Capítulo 8 - Esperança perdida
ANNE E GILBERT
O sol que iluminava sua janela parecia ser o mais brilhante que ela tinha visto em dias, mas em contraste com o seu coração pesado, Anne não conseguia enxergar nenhuma beleza ali, enquanto penteava seus cabelos ainda molhados por conta do banho que acabara de tomar.
Era o dia de seu casamento, e por isso ela se levantara mais cedo que o normal, pois àquela manhã festiva se iniciara ainda de madrugada. Ruby insistira para que tanto a cerimônia como as comemorações depois fossem realizadas no forte. Anne hesitara a princípio, mas ao ver a alegria da amiga depois de dias em um confinamento forçado por causa de sua doença que a fazia definhar dia a dia, ela resolveu aceitar. Roy não pareceu se importar muito, embora tivesse contribuído financeiramente com as despesas. O que Anne pôde notar era que se mostrara aliviado em não ter que lidar pessoalmente com os detalhes do casamento, o que era compreensível do ponto de vista da ruivinha.
Ele era um homem que dedicava sua vida à carreira militar, e estava acostumado a uma dinâmica mais prática no seu dia a dia, e obviamente ficaria entediado se tivesse que perder seu tempo com laços de cetim e com qual cobertura ficaria melhor em cima do bolo. Por esta razão, quando Ruby fizera a oferta ele aceitara com um grande sorriso no rosto, e apesar dos protestos de Ruby, deixara sobre a mesinha da sala uma grande soma em dinheiro, que fizera Anne se perguntar qual era a real condição financeira de seu noivo.
Ela sabia que profissionais como ele recebiam uma boa remuneração salarial, mas não que justificasse a quantidade de dinheiro doada para sua festa de casamento. Talvez ele tivesse herdado alguma fortuna de seus pais ou de algum parente, porém, Anne não podia ter nenhuma certeza acerca disso já que ainda não conhecia muito bem o homem com quem estava se casando. Aquela semana que passara ao lado dele não lhe dera muita base para isso, mas pelo menos pudera interagir com ele pessoalmente e não apenas por carta.
A ruivinha se encarou no espelho e se perguntou se estava fazendo a coisa certa, mas ao se lembrar da vida que deixara para
trás, ela entendia que sua escolha fora feita no momento em que recebera a primeira carta de Roy, e que após investir todas as suas economias e energias naquela viagem, ela não tinha mais nada em Toronto que a motivasse a voltar. Sua vida agora estava em Charlottetown e tudo o que desejava era ser uma boa esposa para seu noivo e construir um casamento forte e harmonioso.
No entanto, ela sabia que não haveria paixão, pelo menos da sua parte. Esse sentimento, ela havia desenvolvido por outro homem que a rejeitara em todas as suas tentativas de aproximação. Gilbert era seu desejo secreto, e o amor platônico que levaria em seu coração para sempre. Ele lhe despertara todos os seus sentidos como mulher, e lhe mostrara como a intimidade entre um casal podia ser, e isso era seu paraíso e também sua danação eterna, pois tinha quase certeza que nenhum outro homem despertaria em seu corpo o desejo primitivo pelo proibido , e a necessidade de se libertar de todos os pudores e amar alguém com a alma livre de uma mulher apaixonada.
Ele lhe mostrara o caminho excitante das sensações intensas, e como chegar a um ponto em que tudo o que importava era sentir e os pensamentos ou raciocínio se tornavam obsoletos. Anne quisera explorar mais de tudo aquilo com ele, mas ele colocara um limite que ela nunca conseguiria alcançar. Seus mundos eram diferentes , mas ela não teria se importado em conhecer mais do dele, pois tudo que se relacionava a a Gilbert Gilbert a fascinava de uma forma quase obsessiva.
Aquela mistura de culturas era que tornava a personalidade dele tão atraente. Gilbert era um poço inteiro de sentimentos que ela não tivera a oportunidade de desvendar, mas por trás daqueles olhos que brilhavam como prata depois da chuva havia um homem profundo em seus princípios e crenças , e tão imensamente apaixonante. Ele era misterioso na medida certa, charmoso mesmo em sua maneira séria de ser, lindo em todas as características físicas, e intenso em suas emoções ocultas e muito pouco expostas por ser um homem reservado, e que quase nada falava de si.
Por um instante, ela fechou os olhos e desejou mesmo por breves segundos que o homem que a estaria esperando em frente a um padre naquela tarde fosse ele, mas logo em seguida os abriu, sentindo que Roy não merecia aquela falta de lealdade da parte dela. Ela tinha que honrar sua palavra e seguir com o que tinha planejado antes, pois por mais que Gilbert não saísse do seu pensamento, não era com ele que deveria sonhar e sim com seu noivo com que prometera iniciar sua vida.
Entretanto, conscientemente pensando, não era tão difícil entender todas essas afirmações, mas convencer seu coração era trabalho árduo e complicado. Ela nunca se apaixonara antes e nunca se sentira como parte de si mesma estivesse conectado a alguém daquela maneira. Em sua adolescência, ela vivia em um conto de fadas por meio dos livros que lia, e os heróis dos seus sonhos eram idealizados por ela apenas para tornar sua realidade menos amarga, pois na verdade, Anne sabia que nunca encontraria um homem galante, lindo e que estivesse disposto a mover céus e terras para ficarem juntos.
Contudo, ao se deparar com o Sargento Blythe, ela vira nele todas as fantasias que criara ao longo da vida sobre o sexo oposto. Era como se a imagem do homem ideal tivesse se encarnado naquele corpo masculino indefectível, e fora ali que sua imaginação a pegara completamente. Mas logo, Anne caíra das nuvens ao descobrir que Gilbert não a via da mesma maneira. Ele deixara bem claro que a desejava, porém não tinha intenções de se aprofundar nos sentimentos que nasceram entre os dois. Enquanto que para Anne tudo o que vivera e sentira com ele ia além da compatibilidade física, para o Sargento era só uma questão de pele, e isso ele poderia ter com qualquer outra mulher que não fosse ela.
-Anne, posso entrar?- a voz de Ruby a arrancou de seu profundo devaneio, e a fez voltar a um presente do qual tinha vontade de fugir, mas não tinha nenhum lugar para ir, forçando-a a permanecer exatamente onde estava naquele momento.
-Pode sim, a porta não está trancada. - ela respondeu, ajeitando a barra da sua camisola com cuidado, antes de ouvir o clique da maçaneta sendo girada, e por fim Ruby se fazer presente dentro do seu quarto.
-Eu vim te perguntar se já quer começar seus preparativos pessoais para esse grande dia.- Ruby disse, com um sorriso lindo no rosto, chamando a atenção de Anne para o fato de que ela parecia ainda mais pálida do que no dia anterior.
Como doía ver um pouquinho dela ir embora todos os dias. Era como observar uma flor em um jardim perder seu viço pouco a pouco. Ainda assim ela continuava linda, e aquele brilho nos olhos não tinha sido roubado dela apesar da doença. Anne queria entender como Ruby conseguia ser tão iluminada, quando enfrentava algo tão grave que sugava sua vida com tanta avidez. Em todo aquele tempo, observando o drama pessoal que se desenrolava dentro da família dos Baynards, a garota ruiva nunca tinha visto Ruby deprimida, ou se lamentando. Ela tinha uma força interior que Anne invejava e que a fazia se lembrar dos rochedos à beira da praia que nunca perdiam sua energia, mesmo sendo golpeados tantas vezes pelas ondas.
Aquela garota era especial em todos os sentidos, e Anne podia imaginar o que seria para Jerry perdê-la de uma forma tão triste. Enfim, Anne estava vivenciando um romance trágico mesmo que nada tivesse a ver com sua história, e ao mesmo tempo era lindo ver aquele casal tão apaixonado ainda mais unido que antes, o que não deixava de ser uma tremenda injustiça também do seu ponto de vista.
-Anne.? - Ruby a trouxe de novo para a realidade do momento.
-Desculpe, eu me distraí.- Anne respondeu se sentindo um pouco constrangida com a situação.
-Está nervosa?- Ruby perguntou, assumindo que o alheamento de Anne naquela manhã era o mal que acometia todas as noivas no dia do casamento. Ela jamais imaginaria que o estado em que Anne se encontrava naquele momento tinha a ver com a confusão mental e emocional. Como poderia dizer que ela desejava secretamente que o homem que a estaria esperando no altar fosse o dono de cabelos negros e não louros.
-Um pouco. - ela respondeu,sendo em parte sincera.Seu estado de humor se assemelhava mais a uma melancolia disfarçada do que nervosismo propriamente dito. Porém, ela sabia que já estava na hora de deixar sua ilusão de lado, e permitir que o Sargento Blythe saísse de sua vida para sempre.
-É compreensível querida. Todas nós temos nossas fragilidades expostas no dia do nosso casamento, principalmente quando se trata da noite de núpcias. - Ruby disse ainda sozinha.
-Noite de núpcias? - Anne perguntou, se sentindo confusa.
-Sim, vai me dizer que não pensou sobre isso?. - Ruby disse, mostrando-se surpresa com aquela informação.
-Na verdade, eu tinha outras preocupações em mente. - ou outra pessoa em mente, Anne ponderou consigo mesma. Apesar de saber pouco sobre o assunto, ela tinha apenas imaginado Gilbert nesse quesito, ainda não conseguira ligar sua mente a uma intimidade de casal com seu atual noivo. No entanto, era normal que acontecesse, e aconteceria independente do que tivesse desejado anteriormente em um momento especial como aquele.
-Vai dar tudo certo, minha querida. Você só tem que relaxar e deixar as coisas acontecerem naturalmente.- Ruby aconselhou.
Anne nunca havia conversado com ninguém a respeito desse assunto, e não sabia se gostaria de fazer isso com Ruby, apesar da amiga ter mais experiência que ela em questões tão íntimas. Ela não era tão leiga sobre esse tipo de experiência, e as poucas vezes em que trocara carícias com Gilbert, ela descobrira que tinha um lado seu bastante intenso, mas a questão era: poderia agir da mesma maneira com Roy?
-Está tudo bem.- a ruivinha respondeu sentindo uma sensação desagradável dentro do peito, sem saber como explicá-la.
-Se quiser conversar a respeito, estou à disposição. - Ruby ofereceu e Anne disse:
-Obrigada.- e em seguida voltou sua atenção para o espelho, se fechando completamente para aquele tipo de assunto. Percebendo o desconforto de Anne, Ruby mudou completamente o rumo da conversa.
-A decoração do salão ficou linda. Eu e Jerry vamos recepcionar os convidados, e Diana
Ficará responsável pelo desenvolvimento da festa em relação às comidas servidas aos convidados. Tudo o que você tem que fazer é se arrumar e ficar linda para seu grande dia.- Anne tentou sorrir, mas uma lágrima desavisada escorreu pelo seu rosto jovem. Ela não sabia bem como estava se sentindo, mas havia uma nota triste tocando em seu coração. Era como se estivesse perdendo algo que nunca seria recuperado, e era uma sensação desalentadora e tão dolorida.
-Desculpe, acho que estou me sentindo emotiva hoje. Não choro com facilidade. - Anne confessou. Aquele era um traço de sua personalidade que desenvolvera ainda menina. Vivendo dentro de um orfanato onde tivera que lutar para manter sua mente e corpos sãos, Anne também aprendera a se preservar e a manter seus sentimentos apenas para si mesma, porque compartilhar emoções nunca fora um tema muito debatido nas aulas de religião que recebera, por isso cada criança lá dentro lidava com seus infortúnios de maneira muito particular e individualista.
-É normal, querida. Sua vida está mudando, e suas perspectivas acerca dela também. Eu quero muito que seja feliz, Anne, e que encontre neste casamento tudo o que está procurando.- Ruby disse, tocando seu ombro com carinho.
-Eu também. - Anne respondeu,enxugando mais uma lágrima que caiu inesperadamente.
-Bem,acho que podemos mudar o tema de nossa conversa para assuntos mais alegres. Vamos começar com seus cuidados pessoais para que seja uma noiva incrivelmente perfeita.- Ruby disse, fazendo Anne assentir com um sorriso discreto.
Nas horas seguintes, Anne apenas se deixou ser cuidada como nunca fora antes, pois boa parte de sua vida ela tivera apenas a si mesma como quem contar, e pela primeira vez em toda sua existência, ela pôde sinceramente relaxar sem ter que pensar nas obrigações diárias que em Toronto quase tomavam todo o seu tempo.
Assim, seus cabelos foram hidratados, seu corpo banhado em espumas perfumadas, sua pele do rosto foi maquiagem de maneira suave e quando se deu conta, faltava apenas colocar o vestido de noiva que Ruby fizera questão de lhe presentear, enquanto a modista da cidade trabalhara incansavelmente por duas semanas para que ficasse pronto a tempo.
No momento em que fechou o último botão, Anne se olhou no espelho e quase não reconheceu a garota esbelta refletida ali. O vestido tinha lhe dado um ar diferente, até mesmo uma certa sofisticação que ela sequer teria imaginado. Ele era todo de renda, sem mangas como o clima demandava, e um decote discreto em formato de coração era o detalhe mais encantador de sua parte frontal. O corte era reto, e delineava todas as suas curvas sem ousar demais, terminando em uma cauda tipo sereia que se arrastava a alguns centímetros dela. Não havia um véu para acompanhar, mas uma tiara com flores brancas artificiais fora colocada em meio a seus cabelos ruivos, destacando-lhe a cor e o brilho.
No entanto, apesar de ter amado toda aquela produção aliada ao fato de que seria quase um dia de princesa para ela, Anne não estava feliz. Faltava-lhe algo, e não queria admitir o que era, pois se o fizesse, todos os seus planos de fazer aquele casamento dar certo naufragariam como um navio viajando ao léu no oceano.
-Você está linda, minha querida. Roy ficará encantado no momento em que a vir. - Ruby disse, segurando em sua mão por um breve momento.- Agora vou deixá-la sozinha para que tenha um tempo a sós consigo mesma.- Ela concluiu, saindo do quarto e levando as criadas que a ajudaram a arrumar Anne para seu casamento junto com ela, sem notar a enorme sombra que passou pelos olhos incrivelmente azuis da garota ruiva.
Um pouco afastado de toda aquela confusão estava o Sargento Gilbert Blythe. Como todo sábado, ele tinha se levantado ao amanhecer e cuidava de suas tarefas diárias. Normalmente nos fins de semana ele não tinha que se apresentar na base da Cavalaria ao alvorecer, mas o seu despertar tão cedo tivera um outro motivo.
Ele ouvira rumores de que sua prima tinha sido levada para um acampamento de brancos a alguns quilômetros de Charlottetown, e acompanhado de um dos seus amigos índios, ele fora averiguar aquela informação, mas chegara tarde porque as pessoas que haviam estado ali já tinham partido, e deixaram apenas alguns indícios de ocuparam aquele espaço por algum tempo.
No entanto, examinando o lugar com cuidado, ele encontrou um colar de Ka'kwet com o qual ele a tinha presenteado em sua infância, e seu coração se agitou no peito cheio de ira, fazendo-o apertar o objeto colorido entre os dedos. Ele estivera tão perto de encontrá-la, e mais uma vez chegara tarde demais.
Sentindo o peso do colar entre seus dedos, Gilbert trouxe para sua mente o rosto doce da prima, a quem ele amara e cuidara como a uma irmã. Quando ela era mais nova, ainda em sua inocência infantil, Ka'kwet esperava por ele ansiosamente todos os finais de semana, em que o pai de Gilbert o liberava de suas obrigações diárias e escolares. Naquela época, a garotinha de olhos e cabelos negros como a noite o seguia para todos os lugares. Ela o via como seu herói preferido, e Gilbert sempre lhe dispensava toda a atenção possível, até que Ka'kwet chegou a adolescência, e eles acabaram se afastando um pouco devido a carreira militar que Gilbert abraçara, seguindo assim os passos de seu pai.
A culpa o atingiu ao pensar que se tivesse ficado mais próximo da prima em um período que se mostrara complicado para ela como fora a adolescência, talvez ela não tivesse caído na conversa maliciosa e cheia de segundas intenções de Roy Gardner, mas agora era tarde para lamentar por sua ingenuidade de ter imaginado que a prima estava a salvo na aldeia do seu avô. Tudo o que desejava era que tivesse a chance de encontrá-la com vida, caso contrário, Roy teria mais um pecado a pagar naquela vida, e Gilbert se encarregaria de que sua dívida moral fosse a mais exorbitante possível.
Sem ter mais motivação nenhuma para continuar sua busca, Gilbert reuniu seus irmãos indígenas e assim voltaram pelo mesmo caminho no qual haviam cavalgado para chegar até ali. Ao alcançarem Charlottetown, cada um seguiu seu rumo, e Gilbert foi até sua base da Cavalaria onde ficaria de plantão naquele sábado. Logo depois do almoço, um de seus superiores se aproximou dele e lhe disse:
-Vá até o forte dos Baynards, e leve essa documentação para Jerry assinar. Ele tem um compromisso hoje, e não virá até nossa base. - Gilbert apenas assentiu, sem fazer nenhuma pergunta adicional. Não era de seu feitio questionar uma ordem de seus superiores, embora naquele caso ele ficara tentado a recusar.
Fazia uma semana que não via Anne, e tentara de todas as formas não pensar nela, mas sua mente não o deixava esquecer do rosto mais doce que já tinha conhecido. Era o inferno desejá-la e não poder tê-la. Era como se fosse corroído por uma vontade maior que todas as suas forças de abraçá-la e se entregar à paixão que ela provocara nele, mas não pudera ser saciada.
Gilbert nunca precisara tanto de uma mulher como precisava de Anne. E essa verdade se tornou tão clara como o dia naquela semana em que ele se afastara completamente dela. Ele sabia que fizera o certo, embora seu coração não quisesse concordar, pois arrastá-la para seu mundo seria egoísmo demais de sua parte. Anne não pertencia aquela vida que seria dura demais para qualquer mulher da classe dela. No entanto, agora que estava em vista de vê-la, ele se sentia de certa forma nervoso. Sempre tivera o controle de suas emoções, mas com ela, acabava agindo completamente diferente do que deveria.
Enquanto todos aqueles pensamentos lhe faziam companhia durante o percurso, ele acabou chegando ao forte sem nem mesmo perceber. Logo, ele desceu do cavalo, o prendeu em um lugar seguro e entrou na casa indo direto ao escritório de Jerry, mas não o encontrou por ali. Assim, ele decidiu ir até a cozinha a procura de um empregado que pudesse lhe dizer onde o rapaz poderia estar. Entretanto, quando passava por uma porta entreaberta, seu coração parou de bater por um momento ao ter a visão mais incrível de todas.
Anne estava vestida de noiva, e tão linda que ele não conseguiu resistir e entrou no quarto sem sequer pedir permissão. Ela se virou surpresa, arregalando seus olhos azuis como o céu lá fora e perguntou em seguida:
-Por que está aqui?
-Desculpe-me, eu não quis parecer indelicado. Vim à procura de Jerry e encontrei você. - os olhos dele sobre ela, e seu tom de voz acariciante fIzeram o sangue de Anne correr mais rápido em suas veias. Ela tentou reagir, mas não conseguiu, pois seu corpo se recusava a obedecê-la. Era incrível como a presença de Gilbert conseguia impactá-la de uma maneira poderosa. - Você está maravilhosa.- ele disse, sem esconder sua admiração, deixando que seus olhos absorvessem cada parte dela, sem perder um contorno sequer.
-Obrigada. O Jerry está ajudando Ruby com os preparativos da minha cerimônia de casamento.- Ela respondeu, vendo os olhos luminosos de Gilbert se escurecerem como se anunciassem uma tormenta repentina.
-Seu casamento é hoje? - ele perguntou com a voz um tanto dura.
-Sim. Pensei que soubesse, ainda mais porque estou vestida assim.
-Não, eu não sabia.- ele respondeu. Na verdade, ele fora ofuscado por aquela beleza fantástica dela que nem pensara no motivo de ela estar vestida de noiva. Seu coração quase gritou com aquela informação, mas ele manteve seu rosto impassível como aprendera a fazer ao longo dos anos.- Então, vai mesmo se casar com Roy Gardner? - a voz saiu com um tom desapontado, o qual fez Anne responder:
-Sim, foi para isso que vim para essa cidade. - ela estava zangada com o tom que ele usara para falar com ela. Que direito ele tinha de censurá-la depois de tê-la rejeitado várias vezes?
-Imagino que saiba o que está fazendo?- ele perguntou, ainda não conseguindo aceitar que Anne se uniria a outro homem, mesmo sabendo que não deveria se envolver naquela situação, porque não lhe dizia respeito.
-Sei sim. - ela confirmou, e Gilbert sentiu um desalento infinito em seu coração, mas controlou seu desapontamento enquanto dizia:
-Então só me resta cumprimentá-la por seu casamento, srta. Cuthbert.
-Obrigada, Sargento. - ela respondeu no mesmo tom de formalidade que ele usara para falar com ela.
-Preciso ir. Está na minha hora.- o rapaz explicou, desejando ao mesmo tempo ficar e partir, pois a sensação de perda dentro dele era gigantesca.
-Certo. - Anne respondeu, sentindo sua garganta se apertar. Não queria que ele fosse, mas ao mesmo tempo sabia que não havia alternativa. Ela iria se casar dali a uma hora e suas esperanças sobre Gilbert estavam todas perdidas. Quanto mais prolongasse aquela situação, mais sofreria.
-Adeus, Anne.- ele disse com a voz neutra mas por dentro havia um furacão se formando, ameaçando engoli-lo inteiro.
-Adeus, Sargento. - Anne respondeu, sentindo o vazio começar a se formar em sua alma assim que o viu sair de seu quarto.
Gilbert saiu do forte sentindo uma tempestade de sentimentos se abatendo sobre ele de uma só vez. Antes de ir embora, ele passou pelo escritório de Jerry, deixando o documento sobre a mesa com um bilhete, explicando que viria buscá-lo depois. Assim, ele cavalgou para longe, deixando que o vento atingisse em cheio seu rosto, bagunçasse seus cabelos, em busca de um alívio que nunca viria.
Uma hora depois, quando Jerry veio buscar Anne para levá-la ao altar , ela tinha conseguido se recuperar de sua súbita melancolia, e exibia um sorriso no rosto que nada tinha de felicidade. E conforme caminhava em direção ao homem que seria seu marido, ela ainda desejou que um par de olhos castanhos com um brilho prateado estivesse lá à sua espera, mas logo entendeu que era uma esperança vã.
Assim como suas palavras diante do padre lhe soaram estranhas, tudo ao seu redor parecia acontecer em câmera lenta. Ela mal prestou atenção na festa, dançou a valsa dos noivos mecanicamente assim como cortou o bolo e atirou o buquê de flores do campo como mandava a tradição, sem prestar atenção em quem o tinha pegado. Felizmente ninguém percebeu seu estado de espírito, e por isso, ela aguentou a festa até o fim, sentindo um imenso alívio quando tudo acabou, e ela e Roy puderam se recolher.
Um quarto da casa de Ruby foi oferecido aos recém casados para que desfrutassem de sua primeiras noite juntos com mais conforto, pois no dia seguinte eles viajariam até a fazenda de Roy onde passaria ser o lar de Anne daí em diante. E enquanto se preparava para sua noite de núpcias, ela não conseguiu acalmar seu nervosismo.
Após tirar o pesado vestido de noiva e toda a maquiagem que usara naquele dia, Anne vestiu uma camisola de seda branca que fora presente de suas alunas no seu último dia de aula antes de vir para Charlottetown, escovou os cabelos e com um grande nó na garganta, ela foi ao encontro do marido que a esperava no quarto.
Logo que entrou, viu que Roy também tinha se despido e vestia somente um par de calças de brim. Ele tinha uma constituição física bastante sólida, mas não chegava nem perto dos músculos de Gilbert, e apesar de ser um belo homem, Anne não sentiu nenhum tipo de atração por Roy, o que por si só já era um mau sinal.
Quando a viu dentro do quarto, o rapaz deu uma boa olhada no corpo de Anne, deixando-a desconfortável, e logo em seguida, ele disse:
-Se aproxime de mim, por favor.- Anne fez o que ele pediu, sentindo um bolo na boca de seu estômago se formar.
-Essa camisola antiquada é para diminuir o meu interesse por você? - ele perguntou cheio de ousadia, e antes que Anne respondesse, ele falou.:Tire-a para mim.
-O que? - Anne perguntou confusa.
-Tire a camisola para mim. - o rapaz pediu impaciente. Anne até tentou fazer o que ele lhe pediu, mas se atrapalhou com a alças, deixando Roy ainda mais irritado, o que o fez se aproximar dela ainda mais e com um puxão, ele rasgou a camisola de cima a baixo, fazendo com que Anne o olhasse chocado com o que ele fizera e tentasse de todas as formas esconder seu corpo do olhar faminto que ele lhe lançou, mas logo outro gesto dele a pegou de surpresa. Sem paciência com o nervosismo de Anne que tremia sem parar, ele falou.
-Venha para a cama. - e como ela mais uma vez demorou para fazer o que ele lhe pedira, o rapaz a puxou pelo braço e a atirou na cama, se apossando dos lábios femininos sem nenhuma gentileza.
Muito mais tarde, enquanto Roy dormia a sono solto, Anne permanecia acordada olhando para o teto, e pensando no desastre que havia sido sua primeira noite com Roy. Só de lembrar dos beijos dele em sua pele, ela tinha vontade de entrar no chuveiro e esfregar sua pele até sangrar.
Não podia dizer que ele fora violento, mas também não tivera nenhuma preocupação ou cuidado com sua inexperiência e temor. Sentindo-se completamente magoada, Anne deixou que as lágrimas cobrissem seu rosto, e sozinha no escuro chorou por sua solidão e coração partido. Por fim, ao adormecer naquela noite, foi um par de olhos castanhos com brilho prateado que invadiu seus sonhos, sendo seu único consolo no meio de toda a sua amargura e dor.
Olá pessoal. Mais um capítulo postado. Espero que o apreciem e né deixem seus comentários e votos. Obrigada por tudo. Beijos.
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