Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

05 | VOCÊ ANDA NA MINHA MENTE

CAPÍTULO CINCO | UN VERANO SIN TI
❝VOCÊ ANDA NA MINHA MENTE❞

eu só estou curiosa para saber se você pode se ver tão bem quanto alguém que tem pensado em você⸺ MAMA, YOU BEEN ON MY MIND; jeff buckley

GISÈLE TINHA O HÁBITO DE ENCOSTAR O ROSTO NOS OMBROS DAS PESSOAS DURANTE CADA ABRAÇO QUE DAVA. Ok, talvez não em todos os abraços. Mas se ela se sentisse confortável e segura, ela encostaria o rosto no ombro da outra pessoa, como uma forma de simplesmente deixar claro que havia confiança.

Era estranhamente fofo, ou pelo menos foi o que Alexia pensou depois de assistir à terceira compilação consecutiva de Gisèle fazendo exatamente isso no Tik Tok, em filmagens de bastidores, entrevistas e vídeos de paparazzi. E então ela imaginou o que a garota faria se elas se abraçassem.

Pareceria um pouco estranho, e ela mesma pensou nisso quando se viu passando um vídeo atrás do outro, mas lá estava ela, como se fosse dez anos mais nova, vivenciando um primeiro "amor", que talvez nunca acontecesse de verdade porque tinha metido na cabeça que no momento havia outras coisas com que se preocupar.

Mas Alexia era um pouco confusa - às vezes. Ela podia exagerar em declarações opostas sem nem mesmo perceber. Às vezes, ela pensava uma coisa e no dia seguinte pensava o oposto.

O problema era que Gisèle parecia perfeita para Alexia. Ela era engraçada, de um jeito bobo, e realmente a ouvia. Ela também não tinha medo de apontar o que a estava incomodando, e mesmo a 700 milhas de distância, ela estava fazendo um ótimo trabalho forçando Alexia a agir como uma pessoa "normal" — sem madrugadas acordada e sem tempo excessivo gasto no trabalho. Ela ainda escorregava, mas não tanto mais, e até Mapi comentou sobre isso. Alguns dias atrás, Lluís perguntou o que Alexia achava sobre estender seu tempo de treinamento. Não que ela precisasse, mas ela fazia isso com certa frequência — ok, com bastante frequência. Mas ela disse que precisava ir para casa.

Mapi tentou entender por que ela tinha que ir para casa, porque em qualquer outra situação, Alexia estaria ansiosa para fazer todos praticarem deslocação, rotação e controle porque ela precisava praticar deslocação, rotação e controle. Mas naquele dia, Alexia teve que voltar para o conforto da sua sala de estar, em uma vídeo chamada com Gisèle, ouvindo-a falar sobre sua última consulta para saber como o bebê estava.

O bebê estava bem.

Com Gisèle não era tão diferente. Ela parecia mais e mais ansiosa a cada dia só para saber sobre Alexia. Sobre o que ela tinha feito naquele dia, o que tinha acontecido de diferente, se ela estava bem, se ela tinha dormido o suficiente - esse último ponto sempre importante. Gisèle estendia o tempo no telefone com Alexia até a hora de dormir, o hábito havia se estabelecido com ela desligando a ligação depois que Alexia realmente tinha adormecido, para que ela pudesse descansar. Gisèle não tinha explicação para isso, mas Alexia já havia dito que dormia melhor se adormecesse conversando com Gisèle.

Talvez ela não tenha dito exatamente com essas palavras, mas ela deixou implícito, e depois de alguns dias caminhando por essa linha, até Gisèle estender a conversa para que ela pudesse ouvi-la até que adormecesse, a inglesa tinha entendido que funcionava. 

Alexia tinha assistido a tudo que podia ver de Gisèle. Ela tinha tirado um tempo para assistir ao documentário dela - lançado um ano antes. E ela adorou. Ela amou vê-la andando pelo norte de Londres, com as montagens imitando filmagens antigas, em uma viagem por onde ela tinha crescido. Seus bastidores em sua última turnê, e todas aquelas histórias sobre como aos 24 anos - a idade que ela tinha na época da gravação - ela já era provavelmente o maior nome da música pop inglesa. Ela era uma grande coisa, não importava o quanto insistisse em dizer que não era, e ao mesmo tempo ela era a garota mais normal que Alexia tinha conhecido em muito tempo. Então, talvez fosse exatamente isso que a fez olhar para a inglesa mais do que deveria. Afinal, observando de fora, elas realmente não tinham muito em comum. Considerando que Alexia cresceu em Mollet Del Vallès, viajando com os fãs do Barça para os jogos do time masculino no Camp Nou enquanto Gisèle estava na Inglaterra, primeiro morando em Milton Keynes e depois em Camden, elas estavam separadas por um mar e tinham vidas muito diferentes.

Mas elas se conheceram por acaso, e agora pareciam conectadas, com cada dia adicional gasto em longas conversas, parecia difícil ver um futuro em que essa conexão não existisse.

Era genuíno.

*

Três dias antes da véspera de Natal, Alexia estava sentada em um quarto de hotel em Abegondo, Espanha, na noite anterior a uma partida da Liga F contra o Deportivo La Coruña. Jenni era sua colega de quarto e estava deitada na outra cama do quarto. Elas conversaram por um tempo, mas depois de uns minutos, a garota mais velha ficou em silêncio, focada em algo em seu celular.

Para duas pessoas que, um ano antes, ainda estavam tentando reacender um relacionamento de três anos que falhou completamente porque estavam se machucando mais do que qualquer outra coisa, Alexia e Jenni realmente conseguiram ressuscitar um pouco de sua amizade de anos atrás.

Quando começou a falar sobre seu relacionamento com Jenni em sua conversa com Gisèle, ela escondeu uma grande parte disso. Alexia disse que não teve nenhum drama, o que não era verdade.

Algumas coisas ainda eram estranhas, e Alexia não falava com Jenni sobre tudo, não como faziam antes de começarem a namorar, quando eram apenas amigas. Mas era exatamente por isso, por estarem lá uma para a outra por tanto tempo durante a carreira que construíram, que de uma forma elas ainda eram figuras positivas uma para outra.

O quarto, no início da noite, logo após o jantar que havia acontecido no restaurante no andar de baixo, estava silencioso, e Alexia não se incomodou. Na verdade, ela não se importou muito com o silêncio especificamente. Apesar disso, ela estava começando a ficar inquieta com o fato de não poder fazer nada. Ela queria se levantar e dar uma volta, ou algo assim. Ela também queria ligar para Gisèle e ver se ela poderia conversar até conseguir dormir, mas naquela noite a garota tinha um jantar em família, e Alexia sabia disso porque elas tinham conversado sobre durante a manhã do dia anterior.

Além das partidas em si, essas viagens, fosse com o clube ou com a seleção, não eram a parte favorita de Alexia em ser uma jogadora profissional. Principalmente porque ela não tinha muito o que fazer além de comer, tentar dormir e depois treinar - e ela odiava o tempo em que não tinha absolutamente nada para fazer entre uma coisa e outra. Ela se sentava em quartos de hotel que sempre pareciam os mesmos, e este em particular em Abegondo tinha sido construído em um quadrado, com varandas empilhadas de cada lado com vista para uma área aberta contendo o lobby, bares e restaurante. Todas as portas dos quartos ficavam de frente uma para a outra, e havia aço e vidro por toda parte. O lugar parecia mais uma prisão do que um hotel, e Alexia estava tentando pensar em como, depois do jogo no dia seguinte, ela pegaria o ônibus, para enfrentar uma viagem de nove horas na estrada, claro — mas ela, finalmente, estaria em casa.

Olhando pela janela, porque sua cama estava a apenas um passo de distância, Alexia podia ver uma rodovia dupla pela metade e um rio cinza fluindo ao lado dela. Não era o tipo de vista que a fazia pensar em dar um passeio noturno, mas mesmo se quisesse, Alexia não poderia sair do hotel. Então, depois de se cansar de se revirar na cama e de ouvir os suspiros de tédio de Jenni, Alexia pegou o controle remoto da televisão e ligou o aparelho.

Não havia muitos canais disponíveis, e Alexia acabou em um canal de música. Pouco depois que o vídeo do último single de Harry Styles, "Golden", ou algo assim — ela nunca tinha ouvido, e mal prestou atenção quando os créditos passaram. Depois disso, o último single do último álbum de Gisèle começou. A música era essencialmente sobre uma pessoa que era completamente obcecada por ela, e naturalmente, a música resultante envolvia Gisèle em um vídeo sugestivo. O ritmo era desacelerado e a filmagem alternava entre filme digital e um efeito Super 8, com Gisèle desempenhando o papel de "garota dos sonhos maníaca e absurdamente linda" enquanto brincava em um vestido de verão amarelo e tênis brancos, comendo batom, segurando a língua com um curvex, dançando em um freezer industrial cheio de pêssegos e mordendo sabão da maneira mais estranhamente atraente que alguém poderia morder sabão. O vídeo era essencialmente sobre o amor muito sujo, nojento e estranho que alguém poderia ter por alguém. Alexia tinha visto outros clipes dela — era impossível não encontrá-los, já que ela havia pesquisado o nome da garota no Google várias vezes — mas esse era diferente. Naquela noite, naquele quarto de hotel claustrofóbico, ela percebeu, de uma vez por todas, que Gisèle era fantástica e que se pudesse, ela encontraria um jeito de ficar com ela.

Parecia simples assim.

— Ela é tão linda. Eu simplesmente amo tudo naquela garota, Mapi. Sabe, é uma pena que eu não possa fazer nada a respeito. Mas se tudo fosse diferente, eu provavelmente me casaria com ela sem precisar pensar mais do que duas vezes.

Mapi provavelmente pensou que Alexia estava ficando meio louca quando ouviu isso no dia seguinte, lá embaixo, enquanto elas dividiam uma mesa no café da manhã. O resto das garotas estava tendo suas próprias conversas, e as duas se afastaram porque Alexia odiava a agitação. Bem, às vezes ela odiava agitação. Naquela manhã ela estava odiando a agitação.

A garota de Saragoça, que tendia a levar tudo o que Alexia falava muito a sério, pensou que talvez - mas apenas talvez - a falta de sono tivesse começado a ter algum efeito na mente da mais velha.

— Em que momento chegamos aqui? — Mapi perguntou, com a boca cheia de uma massa folheada que ela não deveria estar comendo, mas que estava realmente muito gostosa.

— Eu apenas vi ela pela televisão ontem — Alexia deu de ombros — E nós passamos tanto tempo conversando nas últimas semanas. Mas não ontem. Ontem ela tinha um compromisso, e eu senti falta das conversas, claro, mas aí a vi pela tela e... Não sei, acho que só entendi o que estou sentindo.

Mapi tinha ido para o Barcelona três anos antes, mas mesmo antes disso, nos training camps da seleção, ela e Alexia costumavam passar muito tempo uma ao lado da outra. Elas tinham passado por muita coisa juntas, muitas coisas mesmo, mas isso não incluía Alexia reconhecer que tinha se apaixonado por uma estrela pop depois de a ver aleatoriamente na televisão. Mas era isso que estava acontecendo.

Alexia e Gisèle estavam construindo uma história, e naquele momento, o coração da jogadora estava voltado para Gisèle. Ela tinha que ficar com ela, mas como poderia fazer isso sabendo que não estava pronta para um relacionamento? Pelo menos não naquele momento.

Ela era uma garota jovem, com uma carreira como jogadora de futebol que estava apenas começando a ir muito bem, depois de anos em que tinha lutado para estar exatamente nessa posição. Aquela mulher linda e absurdamente sexy que ela estava desesperada para ter do lado era uma das figuras mais famosas do mundo. Gisèle estava em todos os lugares. Número um nas paradas pop, mesmo que seu último trabalho já tivesse alguns meses. Na capa de todas as revistas e na primeira página de todos os jornais. Ela era a maior coisa do planeta ao lado de, talvez, mais uma figura ou outra. Porque havia estrelas pop e estrelas pop. E então havia Gisèle. E ali estava Alexia, decidindo que realmente precisava estar com ela, mas também confirmando que não poderia fazer isso. Não naquele momento.

— Você vai ligar para ela para um encontro ou algo assim?

— Eu disse, não posso fazer nada sobre isso.

— Por quê? — Mapi estreitou as sobrancelhas, as franzindo, e encarou Alexia do outro lado da mesa.

— Não acho que posso ser 100% boa se entrar em um relacionamento agora — ela foi honesta — Você sabe, eu me esforcei tanto para colocar os pés onde estou e agora que tudo está acontecendo, eu não quero comprometer esse caminho. Estar com alguém, significa doar uma parte importante da minha vida, e do meu tempo, e por agora, honestamente, tudo sobre o que eu quero pensar é exatamente isso aqui.

— Mas você está pensando nela.

— Não porque eu quero — Alexia balançou a cabeça — É só... difícil não fazer isso. Além de que... Eu não comentei sobre isso, mas ela está grávida e- 

— Espera — Mapi interrompeu a mais velha, engasgando no meio do caminho porque tinha tomado seu suco exatamente na mesma hora. Ela tossiu algumas vezes, mas se recuperou rápido — Desde quando?

— Algum tempo — ela falou — Ela completa o primeiro trimestre na próxima semana.

— E você está contando.

— Ela comenta sobre isso sempre que conversamos — Alexia perguntava sobre isso sempre que elas conversavam. Sobre cada coisa que poderia saber quanto a gravidez, mas Mapi não a deixaria ver o fim daquilo, então ela apenas desconversou.

— Um filho é grande coisa — Mapi reconheceu.

— Eu sei.

— Mas você gosta dela.

— E não estou fazendo nada sobre isso — Alexia reforçou, antes que pudesse ouvir qualquer contraponto.

— Só quero dizer que é a primeira vez que você realmente gosta, g-o-s-t-a, de alguém, Ale. Bem, pelo menos depois de toda a coisa com a Jenni — Mapi suspirou suavemente — Eu sei que é um contexto diferente, e tem muita coisa acontecendo. Pela primeira vez, tem gente prestando atenção em você, mas tipo, realmente prestando atenção em você... — ela mexeu as mãos, gesticulando antes de continuar — E então tem essa garota que é tipo a pessoa mais conhecida do mundo, e ela também tem muito no próprio prato, mas eu acredito que você é boa o bastante para saber levar isso.

— Não, não, Mapi... O que eu deveria fazer? Ligar para ela e dizer que gosto dela mais do que achei que gostaria? Escrever uma carta? 'Querida Gisèle. Você me conhece há dois meses, mas tenho uma forte sensação de que poderíamos estar juntas de alguma forma, porque acho que nos daríamos muito bem. A coisa é que, minha vida está em uma mudança constante nesses últimos meses, e então mergulhar em um relacionamento sério acabaria sendo outra mudança adicionada. Talvez isso dê muito errado, é importante ressaltar. Talvez nos estraguemos tudo. Mas veja, não sei como podemos fazer isso além de apenas conversar então, o que você acha? Você pode me encontrar todo sábado no Estadi Johan Cruyff, se quiser falar pessoalmente sobre essa situação'.

— Você pensou nisso agora? — Mapi levantou as sobrancelhas, e Alexia esperou pelo comentário ácido que não veio. Não porque ele não surgiu na mente de Mapi, mas a garota estava tentando ser legal, então ficou quieta.

— Minha mente trabalha demais quando fico estressada — Alexia confessou.

— Certo... — Mapi encarou a mais velha por um momento, se atendo ao silêncio por um segundo ou dois, ou talvez mais que isso, mas não que elas estivesse contando. Depois, Mapi suspirou uma outra vez, e continuou — O que você vai fazer, então?

— Provavelmente nada.

*

— Por que você está tão obcecada pelo Barcelona ultimamente? — perguntou Daria ao ver Gisèle assistindo à partida do time feminino contra o Deportivo La Coruña em seu iPad.

Ela estava sentada no chão da sala, e Daria estava no sofá, logo atrás dela, fingindo prestar atenção no que estava passando na TV — o episódio especial de Natal do The Graham Norton Show.

Daria tinha aparecido na casa da irmã no dia anterior. Elas foram para o jantar em família juntas, e então a garota voltou com a irmã. Ela tinha saído de férias e, em vez de ficar em casa, aproveitando que agora podia sair como antes, decidiu fazer companhia a Gisèle.

A mais velha tentou esconder o motivo pelo qual, nos últimos dias, parecia uma verdadeira culer, acompanhando os jogos e se certificando de saber exatamente todos os detalhes sobre as competições que o time feminino estava jogando. Dois dias antes, ela até havia encomendado uma camisa no site oficial do time — mas sem número algum. Ela pensou em escolher o 11, com "Alexia" acima, mas rapidamente dissipou seus pensamentos quando percebeu que talvez parecesse outra coisa.

Mas, por outro lado, às vezes ela estava apenas pensando demais.

— Não, não estou obcecada — Gisèle murmurou.

— O pai sabe sobre isso? — a pergunta da garota mais nova foi feita como uma piada, e Gisèle revirou os olhos.

Sinceramente, Duncan não se importaria se visse sua filha vestindo uma camisa do time catalão. Ele definitivamente se importaria se a visse no azul do Chelsea ou o branco e azul marinho do Spurs. Mas ele não precisava se preocupar com isso, porque Gisèle odiava esses times tanto quanto ele.

Ela veio de uma família com um histórico de fanáticos pelo Arsenal, pelo menos do lado paterno - avô, tios, tias, primos. Havia até uma foto de Gisèle quando bebê, com menos de um ano, vestindo uma camisa minúscula do Arsenal, ou talvez fosse um macacão. Aos oito anos, ela estava no Old Trafford quando o time ganhou a liga.

Gisèle ainda assistia ao time jogar, e estava sempre adicionando nomes ao estoque de camisas que acumulara ao longo dos anos. Ela tinha ídolos e ídolos, e camisas históricas com os nomes de Frank Stapleton, Liam Brady, Frank McLintock, Pat Jennings, Charlie George, Dennis Bergkamp e Tony Adams — grande parte dos quais, infelizmente, ela não tinha visto em campo. Mas Gisèle tinha idade suficiente para se lembrar da majestade que era Thierry Henry.

Na casa do pai, havia uma camisa autografada do jogador. E ela tinha uma foto com o francês, naquela mesma final no Old Trafford.

Então, sim. Ela podia ser tão "louca" pelo Arsenal quanto o pai, mas, aparentemente, ela tinha um segundo time, que vestia grená e azul e estava fazendo uma temporada espetacular com seu time feminino.

— Vou ignorar sua pergunta — disse a mais velha, sem realmente desviar o olhar do jogo.

— Você está de olho em alguém? — Daria pegou o controle remoto da TV e abaixou o volume, antes de se inclinar para tentar ver a tela do iPad com mais clareza.

O silêncio repentino da TV fez com o que barulho que estivesse saindo do iPad, antes baixo, parecesse mais alto. Além disso, os gatos de Gisèle - Thierry, um Ragdoll de pelos brancos com detalhes num castanho muito claro, e Kenny, uma British Shorthair de pelo branco - que estavam "brigando" no outro sofá, tinham também começado a fazer ainda mais barulho.

— Meu Deus, por que você acha isso? — Gisèle ficou um pouco irritada, então deixou o iPad na mesa de centro e virou o rosto, inclinando-o levemente para cima, encarando a irmã que com o movimento voltou à posição antiga.

— Você sempre cria essas hiperfixações do nada quando está interessada em alguém. Como quando você se inscreveu no Friends With Shakespeare por causa de Luke, porque ele fazia parte da Royal Shakespeare Company — ela deu de ombros — Barcelona é sua coisa agora?

— Não é minha coisa.

Era a coisa dela.

O barulho mais baixo no iPad cortou a próxima resposta de Daria, pois Gisèle reconheceu o nome de Alexia sendo falado, na narração em espanhol da qual, de dez palavras, ela só conseguia entender duas claramente. Em sua própria defesa, Gisèle diria que seu espanhol era muito bom, mas isso era porque quando ela estava praticando, era com Alexia do outro lado, e a jogadora era gentil o suficiente para diminuir o ritmo a cada nova palavra. Mas, novamente, na maioria das vezes elas só falavam em inglês. O narrador daquele jogo não parecia achar espaço para respirar.

Daria notou o olhar de Gisèle disparando sobre o iPad, e então ela a viu pegando o dispositivo. Nada realmente tinha acontecido. O jogo estava chegando ao fim, Alexia tinha sido substituída, após três assistências nos seis gols que o time tinha marcado. Ela não tinha marcado, mas a partida tinha sido positiva.

— Você tem certeza?

Gisèle não esperou a partida realmente terminar. Havia tempo de acréscimo, mas ela bloqueou a tela do iPad antes disso, e se virou para sua irmã. A mais velha se acomodou, ainda sentada no chão, mas com as costas contra a mesa de centro.

— Digamos, hipoteticamente, que eu conheci alguém.

— Eu sabia! — Daria tentou não soar tão animada, mas se mexeu no sofá, inquieta — Quem é?

— Ela é uma jogadora.

— Imagino que ela jogue no Barcelona — a garota ligou os pontos, obviamente, e viu a irmã assentindo — Há quanto tempo vocês se conhecem?

— Nós nos conhecemos logo depois que terminei com Luke. Eu ainda estava em Barcelona, ​​​​claro.

— E você está... Você sabe. Vocês estão juntas?

— Claro que não — Gisèle foi rápida em esclarecer — Eu estou admitindo que conheci alguém, não estou dizendo que vou fazer algo sobre isso.

— Por conta do término?

— Desde quando um término recente me impediu de entrar em outro relacionamento? — ela pontuou, e então fechou os olhos por um momento — Ok, falar isso em voz alta faz parecer que eu tenho um problema sério.

— Serial Dater — Daria murmurou, num tom ácido e petulante. Ela estava buscando uma reação, mas nada demais. No máximo, estava apenas brincando, e Gisèle revirou os olhos, mas riu antes de alcançar a almofada na poltrona ao lado e atirar na direção da irmã. Com a distância entre elas sendo praticamente a de um passo, a almofada atingiu o alvo com precisão — Ei, ei... — a mais nova levantou as mãos — É o que todos esses sites de fofocas comentam.

— Por favor, não me diga que você realmente os lê.

— Eles aparecem, mas não que importe também — ela deu de ombros e partiu para o que queria realmente saber — Vamos, você estava dizendo que gosta de alguém e não vai fazer nada sobre isso. Eu quero saber a razão.

— Talvez porque eu esteja grávida — Gisèle disse, como se fosse uma razão suficientemente boa. Daria a encarou um pouco confusa, mas reparou que ela estava sendo honesta.

— E isso te impede de alguma coisa?

— Não, mas... — Gisèle suspirou um tanto quanto cansada — É um momento complicado, e o quanto menos complicado eu puder o deixar, melhor. Eu quero vocês do lado, sabe, minha família e os amigos e não... Não um início de relacionamento e todas as preocupações que vem com ele.

— Nem todo início de relacionamento é complicado e cheio de preocupações — Daria falou suavemente, cutucando o joelho da irmã com a ponta do dedo do pé — Às vezes, pode ser apenas bom. Não é porque você teve experiências terríveis que elas vão se repetir.

— O jeito como você falou fez parecer que fui para a guerra.

— Em uma onda de Jake e Drew e terminando em Luke, você meio que foi para a guerra, Elle.

— Meu Deus, achei que você gostava do Luke! — Gisèle abriu a boca surpresa, e Daria acabou rindo.

— Ele sempre foi divertido, e eu achava legal que vocês fossem amigos, o que não quer dizer que torci para que vocês namorassem, Elle.

— E Jake não era tão ruim — a mais velha comentou, mas o comentário saiu um pouco amargo porque logo em seguida ela se arrependeu, e a expressão que fez foi óbvia o bastante para que Daria entendesse que nem ela acreditava naquilo — Ok, não, não. Ele era bem ruim.

— Ele era péssimo.

Jake era um americano. Cara normal. Alto, olhos escuros e cabelos bagunçados. Tinha dois anos a menos que Gisèle e ainda estava na faculdade, em seu último ano jogando futebol americano pelo estado de Ohio. Ele não era tão conhecido e nem tão bom. Gisèle tinha o encontrado em uma viagem até Cleveland, quando saiu para uma Nightclub. Eles ficaram juntos por um mês, e Gisèle odiou cada minuto. Jake estava irritado demais, dependente demais e parecia querer gritar por atenção a cada cinco minutos. O fato que estava com alguém que era, definitivamente, mais conhecida que ele, meio que o fez ficar sem saber como agir.

Daria não tinha o conhecido, mas ela soube o bastante quando Gisèle contou que tinha acabado, apenas um dia depois do primeiro mês juntos - "juntos", e não realmente namorando, porque nunca tinha passado disso.

Drew era outra história, e sobre ele Gisèle apenas não falava tanto. Ele tinha um histórico e tanto com as mulheres de ser um namorado desprezível. Um cantor que não tinha dado certo e logo se tornou produtor. Tinha assinado com a RCA, e apesar de ser um americano nascido na Filadélfia, ele vivia em Londres, mas não fazia realmente nada se não um trabalho aqui e ali com bandas Indie que nunca fizeram barulho na mídia. Ele tratou Gisèle um pouco mal, no ponto de apenas ter sido uma idiota incapaz de demonstrar qualquer emoção mínima diante do relacionamento que eles tinham. Sem mencionar a diferença de idade horrível entre os dois. Gisèle estava com 23 anos enquanto Drew tinha feito 37 pouco antes de se conhecerem.

Ela queria culpar a idade - e em partes até foi isso -, mas a verdade era que estava mesmo em um momento estranho quando Drew apareceu. Quando eles terminaram, eles realmente terminaram. Ela odiou. Depois, ela escreveu 'Save Myself', que entrou no álbum seguinte, e fez questão de deixar claro que era sobre ele. Depois, ainda precisou aguentar o produtor falando para toda publicação que conhecia sobre como a música tinha o feito se sentir péssimo. Ele também tinha dito coisas como: "Foi uma coisa realmente péssima de se fazer da parte dela" e "Nunca recebi um e-mail sobre isso. Nunca recebi um telefonema. Fui realmente pego de surpresa." Como se Gisèle devesse algum tipo de explicação sobre o que escrevia.

— Você acha que Luke vai ser um bom pai? — Gisèle falou de repente, desviando levemente do assunto. Mas o nome dele tinha surgido, e a questão também apenas apareceu na mente da cantora.

— Oh, claro — ela sorriu, e falou sem precisar pensar — ​​Eu não achava que vocês eram perfeitos um para o outro, e estou sendo honesta quando falo isso, mas realmente gosto do Luke. E eu sei que não estava nos planos, a gravidez e tudo mais, mas... Levando em conta que foi inesperado, ele é o cara para isso.

— É... — Gisèle ficou em silêncio por um momento, como se estivesse esperando para que o que quer que estivesse pensando se assentasse dentre si — Pelo menos eu sei que ele não vai sair correndo.

— Mas — Daria não foi nada sutil, e o olhar que sustentou fez Gisèle imaginar que ela estava pronta para resgatar o assunto de antes — A sua jogadora.

— Ela não é minha.

— Ok, ok, eu sei. Só estou dizendo que, voltando ao que estávamos falando, se você gosta dessa garota, talvez você deva se dar uma chance.

— Por qual razão?

— Ela pode ser sua pessoa — a mais nova deu de ombros, e Gisèle não pôde não rir disso, porque logo pareceu imediato demais e extremamente profundo.

— Eu não quero pensar nisso.

— Você não quer pensar nisso, mas vai ficar aqui assistindo aos jogos dela enquanto finge ser uma amiga, sabendo que queria ser algo mais?

Gisèle encarou a irmã com atenção.

— Primeiro, você nem sabe quem é ela, então porque a ânsia em tentar me convencer a dar uma chance para isso?

— Não tem ânsia alguma — Daria deixou claro — Apenas acho que a sua desculpa sobre a situação atual é um pouco fraca, e é estranho vindo de você. Quero dizer, logo você, que não tem medo de tentar quando o assunto é amor. Você, com seus dezessete ex-namorados — a garota pontuou a última parte e viu a reação que estava esperando, com a irmã revirando os olhos. Ela riu.

— Eu acho que você indiretamente me chamou de vadia, mas tudo bem, eu vou fingir que não escutei — Gisèle disse irônica e Daria sustentou o sorriso leve no rosto.

— Eu não acho que você seja isso, cara. Eu estava brincando. Cala a boca.

— Hm, e eu não tive dezessete namorados. A conta não passa de dez, por mais que o Daily Mail queira me dar muitos mais créditos. E o que você disse, bem, o assunto aqui não é amor. É bom deixar claro.

— Não?

— Eu meio que gosto de alguém, Daria — ela balançou a cabeça — Eu não estou apaixonada nem nada. É só... Como aquela coisinha boba que você sente por sua colega de turma quando tem dezesseis anos e sabe que em algumas semanas isso vai passar, porque essas coisas sempre passam.

Gisèle acreditava no que estava dizendo, ou pelo menos queria acreditar. Ela não estava apaixonada nem nada do tipo. Mas, às vezes, estava só tentando se convencer disso.

*

Alexia tinha ouvido histórias sobre celebridades de primeira linha que sabiam como marcar encontros com outras celebridades. Mas ela não era uma celebridade, e não sabia exatamente o que dizer para que seu agente, Josep, contatasse a agente/publicista de Gisèle para convidá-la a assistir a uma partida do Barcelona no Camp Nou. A primeira partida do time feminino em 50 anos, depois dos dois amistosos disputados pelo time feminino do Barça em 1971. 

Ela queria contar a Gisèle sobre, mas ela teve um final de ano agitado. Então, cinco dias antes do clássico catalão, foi quando realmente conseguiu respirar por um momento e ligar para a inglesa. 

Gisèle passou o Natal e o Ano Novo em Londres. No Natal, sua família se reuniu. No Ano Novo, Luke voou para a cidade, e eles passaram o feriado com amigos. No primeiro dia do ano, Luke partiu para Southampton, e com tudo voltando ao normal, durante aquelas férias de fim de ano/início de ano, parte da família de Gisèle se dispersou por um momento. Celeste tinha ido viajar com o marido para Portugal, a tempo do Ano Novo, enquanto Henry tinha voado para Nova York, para passar alguns dias nos Hamptons, na casa de um amigo milionário que conhecera na faculdade. Isaac estava com o pai, Robbie voou para Belfast, para ver a namorada, Alison - que, por mais que ele insistisse que ela ainda não tinha esse rótulo, todos sabiam que era exatamente isso que a Irlandesa era. Daria deixou Londres no primeiro dia do ano, com alguns amigos, para um tempo mais tranquilo em Devon. Todo mundo estava longe, e quando Alexia mencionou o jogo para Gisèle, a garota relutou porque não parecia exatamente a fim de lidar com uma viagem para Barcelona e depois a ideia de como seria o clima de uma partida no Camp Nou. Depois de tantos meses de portões fechados, o estádio voltaria a receber o público. E a expectativa era de que haveria um público recorde.

Gisèle não deu nenhuma resposta imediata, mas Alexia deixou claro que pediria a Josep para entrar em contato com Holly, a assessora de imprensa da garota. Se ela estivesse no clima certo, poderia aparecer.

Cinco dias depois, Alexia estava no Camp Nou para jogar contra o Espanyol, e antes do jogo, alguém no vestiário disse que a cantora inglesa Gisèle estava do lado de fora, e todos sabiam disso porque ela tinha feito muito barulho ao simplesmente aparecer e ocupar um dos espaços VIP lá em cima. Barulho no nível, o Esport3 havia deixado uma única câmera nela, e a inglesa tinha aparecido no telão, o que rendeu um bocado de gritos de fãs animados. E aquele não tinha sido o arranjo de Alexia. Estar lá em cima, num box separado. Na verdade, a garota mais velha esperava algo mais como Gisèle um pouco mais perto do campo, mas a inglesa estava imersa na vida pública há tempo suficiente para saber que definitivamente não daria certo.

Alexia ficou imediatamente nervosa, mas tentou não demonstrar. O jogo daquela quarta-feira era, de alguma forma, importante, e ela não queria deixar que nada mais atrapalhasse como ela poderia entregá-lo.

Ela entrou em campo tentando encontrar Gisèle, mas havia tanta gente no estádio que parecia impossível encontrar alguém. Eli e Alba também estavam lá, e Alexia tentou encontrá-las assim como tentou encontrar Gisèle, mas novamente, havia tanta gente no estádio que parecia impossível encontrar alguém.

Quando o jogo começou, a mente de Alexia simplesmente foi para outro lugar.

Foi ela quem abriu o placar, e marcou de cabeça aos 45 minutos do primeiro tempo, completando um escanteio da esquerda cobrado pela norueguesa Caroline Graham Hansen. Ela saiu para comemorar e acabou no chão abraçada a Aitana. Antes de retornar à sua posição, ela tentou olhar para onde imaginava que a inglesa pudesse estar, como se realmente fosse ver quem queria, mas isso não aconteceu.

E o jogo continuou. A lateral Marta Torrejón ampliou a vantagem aos quatro minutos do segundo tempo, aproveitando o rebote da defesa do Espanyol. A lateral Melanie Serrano fez o terceiro gol, com um chute da entrada da área, aos nove minutos.

A holandesa Lieke Martens dobrou o placar aos 27 minutos, também de cabeça, e aos 39 minutos, a atacante suíça Ana Crnogorcevic fechou a partida ao desviar um chute da zagueira Mapi no meio da área.

O Barcelona só assumiu a liderança da Liga F naquela rodada, com 33 pontos, porque, apesar da campanha perfeita, o time havia jogado três partidas a menos que as principais rivais.

Mais tarde, Alexia descobriu que a mãe e a irmã estavam muito próximas do campo, na seção de família e amigos, e foi conversar com as duas antes de poder retornar ao vestiário. Ela não viu Gisèle, pelo menos não nos minutos imediatos após o jogo. Mas quando ela foi para o lounge dos jogadores, meio rezando para que a inglesa estivesse lá, ela realmente estava.

Alexia se encontrou com sua mãe e irmã. Gisèle estava conversando em um canto com uma garota que a jogadora tinha visto no Instagram da cantora, mas ela não conseguia lembrar seu nome. E as duas não estavam sozinhas, pois havia dois seguranças e uma mulher mais velha que Alexia rapidamente assumiu ser a publicista da garota, bem ao lado delas.

A garota de Mollet Del Vallès podia sentir pequenas gotas de suor começando a rolar por sua testa, por mais que não estivesse quente e ela tivesse acabado de sair debaixo de uma ducha fria, ainda com os cabelos levemente molhados. Mas ela estava nervosa, e de repente, estava realmente muito quente no lounge, por mais que lá fora estivesse fazendo quinze graus.

Mesmo com Alexia vendo Gisèle primeiro, foi a cantora que se aproximou assim que o olhar caiu sobre a mais velha. Ela não esperou, apenas foi. E Alexia não tinha um discurso pronto, porque apesar de ter feito o convite, sem confirmação alguma, ela apenas imaginou que Gisèle não apareceria. Mesmo que tivessem gritado no vestiário que ela estava lá, Alexia ainda estava pensando que deveria estar imaginando coisas. Mas não, ela estava ali, de verdade.

Diferente de Alexia, Gisèle parecia bem relaxada. A garota que estava com ela tinha tomado uma taça de vinho, ou duas, mas Gisèle - obviamente - tinha se limitado a algumas bebidas sem nada de álcool.

Gisèle apresentou Alexia a Misha, e Alexia tentou não parecer tão nervosa quando apresentou Gisèle a sua mãe e irmã. Eli e Alba não sabiam como as duas tinham se conhecido, mas sabiam que elas se conheciam, e Alexia parecia tão encantada com a presença da garota que a irmã mais nova da jogadora precisou se forçar a não comentar se havia algo acontecendo por ali. Se ela fizesse isso, Alexia muito provavelmente não a deixaria em paz pela próxima semana inteira, então o silêncio foi uma escolha acertada.

No jogo, Alexia tinha marcado aquele gol de cabeça, o que ela esperava que pudesse ter impressionado Gisèle, e isso realmente aconteceu. A garota parecia propriamente em sua energia "fã", mal se contendo no próprio assento, e comemorando cada lance do Barça.

Misha, que parecia não saber ainda com tantos detalhes como exatamente Gisèle tinha conhecido a camisa 11 do time, estava à parte de muito e não só disso. Ela tinha recebido a mensagem de Gisèle perguntando sobre o que achava de uma viagem para Barcelona. Ela apenas comentou sobre como tinha feito uma amiga recentemente - Alexia Putellas, Gisèle disse - e ela estaria no Camp Nou em alguns dias. A mais velha precisou se atualizar de tudo, além de que, honestamente, ela não era uma grande fã de futebol, então até saber quem era Alexia, levou algumas buscas no Google e alguns artigos de páginas esportivas que mal conhecia.

Mas apesar da falta de interesse de Misha com o futebol e do fato de que ela não sabia absolutamente nada sobre o Barcelona, ​​Eli se animou com o jeito da garota, e Alba também entrou no assunto. Do outro lado, Alexia não conseguia pensar no que dizer em seguida para Gisèle, e ela ficou um pouco envergonhada de falar qualquer coisa também estando perto da mãe e da irmã. Foi o que a fez perguntar o que a inglesa achava de um passeio pelo estádio.

As duas se afastaram do grupo não muito tempo depois. Os seguranças de Gisèle a observaram de longe, mas quando elas sumiram de vista, eles ficaram parados ali mesmo no lounge, porque a inglesa tinha deixado claro que ficaria bem. E não havia realmente nada que pudesse acontecer. Alexia garantiu que elas não iriam longe.

Foi justamente quando elas se afastaram que Alexia descobriu que Gisèle estava usando o uniforme principal do Barcelona. Ela estava com uma jaqueta de cashmere com acabamento em couro, da Loewe, e por baixo usando uma camisa vermelha e azul com os detalhes e uma gola amarela. Gisèle abriu um pouco a jaqueta, desabotoando os únicos botões presos, os do meio, e fez isso porque estava se sentindo muito mais aquecida do que tinha estado durante o jogo.

Logo havia um sorriso rastejando para os lábios de Alexia, e Gisèle reparou enquanto elas faziam o caminho do lounge até darem a volta e estarem diante do túnel ao lado do campo. Alexia não disse nada, mas logo ela estava fazendo o caminho para o campo.

— Qual nome você tem nas costas? — a pergunta de Alexia foi feita com curiosidade, e ela não presumiu aquilo, mas em alguma parte da própria mente estava apenas esperando que escutasse que a garota estava com o número '11' na camisa.

— Nenhum — a inglesa disse gentilmente, enfiando as mãos no bolso do casaco — Foi uma compra de última hora.

Aquilo não era verdade, a compra não tinha sido de última hora, mas Alexia não precisava saber.

A mais velha levantou a sobrancelha por conta da resposta e olhou uma segunda vez para a camisa que Gisèle estava usando.

— Você quer ter o meu nome? — a questão saiu levemente estranha, e Alexia fechou os olhos por um segundo antes de tentar se corrigir — Quero dizer, o nome na camisa.

— Por um momento eu pensei que estava sendo pedida em casamento — a inglesa brincou, e Alexia revirou antes de a empurrar suavemente pelos ombros. Ela não usou nada de força, mas de qualquer maneira, quando Gisèle foi levemente para o lado, a mão de Alexia estava em sua cintura para a manter perto.

— Você entendeu — ela falou — Eu posso te dar uma das minhas camisas antigas de jogo.

— Sabe, na verdade, eu achei aquela da temporada 18/19 realmente bonita — Gisèle comentou.

— E eu achei que você não fosse fã — Alexia a irritou, e ganhou aquele mesmo empurrão de volta, mas sua mão esquerda ainda estava na cintura de Gisèle, e ela não foi para lugar algum.

— Talvez eu tenha feito minha lição de casa — ela deu de ombros — Agora que eu conheço a "Rainha".

— Ah, por favor — Alexia revirou os olhos, mas um sorriso achou o caminho até seus lábios— Não você também.

— Eu guardei isso por semanas, apenas para dizer pessoalmente — Gisèle falou, e Alexia não duvidou porque parecia como algo que ela faria mesmo — Todos aqueles vídeos em que você quer apenas morrer quando escuta o apelido.

— Todos aqueles vídeos — Alexia pontuou, e Gisèle quase se arrependeu de ter dado a deixa. Se fosse valer de algo, a mais velha tinha também gastado seu tempo vendo "todos aqueles vídeos" de Gisèle. Não que ela fosse assumir isso  — Você se entregou um pouco aqui.

Gisèle olhou para ela. A inglesa era alta, mas ainda assim mais baixa que Alexia, talvez três ou quatro centímetros, mas aqueles poucos centímetros de diferença ainda indicavam que ela tinha que inclinar um pouco a cabeça para cima às vezes, especialmente quando Alexia parecia estar tão perto, ainda mais com um dos braços em volta da cintura de Gisèle.

Os olhos da mais nova encontram os de Alexia, que estavam estranhamente claros, variando num tom de castanho suave com alguns pontos que quase poderiam ser apontados como verdes.

O clima mudou de uma hora para outra, e logo parecia que Gisèle estava pronta para falar sério. Alexia conseguiu reparar na forma como o sorriso dela se sustentou, mas ficou ainda mais suave, quase como apenas uma sugestão no canto dos lábios.

— Como você está?

— Qual resposta você quer? — Alexia perguntou — A honesta ou a que vou dar para que você fique despreocupada?

— A honesta.

— Eu estou ótima.

— Alexia — Gisèle ralhou, e a jogadora riu.

— Ok, veja, eu estou cansada — ela admitiu — Eu tive um final de ano agitado porque fui com a minha família para o Natal e o Ano Novo em Valência, depois que minha irmã insistiu muito. Então voltei direto para o trabalho, e meus últimos dias foram apenas estranhos. Eu não consegui dormir tão bem.

Alexia queria dizer que era porque elas tinham parado de se falar todos os dias, naquele horário um pouco antes das onze, o horário em que ela deveria dormir. Mas ficou quieta. Gisèle não precisava mesmo saber que ter a voz dela no ouvido, falando qualquer besteira, a ajudava a ter uma boa noite de sono.

— E o que nós podemos fazer sobre isso? — Gisèle perguntou.

— Nós? — Alexia levantou as sobrancelhas, e Gisèle a encarou realmente sério.

Parecia tão estranho que houvesse uma sugestão clara de que algo estava acontecendo entre elas ao mesmo tempo em que elas não pareciam minimamente interessadas a dar um passo adiante, fosse lá a razão para isso. Mas elas estavam ali, se preocupando uma com a outra, em um ponto que Gisèle estava apenas tentando entender o que poderia fazer para ajudar Alexia - ou fingindo tentar entender, porque, honestamente, ela meio que sabia o que a garota precisava.

Lá de cima, do lounge com suas janelas de vidro e a vista do campo, Mapi estava encostada na parede de vidro observando Alexia com o braço esquerdo envolvido na cintura de Gisèle, enquanto elas andavam sem realmente uma direção certa. Talvez elas acabassem apenas dando a volta no campo, enrolando o bastante até precisarem voltar para o lugar de onde tinham saído.

— Essa é a garota nova? — a voz de Jenni surgiu atrás de Mapi, e logo a mais velha estava ao lado da garota, mas o olhar de Mapi ainda estava lá embaixo.

— Tente não ficar com ciúmes — ela murmurou, e Jenni soube que era brincadeira. Quando o olhar de Mapi trocou de direção e caiu direto nela, a garota de Saragoça estava sorrindo — Alexia realmente gosta dela.

— Ela te disse isso?

— É — Mapi deu de ombros — Ela conversou com você sobre isso também?

— Eu apenas imaginei, porque ela parece mais leve, menos preocupada. Um pouco mais feliz — Jenni disse — Mas nós não falamos dessas coisas.

— Por que é estranho?

— Honestamente, não para mim — ela foi sincera — Só que, bem, acho que para ela pode ser. Você sabe como ela é.

— Então... Você está bem com isso?

— Nós terminamos por uma razão, Mapi. Sério, eu acho ótimo que ela esteja seguindo em frente. Já era tempo.

— E você? — Mapi perguntou, e Jenni murmurou um "o que tem eu", então a mais nova continuou — Quero saber se tem alguém.

— Na verdade... Não estou falando sobre isso — Jenni respondeu, vaga o bastante para que Mapi entendesse que talvez tivesse alguém, mas Jenni não iria abrir a boca sobre nem se Mapi tentasse muito.

— Ok, eu entendi — a mais nova levantou as mãos em rendição e deixou o silêncio tomar conta do espaço entre elas. Ela voltou a direcionar o olhar para a cena lá de baixo, e viu Alexia rindo de algo que Gisèle tinha dito.

No campo, Alexia ainda estava sorrindo suavemente, mas tinha mudado de assunto e estava comentando sobre seu trabalho. Ela estava falando sobre o vestiário, e o que acontecia entre as jogadoras e a equipe técnica a portas fechadas.

Não era um assunto recorrente, mas era tão único, porque sempre tinha tanta coisa acontecendo. Especialmente no Barcelona, ​​onde elas tinham tantas personagens diferentes. Nacionalidades diferentes. Passatempos diferentes. Idades diferentes. Elas tinham as jovens de 17, 18 anos, que estavam chegando ao primeiro tempo, e as jogadoras de 35 anos, que já caminhavam para o final de suas carreiras. Era uma mistura de tudo.

Alexia estava um pouco mais falante naquele dia, e em momento algum Gisèle a interrompeu. Ela estava tão feliz de apenas estar ali, depois de tantas semanas apenas conversando através do celular, que poderia ouvir a garota falar sobre qualquer coisa pela próxima hora e então a hora depois dessa também.

E mesmo que Alexia não fosse a pessoa mais falante do mundo, assim como em certos aspectos ela também conseguia ser extremamente tímida, com Gisèle os assuntos apenas aconteciam.

Depois que as duas deram realmente uma volta pelo campo, era hora de voltar para o lounge, mas Alexia não perdeu o tempo e perguntou o que Gisèle achava de sair com ela e alguns amigos. A coisa era que Gisèle deveria sair dali direto para o aeroporto. Ela tinha viajado para Barcelona em um voo particular, e Misha tinha um compromisso no dia seguinte, então aquele era realmente um bate e volta.

Mas Alexia insistiu, e Gisèle se viu despedindo de Misha. A garota partiu para o aeroporto, na companhia dos seguranças da cantora, depois que Gisèle insistiu que ficaria bem. Ela tinha estado em Barcelona sem eles por meses, e claro que as situações eram diferentes, já que ela estava confinada a uma casa alugada com vista de cima para a cidade, mas mesmo que estivesse um pouco mais exposta, estaria por apenas mais um dia em Barcelona antes de voltar para casa.

A mãe e a irmã de Alexia seguiram de volta para casa, um caminho de quase uma hora em direção a Mollet Del Vallès, mas não sem antes Eli sussurrar para a filha que a ligaria depois, porque elas tinham muito para conversar. Alexia sabia que era muito pouco o que passava por Eli, então ela teria algumas explicações para oferecer.

Com o pessoal que acertou o destino para o encontro depois do jogo, Gisèle conheceu o El Xampanyet, um restaurante que ficava em uma das ruas estreitas e exclusivas para pedestres do bairro El Borne, bem na esquina do Museu Picasso.

Apesar da localização perfeita para atrair turistas, o El Xampanyet continuava mantendo todas as tradições de um bar local, com suas paredes de azulejos azuis e mesas de madeira, e uma abordagem sem reservas, sem site e sem frescuras para comida e bebida. O bar estava sempre incrivelmente movimentado e lotado, e dependendo do dia, as pessoas precisavam esperar para se acotovelar só para encontrar um lugar em pé.

Mapi era uma cliente frequente, muito porque adorava o fato de que o público era basicamente os velhos do bairro e sempre algum grupo perdido de turistas. Além de que na terceira visita dela, os funcionários já estavam a tratando como uma cliente regular e já sabiam seu nome.

Naquela noite, junto de Alexia e Mapi, estavam Mariona e Patri, além das mais novas, Jana e Cata. Elas se sentaram do lado de fora. Normalmente, o El Xampanyet não colocava as cadeiras ali, porque o espaço não era tanto e havia sempre outros estabelecimentos enchendo os becos de cadeiras, como o Euskal Etxea que ficava no primeiro espaço seguindo à direita e virando à esquerda. Mas, havia mesas do lado de fora, e no espaço mais aberto frente ao Euskal Etxea tinha uma agitação maior. Um bocado de gente tinha se ajeitado por ali porque um grupo de músicos estava em um set acústico mais animado. Para uma noite de quarta-feira, era consideravelmente normal. As noites de Barcelona não eram exatamente calmas.

Gisèle não estava bebendo, por razões óbvias, e Alexia nunca bebia durante a temporada, mas Mapi se permitiu duas taças de vinho branco, porque a bebida caseira do El Xampanyet custava apenas dois euros e era muito boa. Depois, elas pediram pratos pequenos, porque aquele jantar era mais como um "lanche tardio" e ninguém estava realmente com fome. Mas a comida quente da cozinha era ótima e entre tortilhas, tapas e calamares fritos, a noite passou rápido.

Gisèle era, provavelmente, uma das pessoas mais simples de conversar, e apesar do espanhol levemente quebrado, ela fez questão de tentar o usar ao invés de se ater ao inglês. A inglesa estava sentada entre Mapi e Alexia, e a mais velha estava com um dos braços apoiados na parte de trás de sua cadeira, com uma sugestão de sorriso enquanto escutava a conversa dela com Mapi e Jana.

Todas elas notaram isso, o fato de Alexia não ter parado de sorrir desde que Gisèle tinha colocado os pés no Camp Nou. Ela não tinha parado de sorrir desde que tinha a encontrado pessoalmente.

Mapi sabia o motivo, mas ela não estava contando para ninguém.

*

A camisa branca com o pequeno logotipo da Nike no centro do peito que Alexia tinha pendurada em algum canto do armário acabou no corpo de Gisèle, porque ela não tinha se preparado para mais do que algumas horas em Barcelona. A garota não estava realmente usando nada por baixo além de sua cueca boxer Calvin Klein. Então, quando Alexia se acomodou com ela na cama de casal, já que ela não tinha realmente um quarto de hóspedes, o espaço começou a parecer estranhamente pequeno.

Mas Gisèle sentiu o nervosismo de Alexia, ou o que quer que fosse, e apenas tentou fazer tudo parecer o mais normal possível. Logo, ela estava deitada com seu corpo pressionado contra o da jogadora, sendo abraçada por trás enquanto, com dedos gentis, Alexia traçava padrões na pele macia de seu braço, seu rosto pressionado contra a nuca.

— O que isso significa? — Alexia perguntou, passando os dedos sobre uma das tatuagens que Gisèle tinha em seu braço. Logo abaixo das letras minúsculas "Emos and Greebos Unite" havia uma pequena placa com linhas finas que dizia "Milton Keynes".

— Ah, foi lá que eu cresci — respondeu Gisèle, enquanto olhava para a tatuagem à qual Alexia se referia — Minha mãe costumava dizer que eu poderia 'me cortar por acidente' e meu sangue pingaria Milton Keynes.

— Cidade pequena?

— Hmhmm — murmurou Gisèle — Fui para Milton Keynes quando tinha quatro anos.

— E onde você morava antes?

— Royal Tunbridge Wells. Onde eu nasci. É como uma cidade no condado de Kent. Pequena e antiga.

— Imagino que Milton Keynes seja o oposto.

— Sim, algo assim — ela disse — A cidade é bem nova, mas diferente de tantos outros lugares na Inglaterra, sei lá, tudo era diferente. Eu simplesmente amava estar lá. Ei, você gosta de estar aqui?

— Em Barcelona?

— Não — Gisèle foi irônica, e ficou claro o que viria a partir daquilo — Eu estava falando sobre estar aqui comigo, mas é claro... — ela riu, e Alexia se juntou a ela — Sério, você gosta de estar aqui em Barcelona?

— Eu gosto — Alexia disse suavemente — Sinto falta de estar em casa, mas ao mesmo tempo estou a uma hora de distância de lá, então sempre que as coisas parecem difíceis eu pego o carro e volto para lá, só para tentar respirar melhor. Ainda assim, eu me acostumei a estar em Barna.

— Sua mãe ainda mora em Mollet?

— Ela e minha irmã.

— E seu pai?

— Sim, sim, hum, todos moravam lá, estavam lá, quando ele faleceu.

Alexia nunca falava sobre seu pai, e por um tempo Gisèle se perguntou o porquê. Não era como se a coisa toda estivesse lá para as pessoas saberem. Era só isso. Ela não falava sobre isso. Então, de alguma forma, foi um pouco surpreendente ouvir o que ouviu. O quarto ficou em silêncio por um momento, mas foi um momento muito breve.

— Quero perguntar sobre isso, mas não quero fazer isso se você não quiser responder.

— Eu posso responder — Alexia disse, com a voz mais baixa e o rosto ainda mais próximo da pele de Gisèle. A inglesa estava sentindo a respiração dela, ainda suave — O que você quer saber?

— Só me fale sobre ele.

A família de Alexia era um grupo muito unido, que se tornou ainda mais próximo após a morte de Jaume. Aqueles que a conheciam melhor sabiam que ela podia ser uma pessoa muito fechada às vezes, e raramente falava sobre seu pai. Mas, ao contrário de tantas vezes, ela queria falar sobre ele, porque queria que Gisèle tentasse conhecê-lo. Claro, a inglesa não podia realmente fazer isso, mas ela poderia tentar entender quem ele era pela maneira como Alexia se lembrava dele.

— Ele foi quem se dedicou à minha carreira no futebol desde que eu era uma garotinha. Me pegando na escola, me deixando no treino, assistindo às minhas partidas, postando orgulhosamente vídeos e fotos de tudo o que eu fazia. Às vezes, ele acordava às duas da manhã, não importava o quão cansado estivesse ou não, só para me levar aos campos de treinamento.

— Você queria jogar por causa dele?

— Não exatamente. Eu sempre fui uma criança voltada para esportes. Joguei basquete, hóquei e tênis, mas o futebol sempre foi minha escolha número um porque sempre me saí melhor em campo. Quando eu tinha sete anos, entrei para o Sabadell FC, a 15 quilômetros de Mollet, e naquela época eu estava jogando com meninas que eram, tipo, cinco anos mais velhas que eu — disse ela — E toda a minha família se reunia para encontrar uma maneira de me levar para o treinamento. Minha mãe e minha irmã nem são fãs de futebol, mas elas estão imersas no esporte desde então. Depois que meu pai faleceu, era meio que minha mãe que estava lá. Ela podia não entender metade do que estava acontecendo, mas ela estava lá, em todos os lugares que podia estar. Os treinos abertos, os jogos.

A família de Alexia assumiu o papel de seu pai, pois eram seus fãs número um. Jaume deixou isso claro, com coisas como dirigir três horas de Barcelona até Levante, na costa da Espanha, todo domingo, só para vê-la jogar.

Mas é claro que, nessa época, Alexia ainda era muito jovem e, de certa forma, estava apenas começando a entender o que realmente queria e o que poderia fazer. Ainda havia muito espaço para melhorias e sua tenacidade dez anos atrás era evidente. Por isso, quando o treinador do Levante, Antonio Contreras, disse a ela, bem no início do trabalho da garota no time, que ela confiava demais em seu pé esquerdo, depois do treino ela praticou chutes com seu lado mais fraco, e Jaume estava lá para ajudar com isso. E o trabalho duro valeu a pena, porque quando ela se mudou para o Barcelona no verão seguinte, o treinador mal conseguiu dizer qual era seu lado dominante.

Alexia lembrou disso, e do treinador do Levante, e da época de Jaume fazendo viagens longas para a ver jogar, porque foi realmente o último momento da vida dela que o pai pôde acompanhar. Antonio, inclusive, ainda era um amigo. Quando Alexia voltou ao Valencia para enfrentar o Levante como jogadora do Barcelona anos atrás, pela primeira vez, ela perguntou ao seu antigo treinador se poderia ir até a casa de sua família e conhecer seu filho recém-nascido Alejandro. Toda vez que retornava, ela repetia o encontro. Esse era o tipo de pessoa que ela era.

Ao ouvir Alexia falar sobre essas coisas, e sobre o pai, e então emendar histórias sobre a mãe e a irmã, foi difícil para Gisèle não considerar que havia uma semelhança de Jaume com a filha. Aparentemente calmo e focado, ela parecia ter sido mais como ele mesmo. Enquanto sua irmã mais nova, Alba, era mais como a mãe.

Em partes, isso talvez tenha acontecido porque Jaume sempre esteve junto com Alexia, enquanto Alba vivia seguindo a mãe pelos cantos. Lá atrás, o pai de Alexia era a pessoa mais importante no futebol para ela. Ela tinha realmente se esforçado para fazer do esporte uma carreira, porque ele tinha confiança nela para isso. Mas ele tinha sido também quem quase a fez se afastar dos campos, porque quando a saúde dele começou a se deteriorar, gradualmente ele ficou muito doente com problemas cardíacos, e isso se estendeu por um ano até que ele faleceu. Naquela época Alexia pensou em desistir e voltar para a faculdade. Ela disse para ele que iria "estudar medicina para ser médica" e o ajudar. Mas ele a convenceu do contrário, e ela permaneceu no Levante.

Um dia, o treinador de Alexia no Levante recebeu uma ligação, porque o celular dela estava sem carga alguma. Eli não tinha conseguido falar com a filha, então ligou para Antonio e disse que eles tinham um problema, porque Jaume estava no hospital, e os médicos deixaram claro que era uma situação extremamente complicada.

Ele morreu logo depois.

Contar isso não era uma coisa fácil. Na verdade, falando sobre o momento para Gisèle, foi realmente a primeira vez que ela voltou para aquele mesmo dia depois de quase uma década do momento que tinha acontecido. Então, enquanto falava sobre o que tinha sentido e pensava no caminho de quase quatro horas  que fez de Valência para Barcelona para que pudesse tentar ver o pai uma última vez, ​​ela sentiu os olhos ficarem um pouco mais pesados. Algumas lágrimas quiseram teimar em escorrer, mas Alexia tentou ser mais rápida em impedir que isso acontecesse.

Quando Gisèle sentiu o aperto da garota se afastando de seu braço, com ela usando a mão para limpar o rosto, a inglesa não pensou muito e logo estava se virando para ficar de frente para a jogadora. Ela estendeu uma das mãos até seu rosto, cortando de vez o espaço mínimo que havia entre elas, e limpou a única lágrima que tinha se sustentado, depois se inclinou e deixou um beijo ali, naquele mesmo lugar, antes de se acomodar no abraço de Alexia, sentindo ela apoiar o queixo no topo de sua cabeça.

— Você disse que quase desistiu do futebol naquela época... — Gisèle pontuou, não se limitando à própria curiosidade e ao silêncio quanto a ela — O que aconteceu?

— O que me fez não desistir?

— Sim.

— O Barcelona me chamou, e o Barcelona foi uma das maiores paixões do meu pai. E minha. Era coisa de família. A coisa é que, dois meses depois que.... Dois meses depois da morte do meu pai, eles me ligaram e disseram que me queriam dar um espaço no time principal. Eu ainda estava no Levante, mas na verdade, não tinha voltado para Valencia ainda. Fiquei em Mollet por todo esse tempo tentando entender o que eu faria, e quando me ligaram, eu apenas sabia que deveria tentar dar uma chance para isso. Liguei para o meu treinador e falei o que tinha acontecido. Alguns dias depois eu assinei com o Barça.

— E como você virou "La Reina"? — Gisèle desviou o assunto levemente, tentando tirar o peso de antes, e isso foi o suficiente para que Alexia deixasse uma risada suave escapar.

— Você realmente não vai me deixar ver o fim disso, nena — a palavra escapou dos lábios de Alexia, e Gisèle sentiu o rosto um pouco mais quente do que antes.

— Não, não — Gisèle riu, tentando não parecer tão mexida quanto tinha ficado — É uma pergunta honesta.

— Eu não tenho uma resposta — Alexia falou — As pessoas dizem que eu sou muito disciplinada, quase obsessiva, com meu regime de treinamento e a maneira como encaro o jogo, e acho que, em partes, pode ser verdade, mas também, foi exatamente isso que me trouxe até aqui. Eu me tornei um nome na mídia local depois do meu gol na Copa de La Reina de 2013, que eles chamaram de, e eu lembro muito bem disso, eles chamaram de "estilo Messi", e então meio que uma coisa levou a outra, mas o apelido... Quero dizer, é incrível, ótimo, divertido que as pessoas me tenham dessa maneira... É só que essas coisas vêm naturalmente para mim, eu não as planejei. 

— As pessoas te param na rua aqui em Barcelona? — Gisèle emendou a pergunta, como se tivesse achado o espaço perfeito para isso. E ela tinha, então apenas aproveitaria.

— Você sabe, até um ou dois anos atrás, isso era realmente difícil de acontecer, mas agora não tanto, o que é estranho. Nunca é nada demais, mas tipo, tem fãs pedindo para terem camisas assinadas e todas essas coisas. E eu ainda preciso me acostumar com isso, porque sou muito introvertida — ela confessou — Você vê, eu moro aqui, um pouco afastada de tudo, e eu gosto disso. Mas também tem o lado profissional, e acho que devo isso aos fãs e ao time. É divertido ver que o esporte está crescendo, e no fim, meio que não somos nada sem os fãs. Isso muda totalmente o esporte. Eu sei que essa parte precisa ser nutrida, então se eu tiver que ficar para trás por mais quinze ou vinte minutos e autografar camisas para fãs que pagaram para assistir as garotas e eu, então vou fazer isso.

— Bem, se você quiser alguma dica sobre como lidar com essas coisas, eu estou aqui — a mais nova disse, brincando, num tom mais baixo — Não sou uma super jogadora, nem nada assim, mas eu estou há uma década tendo cada passo que dou sendo documentado. Deve valer de algo.

— É... — Alexia suspirou — Como você consegue?

— Sinceramente, acho que só me acostumei com a atenção — ela foi sincera — E não é tão ruim assim que você entende que nem tudo merece seu tempo. Tem também o fato de que, eu me cerquei de uma equipe muito boa, e minha família está sempre lá para mim. No fim, eu apenas gosto do que faço e, preciso ser honesta, quero dizer, eu ganho dinheiro fazendo exatamente o que amo.  É óbvio que adoro o que faço. Tem maneiras e maneiras de levar a vida e eu estou bem com a minha maneira. Certo que os pontos negativos estão aí, mas eles terminam sendo mínimos perto do todo.

— Você é sempre tão normal.

— E eu não deveria ser? — ela riu.

— Não, você me entendeu. Para alguém que tem o mundo inteiro querendo saber seu próximo passo, é surpreendente que você seja apenas aquela garota de Milton K-Keynes. Milton Keynes? — ela queria ter certeza de que tinha acertado a cidade, e Gisèle assentiu, sorrindo de leve.

— Milton Keynes.

— Então, é disso que estou falando.

— Bem, você também parece ser como uma garota extremamente normal de Mollet.

— Isso é porque, no caso, eu sou.

— Alexia...

— A sua realidade não é a minha — Alexia continuou — Eu tenho certeza de que você não poderia ficar cinco minutos na Plaça Catalunya sem atrair uma multidão. Eu posso fazer isso.

— Ainda. Isso vai mudar.

— Porque você diz isso?

— Porque tem sido um ano estranho — Gisèle comentou, usando as palavras de Alexia. Ela tinha dito aquilo em uma das últimas conversas que tiveram pelo celular — Você anda atraindo ainda mais atenção. E sua temporada... Acho que vocês são o melhor time do mundo.

— Uau, melhor que o seu Arsenal? — Alexia tentou, e Gisèle quase revirou os olhos, mas acabou sorrindo.

— Você não vai conseguir com que eu fale isso tão diretamente.

— Eu pelo menos tentei — ela riu — Mas, independente, mesmo que as coisas mudem, eu vou continuar a mesma. Ou, pelo menos, eu vou tentar. Você ainda vai poder falar comigo e contar seus problemas. Eu ainda serei uma ótima ouvinte. Eu ainda vou gostar de rir e brincar sobre as coisas mais idiotas possíveis. E ainda vou estar com os meus amigos e querer passear com a Nala, sair para um café, ir à praia. Eu ainda vou ser uma pessoa muito, muito normal. Eu vou ser a pessoa mais normal que você conhece, na verdade. Não vai existir ninguém mais absurdamente normal do que eu — ela brincou na última sentença, mas Gisèle realmente acreditou naquilo.

Se houvesse alguém capaz de permanecer imutável, em relação a si mesma, diante de uma mudança tão grande de vida como a que parecia estar prestes a acontecer, essa pessoa provavelmente era Alexia.

— Você é realmente alguma coisa, hm.

— O que isso deveria significar?

— Certo... — Gisèle sorriu gentilmente, registrando que inglês definitivamente ainda não era a coisa que Alexia mais dominava, então ela não entendeu de qualquer maneira o sentido da frase — É só que você é diferente, não sei como explicar isso.

Alexia soltou uma risada baixa, e sua mão deslizou para cima para segurar o rosto de Gisèle. O polegar do jogadora traçou o lábio inferior da garota mais nova, mas sem realmente intenção alguma.

— Posso confessar uma coisa? — a voz de Alexia estava mais baixa, e um pouco mais rouca. Seu sotaque então pareceu ainda mais nítido, mas Gisèle o achou perfeito.

— Claro.

Alexia queria dizer que nunca tinha se sentido assim por ninguém antes. Assim que conheceu Gisèle, ela sabia que queria que algo mais acontecesse. Dizer isso em voz alta parecia loucura, mas Alexia teve certeza disso tão rápido. E elas tinham se acostumado uma com a outra. Elas se descobriram, e aprenderam a confiar uma na outra durante aquelas conversas pelo celular que às vezes duravam quatro horas.

Alexia não era uma pessoa que sabia jogar conversa fora, pelo menos não até conhecer alguém muito bem, mas ela tinha sido assim com Gisèle. E talvez estar em lados opostos, há duas horas de avião, não tinha sido a pior coisa para aqueles primeiros dias, porque ali, se vendo depois de tanto tempo, parecia que elas já tinham se aproximado muito rápido. E mesmo sendo tímida às vezes, ao menos na companhia de outras pessoas, quando se tratava de contar seus pensamentos a ser honesta com Gisèle, tudo era mais fácil.

Então, Alexia tentou ser o mais honesta que conseguiu e, na verdade, elas deram início a conversa mais simples e bonita que duas pessoas conseguiriam ter uma com a outra. A mais velha murmurou: 'Acho que estou apaixonada por você, Gisèle.'

'Acho que também estou apaixonada por você', foi o que ela recebeu de volta.



notes.

Oi! Parando aqui apenas para explicar uma coisa e perguntar outra. 

Primeiro, vocês devem ter reparado que aqui na história, no início de 2021, as garotas jogaram no Camp Nou com público. Obviamente, na realidade isso não aconteceu. Elas realmente jogaram no Camp Nou 50 anos depois que a equipe feminina do Barça jogou no Estádio, mas não havia público por motivo de "pandemia". Mas isso aqui é uma fanfic então vamos fingir, porque na verdade, partindo daqui o mundo na história vai voltar a ficar consideravelmente "normal".

Agora, queria apenas perguntar o que vocês estão achando de Un Verano Sin Ti? Os últimos dois capítulos acabaram sendo bem mais longos do que eu tinha planejado, mas a coisa é que, tem sido realmente mais fácil e divertido escrever isso aqui, então... é, queria apenas saber o que vocês estão achando.

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro