11.
capítulo onze.
o som do exílio
MAIS DUAS MORTES FORAM CONFIRMADAS naquele dia, e apenas uma havia ocorrido na arena. Em um momento confuso para todos, Sapphire Rendwick, a mentora do Distrito 3, havia tido uma repentina parada cardíaca e falecido na sala dos mentores, pouco tempo depois de todos chegarem para assistir aos Jogos Vorazes dali. Meadow ficou paralisada, em choque, ao ver seu corpo ser levado dali por pacificadores às pressas, enquanto pensava sobre o quão terrível e injusto era sobreviver à arena para então morrer daquela forma.
A outra morte foi de Icarus, o rapaz do Distrito 10, que teve a infelicidade de encontrar um dos grandes ursos que se escondiam na arena. Foi uma morte rápida, mas brutal. Enquanto seu corpo foi estraçalhado pelas garras e presas do animal, sujando a neve branca de sangue, a maior parte dos mentores não foi capaz de assistir a cena. Meadow precisou ir ao banheiro, onde vomitou todo o café da manhã. Após algumas horas monótonas, ela voltou para o prédio onde estava hospedada, sentindo-se cansada e enojada.
Os Jogos Vorazes não estavam avançando como deveriam. A brutalidade entre os tributos não havia ido muito além do primeiro dia, e o público estava perdendo o interesse. Mervyn e Sylvia estavam escondidos na caverna com Annie, e Meadow sabia que, se a competição continuasse tão monótona, alguma surpresa seria enviada pelos idealizadores para movimentar um pouco o jogo e, certamente, tirar todos os tributos de seus esconderijos diversos. Ela precisava tirá-los de lá antes, para que tivessem ao menos uma chance.
━ Já estão mandando outra campeã do Distrito 3 para substituir Sapphire ━ Finnick comunicou, adentrando o quarto de Meadow e encontrando a mulher deitada na cama, encarando o teto. ━ Ela tinha alguns problemas de saúde que estavam evoluindo. Acho que seu coração não aguentou a pressão de vivenciar os Jogos Vorazes mais uma vez.
━ A arena continua nos matando quando saímos de lá ━ Meadow observou, com a voz baixa, e Finnick assentiu. ━ E eles só vão trazer uma nova mentora. Só vão substituir a que perderam. Nós somos todos descartáveis para eles.
━ Especialmente quando eles se cansam de nós. Sapphire já estava velha, eles não ligavam para ela há muito tempo ━ o rapaz continuou, sentando-se ao lado de Meadow na cama. ━ É nossa vida futura. Um dia, nós não vamos mais ser tão jovens e tão lindos. E a Capital não vai fazer nada por nós, porque vão ter perdido o interesse em nossas vidas no momento em que pararmos de gerar entretenimento para eles.
Meadow encarou Finnick e soltou um suspiro cansado. Morrer de forma natural, para eles, podia ser uma bênção; certamente era melhor do que morrer pelas mãos de alguém, como quase aconteceu durante seus jogos vorazes. Ser deixada de lado pela Capital era o maior sonho de Meadow. Apesar de que a arena tivesse, indiretamente, matado Sapphire, ainda era um futuro melhor do que muitos dos jovens que haviam sido enviados para ela tiveram. Sapphire não sofreu. Ela provavelmente sabia que aquilo iria acontecer em algum momento. E havia vivido uma vida longa e, apesar de todos os males, confortável.
Não era exatamente a morte da colega que incomodava os jovens mentores, e sim o descaso da Capital com o assunto. Eles podiam parar os Jogos Vorazes, podiam ao menos os interromper. Podiam dar a Sapphire uma despedida digna, mas iriam apenas substituí-la. Todos sabiam que eram apenas brinquedos para eles, mas podiam, ao menos, homenagear Sapphire. Finnick sabia que se morresse naquele momento, a Capital declararia luto por três dias, fariam um grande velório e seu enterro seria televisionado enquanto as pessoas choravam em todos os cantos. Se ele morresse dali a 20 anos, provavelmente seria tratado com o mesmo descaso que a falecida colega do Distrito 3.
━ Eles não vão nem fingir que se importam? ━ Meadow perguntou, com uma ruga na testa enquanto pensava sobre toda a situação ocorrida naquele dia.
Finnick deu de ombros.
━ Vão. O presidente Snow está vindo, dizem que ele vai falar algumas palavras prontas, que diz sempre que algum vitorioso morre e ele precisa fingir que liga, e anunciar que a mentora vai ser substituída. E nós vamos ficar no fundo, fingindo que está tudo bem e que estamos de acordo ━ ele explicou, passando uma das mãos pelo rosto cansado, e então fechou os olhos, tentando focar no vazio de sua vista para se esquecer um pouco dos últimos dias, sem sucesso. ━ Além de tudo que nós temos pra pensar, ainda temos que participar de mais um teatro.
A simples menção ao nome do presidente Snow fez Meadow se arrepiar. Ela não o via desde a noite em que anunciou seu noivado, e desde então, Finnick e ela haviam tido atitudes das quais ele não deveria gostar muito. Além do envio do aerodeslizador, a homenagem de Meadow ao dizer querer nomear seu filho como Coriolanus talvez não tivesse o agradado muito.
━ Você tomou os seus analgésicos hoje? ━ ela perguntou, mudando de assunto brevemente, vendo um pequeno roxo escapar da camisa de Finnick, que havia se movimentado quando o rapaz se deitou. Ele ajeitou a camisa, tampando o hematoma, parecendo desconfortável. ━ Eu vou pegar os seus comprimidos. Espera aí.
Ela se levantou da cama em um pulo, colocando-se a caminhar com pressa. Meadow não queria que Finnick sentisse dores nem por um segundo, e saber que ele estava machucado a incomodava de maneiras inimagináveis.
━ Não precisa ━ o vitorioso interrompeu sua ação, sentando-se novamente e segurando um dos braços de Meadow, e ela o encarou. ━ Eu estou bem, Meadow. Já disse que não dói, eu estou aguentando bem.
Meadow o analisou, unindo as sobrancelhas enquanto observava o rosto cansado de Finnick, e foi capaz de ignorar o arrepio em sua pele quando ele a tocou, segurando o ímpeto de puxar o braço de volta. Ela não precisava fazer aquilo, não com ele, e tentava sempre se lembrar daquilo. Com Finnick, ela estava segura.
━ Dói em mim ver você assim ━ ela retrucou, com a voz baixa. ━ E hoje nós vamos encontrar Snow de novo. Não vai ser fácil.
━ É. Vamos reencontrar o homenageado do nome do seu filho ━ ele retrucou, com um sorriso lateral, na tentativa de aliviar um pouco o clima pesado instaurado no quarto.
Com um suspiro, Meadow se aproximou mais da cama, e apoiou as mãos nos ombros de Finnick delicadamente. Ela o observou com cuidado, procurando por qualquer sinal de dor em seu rosto, e subiu uma das mãos para passar pelo cabelo do rapaz. Seu toque era leve e terno, tímido, e Finnick sentia a pele queimar onde os dedos dela esbarravam. Ela não costumava tocá-lo, não sem que estivesse procurando por machucados ou tentando o confortar. Naquele momento, ela parecia tentar confortar a si mesma, forçando-se a acreditar que Finnick estava bem, porque ela não suportava a ideia de vê-lo sofrer.
━ Ninguém mais vai machucar você ━ ela disse, passando uma mão pela bochecha de Finnick, enquanto o admirava com as sobrancelhas juntas, passando alguns segundos com os olhos presos nas leves sardas causadas pelo sol na pele do rapaz. ━ Nem que eu precise me casar com você essa noite. Eu vou virar todos os holofotes para nós dois, e você vai sempre estar em evidência e ninguém vai correr o risco de machucar você ━ Meadow continuou, engolindo em seco, e Finnick apoiou uma mão sobre a sua. ━ Eu não posso permitir. Você é a melhor parte de mim.
Uma das poucas certezas que Meadow tinha era que, sem Finnick, ela não iria prosseguir. Não queria continuar se o perdesse, e por isso, precisava o proteger, porque já havia perdido pessoas demais e não podia deixar nada de ruim acontecer com aquele que era o único capaz de fazê-la sentir algum resquício de felicidade. Meadow não sabia explicar bem o amor que sentia por Finnick; não era como o amor fraternal, mas ela sabia que não era capaz de sentir amor romântico. Era um amor diferente, que transcendia tudo o que ela conhecia. Ele havia se tornado parte dela em algum momento que ela não sabia especificar, e aquele laço não podia ser desfeito.
Ela amava poucas pessoas. Finnick, Cedar e seu pai. Ela gostava de algumas outras. Mas era Finnick quem a fazia querer continuar lutando. Sem ele, nada daquilo fazia sentido; Cedar e River provavelmente estariam melhores sem ela para complicar suas vidas e fazê-los sentir mal. Era Finnick quem a entendia, quem a protegia, e quem gostava dela de verdade, com todos os defeitos e traumas que trazia. Ele era o motivo dela estar ali, menos infeliz e perdida do que até alguns meses antes. Ele a protegia e ela desejava fazer o mesmo, mas no fim, Meadow era como um furacão que destruía tudo por onde passava. Aspen estava morto por sua culpa e Finnick havia sido espancado por ceder à uma de suas ideias.
Ser consumida diariamente pela culpa era doloroso. Ela tentava não se colocar naquela posição, tentava ignorar as vozes que diziam que ela era a raiz de todo o mal, mas não conseguia, porque aquelas vozes eram suas. E se Meadow não podia escapar da culpa, o mínimo que podia fazer era tentar proteger Finnick. Tentar salvá-lo de si mesma. Era quase cômico que a melhor forma de fazer aquilo era se casando com ele.
━ Você é a melhor parte de você, Meadow. Não eu, nem ninguém mais ━ Finnick corrigiu, abraçando sua cintura e descansando a cabeça contra seu abdômen. Ela continuou acariciando seus cabelos, em silêncio, e Finnick fechou os olhos. ━ Tenho sorte de ter você.
Meadow não o afastou. Não se envergonhou. Ela apenas aproveitou o momento de proximidade, o enlace dos braços de Finnick em seu corpo, porque aquilo a fazia ter certeza de que ele estava ali.
━ A última coisa que nós temos é sorte, Finnick.
━ Tem razão. A única coisa que nós temos é um talento admirável para contar mentiras.
━ Se chama criatividade.
E, é claro, tinham um ao outro. Aquilo já estava claro para os dois em cada toque, cada fala, cada olhar. Era uma das poucas certezas que tinham.
Os dois riram baixo por alguns segundos, e então ficaram em silêncio, ainda com os corpos unidos. Depois do beijo ocorrido alguns dias antes, Meadow teve medo de que as coisas entre os dois ficassem estranhas, principalmente porque ela não sabia como agir ou como se sentir. Mas tudo estava bem entre os dois; não tocavam no assunto e nem se preocupavam com aquilo. Não havia a necessidade de colocar complicações no relacionamento que tinham.
━ Falando nisso, Zinnia acabou de tirar minhas medidas de novo, antes que eu viesse até aqui ━ ele contou, e Meadow assentiu. ━ Os jogos estão caminhando, e os preparativos de nosso casamento também, pelo que parece.
Novamente, a conversa se guiava para um assunto sombrio. A arena. Os perigos que os tributos enfrentariam diariamente até que um deles se consagrasse como campeão.
━ Eu não tenho tanta certeza sobre os jogos, Finnick. Estou com medo, estão todos dizendo que não vai demorar até os idealizadores tomarem alguma decisão drástica para movimentar a arena ━ ela disse, agora se sentando ao lado de Finnick na cama, encarando um ponto fixo na parede. ━ E quando isso acontecer, eu não sei o que vai ser de Sylvia e nem de Mervyn, eles não vão durar muito quando estiverem juntos dos outros tributos e… ━ a garota continuou dizendo, com os pensamentos escalando rapidamente para imagens brutais que vinham sem sua permissão. ━ Se eles não vão viver, eu queria que pudessem morrer como Sapphire. Ela se foi sem demora, sem sofrimento. Não existe essa opção na arena.
Ela estava cansada de se sentir impotente. Não importavam seus esforços, não havia uma forma de fazer com que uma das crianças às quais ela havia se apegado e por quem ela se sentia responsável pudesse sair vitoriosa da arena. Ela já havia perdido Aspen lá dentro, e em breve, perderia Sylvia e Mervyn. Meadow não conseguia salvar nenhuma das pessoas com quem se importava e aquilo a destruía por dentro.
Finnick era a única pessoa que conseguia proteger, ao menos um pouco. Finnick, que também já havia sofrido o bastante por sua culpa. Ela fracassava em tudo o que tentava fazer. Não salvava as pessoas que devia proteger. Meadow não entendia por quê era chamada de vitoriosa, se as derrotas eram os acontecimentos mais presentes, constantes e marcantes em sua vida.
Tudo o que ela precisava era de uma ideia que desse certo. Uma ideia que funcionasse, para que conseguisse garantir a sobrevivência de suas crianças na arena. E quando ela mais precisava, todas as ideias fugiam de sua mente.
━ Eu vi nas costas de Hayden quantos tributos ele perdeu. Ele não conseguiu salvar nenhum ━ ela continuou dizendo, após engolir em seco. ━ Se ele não pôde fazer isso, eu também não vou conseguir.
Finnick queria poder dizer a ela que ela não devia pensar daquela forma, que ela tinha uma chance e que tudo se tratava de estatísticas que podiam ser contrariadas, mas aquilo seria crueldade. Dar a ela esperanças que provavelmente seriam destruídas de forma drástica em alguns dias era maldade. Falar a verdade também não era muito melhor; era tão doloroso quanto a primeira opção, mas ainda era a melhor a se escolher.
━ Você entende que todos temos péssimas chances, não entende? Cada um de nós tem uma chance de vitória entre vinte e quatro. E cada um de nós tem vinte e três chances de derrota ━ ele falou, sob o olhar atento dela, e tentou manter a voz o mais gentil possível enquanto seguia falando. ━ Eu sei que é terrível, mas acho que precisa começar a se preparar para o pior. Você precisa começar a ficar em paz consigo mesma para não enlouquecer quando a hora da despedida chegar, Meadow. É o que eu estou tentando fazer sobre Annie. Não é fácil aceitar esse pensamento, mas eu sei que, no momento em que eles saírem da caverna, ela não vai durar muito tempo, não quando os outros tributos a encontrarem.
Ele odiava momentos como aquele. Odiava ter que agir de forma fria sobre assuntos tão sensíveis. Odiava o olhar quase assustado que Meadow o lançava toda vez que ele falava sobre aceitar que a crueldade aconteceria de uma forma ou de outra.
E Meadow odiava o fato de que estava começando a pensar da mesma forma. Ela sabia que não podia salvar todos, mas agora, encarava a verdade: não podia salvar nenhum deles. Aquele poder estava distante de suas mãos e de suas mentiras.
━ Eu estou cansada de tudo isso. De não poder salvar ninguém.
━ Todos nós estamos ━ ele concordou. ━ Só podemos salvar a nós mesmos, no fim das contas.
Mas Meadow era teimosa demais para aceitar até mesmo a verdade. Quando ela e Finnick se arrumaram para descer e encontrar os outros mentores, sua mente ainda estava presa na construção de planos, dos quais a maioria não daria certo. Planos para tirar seus tributos da arena. Planos que não passavam de delírios desesperados.
No saguão, a maior parte dos mentores já estava reunida, aguardando para saber o que deveriam fazer a seguir; se iriam novamente para a central dos mentores, ou se deveriam permanecer por ali e aguardar pela chegada de Snow. Ela imaginou que fosse a segunda opção, porque alguns dos homens que estavam ali presentes não se tratavam de vitoriosos; eram idealizadores dos jogos, ela se lembrava de seus rostos por vê-los em festas da Capital, geralmente ao lado do presidente.
━ Me dê sua mão ━ Finnick pediu com a voz baixa, e ela não demorou a fazer como o solicitado. ━ Você está derretendo, cubo de açúcar.
━ Estou suando frio ━ ela murmurou de volta, percorrendo os olhos pelos idealizadores que estavam por ali, entretendo-se em conversas com alguns vitoriosos, que forçavam risadas e tocavam em seus braços, na tentativa de os agradar e talvez conseguir privilégios discretos para seus tributos. ━ Onde será que ele está?
━ Ensaiando as falas no banheiro ━ ele retrucou, agora com o rosto próximo ao seu enquanto falava em seu ouvido. ━ Tente não parecer muito nervosa.
━ Uma mulher morreu, não podemos parecer felizes demais ━ Meadow pontuou, unindo as sobrancelhas. ━ Olha, benzinho, eu sei que preciso parecer feliz e apaixonada, mas nós precisamos saber a hora certa. Agora estamos de luto por Sapphire.
━ Você é tão inteligente ━ ele elogiou, num tom de brincadeira que era apenas o suficiente para irritar Meadow, mas passava longe de fazer parecer que estava sendo sarcástico. Então, ele colocou a mão livre em uma das bochechas de Meadow, observando seu rosto com um sorriso mínimo. ━ Estamos tristes, mas ainda somos o casal mais apaixonado de Panem. Estou consolando você.
━ Estou começando a achar que você é quem fica procurando motivos para ficar assim, tão próximo do meu rosto ━ ela resmungou, vendo Finnick abrir um sorriso sem tentar disfarçar. ━ Sério, tente parecer menos feliz. Não estão nos filmando.
O sorriso de Finnick diminuiu, mas permaneceu ali. Ele correu os olhos pelo local, vendo que havia atraído a atenção de alguns dos colegas e idealizadores. Então, voltou a encarar Meadow.
━ Quer dar um beijinho? Todos estão olhando.
━ Você é ridículo.
━ Isso é um não?
━ Isso é um “Você é ridículo” ━ ela levantou as sobrancelhas, ouvindo a risada rouca de Finnick preencher seus ouvidos. Então, ela franziu o cenho, vendo por cima dos ombros de Finnick enquanto Hayden e Mags conversavam com um dos idealizadores, olhando atentamente para os dois. ━ O que eles estão falando com aquele cara?
Finnick a abraçou pela cintura, movimentando os pés lentamente para que girassem e trocassem de posição, de forma que ele pudesse estar direcionado para Hayden e Mags.
━ Estão conversando com Plutarch Heavensbee ━ disse, unindo as sobrancelhas, e segurou o rosto de Meadow quando ela fez menção de se virar para eles novamente. ━ Não olhe agora. Vão achar que estamos fazendo um show especialmente para eles.
Então, os dois permaneceram ali por mais alguns minutos, ocupando praticamente o mesmo espaço enquanto trocavam carícias e sorrisos, sempre com os olhos movendo-se discretamente pela sala para terem certeza de que eram notados. Não haviam câmeras por perto, mas aquele era o ponto: fazer as pessoas acreditarem que era algo real. Quando o presidente Snow entrou pela porta da frente, com pacificadores a sua disposição, um silêncio mortífero reinou no local. Os olhares ferozes que os vitoriosos o lançaram de primeira foram rapidamente substituídos por sorrisos cordiais, disfarçando o desprezo que sentiam pelo homem culpado por todo o sofrimento.
Meadow e Finnick se distanciaram um pouco, mas permaneceram de mãos dadas. O presidente Snow sorriu, mas o sorriso nunca chegou até seus olhos, que estudaram minuciosamente cada um dos mentores que estavam presentes ali, levando um tempo maior em Meadow e Finnick, que o cumprimentou com um simples aceno de cabeça. A garota apertou sua mão levemente, respirando fundo. Era incrível a forma com que Finnick, após o que havia passado naquela semana, conseguisse se manter mais calmo do que ela naquela situação.
Snow não disse nada após isso, aguardando para que as câmeras e outros equipamentos de filmagem fossem posicionados para que ele pudesse dar início ao seu show de misericórdia.
━ Aí estão os pombinhos ━ uma voz os fez se virarem levemente para o lado, encontrando Plutarch Heavensbee se aproximando dos dois. ━ Imagino que estejam nervosos, deve estar sendo difícil para vocês, não é? Digo, ter uma colega morrendo tão perto, tão de repente…
━ É verdade, estamos todos muito tristes pelo que aconteceu com Sapphire ━ Finnick falou, enquanto Meadow apenas concordou com a cabeça.
━ Claro ━ Plutarch disse, balançando a cabeça positivamente, antes de pousar os olhos sobre Meadow. ━ Pobrezinha. Deve ter sido um susto e tanto para você, espero que esteja tudo bem.
Em dúvida, ela olhou para Finnick. Por que a morte de Sapphire seria pior para ela do que para os outros? As duas nem ao menos eram do mesmo distrito. Antes que ela pudesse falar alguma coisa, no entanto, Hayden surgiu ao seu lado, passando um dos braços carinhosamente por seus ombros antes de apoiar a mão livre sobre sua barriga, fazendo-a arregalar os olhos.
━ Foi um susto e tanto, eu fiquei preocupado pelo bebê. Meadow certamente não precisava estar na sala naquela hora, foi horrível ━ ele disse, rapidamente, e Meadow o encarou em silêncio, perdendo a fala enquanto tentava compreender o que ele estava fazendo ali. ━ Todos nós tememos muito por mulheres grávidas. Especialmente nossa Meadow, que pode estar gerando o pequeno Coriolanus.
Finnick parecia tão perdido quanto ela, mas logo embarcou na história quando Mags o abraçou de lado, apertando levemente sua cintura. Limpando a garganta, ele afastou disfarçadamente a mão de Hayden da barriga de Meadow, sabendo que aquilo devia estar a assustando e tirando seu conforto. Então, posicionou a própria mão ali, antes de dar um beijo no topo da cabeça da garota.
━ Vocês… Vocês contaram a ele sobre o bebê?
Nem mesmo Finnick sabia de que droga de bebê eles estavam falando e muito menos de onde aquela história ridícula havia surgido, mas se Mags estava envolvida, ele certamente deveria seguir o teatro.
━ Ah não, não precisam se chatear com Hayden e Mags. Foram os outros mentores, na verdade. Alguns mencionaram que Meadow se ausentou algumas vezes na manhã de hoje, sentindo enjoo, e eu uni os pontos. Não foi tão difícil. Jovens apaixonados, vivendo juntos, com o casamento cada vez mais próximo ━ Plutarch explicou, abrindo um sorriso que variava entre acolhedor e predador. ━ Só fui até os dois para que pudessem confirmar ou negar minhas suspeitas.
Meadow abriu e fechou a boca algumas vezes, procurando algo para dizer após descobrir que, aparentemente, ela estava grávida.
━ Não queríamos que isso viesse a público ainda. A gravidez ainda está muito no início, gostaríamos de manter em segredo até que fosse mais seguro contar sobre isso ━ ela explicou, mordendo as bochechas por dentro enquanto Finnick acariciava sua barriga. Então, forçou uma risada. ━ Mas acho que Hayden não foi capaz de segurar a língua, não é?
━ Ah, você precisa me entender, Meadow… Eu estava preocupado com meu afilhado!
Afilhado? Hayden agora estava se auto intitulando padrinho do bebê inexistente? Se Meadow tivesse um filho, ela gostaria de ter uma ordem de restrição que impedisse aquele homem de estar a menos de cinquenta metros de distância da criança.
Mags tossiu, e disse com um pouco de dificuldade:
━ Ou afilhada.
━ Já estão todos sabendo? ━ Meadow perguntou, curiosa, e Plutarch tombou a cabeça levemente para o lado, assentindo.
━ Me desculpem por isso. Tive que contar ao presidente Snow. Perdemos Sapphire, mas agora podemos anunciar que a família de Panem vai ganhar um novo integrante. O bebê mais aguardado pela população.
Aquilo só podia ser um pesadelo. Meadow estava grávida e era a última a saber. O que as pessoas diriam quando os meses se passassem e sua barriga não crescesse nem um centímetro? E dali a nove meses, quando nenhum bebê estivesse entre eles? Que plano estúpido Hayden havia tido. Ela queria torcer seu pescoço, e Meadow não costumava ter pensamentos violentos. Ao menos, agora podia culpar seus hormônios da gravidez.
━ É arriscado anunciar uma gravidez tão no início ━ Finnick se pronunciou, sentindo um gosto amargo na boca enquanto comprimia os lábios numa linha fina. ━ Não queremos decepcionar ninguém.
━ Bom, nós faremos de tudo para que Meadow tenha uma gestação segura e saudável ━ assegurou o idealizador, levantando as sobrancelhas enquanto um sorriso dominava seus lábios. ━ Mas teremos que adiantar o casamento, acredito eu. É possível que Meadow não entre no vestido daqui a alguns meses.
Todos eles encontraram a mesma saída: forçar uma risada, enquanto assentiram em concordância com Heavensbee, todos muito felizes e preocupados com o bebê de Meadow. Por fim, o homem se afastou novamente, deixando os quatro sozinhos. Meadow olhou para Hayden.
━ Você realmente acha que seria padrinho do meu filho? ━ foi a primeira pergunta que conseguiu fazer, antes de focar no verdadeiro problema: ━ E de onde saiu esse bebê?! Vocês ficaram loucos!
━ Você sabe como os bebês são feitos, eu não vou explicar isso. E o seu nem existe. Que mal faz eu ser padrinho dele?
━ Por que, de repente, Meadow ficou grávida? Podemos saber? Nós somos os pais do bebê imaginário e acho que temos esse direito ━ Finnick se pronunciou, puxando Meadow para um canto e sendo seguido por Mags e Hayden.
Após se certificar de que ninguém estava prestando atenção, Hayden disse:
━ Precisamos de patrocinadores que mandem coisas úteis de verdade. E precisamos que os idealizadores não expulsem os nossos tributos da caverna e os entreguem diretamente à morte ━ ele praticamente sussurrou. ━ Ninguém vai querer fazer isso com Meadow enquanto ela passa por uma gravidez. Nossos tributos vão ter mais tempo.
━ E você não pensou que alguém pode estranhar quando não tiver nenhum bebê daqui a alguns meses?
━ Vocês passam o dia todo enfurnados em um quarto. Usem o tempo para fazer um de verdade e ninguém vai descobrir que mentimos.
Nessa hora, Mags precisou segurar Finnick, que avançou em direção a Hayden rapidamente, enquanto o mais velho deu um passo para trás, levantando as mãos em frente ao corpo enquanto pedia calma. Havia certa ira nos olhos de Finnick; toda aquela mentira era ridícula, e a sugestão de Hayden foi provavelmente a coisa mais nojenta e desrespeitosa que ele já havia ouvido em anos. Hayden havia tocado em um assunto mais do que sensível para ele, que temia colocar filhos naquele mundo mais do que temia qualquer outra coisa na vida.
Hayden sabia sobre as coisas que os dois haviam passado, todos sabiam. Ele também sabia o que sempre ocorria com filhos de vitoriosos: eles terminavam na arena. Então, ele deveria saber que sugerir que ele e Meadow fizessem um bebê para acobertar sua mentira era algo simplesmente horrível, para além de cruel. Hayden via Meadow se contorcer sempre que alguém a tocava. Ele a viu tremer no elevador quando ele tirou a camisa para mostrar as tatuagens de suas costas. Ele sabia de tudo aquilo.
━ Eles vão ter mais… Mais cuidados com vocês dois agora ━ Mags disse, desviando a atenção de Hayden para tentar acalmar Finnick. A mulher tossiu algumas vezes, com dificuldade para falar, e continuou: ━ Podem dizer que ela perdeu o bebê daqui a algum tempo, querido. Só nos aproveitamos da fofoca que os outros criaram. Foi nossa melhor opção.
Meadow a encarou.
━ Ninguém nunca considera ficar calado uma opção?
━ Talvez se cortarem minha língua eu passe a considerar ━ Hayden retrucou, e Finnick uniu as sobrancelhas.
━ Torça para eu não encontrar uma tesoura.
━ É melhor você melhorar esse seu mau humor, Odair. Você vai ser papai.
Balançando a cabeça negativamente, Meadow puxou Finnick para longe dos dois, sabendo o quanto toda aquela ideia o incomodava. O pensamento de ter filhos provavelmente o afetava muito mais do que fazia com ela, ela já havia percebido, e enquanto se afastavam, ela descansou uma mão sobre o ventre, tentando não se esquecer de que, além de tudo, ela agora estava grávida.
Finnick a encarou, e ela soltou um suspiro, antes de descansar a cabeça em um de seus ombros, vendo que os equipamentos de filmagens estavam quase prontos.
━ Mags sabe do que aconteceu com você ━ ela concluiu, e Finnick não respondeu. ━ Ela sabe, porque disse que essa gravidez vai proteger nós dois.
━ Claro, a gravidez vai nos proteger enquanto acreditarem que ela é real.
━ É o bastante. Vai adiantar nosso casamento e então eu vou perder o bebê. É uma gravidez de risco e toda a Capital vai ficar triste por nós dois ━ ela começou a maquinar outro plano, tentando ver o lado positivo da mentira contada por Hayden e Mags. ━ A partir daí, vamos viver dizendo que estamos tentando engravidar e isso vai ser o suficiente para nos garantir segurança.
Seu potencial para criar mentiras era algo a se admirar. Finnick achava absurda a capacidade que Meadow tinha de criar diversos cenários que pudessem a manter segura com uma simples mentira. Daquela vez, ele se surpreendeu ainda mais, porque ela estava fazendo aquilo com uma mentira criada por outra pessoa sem seu conhecimento.
━ Eles não deveriam ter feito isso.
━ Bom, eu não espero muita coisa de Hayden. Mas se Mags achou uma boa ideia fazer isso, Finnick, então acredito que não foi por mal. Eles nos colocaram numa situação difícil, mas pode ser que eles estejam certos e isso possa ajudar nossos tributos.
A verdade era que Meadow tentava se agarrar à qualquer possível chance de salvar Sylvia e Mervyn. Se aquela era uma dessas chances, ela estava de acordo em entrar no jogo, não que ela tivesse uma verdadeira opção, em vista que foi a última a descobrir sobre a própria gravidez.
━ Agora você é uma otimista?
━ Não. Agora eu sou uma mulher grávida.
Ele riu pelo nariz, ainda contrariado, e logo os dois tiveram de ficar em silêncio para dar início à transmissão ao vivo para toda Panem. Finnick não conseguiu focar bem nas palavras que Snow vocalizou no início de seu discurso ou na forma que o presidente cumprimentou a população. Dividido entre estar enojado pela presença de Coriolanus e o sentimento de incômodo causado pela necessidade de fingir que Meadow estava à espera de um filho seu, o rapaz não era capaz de ouvir uma única palavra que deixava a boca do presidente.
━ É com muita tristeza que anunciamos o falecimento de Sapphire Rendwick, vencedora da vigésima terceira edição dos Jogos Vorazes. Ela acumulava muitos admiradores ao longo de sua trajetória ━ quando o presidente mencionou o nome da colega, Finnick conseguiu prestar atenção, interessado em como o assunto seria tratado, sem ter dúvidas de que seria de forma desprezível. ━ Sapphire morreu de forma pacífica, e um de seus últimos desejos foi que não deixássemos seu tributo desamparado. Por isso, para honrar uma de suas últimas vontades e para que o jogo possa continuar, uma nova mentora para o tributo de Sapphire está a caminho da Capital neste momento. Tulip Kerch chegará pela manhã, assumindo o trabalho de Sapphire.
Foi ainda pior do que Finnick pensou que seria. Ele duvidava muito que Sapphire tivesse dito algo sobre os Jogos Vorazes em seus últimos desejos. Não, ela não disse nada; ele estava lá e viu. Sapphire apenas se foi, sem pedidos, sem desejos, sem segredos revelados. E ali estava Snow, criando toda uma história, como se a mulher tivesse tido tempo para se despedir do mundo com direito a últimas vontades e coisas parecidas com aquilo.
━ Mas, no mesmo dia que anuncio a perda de uma de nossas vitoriosas, querida por toda Panem, faço também outro anúncio ━ Snow voltou a falar, e Meadow sentiu o coração acelerar em seu peito. Ela apertou fortemente a mão de Finnick, que assim como a dela, suava. ━ Um anúncio feliz, dessa vez. Tenho certeza que trará a alegria necessária para confortar seus corações. Hoje, perdemos Sapphire, mas ganhamos uma ótima notícia, especialmente para aqueles que admiram um de nossos casais preferidos ━ o presidente continuou, abrindo um sorriso, e os olhares de todos os presentes já começavam a se direcionar para Meadow e Finnick. ━ Meadow Selcouth, a campeã da última edição dos Jogos Vorazes, está à espera de seu primeiro filho, e é claro, Finnick Odair será pai. O primeiro fruto do amor de dois de nossos vitoriosos. E que venham muitos outros pela frente!
Meadow se obrigou a sorrir, ajeitando a postura enquanto se aproximava das câmeras com Finnick, que também sorriu, acostumado com a exposição. Quando se aproximaram o suficiente, Snow se virou para os dois, lançando um olhar tão afiado quanto uma flecha para o casal.
━ Devo os parabenizar. Um filho, que coisa maravilhosa, especialmente em tempos como estes ━ ele continuou seu teatro para as câmeras. ━ Tenho certeza que devem estar muito felizes em anunciar isso.
━ Bom, nós planejávamos esperar mais um pouco para contar ━ Finnick respondeu, abraçando a lateral do corpo de Meadow, que sorria gentilmente. ━ Mas pensamos que seria bom trazer um pouco de alegria a Panem depois das notícias de hoje.
━ Sabemos o carinho que Panem tem por nós dois, presidente Snow. Que bom foi poder retribuir esse carinho, pelo menos um pouco, e compartilhar essa notícia com o povo. Sei que eles ficarão tão ansiosos pela chegada de nosso filho como Finnick e eu estamos nesse momento ━ foi a vez de Meadow dizer, descansando ambas as mãos sobre a barriga, olhando ternamente para Finnick. ━ Estamos um pouco nervosos, claro, ainda somos muito jovens. Mas essa criança foi tão esperada por nós dois, e vai ser tão amada.
Snow a encarou por um breve momento, semicerrando os olhos, sem que o sorriso abandonasse seu rosto por um só segundo.
━ Claro. Não restam dúvidas disso, Meadow ━ ele falou, estendendo a mão para parabenizar os dois com um aperto. Então, por um breve segundo, tocou a barriga da garota, fazendo-a gelar no lugar. ━ Torço para que seja um menino.
━ O pequeno Coriolanus ━ Finnick sorriu, e Snow assentiu, soltando uma risada cordial.
━ Isso mesmo. O pequeno Coriolanus ━ ele repetiu, com o sorriso diminuindo aos poucos. ━ Novamente, meus parabéns aos dois. Mal podemos esperar para conhecer o bebê.
Eles agradeceram e se distanciaram, enquanto o presidente falou suas considerações finais, se despediu da população e foi embora novamente. Meadow não sabia dizer se ele estava acreditando ou não na gravidez, mas sabia que ele torcia para que fosse mentira. Torcia para que, em breve, pudesse desmascarar Meadow e a castigar por enganar a todos.
Eles não a deixariam em paz. Sua gravidez, assim como seu casamento, seriam o entretenimento do povo e ela certamente precisaria fazer visitas esporádicas à Capital para passar por exames. Era provável que em breve houvessem apostas sobre o peso que seu bebê nasceria, que nome receberia, a data que chegaria ao mundo.
Foi quando ela percebeu que lidar com uma gravidez na Capital era muito diferente do Distrito 8. Não havia consultas médicas lá, a não ser para os ricos que podiam pagar. Não havia como saber se o bebê seria um menino ou uma menina e nem se estava saudável até o nascimento. Na Capital, por outro lado, Meadow imaginava que existiam todas aquelas tecnologias e outras mais avançadas e, se fosse o caso, sua mentira seria descoberta em questão de semanas.
Os vitoriosos começaram a se dispersar, retornando para seus quartos. Alguns desejaram felicidade e saúde para Meadow e o bebê no caminho, enquanto outros pareciam não acreditar na história. Restavam poucos mentores por ali quando Hayden Sage fez menção de entrar no elevador, sendo rapidamente puxado por Meadow, que o agarrou pelo colarinho da camisa e deu um tapa forte em seu rosto, antes de voltar a segurá-lo pelo tecido. Finnick arregalou os olhos, mas não tentou a impedir por um só segundo; aquela era apenas a segunda vez que ele a via fazer algo violento, ainda incomparável com as brutalidades que ele e Hayden haviam feito na arena. A última vez em que Meadow havia tido uma reação como aquela foi quando descobriu que seria vendida para a Capital.
━ Você quer me matar? ━ ela indagou, com a voz baixa e os olhos desesperados, enquanto Hayden levava uma mão até a bochecha atingida. Mags se aproximou, tentando puxar Meadow pela cintura, e Finnick apenas observou de braços cruzados, sem desejar questionar. ━ Eles vão supervisionar a gravidez de perto. Você é idiota, mas não é burro, Hayden, você sabe que eles vão descobrir.
━ Você sabe como resolver a mentira. Faça ela se tornar verdade ━ Hayden respondeu, e Meadow mordeu o lábio inferior, enquanto o mais velho olhou para Finnick. ━ Você já sabe o que fazer, não sabe?
Meadow o chutou entre as pernas antes que o noivo pudesse retrucar. Finnick e Mags arregalaram ainda mais os olhos quando Hayden caiu de joelhos no chão, sentindo dor enquanto seu rosto ficava vermelho e ele soltava gemidos. Desde o primeiro tapa, todos estavam em choque, afinal Meadow nunca foi violenta. Mas todos sabiam que em algum momento ela iria explodir, e aquilo finalmente aconteceu.
━ Eles vão querer me examinar em questão de dias, e eu não vou estar grávida ━ ela falou, agora com lágrimas se formando nos olhos, e encarou Hayden com desprezo. ━ Você vai me matar e vai matar nossos tributos também. Nós não estamos na droga do Distrito 8, eles têm máquinas aqui! Eles têm pessoas especializadas, médicos, tudo! Tudo para que essa farsa não dure ━ Meadow continuou, afastando-se de Hayden para apertar os botões para chamar o elevador, que havia subido novamente. ━ E você trata tudo isso como uma piada. Espero que esse chute te impossibilite de ter filhos.
━ Deus ouça suas preces ━ Hayden retrucou, entre gemidos de dor, tentando se levantar. ━ É assim que você trata o padrinho do seu filho?
━ Eu não deixaria você ser o padrinho se eu adotasse um verme.
Quando o elevador chegou, Finnick apoiou uma das mãos nas costas de Meadow e a empurrou levemente para dentro, balançando a cabeça negativamente para Mags quando ela olhou para os dois, fazendo menção de se unir a eles no cubículo. Ele temia que Meadow lembrasse que a senhora também estava envolvida naquela mentira e fizesse algo parecido com o que fez com Hayden.
Quando a porta se fechou, ele se virou para Meadow, que agora estava tensa e assustada. Ele não a julgaria por ter estapeado e chutado Hayden; não era algo de seu feitio, mas ela fez o que ele tentou fazer minutos antes e foi impedido.
━ Você muda de opinião rápido.
━ Eu não mudei de opinião. Eu só percebi os riscos ━ ela retrucou, brincando com os dedos para afastar a ansiedade. ━ Tudo mudou quando vi Snow falando sobre a gravidez. Ele quer que seja verdade tanto quanto nós dois.
Finnick suspirou, descansando a cabeça em uma das paredes geladas e fechando os olhos.
━ Como a gente disse mais cedo, é arriscado anunciar uma gravidez logo no início. É a fase mais sensível ━ ele lembrou, tentando ser prestativo. ━ Vamos falar que você perdeu. Pronto.
Ele não obteve uma resposta de Meadow. Naquele momento, nem um dos dois estava apto para consolar ou aconselhar o outro; estavam absortos demais nos próprios pensamentos e nas próprias preocupações, que haviam se triplicado na última hora. Os papéis haviam se invertido, e agora era a garota que estava preocupada com toda a situação envolvendo a falsa gravidez, enquanto Finnick se agarrava à possibilidade de que Mags sabia o que estava fazendo quando se uniu àquela mentira.
A porta do elevador voltou a se abrir quando ambos chegaram ao andar de seus quartos. Eles caminharam pelo corredor em silêncio, e quando pararam em frente ao quarto de Meadow, Finnick tomou a chave de sua mão ao ver o quão trêmula ela estava, destrancando o quarto em seu lugar e entrando após ela fazer o mesmo, indo diretamente até o banheiro para tomar um. banho e, esperançosamente, afastar aqueles pensamentos da cabeça. Talvez ela estivesse exagerando; a invenção de uma gravidez não era, nem de longe, a pior coisa que havia acontecido em sua vida na Capital. No entanto, era algo que havia fugido completamente de seu controle, e não saber quando aquilo iria desmoronar a aterrorizava. Ela pensou no assunto enquanto a água caía sobre seu corpo, e de todos os ângulos que observava o problema, ele parecia horrível.
Se descobrissem que era uma mentira seria seu fim. Se ela falasse que perdeu o bebê tão cedo, seria uma grande decepção e as pessoas a odiariam do mesmo jeito, e aquilo era algo que ela não podia permitir, porque aquela era apenas a sua primeira vez como mentora dos Jogos Vorazes, e ela precisava assegurar que tinha o carinho da população para que seus próximos e azarados tributos tivessem, ao menos, alimento para durar alguns dias na arena. Quais seriam as consequências enfrentadas na vida pessoal por decepcionar o povo da Capital? Ela não gostava nem de pensar. Quando Meadow saiu do banho, não conseguia pensar direito em nada. Vestiu o roupão de banho, percebendo que não havia levado uma nova muda de roupas, e retornou ao quarto com o olhar vazio e em silêncio, encontrando Finnick folheando uma revista encontrada por ali.
━ Vamos ficar bem, Meadow ━ ele afirmou, vendo o estado catatonico da garota. ━ Nós vamos sair dessa, assim como já saímos de problemas piores. Confie em mim.
Ele também não era um fã daquela mentira, claro que não, mas precisava acreditar que iriam se safar daquela. Talvez não sem consequências, mas ainda assim, quando Meadow não conseguia se manter forte, ele precisava fazer aquilo por ela, assim como ela fazia por ele quando era necessário.
Meadow continuou de pé, encarando um ponto fixo na parede, sem demonstrar reações. Finnick uniu as sobrancelhas, aproximando-se dela e segurando seus ombros gentilmente. Ela o olhou após alguns segundos, encontrando a preocupação em seu rosto.
━ Escute, eu vou sair para você se vestir, tudo bem? ━ ele falou, sem obter resposta, e continuou: ━ Vou voltar em alguns minutos, com alguma coisa para você comer.
Devagar, ela balançou a cabeça em concordância, vendo Finnick se afastar aos poucos. Quando ele já estava alcançando a porta, batidas foram ouvidas do lado de fora, e ele olhou para Meadow, estranhando a situação. Com cuidado para não revelar o quarto por completo e a garota coberta pelo roupão, Odair abriu a porta apenas o suficiente para encontrar a figura de um pacificador, que o encarou por um breve segundo, antes de dizer o que fazia ali:
━ Temos ordens de retornar com Meadow para o Distrito 4.
Finnick comprimiu os lábios em uma linha fina, olhando para a garota por cima dos ombros, certificando-se de que ela não estava ouvindo a conversa.
━ Como é que é?
━ Ela vai retornar para o Distrito 4 ━ o pacificador repetiu, aumentando a raiva de Finnick. ━ Para não ficar exposta ao estresse de ser mentora durante os Jogos Vorazes. Todo o cuidado com sua gravidez é pouco ━ ele continuou, e então finalizou sua fala: ━ Cecelia virá do Distrito 8 para substituí-la.
━ E… E por que não mandar Meadow para o Distrito 8, que é onde a família dela está? ━ ele indagou, sabendo que não adiantaria nada discutir e implorar pela permanência de Meadow na Capital.
━ Porque ela vive no Distrito 4 agora. É como as coisas funcionam.
Respirando fundo, Finnick assentiu, tentando manter a calma enquanto pensava em como Meadow iria reagir diante da notícia. Ele limpou a garganta, antes de responder brevemente:
━ Ela acabou de sair do banho. Vamos arrumar as coisas dela e descer em breve.
O pacificador assentiu, e Finnick fechou a porta cuidadosamente. Ele sabia que toda aquela história de gravidez seria mais difícil para Meadow, afinal, era ela quem estava grávida. Mas não imaginava que as complicações começariam tão rápido assim; não fazia nem uma hora completa desde que tudo havia acontecido, e eles já queriam despachá-la dali com a desculpa de mantê-la sã para dar continuidade à gravidez.
Meadow estava certa quando disse que Snow torcia para ser uma mentira. Ele queria a castigar e aquela era a primeira forma de fazer aquilo: mandando-a para um distrito que não era o seu, longe de Finnick e de sua família. Seria difícil contar aquilo a ela, mas ele não tinha tempo para perder. O trem sairia em breve e ela precisava embarcar.
━ Meadow ━ ele chamou, com cuidado, e ela o olhou, ainda em silêncio. ━ Você pode me responder? Com suas palavras?
━ Posso ━ ela resmungou, sem se esforçar muito para formar uma frase.
━ Certo. Eu preciso que você me escute com atenção. Você vai embarcar no trem em alguns minutos e precisamos arrumar as suas malas ━ ele contou, mantendo a calma, e a viu arregalar os olhos, começando a se agitar. Finnick segurou seus braços, mantendo-a no lugar, e continuou: ━ Você vai para o Distrito 4, porque é onde você mora agora. Eu sei que é horrível, você vai ficar sozinha lá. Mas não podemos fazer nada. Eu vou voltar em breve, não vai ser muito tempo. Tudo bem?
━ Tudo bem? ━ ela repetiu, quase num sussurro. ━ Finnick, eu preciso ficar. Preciso ajudar Sylvia, preciso cuidar das minhas responsabilidades.
━ Cecelia está vindo substituir você. Eles acham que você não deve se estressar com todas as responsabilidades que ser uma mentora envolve estando grávida de poucas semanas ━ o rapaz explicou, vendo-a unir as sobrancelhas. ━ Vamos começar a arrumar as suas coisas, certo? Você consegue se vestir?
Ela assentiu devagar, levantando-se da cama após Finnick soltar seus braços, e caminhou até o guarda-roupas enquanto um nó se formava em sua garganta ao mero pensamento de abandonar tudo o que havia iniciado ali. Até algumas semanas antes daquela noite, ela ficaria feliz de ceder sua vaga para Cecelia, mas agora, Meadow já se sentia responsável por Sylvia e Mervyn e havia se apegado às crianças. Ela tinha a necessidade de estar ali, lutando para salvá-las, e aquilo estava sendo arrancado dela em função da proteção de uma criança que não existia de verdade.
Um soluço emergiu de sua garganta quando ela selecionou as roupas que vestiria durante a viagem de trem, chamando a atenção de Finnick, que se virou para ela preocupado. Ele se aproximou, apoiando suas mãos nos ombros da garota por trás, e murmurou algumas palavras tranquilizantes em seu ouvido, tentando fazê-la sentir melhor. Ela se desvencilhou de seu toque, balançando a cabeça negativamente enquanto começava a jogar as roupas organizadas sobre a cama, para que em breve as colocasse na mala.
Quando jogou o último par, ela se ajoelhou ao lado da beirada da cama, perdendo as forças para ficar de pé, e apoiou a testa no colchão enquanto chorava para si mesma. A cada soluço ouvido, o coração de Finnick se partia um pouco mais, mas ele sabia que não havia nada a ser feito para reverter aquela situação. Se Meadow se negasse a ir embora, tudo seria ainda pior.
━ Meadow, me escute ━ ele pediu, ajoelhando-se ao lado dela e limpando suas lágrimas com a ponta dos polegares. ━ Nós vamos cuidar dos garotos. Eu, Cecelia e Hayden. Vamos fazer de tudo para os apoiar. Tudo que você faria. Sei que Hayden é um idiota, mas ele não faria nada para machucar aqueles dois. Você vai ter que confiar na gente.
Meadow escondeu o rosto nas mãos, balançando a cabeça negativamente. Não era a mesma coisa. Ela precisava estar ali para ajudar Sylvia. Sylvia era sua responsabilidade, era ela quem a conhecia e quem havia prometido fazer de tudo para salvá-la. Era ela quem pediria desculpas aos seus pais caso aquilo não fosse possível. Era ela quem nunca se perdoaria caso algo ruim acontecesse à garotinha que confiava nela e em seus conselhos durante sua ausência. Dentro da arena, Sylvia ainda estaria acreditando que era Meadow a enviando comida e lutando por sua sobrevivência do lado de fora.
Finnick entendia seu sofrimento, mas ele também entendia que o trem não iria esperar por Meadow. Ela precisava se reerguer e enfrentar aquele problema para evitar a criação de outros. Ele se levantou primeiro, antes de puxar o corpo da garota para cima com delicadeza, ajudando-a ficar de pé, e então a virou lentamente para o encarar. Agora mais gentil e cuidadoso do que nunca, ele apoiou as mãos sobre as cordas de seu roupão, olhando para Meadow.
━ Escute, eu sei que é difícil. É difícil, mas você precisa ir ━ ele disse, com a voz baixa, e ela o encarou com os olhos vermelhos pelas lágrimas. Finnick comprimiu os lábios numa linha fina. ━ Eu vou desfazer o laço, tudo bem? Vou ajudar você a se vestir. Você me permite?
Ele sabia que, dados os acontecimentos do passado de Meadow após sua saída da arena, aquilo seria um desconforto. E Finnick jamais teria intenções parecidas com as das pessoas que machucaram Meadow profundamente nas noites festivas da Capital, e nunca a olharia da mesma forma que seus clientes fizeram no passado, mas sabia que aquilo não iria tornar nada menos difícil para a garota. Mas Meadow assentiu lentamente em concordância, sabendo que não estava em condições de fazer nada daquilo sozinha, porque sabia que, se havia uma pessoa que nunca faria nada parecido com as coisas que ela havia passado na Capital, esse alguém era Finnick.
Engolindo em seco, Finnick desistiu de desatar o laço do roupão de Meadow, pensando em uma forma menos invasiva e desconfortável para a garota de ajudá-la. Ele se ajoelhou em frente à ela, pegando sua roupa debaixo e uma calça, e as passou pelas pernas da garota com cuidado para que seu roupão não saísse do lugar e Meadow não ficasse completamente exposta. Não era um ato minimamente sexual, os dois entendiam aquilo; era um ato de cuidado e de preocupação. Mas os traumas ainda eram recentes, e Finnick faria de tudo para não os reviver.
Ao se levantar, Finnick virou o corpo de Meadow, fazendo-a ficar de costas para ele, e assim desatou seu roupão, passando-o devagar pelos ombros e braços da garota até o retirar por completo. Em silêncio, ainda ouvindo os soluços de Meadow, Finnick pegou uma camisa larga e a passou por sua cabeça, vendo-a se esforçar para levantar os braços e passá-los pelos buracos da vestimenta. Ele virou Meadow novamente, tentando abrir um pequeno sorriso tranquilizador para ela, e pegou um casaco pesado, passando-o por seus braços e abotoando todos os botões da frente. Então, a empurrou com delicadeza até que ela se sentasse em frente ao espelho, e trancou seu cabelo longo do jeito que era comum no Distrito 4. Ao terminar, deu um beijo em uma de suas têmporas e se afastou, deixando-a chorar mais um pouco enquanto ele arrumava sua mala.
O som do choro de Meadow fazia um aperto crescer em seu peito. Ele desejava poder a consolar, mas não havia tempo para fazer aquilo. Finnick organizou as roupas na mala o máximo que pôde, antes de fechar o zíper e retornar para próximo da garota, agora fazendo a última coisa que faltava: ele calçou seus sapatos, amarrando os cadarços firmemente, e ajoelhado em frente à ela, limpou mais algumas de suas lágrimas.
━ Eu sinto muito por tudo isso ━ ele disse, vendo-a assentir em silêncio. ━ Precisamos ir agora, Meadow. Está dando a hora.
Ela se levantou devagar, e Finnick lhe deu a mão e a apertou três vezes. Ele pegou a mala sobre a cama, e com calma, enquanto Meadow tentava cessar o choro, eles deixaram o quarto, passando pelo corredor em silêncio. Quando Hayden, que estava parado na porta do próprio quarto os aguardando passar fez menção de se aproximar dos dois, Finnick balançou a cabeça negativamente.
━ Agora não, Hayden.
━ Eu preciso falar com ela ━ ele pediu, e antes que um dos dois dissesse alguma coisa, ele seguiu: ━ Ninguém vai descobrir nada, Meadow. Eu… Eu não posso entrar em detalhes agora, tudo bem? Não posso. Mas eu te prometo que ninguém vai descobrir nada, nem nos exames, e… Eu vou cuidar de Sylvia. Prometo.
Meadow o encarou em silêncio. O que ele queria dizer? Nada além de mentiras vazias, ela acreditava, e se estivesse com forças o suficiente, teria o chutado mais uma vez apenas para que ele ficasse calado. Como não estava, Meadow apenas apertou a mão de Finnick, pedindo para voltarem a caminhar até o elevador.
━ Tente falar com Indigo ━ Hayden pediu, em voz alta, enquanto os jovens se distanciaram. ━ Ele vai explicar melhor!
Finnick se virou para Hayden, balançando a cabeça negativamente.
━ Ela vai ser mandada para o Distrito 4.
E, mais uma vez, como havia acontecido algumas semanas antes, aquelas palavras eram usadas para afetar Meadow, levando-a para longe de todas as pessoas que se importavam com ela. Hayden não respondeu Finnick, sendo pego de surpresa pela notícia, e apenas observou silenciosamente enquanto Meadow entrava no elevador.
Tão rapidamente quanto teve início, sua trajetória como mentora chegou ao fim.
o peeta nesse momento anotando todos os passos do finnick e da meadow como se estivesse assistindo uma aula pra fazer igual depois
espero que tenham gostado do capítulo de hoje, acho que consegui fazer algo um pouco diferente do esperado e tenha surpreendido vocês. e aí, o que acharam do capítulo? opiniões sobre os acontecimentos e personagens?
vejo vocês no próximo capítulo!
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