Revelações
18 Novembro 2014
Oliver encontrava-se ainda com os seus olhos fechados , e eu olhava-o sentada na cadeira azul escura de veludo que se encontrava ao lado da sua cama .
Era tarde , por volta da meia noite . Hannah já tinha ido embora pois não tinha comido nada , devido ao facto de me ter dado a sua sanduíche caseira . Os restantes tinham ido embora também , por pedido meu . Após o acordar de Oliver ficámos um tempo a jogar todos , e apesar de estar ligeiramente incapacitado , Oliver ganhou de todas as vezes . Ele havia adormecido por volta das 21:00 , após lhe terem dado um sedativo para que ele não sentisse as dores . Era agora 00:32 , e embora todos me tivessem dito para ir embora , eu tinha de ficar com ele , até porque me faria bem ter um tempo para pensar sem mais nada à minha volta .
O corpo dele havia aceitado perfeitamente a transfusão , o que queria dizer que éramos compatíveis , e como o médico dissera antes , para isso tinha de haver algum tempo de parentesco entre nós . Agora questionava-me se por acaso Oliver sabia de algo , relembrando aquele nome doce que ele me havia chamado quando estivéramos juntos no meu quarto .
És a minha pequenina.
Isso podia significar que ele sabia , mas não fazia sentido na minha cabeça . A minha mãe tinha feito uma inseminação , só se pudesse ser isso , mas seria demasiada coincidência calhar um homem que morasse perto deste lugar . Mas pelos vistos as minhas perguntas iam ser respondidas mais rápido do que eu pensava , pois vi as pestanas de Oliver moverem-se , e logo depois os seus olhos castanhos imergirem , dando-lhe vida . Estes moveram-se pelo quarto , provavelmente procurando a rapariga de cabelo negro que lhes dava tanto brilho .
- A Hannah foi para casa comer algo , ela volta amanhã - murmurei com um sorriso e levantei-me andando até ele para poder estar dentro do seu campo de visão .
- Ainda bem - a sua voz deambulava , provavelmente ainda devido ao sedativo .
- Muita coisa aconteceu hoje ein ? - soltei uma gargalhada nervosa , pois eu não sabia como começar a conversa , mas não queria ir directa ao assunto , pois isso seria , no mínimo , inapropriado .
- Tu já sabes a verdade não já ? - ele foi directo ao assunto . Fiquei tensa e o meu riso nervoso desbotou , ficando agora apenas com um sorriso fraco até mesmo um pouco falso .
Limitei-me a assentir . A mão de Oliver andou até ao aparelho que servia para subir a cama , e assim o fez , ficando agora sentado a olhar para mim com uma expressão desiludida . Não parecia desiludido comigo , mas sim consigo próprio . De seguida a sua mão aproximou-se da minha , que estava pousada numa das barras que estava ao lado da cama , e agarrou-a calmamente .
- Desculpa não te ter contado - ele realmente sabia . Mas como é que ele sabia ? Mais um motivo para desconfiar da história contada pela minha mãe .
- Uhn , sem mal - murmurei , apesar de para mim obviamente ter algum mal .
Eu queria tanto saber a verdade , mas como perguntar ? Será que ele também era irmão da Seira ? O pensamento da minha irmãzinha trouxe automaticamente as lágrimas aos meus olhos , fazendo-me ficar com a visão enevoada . Os lábios de Oliver pressionaram-se um contra o outro , como se lesse os meus pensamentos , e como se isso lhe doesse tanto quanto a mim .
- Seira - foi a única coisa que ele pronunciou , antes de ambos enchermos o quarto com os nossos soluços .
Isto respondia à minha questão perfeitamente , e eu não conseguia evitar rever novamente tudo o que se tinha passado na minha cabeça . A mão de Oliver agarrava a minha , agora com mais força , acariciando-me a mesma com o polegar , tentando acalmar-me . De alguma forma era reconfortante saber que afinal eu tinha alguém .
- C-Como ? - murmurei acalmando os meus soluços para ser capaz de falar de forma compreensiva .
- A tua mãe , teve um caso com o meu pai , quando eu já tinha 4 anos . E passado alguns meses nasces-te tu . Sem ofensa mas a tua mãe era uma mulher muito controversa . Ela queria o meu pai , mas dizia que amava o homem com quem ela estava , que calculo que tenhas chamado pai toda a tua vida . O meu pai quis ficar contigo quando descobriu que aquilo tinha acontecido , mas a tua mãe não deixou , porque ela foi cega e não percebeu que era óbvio quem to tinha feito - ele olhou-me e suspirou antes de continuar - Treze anos passaram , e a tua mãe procurou novamente o meu pai , mas de novo acabou por ficar grávida , desta vez da Seira . Os vossos nomes foi tudo escolha do meu pai e da tua mãe , por causa dos desenhos que eles viam juntos , e ele novamente ficou destroçado quando soube o rumo que ela tinha levado - ele murmurou baixo algo como " Que Deus a tenha " .
- Isso quer dizer , que eu tenho pai ? Digo , um pai de verdade ? - algo dentro de mim pareceu saltar de felicidade . Eu realmente tinha alguém da minha família que não me odiasse , incluindo o Oliver .
- Sim , apesar de ele estar a viajar - ele suspirou e sorriu levemente orgulhoso .
- Desculpa a pergunta , mas então o que estás tu aqui a fazer no campus ? - olhei-o confusa . Eu ainda não sabia a maioria dos motivos de todos estarem aqui , mas o Oliver não me parecia nada problemático .
- Eu ? - ele soltou uma leve gargalhada olhando-me - Eu estou aqui para te proteger , obviamente .
Poderia ser que o meu pai tivesse descoberto para onde eu vim e mandou o Oliver para eu não estar só ? Isso era demasiado bondoso se fosse verdade , mas eu queria que fosse . Eu queria uma família boa , ou pelo menos alguma dela .
- Irmãzinha - a voz do Oliver ecoou trazendo-me lágrimas aos olhos novamente , mas desta vez eu estava a chorar de felicidade . Ser chamada de irmã por alguém como ele era demasiado bom . Ele era o irmão e pai que eu nunca tivera , e ao pensar isso , eu mal poderia esperar para conhecer o meu pai .
- Irmão - acabei por pronunciar com um sorriso e com cuidado para não o magoar , abracei-o .
Eu estava abraçada ao meu irmão .
Soava tão irreal , e tão confortante . Eu tinha um pai , um irmão e inclusive uma cunhada . Mas então , o que havia acontecido com a mãe de Oliver ?
- Oliver ... E a tua mãe ? - olhei-o com medo da sua reação , com medo de tocar num ponto sensível , mas ele limitou-se a continuar com um sorriso .
- Ela está em casa dela , i guess - ele soltou uma leve gargalhada olhando-me - Eles estão divorciados , mas foi muito pacífico . Estou muitas vezes com ela e o meu pai ainda fala com ela sem qualquer tipo de problemas . Não tenho um passado negro como quase todos aqui .
Era bom saber que pelo menos ele tinha memórias agradáveis para com a família .
- E a Hannah ? Como aconteceu ? - eu sorria ao falar disso . Falar com o meu irmão e descobrir mais coisas sobre ele era reconfortante .
- A mãe dela trabalhava com a minha . Eram tipo as melhores amigas , e incluso engravidaram quase ao mesmo tempo . No entanto a saúde da sua mãe era fraca , e ela não aguentou o parto , ou seja , como eu , a Hannah ficou com o seu pai . Ele trabalha aqui por acaso - ele sorriu ao falar do suposto sogro . Notava-se que se davam bem , e isso fazia-me feliz .
- Eu sei , foi ele que fez a transfusão - apontei para o algodão que se encontrava pressionado contra o local onde o meu braço encontrava o meu antebraço , na parte interior .
- Ainda bem , ele faz sempre um trabalho impecável - Oliver sorriu novamente , e eu olhava-o . Nesse momento a porta do quarto branco onde nos encontrávamos foi aberta , revelando o médico que outrora tanto havia ajudado o meu irmão .
- Oh , finalmente acordas-te da soneca ? - ele dirigia-se ao Oliver com tamanha confiança , também isso era normal se a sua filha namorava com ele .
- É , estava a ficar com um cheiro um bocado pútrido - ambos riram com a piada negra e eu fiz uma careta .
- Então , já conversaram sobre a "coincidência" ? - o doutor fez aspas com os dedos e sorriu na nossa direcção , referindo-se obviamente ao nosso parentesco .
- Sim - eu pronunciei-me respondendo-lhe com um sorriso na face e o Oliver apenas sorria na sua direcção .
- E então ? - ele olhava-nos curioso esperando uma explicação da nossa parte .
- Encontrei a minha irmãzinha - Oliver respondeu-lhe apertando levemente a minha mão.
O olhar do médico ganhou um brilho e os seus lábios rodeados de rugas ganharam um enorme sorriso , notava-se que ele estava feliz , provavelmente por Oliver , visto ter uma boa relação com ele .
- A menina já não devia estar aqui - uma enfermeira dirigiu-se a mim ao passar pela porta e ao ver-me e logo parou ao ver o médico ao meu lado .
- Ela tem autorização , dada por mim - o médico colocou a mão no meu ombro e as palavras seguintes quase me fizeram chorar - Ela é família .
☜♥☞
A noite já ia bem avançada . Eu já me tinha sentado novamente no sofá , tentando adormecer . Mesmo que o Oliver insistisse para que eu fosse para casa . eu não o ia deixar , não agora que finalmente o tinha encontrado . Tentei mudar de posição , colocando as pernas por cima de um dos braços dos sofás e encostando a cabeça à parte de trás . Ouvia-se a respiração calma do Oliver , e não aqueles 'beeps' irritantes que costumam ser perceptíveis nos quartos de hospitais . O médico dissera que podiam desligar a máquina porque o estado do Oliver era estável , só queriam tê-lo de baixo de olho um pouco para poder confirmar que não haveria mais nenhum problema .
Olhei o relógio , eram 2 da manhã e eu tinha a sensação que não seria capaz de pregar olho . Repentinamente ouvi um pequeno barulho de algo a embater contra a janela , mas não liguei . No entanto passados alguns segundos voltei a ouvir o mesmo , e após soltar um longo suspiro acabei por me levantar , dirigindo-me à janela para ver o que se passava . Fui surpresa por um encapuçado negro lá em baixo , estávamos no 3º andar . Olhava estranhamente para a pessoa desconhecida , que logo me causou um arrepio pois olhou para cima , deixando-me encontrar os seus famosos olhos azuis mar , deixando-me sem jeito como sempre .
- O que estás aqui a fazer ? - sussurrei um pouco alto , mas não alto o suficiente para acordar o Oliver , também ele tinha um sono pesado , por isso não tinha problema .
- Queria ver-te ! - ele sussurrou exatamente no mesmo volume , e as suas palavras fizeram-me corar , e sorrir , e causavam mil e uma borboletas no meu estômago .
- Não podias esperar até amanhecer ? - acabei por responder com uma leve gargalhada recebendo também uma de sua parte .
- Não , não consigo dormir sabendo que tu estás aqui . Mas não me deixam entrar - o seu sorriso era proeminente na sua tentativa de frustração .
- Andy , vai para o campus , se te apanham fora estás metido em sarilhos - avisei-o verdadeiramente preocupada pois não queria que ele tivesse problemas por minha causa .
- Não vou enquanto souber que tu vais ficar acordada a pensar na vida - ele cruzou os braços e sentou-se de pernas à chinês , como uma criança amuada , ou um hippie a fazer greve .
- Mas eu não tenho sono - ripostei olhando-o e ele sorriu de novo .
- Eu faço companhia até teres - o seu carapuço foi puxado mais para a frente cobrindo o pouco cabelo que lhe saia agora da parte de cima .
Acabei por ceder assentindo .
Ali ficámos , eu levantada debruçada na janela e ele sentado na relva a olhar-me com tamanha ternura . Falámos de tanta coisa . Contei-lhe o parentesco entre mim e o Oliver , contei-lhe coisas de onde eu morava , fiz um desenho com um pouco de tijolo num dos papeis do quarto do Oliver para lhe mostrar como era o meu quarto de volta a casa . Ele contou-me sobre si . Contou-me a sua história com a Jenny , contou-me o que ele tinha a ver com o Austin e contou-me tudo o que já tinha passado com o Ashley , no entanto nada referiu sobre o motivo da sua estadia no campus .
Quando demos por isso , o sol espreitava pelas árvores altas que ficavam ao lado do hospital . Acabara por passar a noite em branco , no entanto esse branco era tão colorido quantos olhos do Andy .
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