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Capítulo 40

A noite escura me impede de enxergar o que exatamente estava diante de mim. Estou em uma espécie de mata, não sei ao certo. A única certeza que eu tenho é que a vegetação local era alta, ultrapassando-me alguns bons centímetros.

Uma brisa suave brinca com minha pele, praticamente nua, causando um arrepio na mesma. Olho para baixo e percebo que uso um vestido preto, de alça grossa, que vai até os meus joelhos.

Continuo caminhando, ainda sem saber para onde ia. De repente, escuto um grito ensurdecedor.

— SOCORRO! — Uma voz feminina, que vinha de um lugar próximo, clama com desespero. A angústia rapidamente toma conta do meu ser, então me ponho a correr.

— POR FAVOR, ME AJUDE! — A pessoa insiste.

— ESTOU CHEGANDO! — Grito de volta, na tentativa frustrante de acalma-la.

— ÁGUI? É VOCÊ, ÁGUI? — Espanto-me quando a pessoa parece me conhecer. Entretanto, em meu íntimo eu também tinha a sensação de conhecer a dona da voz.

— SIM, SOU EU! ONDE VOCÊS ESTÁ? — Escorrego em algo e vou direto ao chão.

— EU NÃO SEI! — Sua voz sai chorosa e reflete todo o medo que ela está sentindo.

Tento me levantar, entretanto, me assusto ao olhar para minhas mãos e vê-las sujas de vermelho. Engatinho rapidamente para trás e suspiro aliviada ao ver dezenas de tomates podres esmagados pelo chão.

— ELES ESTÃO CHEGANDO! IRÃO ME MATAR!

— Não! — Sussurro. O medo era evidente em minhas pernas bambas — POR FAVOR, ACALME-SE! ESTOU CHEGANDO! — Levanto-me e corro ainda mais rápido. Ao fundo consigo enxergar um pouco mais de claridade entrando pelas folhas fechadas.

— AHHHHHHH! — O grito agudo da mulher me faz estacar no lugar — ME SOLTA! NÃO, POR FAVOR! ME SOLTAAAAA!

— Não! Não! Não! — Tento gritara, mas minha voz sai baixa demais diante dos gritos de desespero da pessoa.

Até que finalmente o matagal acaba, e eu me deparo com um grande lago artificial. A calmaria das águas escuras contrastava com o medo e o desespero do cenário ao redor.

Despertando dos meus desvaneios, olho para o lado esquerdo e não vejo ninguém. Mas ao virar para o lado direito, meus olhos encontram a mulher, que se debate desesperadamente nos braços de um dos dois homens. Homens estes que vestiam macacões pretos e toucas da mesma cor.

Ela clama por misericórdia, mas eles apenas se põem a rir e caçoar da pobre moça.

Eu preciso ajuda-la!

Faria de tudo para socorre-la, no entanto, o grito que estava prestes a sair dos meus lábios, fica entalado na garganta, diante da cena brutal que presencio.

O segundo homem, sem dó nem piedade, retira um canivete do bolso e enfia no abdome da vítima, que automaticamente cai de joelhos. Enquanto eles gargalhavam de seu sofrimento, a mulher ergue a cabeça lentamente. É quando seus olhos encontras os meus, e eu finalmente a reconheço.

— NAAAAAÃO!!!

— Águi? Águi, acorda!

Abro os olhos e suspiro aliviada ao ver os rostos de Aisha, Lídia e Antonella me encarando.

Sento-me na cama, com a respiração ainda desregulada e o suor escorrendo pelas minhas costas e testa.

— O que aconteceu? — Lili pergunta com preocupação.

— Nada! Apenas um pesadelo. — Respondo sem encara-las.

Levanto da cama em um rompante e sigo para fora do quarto.

Graças ao bom Deus, o corredor estava vazio. Entro no banheiro, e assim que a água morna toca minhas costas, fecho os olhos e faço uma oração. Meu coração, ainda acelerado, clamava pela misericórdia do Senhor sobre nós.

Deparo-me com Aisha ao abrir a porta do banheiro. A mulher estava de braços cruzados, escorada na parede.

— Quer pegar um ar? — Pergunta.

Respiro profundamente e confirmo com a cabeça.

Caminhamos em silêncio até a pequena varanda, que fica no final do corredor. A brisa suave toca o meu rosto, assim como no sonho. Tal pensamento me faz engolir em seco.

— O que te aflige, Agatha?

Sua pergunta me pega de surpresa, mas resolve me abrir com ela.

— No fundo, acho que tenho medo do que nos espera na Líbia. — Fito o céu carregado com as densas nuvens — Hoje a Nádia me contou tudo o que aconteceu com ela e seu companheiro. Ter conhecimento de toda a dor e sofrimento desse casal me deixou ainda mais aflita.

— É natural sentirmos medo. Grandes homens na Bíblia tiveram medo, principalmente diante de circunstâncias assustadoras e desfavoráveis.

— Eu sei. — Concordo — Mas o que realmente me faz mal, é a possibilidade de eu me deixar ser dominar por esse medo! — Encaro-a com seriedade — Nós temos duas opções: deixar que ele nos domine, ou entrega-lo diante de Deus. E sério, Aisha, eu tenho tentado fazer a segunda coisa, mas tem sido cada vez mais difícil.

Minha voz embarga e os olhos começam a marejar. Entretanto, luto contra as lágrimas.

— Não resista à presença de Deus, Agatha! Deixe essas lágrimas levarem embora toda aflição. Ele é muito maior do que essa situação, e está cuidando de você. Peça coragem a Deus e confie em seu amor. O Espírito Santo vai lhe ajudar a superar os seus medos, assim como fez comigo.

Sinto seus braços me envolvendo. As lágrimas começam a rolar, copiosamente.

Ficamos um bom tempo assim, até que me afasto delicadamente enxugando a face molhada e inchada.

— Tem amigos que realmente se importam com você, sabia? — Meu rosto denuncia minha confusão.

— Do que está falando?

— Há alguns dias seus companheiros de profissão vieram conversar comigo. — Franzo o Cenho.

— Théo e Vicente? — Questiono e ela assente.

— Me contaram sobre seus temores em atravessar a Wadi Al-Mjeneen sozinha. — Fecho os olhos e suspiro.

— Sim...

— Desde então, temos orado pedindo novas estratégias a Deus. Eu realmente conheço essa barragem, e é um local muito perigoso, principalmente para uma mulher atravessar sozinha.

Sinto-me grata por tal revelação.

— Até essa noite não lembrava de nenhuma outra solução, mas enquanto te esperava sair do banheiro, o Senhor me trouxe à memória algo que já fiz algumas vezes com o meu irmão. Talvez possa funcionar.

Tenho certeza que meus olhos estão brilhando neste momento.

— O que seria?

Ela apoia suas costas no guarda-corpo ficando de frente para mim.

— Quando éramos mais novos, papai e mamãe iam até a cidade para comprar algumas coisas, e devido os grandes riscos, nos deixavam em casa com nossos avós.

— Você e seu irmão?

— Isso! — Sorriu com as lembranças — Na maioria das vezes nós costumávamos obedecer, mas tinham momentos que queríamos ir e ponto! Então nós entravamos na caçamba da caminhonete de papai e nos escondíamos entre os caixotes e tecidos que ele levava para trazer as frutas, legumes, adubos... tudo o que precisávamos. Eles só descobriam ao retornarmos, quando precisava ocupar os caixotes e sacolas.

Ela morde o lábio inferior e me olha com expectativa.

— Eu sei que éramos crianças na época, mas... Talvez essa possa ser a única saída para você Agatha. Se você realmente quiser, posso conversar com o meu irmão.

— Eu quero! — Não precisei pensar duas vezes.

— Mas lembre que ainda assim, há riscos. As coisas mudaram de dez anos para cá.

— Sei que terão riscos, mas também acredito que essa foi uma resposta de Deus para as nossas orações! — Digo convicta — Assim que te conheci, tive a certeza que você nos ajudaria quanto a isso.

— Vicente me contou sobre isso. — Sorri com a recente lembrança — Então assim será! E que Deus envie anjos para acompanharem vocês!

— Amém! — Um bocejo involuntário sai de minha boca — Acho que o sono está voltando.

Aisha pega o celular e ao ver as horas começa a rir.

— Sabe que horas são?

— Quatro? — Respondo após analisar o céu e tentar encontrar algum indício do amanhecer.

— Cinco e vinte!

— Ok! Temos uma hora e meia até o despertador tocar. Para mim é o suficiente! — Digo.

— Médicos... — Revira os olhos e entra, me deixando sozinha na varanda, enquanto ria.

>>>><<<<

Mais um fim-de-semana chegando para a glória do nosso Senhor! Deus abençoe o descanso de cada um 🙏🏼

Att.
NAP 😘

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