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Capítulo 46

-Estou com fome. -Catarina resmunga quando saio da quarto e fecho a porta. Não escondo o ódio no meu olhar, mas ela ainda está meio grogue.

Vou para a cozinha e esquento alguma comida que estava na geladeira.

-Você está com raiva. -Ela percebe. 

-Ah, jura?

-Desculpa se interrompi alguma obscenidade, mas precisava muito comer.

-Tudo bem, eu entendo. -Entrego o prato de comida a ela e me sento na sua frente. -Não chegamos lá.

-Não chegaram? -Ela ergue as sobrancelhas. -Então, estavam no caminho?

-Pode se dizer que sim. 

-Safada!

-Aham. Muito.

Rimos um pouco e logo ficamos em silêncio.

-Acho que ainda não estou pronta. -Falo de repente. -Sinto que ainda preciso resolver coisas comigo mesma.

-Lindíssima. Falou tudo. Sério, estou orgulhosa. Te ensinei bem.

Sorrio.

-Converse sobre isso com a psicóloga, quando você for.

-Eu irei. Está marcado. Cat, estou apavorada.

Ela toca a minha mão, e eu a seguro.

-Eu também.

Naquele momento, só consegui lembrar de uma frase que li na internet de um livro chamado "A Coragem de Ser Imperfeito": Muitas vezes nossa primeira e maior ousadia é pedir ajuda.

Catarina diz que vai embora cedo e não quer me acordar, deixo a chave em cima da mesa para ela.

                           *******

Acordo com o barulho da porta do banheiro. Abro meus olhos e vejo Thomas entrando. Quando ele saiu, digo:

-Bom dia.

Meu corpo ainda está cansado. Sinto que não dormi o suficiente, mas não me sinto de ressaca.

Thomas já vestido novamente (infelizmente) se inclina e me dá um selinho.

-Bom dia, raio de sol.

-Brega. Estou mais para nuvem negra.

-Para com isso, vai. Você ilumina minha vida.

-Ok. Estranho. Nem transamos ontem a noite e já está assim...

Nem percebo as palavras ousadas saindo da minha boca. Não me importo. Já estamos íntimos. Pensei que ia ficar com vergonha sobre ontem à noite, mas não estou.

Ele se joga na cama ao meu lado e me beija lentamente.

-Imagina quando acontecer então...

Nos beijamos mais um pouco. Nada demais. Sem esquentar muito. Ele já estava vestido.

-Tenho que ir. -Thomas afunda a cabeça na minha clavícula e suspira. - Tenho que buscar meu irmão na casa do Rafa.

Ele beija suavemente meu ombro e se levanta.

-Ty e esse amigo dele são bem grudados, né?

Thomas para por um instante e fica olhando para o nada por um tempo. Divagando.

-Terra para Thomas...

-Ah, oi! Desculpa. Pode se dizer que sim. -Ele diz isso com um sorrisinho. -Abre o portão para mim?

-Estou pensando no seu caso. -Brinco.

-Vai me manter em cárcere privado, é?

-Lindo desse jeito... -Digo me levantando e puxando a gola da sua camisa. -Talvez sim.

-Tentador.

Ele me beija de novo. Com mais vontade. Beijo de despedida. Até segunda...

Thomas passa pelo portão da minha casa e depois de muito tempo percebo minha solidão.

A noite foi ótima, quase perfeita, mas os problemas sempre voltam. O peso não vai embora. Ignoramos por um momento.

Fico andando de um lado para o outro na casa. Inquieta. Tentei ler. Assistir filmes, séries e vídeos no YouTube. Ouvir música, dormir, me masturbar. Mas nada ia. Tudo me irritava ou me deixava mais inquieta. Os meus pensamentos não paravam. E eu me sentia só sem Thomas ou Catarina por perto. O que era um problema. Não posso depender deles. Tenho que me bastar sozinha. Preciso trabalhar nisso.

A única coisa que fiz foi comer muito. Estava ansiosa. Sabe se lá o porquê. E depois me senti mal, culpada.

Chorei.

Eu tinha tudo. Tudo que eu precisava. Até mais. E não bastava. O vazio estava sempre ali. A nuvenzinha negra pairava acima de mim.

Eu só precisava ser forte até conseguir ajuda. Aguente firme, Lily. Digo isso para mim várias vezes, até conseguir pegar no sono e torcer para o amanhã ser melhor que hoje.

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