3 • Plano
17 de março de 2020 - Quarta-feira
Era por volta das 7 horas da manhã. Um dos dias onde as crianças iam para a escola de manhã ao invés de tarde.
Katsuo e Hana acordaram com muita dificuldade e agora estavam praticamente caindo de sono por terem ficado acordados até tarde bolando uma lista de requisitos que a nova namorada de seu pai deveria atender. Ideia de Hana, que apesar de ter apenas 8 anos, gostava de uma boa organização. Se procurarão alguém para fazer seu pai feliz, não se dariam o luxo de errar na escolha, estava determinada a fazer seu trabalho de cupido perfeitamente junto ao irmão.
- Vocês dormiram tarde de novo? - Bakugou perguntou às crianças que tomavam o café da manhã com os olhos pregando - O que eu falei sobre fazerem isso? - suspirou. Estava cansado de avisar aos pequenos que aquilo faria mal a saúde deles.
- Desculpa papai - a loirinha falou- Foi só dessa vez.
- Sim, tivemos um bom motivo! - um pouco mais eufórico, Katsuo acabou por dar detalhes demais, sentindo a sapatilha de Hana pressionando seu pé, fazendo-o gritar de dor - Ai!
- Ah é? - sorriu, curioso sobre o que eles aprontaram - E qual seria esse motivo meus pequenos?
- É segredo! - Hana se precipitou. Não queria estragar o plano.
- Hm, tudo bem então... - sorriu, afagando os fios loiros da garota. Imaginou ser só alguma brincadeira boba de suas crianças.
***
Mais tarde, foram para escola junto ao seu pai e se despediram dentro dela com cada um indo para suas respectivas salas, Katsuki indo dar aula e as crianças indo assistir outras.
Durante as aulas, Hana sempre se esforçava para manter-se atenta e aprender o conteúdo corretamente, sempre tirando dúvidas e realizando atividades com muito empenho. Herdou tal característica de Katsuki e o próprio se orgulhava muito de ver sua filha sendo tão dedicada mesmo sendo tão nova. Por outro lado, Katsuo era o tipo de moleque que conversava durante as aulas, sendo chamado a atenção diversas vezes e tendo uma dificuldade tremenda para prestar atenção na explicação do conteúdo, ficando atento apenas quando a aula era interativa e haviam brincadeiras ou coisas do gênero.
Seu progenitor já lhe avisou diversas vezes que deveria se esforçar um pouco mais, ainda mais quando ele era um professor e era rigoroso quanto à educação de seus filhos, mas obviamente não pretendia forçar nada ao garoto nem iria humilha-lo, muito menos machuca-lo e gritar com a criança por não realizar tarefas de casa. Repreendia seu comportamento ignorante, sempre incentivando-o a melhorar e alertando que era para seu próprio bem, esperando que ao menos o rapazinho de fios rebeldes aprendesse com os próprios erros futuramente.
Porém, nesta aula decidiram analisar a professora de música chamada Kyoka Jirou. Achavam ela uma ótima professora, sempre animada e aberta a outros gostos musicais, mas com uma paixão por rock intensa. Sabiam que seu progenitor também gostava bastante deste estilo musical, imaginando que poderiam ter algo em comum para conversar.
- Seria legal se a Tia Jirou fosse namorada do papai... - Katsuo sussurrou baixinho para sua irmã - Eu já vi eles conversando e o papai parecia feliz.
De fato, Jirou conhecia Bakugou desde o Ensino Médio e conversavam muito sobre música, mas nunca passou de uma amizade.
- Mas será que ela já não tem namorado...? - a loirinha questionou enquanto olhava a arroxeada falar animada.
Katsuo franziu o cenho em irritação na hora. Como não havia pensado nisso antes?
Antes que pudesse dizer algo, uma música tocou, sinalizando o horário de recreio qual tanto adoravam, pois durava meia hora e poderiam ficar brincando. Mas não foi dessa vez.
Decidiram tirar suas dúvidas, esperando que todos seus colegas saíssem da sala e enfim chamando sua professora para conversar.
- Tia Jirou! - Katsuo se aproximou da mulher, que sorriu simpática para ele.
- Sim querido?
-Você... - começou a juntar coragem para fazer aquela pergunta. Hana se recusou, imaginando ser inconveniente demais, mas o rapaz estava disposto a perguntar coisas idiotas. - Tem na-
Uma música alta começou a tocar de repente, não era o sinal, pois as palavras pronunciadas eram grosseiras, se assemelhado à uma letra de rock. Ou seja...
- Ah, espere um segundo - a mulher tirou o celular do bolso, atendendo a ligação e aproximando o aparelho do ouvido - Olá amor.
"Amor"?
Aquilo não era como seu pai costumava chamar sua mãe...? Oh, então será que de fato ela estava comprometida?
Curtos minutos passaram até que a arroxeada finalmente encerrasse a ligação, rindo da pessoa que falava idiotices do outro lado.
- Era seu namorado? - curioso como era, questionou sem um pingo de vergonha na cara.
- Não, meu marido - ela sorriu, não se incomodando muito com a pegunta e lembrando dos momentos antes da ligação - O que você estava dizendo antes?
- Ah, nada não... - negou, virando-se para a irmã que observava a cena quase morrendo de vergonha alheia e a chamando para sair da sala logo - Vamos mana!
***
Bakugou, apesar de ser dono de uma personalidade explosiva e ser muito exigente, sempre foi um professor carismático e muito amado pelos alunos. Dentro da sala de aula ele se sentia empolgado demais para ensinar cada uma daquelas crianças sobre as diversas matérias que compunham a história, desde o Período Paleolítico, perpassando a Idade Média e obviamente não perdendo a oportunidade de ensinar sobre seu assunto preferido, que inclusive era seu objeto de estudo; As Guerras Mundiais.
As aulas rendiam muito e os alunos adoravam a forma como ele abordava cada tema, onde vez ou outra tinha de se conter para não ficar empolgado demais e falar muito rápido. Era cômico e divertido.
Katsuki queria muito que ainda estivesse assim, contudo, nesses últimos dois meses andou bem mais desanimado e irritadiço por conta do ocorrido. Sabia que não deveria deixar seus problemas pessoais afetarem sua carreira profissional, mas era inevitável não sentir ódio e mágoa toda vez que se lembrava que quando terminasse de dar suas aulas, teria que voltar para casa. A casa que agora de alguma forma parecia assombrada. Era mais silencioso e solitário estar dentro dela.
A última aula que daria era antes do almoço, sendo na sala que seus filhos estudavam. Era a quarta série, ou seja, era mais difícil com que os alunos prestassem de fato atenção nas aulas e tivessem maturidade o suficiente para não conversar, contudo, Bakugou era temido o suficiente para que não ousassem desrespeita-lo, fazendo a aula passar tranquilamente e acabar rápido.
Katsuo e Hana foram até a mesa do professor, esperando por seu pai para enfim irem almoçar.
- Podem ir almoçar - disse às duas crianças que lhe encararam com confusão - Tenho algumas coisas para arrumar aqui, vou daqui a alguns minutinhos. - e então ambos concordaram com receio de que aquele fosse mais um dia onde seu progenitor não teria tempo para almoçar.
Quando as crianças saíram, Katsuki suspirou. Droga, esses dias haviam sido tão estressantes que os sentimentos acabavam se acumulando demais, fazendo com que ele não tivesse um momento onde poderia botar tudo para fora sem que ninguém soubesse.
Continuou arrumando os trabalhos que havia recolhido no dia, organizando-os em uma de suas pastas distraidamente, pensando nos momentos em que já esteve desanimado assim e sendo consolado por Akane.
Merda, não deveria ter depositado toda sua confiança nela, não deveria ter sido tão estúpido. Martelava esse pensamento em sua mente com frequência, tanto que acabou extravasando do pior jeito possível ao seu ver.
Chorando.
Seus olhos começaram a arder quando tentou conter as lágrimas, que inevitavelmente escaparam e escorreram por sua face. Um bolo formou-se em sua garganta conforme passava as mãos desesperadamente por seu rosto enxugando suas lágrimas, não deveria se dar o luxo de chorar agora. Imagine se alguém o visse sensível assim por causa de algo tão "besta" aos olhos de outras pessoas, principalmente de alguns amigos que diziam que "era só pegar outra pessoa" que ia ficar tudo bem. Não, não ia ficar tudo bem se simplesmente descontasse suas frustrações nos outros como costumava fazer no Ensino Médio. Sabia disso como ninguém.
- Senhor Bakugou? - ouviu alguém chamar por seu nome. Já tinha ouvido esta voz antes, sabia a quem pertencia. Ergueu seu olhar para confirmar sua teoria, vendo um rapaz moreno de madeixas ruivas presas em um coque mal feito, suas orbes carmesim lhe fitavam cheias de preocupação. Pelo que lembrava, seu nome era Eijirou Kirishima, o professor de educação física que era carinhosamente chamado de "Tio Eiji" por seus alunos, inclusive seus próprios filhos.
Merda, havia sido pego chorando por um cara.
- Está chorando? - o ruivo perguntou, se aproximando e levando uma das mãos ao bolso, tirando de lá um lenço e oferecendo ao loiro - Tome!
Bakugou fitou a mão estendida do ruivo por um tempo. Se sentia humilhado por ter sido pego chorando por alguém, ainda mais quando a maioria das pessoas sabia sobre sua situação. Não queria que sentissem pena, era algo horrível, portanto, foi frio e grosso para recusar o ato de gentileza do outro professor, imaginando que ele sentisse dó de seu estado.
- Não estou. - virou a cara, começando a arrumar os papéis mais apressadamente em sua pasta - Vai embora. - disse ríspido, evitando contato visual.
- Não precisa ter vergonha, senhor Bakugou - Kirishima sorriu - Não vou te julgar nem nada que esteja pensando - tentou tranquiliza-lo, deixando o lenço em cima de sua mesa.
- Não me importo, não preciso que sinta pena de mim.
- Não estou com pena - negou - Apenas não gosto de ver pessoas chorando e sei o quanto sua situação está complicada, então imaginei que algum apoio não lhe faria mal. - explicou-se - Sinto muito se fiz algo que te ofendeu.
Katsuki estalou a língua, pensando que seria apenas uma desculpa esfarrapada de um homem pagando de bom samaritano apenas para se sentir bem com ele mesmo.
- Não fale como se já tivesse passado por uma merda de situação assim, desgraçado - levantou a cara, fitando os olhos carmesim que continuavam cheios de preocupassem. A expressão tristonha do ruivo não parecia nenhum pouco fingida, fazendo-o franzir o cenho em surpresa. Talvez tivesse sido rude de mais.
Ouvindo aquilo, Kirishima engoliu em seco. Um sentimento desgostoso instaurando-se em seu peito, mas tratou de ignora-lo, tendo consciência de que o professor de história tinha um temperamento forte e era bem impulsivo.
- Apenas aceite - foi gentil - Eu realmente estou preocupado, não é nenhum fingimento, mas imagino que não importe para o senhor - concluiu - Eu sinto muito pelo que aconteceu e espero que fique tudo bem, tenho certeza que você não mereceu o que teve.
- Não sinta muito, cacete. - rosnou, mas ouvir aquelas palavras de consolo trouxeram uma pequena porção de tranquilidade ao seu peito. Mesmo xingando-o, Eijirou não deixou de mostrar um sorrisinho despreocupado.
- Certo, não vou sentir - respondeu-o, vendo que Bakugou já aparentava estar minimamente bem, vendo-o finalmente pegar o lenço para secar as lágrimas e devolvê-lo a si - Caso queira conversar, pode me procurar, viu? - já estava saindo da sala, imaginando estar perturbando o loiro.
Não houve resposta. Katsuki pensou em xinga-lo ou qualquer coisa do tipo, mas as palavras simplesmente entalaram em sua garganta. Nenhum desconhecido nestes dois meses se ofereceu para ouvi-lo. Aquela oferta era estranha e com certeza não era séria, apenas sendo algo oferecido por educação na visão de Bakugou, então decidiu ficar quieto, vendo o ruivo sair depois de encara-lo por alguns segundos.
***
Katsuo e Hana almoçaram sem muita vontade, preocupados com seu pai e ansiosos para encontrar alguém que trouxesse novamente sua alegria.
Durantes as outras aulas olharam várias outras professoras, em sua maioria mais velhas ou comprometidas, mas não pareciam pessoas que fossem se dar bem com seu progenitor.
Continuaram sua busca depois de se alimentarem, mas ainda sem sucesso. Será que encontrariam alguém perfeito para ele? Já tinham visto quase todas as professoras da escola e estavam começando a perder a esperança.
- Será que vamos mesmo conseguir? - Katsuo perguntou tristonho à irmã.
- O que está dizendo? É claro que vamos! Vamos que encontrar alguém perfeito para o papai e poder vê-lo sorrir de novo!
- Mas acho que nenhuma tia nossa quer ficar com nosso pai, eu vi algumas falando mal dele também... - murmurou pessimista.
- Falando mal? - Questionou indignada. Como ousaram falar mal de seu querido pai? Alguém tão carinhoso e dedicado como ele não merecia esse tipo de tratamento.
- Sim... - pensou em contar o que ouviu, mas decidiu mudar de assunto para não deixar a garotinha mais irritada ainda, tratando de citar alguns dos atributos que tinha na lista que fizeram - Mas sabe, a mamãe era estilosa, bonita, gentil e carinhosa, talvez o papai queira alguém assim, alguém que se preocupe com ele e-
Não pôde terminar de falar, batendo contra alguém e caindo no chão assustado.
- Ah, me desculpe - uma voz preocupada soou e quando Katsuo olhou para frente viu a mão de seu professor de educação física estendida para ajudá-lo a se levantar - Você está bem garotinho?
- Tô sim tio Eiji, não tem problema - sorriu, contagiando o ruivo e aceitando a ajuda.
- Vocês são filhos do senhor Bakugou, não são? - perguntou, lembrando de seus nomes e percebendo as semelhanças para com o loiro.
- Somos sim - Hana respondeu sorrindo.
- Cuidem bem do seu pai, viu? - afagou a cabeleira de ambos carinhosamente.
- Vamos sim! - foi o rapaz de cabelos espetados que respondeu com uma determinação enorme.
Eijirou deixou um sorrisinho escapar com toda aquela determinação, ficando contente pela animação de seus alunos para cuidar de seu progenitor e rumando para o pequeno restaurante que havia na escola.
- Por que ele disse isso? - Katsuo questionou-se.
- Será que ele tá preocupado com o papai? Então...
- Ele também é muito gentil e estiloso.
- Estiloso aonde? - a loira questionou franzindo o cenho confusa. Adorava seu professor, mas seu gosto para roupas não lhe parecia bom.
- Não viu aquelas crocs vermelhas? São muito maneiras! - afirmou empolgado - E o cabelo vermelho dele também é legal, principalmente quando tá todo espetado que nem o do papai.
- Seu gosto é péssimo... - não acreditava que seu irmão estava de fato achando aquilo estiloso.
- O seu que é - rebateu, buscando mudar de assunto novamente - Ele é legal e se preocupa com o papai!
- Verdade - concordou. Aquilo era um fato inegável - Mas ele é um menino...
- Idai? - perguntou, inconformado com a indagação da irmã. Tudo bem, seu pai não teria uma namorada como planejavam, mas não via nada de errado nele ter um namorado.
- É estranho, nós não teríamos dois papais assim? - sua dúvida era inocente, estava confusa com aquilo.
- Isso seria legal! - sorriu animado, conseguindo contagiar a irmã e fazê-la pensar melhor na ideia.
- Tem razão - ela concordou, deixando um sorrisinho de felicidade escapar.
Não acharam uma namorada como planejavam, mas ter um segundo pai não parecia uma ideia nada ruim.
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