16 | Hurts so good
"Quando dói, mas dói
de um jeito tão bom
Você aceita isso?"
— Astrid
—— A A R O N ——
A leve chuva que caia lá fora tinha se cessado, mas o céu ainda permanecia nublado. Após terminar de organizar a biblioteca seguimos juntos para o estacionamento fazendo com que a brisa suave do vento se enlaçava aos corpos em palavras vazias enquanto caminhávamos em silêncio.
A garota parecia pensativa como se algo a estivesse incomodando. Tentei ao máximo ignorar enquanto destravava a porta do carro, mas assim que vislumbro seu reflexo no vidro do carro caminhando em direção a estrada suspirei fundo.
— Quer ir comer alguma coisa? — Me virei para olhá-la.
— Agora?
— Sim, não estou afim de voltar para casa e por você ter recusado todas as ligações da sua mãe imagino que você também não.
Amélia me olhou comprimindo os olhos e arqueou a sobrancelha voltando com a expressão pensativa e se moveu um pouco como se estivesse analisando as opções e voltou a me encarar de forma desconfiada.
— E o que você ganha com isso?
— Uma companhia? — Usei o tom sarcástico vendo-a segurar uma risada.
— Tudo bem. — Mudou a postura. — Vou aceitar só porque estou faminta.
— Claro. — Rimos.
Em silêncio entramos no carro e girei a chave ligando o motor vendo-a de relance ter um pouco de dificuldade para colocar o cinto, mas após sua segunda tentativa conseguiu. Então ergui meus olhos para o retrovisor passando a macha ré e manobrei saindo do estacionamento.
— Já podem te contratar para ser piloto de fuga. — Brincou me fazendo rir.
— Vou me sentir o próprio Vin Diesel. — Respondi sem desviar a atenção da estrada.
— Não nos matando está ótimo.
— Já é um começo. — Soltei uma leve risada. — Tem preferência de algum lugar que goste?
— Vou deixar você me surpreender, já que gosta tanto desse desafio.
Por breves instantes desviei o olhar da estrada para olhá-la. Ela estava com uma expressão impenetrável no rosto mesmo sentindo vontade de rir do seu próprio comentário. Abri um sorriso sórdido e voltei a prestar atenção na estrada levando as pontas dos dedos sobre meus lábios apoiando o cotovelo na janela enquanto a outra mão estava no volante.
— Tudo bem, desafio aceito.
— Devo me preocupar?
— Vai depender do seu gosto. — Falei olhando-a de relance pelo retrovisor.
Amélia riu discreta sem tirar à atenção da vista da janela fazendo seus cabelos voarem com a brisa fresca do vento. O sol começou a se abrir na extensão do céu nublado fazendo com que os raios solares aquecessem a estrada ainda molhada pela chuva.
— Sabia que podemos saber muito da pessoa só pela música que ela escuta? — Atraiu minha atenção para o seu rosto enquanto parava no sinal. — Vamos ver o que você tanto escuta, Aaron.
A garota inclinou-se para ligar o rádio e estava tocando. "Waves - Dean Lewis"
— Não acredito! — Indagou abrindo a boca surpresa. — Jurei que iria tocar algum rap.
— Acho melhor não ficar tão surpresa assim, Maggie é quem toma de conta da playlist. — Segurei a risada. — Mas olha, não é uma música ruim.
— Não acredito em você.
O vento mais uma vez passou pela janela fazendo seus cabelos voarem enquanto ainda mantinha um sorriso nos lábios. Seus olhos brilhavam em minha direção e todo o movimento ao meu redor pareceu desaparecer por longos segundos.
— "There is a light in the dark" — Com a voz rouca cantei uma parte fazendo-a gargalhar de forma calorosa jogando sua cabeça para trás.
— Sabia que você conhecia.
— Não tenho culpa se minha irmã me obrigava a ouvir todo dia me forçando a decorar.
— "It carries us away" — Retrucou com a voz doce e afinada virando seu rosto em minha direção.
— Ok, eu não sabia que você cantava.
— Eu não canto.
— Não acredito em você. — Usei suas palavras semicerrando os olhos vendo-a rir com minha expressão.
O sinal abriu e voltei a me concentrar na estrada dando uma rápida olhada para a hora no meu relógio de pulso. A garota balançava a cabeça no ritmo da música que tocava baixa no rádio e cantarolava a letra. Ficamos o resto do caminho em silêncio, eu dirigia com a mão firme no volante e ela olhava a movimentação de outros veículos a nossa frente. Quando atravessei a pista ela não viu que o carro havia feito o contorno, mas assim que atravessei a segunda pista indo para a estrada de chão a garota se virou e me olhou confusa.
— Para onde estamos indo?
— Você vai ver. — Abri um leve sorriso.
— Que lugar é esse?
— Se eu contar vai estragar a surpresa, mas garanto que tem o melhor lanche da cidade.
— No meio do nada? — Riu.
— Essa é a melhor parte.
Girei o volante para a esquerda só com uma mão entrando em uma rua rodeada de árvores e a garota parecia nervosa, mas assim que viu alguns carros estacionados logo a nossa frente pareceu ficar mais tranquila.
— Chegamos. — Disse estacionando.
— Esse lugar tem uma vista linda. — Falou descendo do carro olhando em volta.
— Da para ver a cidade inteira daqui de cima.
— E o cheiro que vem de dentro da cabana também é ótima. — Confessou me fazendo rir.
— Vamos entrar.
Vejo-a assenti e então abri a porta e dei passagem para que ela entrasse primeiro. O lugar não estava muito cheio, mas havia algumas famílias sentados e conversando, pareciam animados. Dava para ver pela janela algumas crianças brincado e correndo atrás dos pássaros do lado de fora e Amélia não tirou seu sorriso do rosto desde que chegamos. Assim que nos aproximamos do balcão a mulher que atendia ergueu seus olhos para mim.
— Aaron, que bom te ver.
— Olá Mary, como está o Henry? — Perguntei abrindo um sorriso.
— Bem, graças a Deus. — Olhou para a garota do meu lado. — Não vai me apresentar a sua namorada?
— Essa é a Amélia. — Disse fazendo ela sorrir sem graça erguendo sua mão para cumprimentar a Mary. — Somos amigos.
— Ah entendi, você vai querer o de sempre?
— Sim e bem caprichado. — Pisquei e caminhamos em direção a saída dos fundos onde dá acesso ao ar fresco e uma mesa na qual gostava de me sentar para ter uma vista perfeita da cidade.
— A primeira coisa que ela imaginou é que éramos namorados. — Rimos.
— Aposto que pensou "Mais uma?"
— Na verdade a Mary deduziu aquilo justo por me ver com alguém, já que nunca havia trazido ninguém para esse lugar.
— Não precisa mentir.
— É tão difícil de acreditar? — Pergunto com um leve tom de indignação escorando minhas costas no banco com as mãos no bolso do casaco.
— Desculpa, mas é quase impossível.
— Tudo bem, não vou tentar mudar os seus pensamentos. — Ergui meus olhos para o seu rosto. — Não tenho uma fama muito boa mesmo.
— Será por que? — Rimos — Como conheceu esse lugar?
— O meu pai me trazia sempre aqui quando era criança.
— Entendo, um lugar sentimental.
— Sim, mas não estamos aqui para falar de mim, eu não sei nada sobre você, por que não começa me contando?
— E o que quer saber?
— Pode começar me dizendo sobre sua relação com sua mãe, está com algum problema? — Perguntei apreensivo.
— Ela só está ficando muito ausente por causa do trabalho.
— Isso é uma droga, mas e o seu pai?
Vejo-a suspirar fundo e olhar para suas mãos como se esse assunto fosse delicado, ela ergueu seus olhos para frente olhando o horizonte e voltou a me fitar com um olhar triste.
— O meu pai faleceu no começo do ano em um acidente então só somos eu e minha mãe.
— Sinto muito, eu não sabia.
— Tudo bem, ainda é um assunto delicado, mas estamos nos recuperando aos poucos. — Desviou seu olhar do meu.
— Não precisamos falar sobre isso se não quiser, sei que é difícil.
— Trouxe pra você. — Uma criança que não aparentava ter mais de cinco anos se aproximou entregando uma flor para a Amélia.
— Obrigada! — Abriu um sorriso pegando o presente. — Você é muito fofa.
A menina se encolheu envergonhada deixando visível um sorriso de canto e então saiu correndo para se juntar com as outras crianças. Amélia levou a flor até o nariz e fechou os olhos puxando o odor cativante das pétalas rosadas.
— Tem um cheiro tão bom.
— Essas flores significam beleza natural e nascem muito nessa região, certamente a criança te achou bonita.
— Não precisa exagerar, a menina só foi gentil. — Falou dando de ombros.
— Vamos ver como fica em você.
Me ergui pegando de sua mão e me inclinei um pouco ficando de frente a ela colocando a flor sobre sua orelha deixando um pouco de cabelo cair por cima e abri um sorriso involuntário ao vê-la corar, seus olhos pareciam um ímã me prendendo de forma que fosse impossível de não admirar sua orbes azuis.
— Agora está perfeito.
— Não sabia que você conseguia ser fofo. — Zombou me fazendo rir.
— Eu não sou. — Disse inclinando a cabeça em tom mordaz. — Vou buscar o lanche.
Levantei-me e assim que entrei na cabana me dirigi até o balcão vendo que o meu pedido já estava pronto e Mary realmente havia caprichado com o recheio. Peguei a bandeja e voltei para fora vendo Amélia com seus olhos cravados na dimensão da paisagem como se aquilo estivesse lhe trazendo paz e tranquilidade.
— Vamos ver se ainda consigo acertar o seu gosto. — Disse atraindo sua atenção para mim.
— O que é isso?
— Experimenta, quero ver sua reação em primeira mão. — Sentei-me no banco a sua frente.
— Pelo menos está com um cheiro bom, vamos ver o gosto.
Vejo-a atentamente pegar o lanche e levar até a boca dando uma generosa mordida. Ela parecia saborear devagar fazendo uma expressão impenetrável deixando impossível de adivinhar se o que ela transmitia em seu rosto era aprovação.
— Olha sinceramente... Isso está muito gostoso!
— Mas é claro que está. — Resmunguei aliviado fazendo-a rir.
— Você teve muita sorte.
— O meu placar ainda segue firme e forte. — Brinquei pegando um lanche.
Assim que terminamos de comer ela apoiou sua cabeça entre suas mãos na mesa olhando para os prédios que estavam a baixo de nós e as vezes desviava seu olhar para o meu rosto, mas logo disfarçava quando percebia que eu a encarava. Era até engraçado.
— Você está perdendo a melhor parte sentado de costas.
— E se eu disser que já decorei até as cores de tanto que fiquei olhando para esse lugar?
— Não seja estraga prazeres e vem logo me fazer companhia. — Reclamou me fazendo desistir de argumentar e levantei me sentando ao seu lado.
Amélia suspirou fundo sentindo-se completamente confortável e apoiou a cabeça no meu ombro e levemente subi minha mão por suas costas aproximando-a para mais perto num abraço acolhedor e ficamos em silêncio admirando a vista.
{...}
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