"Eu não temeria um grupo de leões conduzido por uma ovelha, mas eu sempre temeria um rebanho de ovelhas conduzido por um leão."
– Alexandre O Grande

   Depois de uns vinte minutos Mike chegou ao hotel cujo nome não havia decorado, abriu a porta da pseudo suíte e notou pelo menos 20 pessoas no quarto, incluindo Rick que estava furioso e com pelo menos três celulares diferentes nas mãos.

— Por onde você andou? Sabe o quanto é perigoso ficar por aí? Tive que emitir um alerta para a polícia local. — o empresário suspirou fundo e revirou os olhos, observando a equipe.

— Desde quando eu sou um fugitivo? Apenas resolvi caminhar um pouco, o colégio fica perto daqui. — Bufou enquanto tirou os sapatos. — Não sou um fora da lei, Richard.

— Você sabe o quanto isso é perigoso? Não conhecemos essa cidade, e se alguém te reconhecer nas ruas? — Rick lançava um olhar furioso.

— Estou vivo, ok? Nunca me senti tão vivo quanto hoje. — o astro deitou-se de bruços na cama depois de tirar boa parte de seu figurino.

— Mike, eu não preciso te lembrar que você não é um adolescente comum em que a única preocupação é o término do ensino médio e qual faculdade escolher?! — Rick cruzou os braços e fitou o rapaz que levantou da cama e suspirou fundo. — Eu sei muito bem quem sou, quer dizer, quem eu devo ser quando estou com essa roupa. As pessoas nem me olharam, e quando o fizeram, era com repulsa. — dissera de um jeito melancólico — Sou um nerd comum.

— Tudo bem, Mike. Só tente se comunicar antes de fazer algo desse tipo. Eu me preocupo com você. — Rick suspirou fundo, a raiva e tensão se dissiparam aos poucos.

O astro apenas assentiu e passou mão no cabelo de forma apreensiva,estava cansado, na maior parte era cansaço psicológico.

— Desculpe-me, não tive a intenção de te deixar preocupado, acho que fui levianamente seduzido pela breve liberdade.  — disse por fim, enquanto a metade da equipe já estava saindo do quarto.

— Tudo bem, eu só queria te dizer que o TMZ já sabe que você não está no Caribe, checaram todas as viagens e algum aproveitador disse que me viu nas redondezas, então, precisamos ir embora. Quanto mais rápido, melhor.  — Rick puxou um cadeira sentou-se depois de dizer que a vida dupla do astro estava em risco. — Eu posso dar um jeito nisso, não quer falar sobre os acontecimentos de hoje?

   Ele perguntou de um jeito descontraído, Rick sempre será o que Mike tinha mais próximo de um amigo. O astro terminou de narrar os emocionantes fatos do dia (contém ironia) omitindo a garota irritante de hoje cedo.

   Richard assentiu com atenção procurando alguma desconfiança sobre a identidade do astro mas na verdade, o look não é tão incomum. "G" estava sendo apenas um nerd impopular.

  Escolas públicas geralmente tinha um sabor mais gostoso de diversidade ao invés dos mesmos riquinhos mimados esbanjando suas viagens caras e veículos importados.

   Depois de ficar sozinho, apenas com os próprios pensamentos, ele tirou a roupa por completo e foi em direção ao banheiro tomar uma maravilhosa ducha quente. Por alguns segundos era uma delícia ser ele mesmo. O jovem observou o próprio corpo desinibido e com algumas tatuagens, o topete ridículo que deixava uma controvérsia engraçada em contraste com as marcas eternas na pele.
Era como ser rebelde e bonzinho ao mesmo tempo. Ser o yin e o yang juntos em uma sincronia. Ele começara a duvidar se realmente dentro dele havia um Michael que não conhecia. Porém, estava gostando dessa versão atualizada de quem era, talvez ela só estivesse se escondida.

****

   Mike ligou o chuveiro adentrando aos poucos no box, ele passou as mãos nos cabelos e fez o sabonete deslizar pelo corpo enquanto pensou na vida. O astro adorava fazer isso no tempo vago, sentia-se novo demais para ter nostalgia da juventude, exceto, quando ela remetia à infância. Às vezes achava que era um idoso preso num corpo juvenil.

   Após terminar o banho, ele saiu do banheiro com uma toalha enrolada na cintura e cachos úmidos caindo na nuca. Ponderou o jantar de hoje, resolvendo pedir uma comida japonesa e assistir algo, ele folheou  freneticamente os canais na velha televisão do quarto. Vestiu uma cueca box preta, deitou na cama e fechou os olhos, acabara de ter uma ideia genial.

   A ideia consistia em fazer um "trabalho voluntário" incentivando os adolescentes da escola na qual ele estava como nerd. Por um dia ele seria Mike ao invés de Marcel e poderia checar a popularidade, aquela gótica metida iria cair aos seus pés ao invés tratar o astro como lixo. Isso! Que ideia brilhante! Rick irá adorar, seria um modo de atrair propaganda positiva.

Alguém bateu na porta, fazendo ele dar um sobressalto, curioso Mike foi atender mas deparou-se com um dos seguranças que entregava o jantar numa embalagem personalizada.

   Mike não era uma pessoa "comum" por que imaginou que iria ver o entregador, dar boa noite e mandar ele ficar com o troco?!
Agradeceu ao segurança recém contratado, ele não tinha culpa, só está fazendo seu trabalho, escondendo-o das possíveis fofocas. Pegou o pacote e comeu rapidamente, não havia comido nada desde que chegara da escola, também esqueceu que estava exausto porque após o término do jantar dormiu feito uma pedra deixando as embalagens sujas no chão.

[...]

Como de costume, Rick chegou sem bater, com uma proposta tão insana quanto sua ideia, já conhecia aquela expressão no olhar dele, porém, resolveu dar a primeira palavra.

— Tive uma ideia tão genial que acho que ela saiu da sua cabeça e veio direto para a minha. — dissera enquanto caminhava para o banheiro dando início à higiene matinal. — Eu sou genial.

— Usando o artifício da bajulação para tentar me convencer de sua ideia maluca?! Estou ouvindo, pode falar. — Rick respondeu de um jeito brincalhão enquanto Mike estava fazendo a higiene bucal.

— Eu pensei em ser voluntário na escola na qual estou "estudando" um dia para aconselhar os sonhadores a nunca abrir mão dos seus sonhos, essas coisas sobre inspiração, sabe?

   Ele olhava sem compreender então o astro explicou melhor a sua ideia e seu empresário acabara concordando.
O café da manhã foi colocado na mesa de seu quarto, Mike mordiscava um croissant e bebia leite quente. Rick o pegou de surpresa com uma ideia maluca que iria dar assunto para os sites de fofocas.

— Um namoro midiático com Scarlett Accolla? Diga que isso é brincadeira! — Michael estava boquiaberto com a proposta.

O rapaz nunca pensou que teria que fingir ser apaixonado por alguém só para que as pessoas o deixassem em paz quanto à sua sexualidade. Que de forma errônea, achou que era dele.

— Ela é uma modelo bonita, simpática e muito influente nas mídias sociais. Seria bom para afastar os boatos, vocês já se conheceram, seria mais fácil desenvolver algum relacionamento. — Mike andava em círculos pelo quarto, permanecia de cueca, no entanto, isso era o menor de seus problemas.

— Eu só a encontrei uma única vez, num evento cheio de famosos. Somos dois estranhos. Rick, o que exatamente está planejando? — observava seu empresário com atenção enquanto o mesmo devorava uma torta de frutas.

— Não estou planejando nada, você não confia em mim? Quando eu fiz algo que deu errado para você? — Rick pareceu ofendido.

Nisso ele tinha razão, todas as suas ideias eram geniais, sempre para o benefício de sua carreira quando as pessoas tentavam sujar seu nome.

— Tudo bem. Eu confio em você. O que achou da minha ideia? — Mike olhava com aqueles olhos firmes no rosto do empresário.

— Claro que gostei. Genial, está aprendendo com quem, garoto? — ele sorriu e levantou-se pegando um dos vários celulares numa maleta preta. — Só não demore, ponha sua melhor roupa madame, hoje nós vamos dançar.

   Rick saiu do quarto de Mike com sua equipe deixando apenas dois seguranças na porta. O astro já estava habituado com aquele ritual.
Vestiu uma roupa não tão chamativa, uma camiseta preta lisa, um coturno mostarda e uma calça escura, colocou uns anéis e passou perfume. Já estava pronto para ser ele mesmo por um dia.

   Obviamente Rick já tinha avisado para toda a imprensa que o cantor estaria lá, porque vários fotógrafos impediam a entrada no local.
Mike G deu uma breve entrevista explicando o motivo da sua ação beneficente, havia outros motivos mas isso não deixava de ser caridade.

   Ele entrou em todas as salas e foi bem recebido pelos alunos, restava apenas a sala dele, acabara deixando por último. Sorriu saudando o professor que apertou sua mão dizendo que adorava seu trabalho.
Os jogadores estavam fazendo perguntas e pedindo dicas para conseguir conquistar as garotas, as líderes de torcidas de uma forma insistente mexiam no cabelo.

   Somente uma pessoa da sala sequer ligou para sua presença, aquela mesma garota que sempre sentava na cadeira que estava vazia, a irritante gótica. Algumas pessoas chamavam a atenção dela quando a mesma direcionou seu olhar para o astro e depois voltou a dormir novamente. Mike sentia-se meio frustado, será que ela tinha alguma implicância pessoal com ele? Ah, ela não sabia quem ele era, ou será que desconfiava?!

   Depois de algum tempo ela acordou com cara de pouco amigos, olhou sem entender a expressão confusa de todos na sala. Ela nem parecia surpresa com a presença do astro. Quem essa garota acha que é?!
Michael tentou ser gentil e sorriu enquanto perguntava o sonho de cada um, nenhum deles muito promissor, alguns só queriam uma vida feliz e dois filhos, talvez esse seja o carma das cidades pequenas, as pessoas só sonhavam não tão grandiosas. Perguntou para a líder de torcida que agora identificava como Candice sobre quais eram seus sonhos.

— Um cara como você na minha vida, é pedir muito? — a garota sorriu maliciosa e mordeu a ponta do lápis.

Ela acabou fazendo-o corar e sorrir meio abobalhado, tudo bem, ela até que era bonita e o deixou super sem graça. Mike deu uma piscadela sem saber o que responder e direcionou a mesma pergunta para a gótica.

—  Eu quero que você vá se ferrar, é pedir muito? — a loira respondeu enquanto fazia uma voz meiga mas com um olhar bem hostil.

Antes da elaboração de uma resposta, um cara que estava no fundo da sala se pronunciou. Talvez ele fosse novato pois Mike jamais havia reparado no rapaz.

— Quando eu te conheci, você era mais calminha, gata.

   Ele exclamou de uma forma sarcástica fazendo o pessoal "popular" rir em uma sincronia perfeita. No fundo conhecia aquele olhar e tom de voz, ele estava insinuando algo sobre ela, algo que certamente ainda era uma ferida aberta o que ocasionou a sua saída instantânea da sala de aula.

   Todos riram, uma raiva interna e descomunal crescia dentro de seu peito, sabia que ela era hostil às vezes, mas tudo que ele fez foi para constranger a garota.
Mordeu a parte interna da bochecha e secretamente cerrou os punhos, obviamente algumas pessoas perceberam, inclusive, o babaca que disse a "piadinha".
Estava pronto para atacar mas a chegada​ de Rick surpreendeu todos, fazendo com que Mike baixasse a guarda.

— Desculpa pessoal mas vou ter que roubar o Mike de vocês. — Rick soou brincalhão e arrancou sorrisos dos alunos.

Porém, raiva acumulada ainda tinha um alvo, ele tinha olhos verdes, cabelo castanho e dentes brancos e perfeitos, bem, pelo menos até Mike acertar um soco naqueles dentes.

   Rick notou a apreensão de Michael e tentou fazer com que ele falasse mas Mike fugiu do assunto, bebeu uma água para relaxar e quando estava indo embora, viu a gótica fumando e estava sentada perto do refeitório. Pediu para Rick esperar um pouco e foi até ela.

— Oi, eu sou o Mike, bem, não achei legal aquela atitude dele... — havia gentileza na voz do rapaz e algumas garotas já tinham notado sua presença e começaram a tirar fotos dos dois. — Você está bem?

— E daí? Vocês homens são todos iguais. — a loira soprou a fumaça no rosto do rapaz que havia ficado irritado.

— O quê...? Você nem me conhece, como pode dizer isso? — ela sorriu meio irônica e se levantou jogando cigarro no chão e apagando com a sola do coturno preto.

— Conheço seu tipo, bom moço, simpático, queridinho das mulheres. Pelas costas são cruéis e falsos. Você são todos iguais! — A gótica revirou os olhos.

Após sair e acabar esbarrando em seu ombro, todo mundo olhava a saída triunfal e teatral da garota que Mike nem sabia o nome. Ele deu de ombros e foi tirar fotos com as garotas educadas.

****

   Estávamos de volta ao hotel, para comemorar a repercussão boa de hoje, jantamos todos juntos no salão principal do hotel, eles eram tudo o que eu conhecia como família.
Depois de me alimentar bem e desfrutar de ótimas companhias, fui tomar uma ducha e colocar um pijama que consistia em uma camisa de algodão e uma bermuda de moletom.

   Recebi um SMS da Scarlett, minha futura namorada midiática marcando um encontro quando eu estivesse em Manhattan novamente. Ela era bonita, eu só não sabia como isso iria dar certo. Uma namorada de mentira? Onde eu fui meter?! Enquanto esses pensamentos estavam engarrafados em minha mente eu recebi uma ligação inesperada.

-— Tudo bem aí na cidade? Eu e George te vimos na televisão. — Era a minha mãe ao telefone, eu não falava com ela desde a minha última turnê há exatamente 6 meses.

— Hmm.. é... Sim eu estou aqui e talvez vou ajudar uma instituição carente. Tudo bem por aí? —Perguntei enquanto coçava a nuca, era estranho falar com ela naturalmente depois de muito tempo.

   Acho que a minha mãe  nunca foi uma pessoa muito afetiva, nunca me deixou faltar nada, não sou mal agradecido mas ela não era muito afetuosa, exceto com Melissa, minha irmã mais velha. Meu pai sempre foi ausente em todos os sentidos.

— Querido, eu e o George estamos com um probleminha, a casa está hipotecada por causa da faculdade da sua irmã, você poderia nos ajudar? — Suspirei fundo e balancei a cabeça negativamente, sabia que ela queria alguma coisa, só não esperava que fosse pedir tão cedo.

— Tudo bem. Eu vou pedir para o Rick cuidar disso. — me joguei na cama, achava que iria receber algum parabéns ou incentivo mas nada veio.

— Obrigada, querido. Você sempre nos ajudou, sou muito grata. Beijo. Até logo. — ela desligou sem se importar com a resposta.

Desliguei a chamada e aquela mesma sensação de vazio abraçou meu peito como se fosse uma velha amiga.