei o horizonte pela janela, no céu, um morcego de asas largas cortava o horizonte, voando sobre ossos espalhados pelo solo e sombras distorcidas.
— Alucard. — Chamei-o. Alucard apertava o punho da espada em suas mãos com firmeza.
Quando o seu olhar chocou-se até a criatura, atravessamos aquele comodo indo até a enorme varanda, a noite se derramava pelo horizonte como um manto de escuridão, interrompida apenas pela imensa lua vermelha que pairava no céu, iluminando tudo com uma luz carmesim. O ar era denso, e cada sombra parecia sussurrar segredos antigos de morte e poder. A criatura voava, há uma sensação de que ela está no comando, aguardando calmamente o desenrolar de algo. A atmosfera é carregada de suspense e uma vibração sobrenatural. Quando o morcego desaparece de nossas vistas, sinto algo percorrer em minha espinha, o zumbido estridente é gritado. O vento é cortado quando novamente aquela coisa passa por cima de nossas cabeças. As asas, tingidas de sangue, rodopiavam ao seu redor, como que convocadas por uma força invisível e ancestral.
— São da vigília de Absalão. — Alucard profere, meu corpo trava ao encarar aquela criatura horrenda. — Seulgi!
Meu corpo é arrastado para dentro, as janelas são fechadas e cobertas pela cortina pesada, o coração de Alucard bate freneticamente. Por um breve momento, me esqueço de sua natureza híbrida — o príncipe das trevas, herdeiro da maldição de Drácula, mas também filho de uma mortal. Seus olhos, que deveriam brilhar com o desprezo frio de um vampiro, carregam algo que nunca esperaria: medo. Um traço humano que sua mãe lhe transmitiu e que o fazia, às vezes, parecer mais vulnerável do que jamais admitiria.
— Eles não conseguem passar pelo castelo. — Drácula afirma o que eu gostaria de questionar. — Chequem se não há intrusos entre os humanos. Morcegos da vigilia conseguem se misturar entre os humanos como metamorfos. Tentem encostar a prata lâmina nos humanos para checar, avise apenas os vampiros confiáveis.
Suas últimas palavras pairam no ar como uma ameaça velada. Alguém poderia estar traindo. Alucard ergue-se, ainda com o coração acelerado, e me lança um olhar furtivo. Um olhar que me lembra que, apesar de tudo, ele também é um estranho no domínio de seu pai — entre dois mundos, carregando tanto a bênção quanto a maldição de ambos. Nos movemos em silêncio pelo salão, seus passos quase imperceptíveis contra o piso de mármore frio. Ele evita olhar diretamente para o pai, mas a tensão é palpável. Eu o sigo de perto, ainda atordoado pela súbita mudança no ambiente. Pessoas abrigadas ali veem a figura do vampiro, o fogo da lareira clama trazendo o ar quente.
— Você está preocupado, não está? — Questionei.
— É difícil não estar. — Alucard hesitou.
Alguns minutos fazendo a checagem, não havia ninguém que fosse o intruso, a lâmina fora encostada inúmeras vezes, mas o nosso alerta maior é a criatura rodeando o castelo. Vejo a aproximação de meu pai atravessar o salão vir até mim.
— Recebi um bilhete dos Mavros, há uma carroça das criaturas que eles mataram, o número de criaturas vindo da fenda está aumentando, querida. — Meu pai ergue o bilhete com cautela para que minha leitura fosse feita.
— Significa que estão cumprindo a promessa. — Segurei o punhal em minha cintura como apoio ao proferir. — Papai, durante o ocorrido na catedral, um dos vampiros trouxeram a Joo até aqui como ordenei. Onde ela está?
— Bom, somos o único abrigo até o momento, o clã Mavros não poderia, por estarem lá fora com vampiros para lutarem. — Sua explicação é quase inaudível.
A catedral, um local que deveria simbolizar proteção, havia se transformado em um campo de batalha. Agora, o castelo era sua única esperança, mas a ausência de Joo o fazia sentir como se um buraco estivesse se formando em meu estômago. Havia pessoas demais, ouço a voz de Maya me guiar, afasto de meu pai seguindo até a voz de minha irmã, o campo de pessoas apertava um pouco. Quando sinto o vazio, meu corpo relaxa, procuro-a pela escadaria, no topo de uma escadaria coberta por tapetes luxuosos, decorados com flores em tons sombrios, ela estava sentada, imóvel. Mas logo levanta de prontidão arrastando os pés em um possível lamento.
— Maya! — Chamo sua atenção. A imensidão escura apenas pelo brilho carmesim que invade as vidraças ilumina sua silhueta.
O rosto de minha irmã, iluminado pelo brilho rubro da lua, era esculpido em mármore, belo e impassível, mas nos olhos dela havia algo mais: um peso, uma certeza. Aquela não era uma noite comum, e ela sabia que o caos estava prestes a se desenrolar. O olhar fixo dela se perdia no horizonte, como se visse muito além das muralhas do castelo, como se já estivesse prevendo o sangue que logo mancharia o chão.
— Maya, o que aconteceu? — Quando ela vira o corpo para me encarar, seu rosto banha-se em lágrimas.
Quando seus olhos encontram os meus, o brilho carmesim que atravessa as vidraças não mais iluminam apenas sua face, mas também o rastro de lágrimas que escorre por suas bochechas. Lágrimas que eu nunca acreditei que veria em alguém tão forte quanto minha irmã. Ela nunca chorava.
— Eu... vi. — Sua voz é um sussurro trêmulo. — Eu estava certa.
— Diga o que você viu em suas visões.
Maya sempre teve uma ligação especial com o mundo ao nosso redor, um pressentimento que eu nunca compreendi completamente. Quando ela dizia que algo estava acontecendo, estava acontecendo. Ela não responde de imediato, apenas desvia o olhar para a lua vermelha, brilhando de forma sobrenatural no céu. Cada segundo que passa sem sua resposta me faz sentir o desespero crescer, como se o tempo estivesse se esgotando.
— A humana é a criatura que Absalão criou. — Minha irmã diz finalmente com sua voz quebrada.
Eu recuo, minhas mãos involuntariamente tremendo. Joo. O nome ecoa em minha mente, como uma maldição sussurrada nos corredores mais sombrios da nossa história. O horror em suas palavras me atinge como um golpe. O ar parece mais denso, mais pesado, e, de repente, sinto como se as paredes do castelo estivessem se fechando sobre nós.
— Não pode ser... — Murmurei, quase sem ar.
— Seulgi.
O nome Joo continuava a ecoar dentro de mim, cada repetição trazendo uma nova onda de pavor.
— Como isso é possível? — Minha voz saiu rouca, trêmula, quase implorando por uma explicação.
— Ele queria algo... além da nossa compreensão. Algo que pudesse romper o equilíbrio que mantemos há séculos. — Ela abriu os olhos, o brilho carmesim da lua refletindo neles como chamas. — Você é a parte do equilíbrio. Ela é a fusão da escuridão de Absalão com a natureza imprevisível da humanidade. Ele está usando-a para te trazer tormento, minha irmã.
Eu sentia meu estômago revirar. As palavras de Maya eram como um veneno que lentamente se espalhava pelas minhas veias.
— Joo é mais poderosa do que imaginávamos, mais letal. — Maya continuou, sua voz vacilando por um segundo antes de endurecer. — Ela carrega o caos nas veias, Seulgi, e não podemos permitir que ela viva.
— Não podemos simplesmente... matá-la. — Minha voz soava fraca, mas eu sabia que matar Joo seria mais complicado do que parecia. — Eu preciso...
Algo estranho me consome, as paredes gélidas são meu apoio, seguro com firmeza o punhal na qual ceifará a vida de Joo, a onda de vertigem me atingiu como uma maré violenta, quase me derrubando no chão frio do castelo. Minhas mãos trêmulas seguravam o punhal com força, o metal gélido queimando contra a pele. A lâmina, fina e letal, parecia pesar toneladas agora. Eu precisava me concentrar, mas as palavras de Maya continuavam ecoando em minha mente, como um feitiço sombrio que me sufocava a cada segundo.
"Ela carrega o caos nas veias, Seulgi..."
A realidade da situação se desenrolava diante de mim em pedaços fragmentados. Uma estranha mistura de emoções toma conta de mim, martelo nada suavemente os questionamentos o que vem a seguir. Meu olhar fica perdido, a aproximação de Maya atrás de mim corrobora meus passos apressados, acabo me esbarrando em algumas pessoas, mais uma vez minha confiança foi violada. Sua inocência e curiosidade me aprisionaram sem nenhuma cautela, o zumbido corroía o possível paraíso da minha cabeça, as vozes de comando de Alucard do outro lado ecoava, mas eu me perdi. A minha crença no amor eterno é um pesadelo, uma divina violência.
(...)
— JOO; Irene.
Meus olhos pesam não pelo sono, não os consigo manter abertos, meus braços de alguma forma estão levantados. De repente, algo me acorda, um estrondo me desperta, um raio quase próximo fez meu corpo tentar se erguer. Mas algo me derruba. Meu corpo mergulha naquele lugar e o vento forte não é suave, a cena diante de mim era um monumento sombrio e imponente, suas paredes altíssimas cobertas por intricadas esculturas douradas que refletiam o brilho do fogo. Um mar de luzes rubras dançava nas sombras, projetando um espetáculo macabro contra os relevos detalhados. As colunas, como gigantes de pedra, erguia-se até o teto abobadado, onde lustres massivos pendiam, pesados de velas derretidas, lançando um brilho pálido e inquietante.
No centro do altar, uma figura escura estava de pé, indistinta, mas imponente, sua presença dominando o salão. As chamas da cor do sangue iluminavam seu contorno, conferindo-lhe uma aura de poder ancestral. Era como se as sombras ao seu redor estivessem vivas, movendo-se sutilmente, sussurrando segredos antigos que ecoavam pelas paredes. Cada detalhe da arquitetura era um testemunho da devoção à escuridão. Rostos esculpidos nas colunas pareciam gritar silenciosamente, suas expressões contorcidas em dor e angústia.
O ar, denso e sufocante, carregava o peso de mil preces não respondidas. Era um lugar onde o tempo parecia se desintegrar, onde o equilíbrio entre o mundo dos vivos e o dos mortos estava perigosamente frágil. O som do meu corpo preso ecoando pelas pedras do chão coberto por um manto de neblina vermelha me assusta.
Eu sabia que não estava sozinha.
— Você não pode fugir do destino. — A voz dele soou suave e cavernosa, como um sussurro na brisa fria. Meu corpo ficou estático, meu coração batendo acelerado no peito. — Lembra de mim, jovem?
Não havia um rosto claro, apenas uma sombra alta, uma figura que se misturava ao manto da noite. Seus olhos, porém, brilhavam como brasas, cravados nela. Não pude me mover, mas sentia o peso da conexão sombria, com um pouco da clareza o rosto mostrou-se com um sorriso de glória. O espanto em meu rosto é nítido.
— O Criador...
Ele estendeu a mão, os dedos envoltos em sombras, oferecendo a última tentação.
— Venha, Bae Joo-Hyun. — Ele sussurrou, sua voz proferindo o nome de não-batismo é ecoado cavernosa naquele ambiente. — Tudo o que você quer está aqui.
Eu não sei o que está acontecendo, penso no apocalipse, ou talvez no fim do mundo. O som de seus passos ecoando na vastidão silenciosa. Meus olhos se fecham, a luz clara me banha de forma sussurrante, ao nosso redor estava tão densa quanto o véu da morte, e a única luz que iluminava aquela ruína vinha de uma aura misteriosa. Ele estava atrás de mim, seu corpo alto e ameaçador me envolvia como uma sombra que nunca me deixaria escapar.
Um espelho magnifico surge o alto da montanha que estamos, a nova lua ilumina seu carmesim, o homem está diferente. Sua pele pálida, quase cadavérica, e seus olhos ardiam com uma malícia sombria, como brasas escondidas nas profundezas de um abismo. Sinto seus dedos longos e pálidos deslizavam pelo meu pescoço, os mesmos que agora apertavam delicadamente minha garganta, não para sufocar-me, mas como um aviso. Com a outra mão, ele aponta a nossa imagem, mas não estamos ali. Vejo o rosto de Seulgi ali e me ponho a sorrir.
— Seulgi! — Um fio de voz sai de minha boca.
Sinto um aperto, encaro a mulher novamente, sua expressão está diferente. Como se o ódio tivesse consumido-a insanamente. Seu cabelo estava branco por completo, eu não entendo sua mudança repentina, mas ao erguer a lâmina na qual um dia ela proferiu, me causa um certo tremor. A lâmina fria que ela segurava em sua outra mão refletia o brilho da lua carmesim, implacável, como se já tivesse sentido o gosto de sangue antes.
"Sua pobre, doce, inocente criatura. Eu matarei você."
A voz dela soa como um aviso. Não entendo quem ela se refere. Mas sou virada contra o espelho, os olhos do homem brilham em chamas, ele me observava com uma calma perturbadora.
— Você é minha criação, Peccator. — O sorriso cruel que curvava os lábios do homem. — E aquela vampira é sua sina.
A sensação de formigamento invade meu corpo, o poder oculto em seus gestos, revelava que aquele momento era apenas uma peça de um jogo muito maior, um confronto entre a luz e a escuridão. O eco das palavras dela se espalhou pelos meus ouvidos, a lua vermelha continuava a brilhar, como uma testemunha silenciosa. A realidade se desenrolou diante de mim em pedaços fragmentados, meus lábios tremeriam, e a palidez tomou conta do meu rosto, lágrimas talvez não surgissem de imediato, mas meus olhos ficariam marejados brevemente.
— Você pode escolher como será. — Ele sussurrou, a voz tão suave quanto perigosa, como o farfalhar das asas de um corvo. — Um destino com a Vampira de Kaliban é o seu desejo.
Havia algo na forma como ele falava, uma sedução cruel que provocava meu consciente, a ceder à fraqueza.
— Escolher? — Minha voz saiu baixa, mas firme.
— Pode escolher, trazer Kaliban até mim permitira que ambas fiquem juntas, mas não a trazer poderá causar a morte de todos. — Neguei veemente com suas palavras. — Ah, minha doce ilusão... Você ainda não entendeu, não é? O sofrimento é uma escolha. Resistir é inútil. Ceder ao caos... isso, sim, é liberdade.
Aquelas palavras me causaram náusea. "Liberdade" nas palavras dele era apenas mais um eufemismo para servidão, para ser moldada pela vontade dele, para cair no vazio da escuridão que ele representava. A lua, que antes parecia distante, intensificou seu brilho. Uma luz vermelha tingiu todo o céu, como se o próprio universo estivesse prestes a desabar sobre nós. Meus braços foram erguidos por impulso, sentindo uma força ancestral crescer dentro de mim, algo que jamais havia sentido antes. Ele me observava, atônito, sem acreditar no que via.
E então, o chão sob nossos pés começou a tremer. A figura diante de mim parecia emergir do próprio tecido do universo, como se a escuridão e o cosmos tivessem se curvado, moldando-se para criar uma entidade que transcende qualquer limite humano de compreensão. Aquela sou eu flutuando com uma graça espectral, envolta em um manto de sombras que fluíam ao redor de seu corpo, como uma extensão viva de sua própria essência. Cada fio de seu traje parecia composto de estrelas e galáxias, cintilando em um brilho distante, com a imensidão da eternidade girando ao seu redor.
Seu rosto reluzia com uma coroa de luzes estelares, era impassível, misterioso, como se estivesse contemplando o próprio destino dos mundos. Cada movimento dela era delicado, porém terrivelmente poderoso, como se uma simples mudança no ar ao redor pudesse destruir universos inteiros.
— Omnus sumus peccatores. — Sua voz finalmente ecoou.
Havia uma satisfação sombria em seu tom, uma promessa de que meu destino não seria misericordioso. Suas palavras, mais que simples som, pareciam reverberar pelo espaço, distorcendo a matéria ao meu redor, como se a própria realidade estivesse se contorcendo em resposta a sua presença. O ar dos meus pulmões somem, cada batida do meu coração parecia um fardo, como se o simples ato de estar vivo fosse uma afronta àquilo que ela representava. A escuridão ao redor dela se aprofundou, absorvendo as últimas centelhas de luz ao redor, e, com um simples gesto, ela abriu as mãos, deixando a luz escapar, expandindo-se em um feixe radiante.
Senti o frio atravessar minha pele, congelando-me de dentro para fora, enquanto a energia que ela liberava parecia consumir tudo ao meu redor. Quando ela se aproxima, sinto um beijo gélido tocar meus lábios, sou consumida por minhas memórias que lentamente se apagam, e minha última memória é o rosto de Seulgi Kang quando a vi pela primeira vez.
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