Capítulo 28
Cheguei em casa e fui direto para o meu quarto. Minha mãe correu atrás de mim, provavelmente para continuar seu discurso, mas meu pai a parou.
-Tudo que tinha pra ser dito já foi. -Ouvi meu pai dizer. -Agora é ficar em cima para ela estudar e ficarmos de olho, apenas isso.
-Olha só o que ela fez a gente passar, Luiz! Como pode ficar tão calmo? Eu vou passar mal.
-Fica calma, tome água com açúcar, deite um pouco. Aproveite o dia livre. Estão precisando de mim no escritório e vou voltar pra lá. Deixe a Lilian um pouco em paz pra ela repensar suas atitudes.
Minha mãe apenas suspirou e ouvi seus passos vindo até o meu quarto. Ela abriu minha porta bruscamente.
-O que está fazendo? -Ela gritou e eu fiquei em silêncio, apenas encarando. -Comece a estudar AGORA! E se você não estiver estudando, vai me ajudar com as tarefas de casa. Tem muita louça para lavar por aqui.
E assim ela saiu batendo perna, e fechando a porta do meu quarto com força.
Me joguei na cama e fiquei ali por um bom tempo encarando o teto, pensando no que eu fiz, pensando nas palavras dos meus pais e da diretora, pensando em Thomas e em Catarina.
Assim o buraco no meu peito foi aumentando. Eu me senti encolher aos poucos num corpo tão grande. O buraco negro em volta do meu coração parecia me engolir, e a busca por ar para os meus pulmões parecia inútil.
Eu chorei, chorei muito. Por arrependimento, raiva, culpa, tristeza e muitos outros sentimentos.
Chorei tanto ao ponto de não conseguir me mexer por minha cara estar toda cheia de catarro, vermelha e inchada.
Chorei ao ponto de soluçar e não conseguir respirar mais.
Eu abafei um grito no meu travesseiro e chorei mais um pouco até minha cabeça doer, e eu finalmente conseguir dormir, ou eu apenas desmaiei. Eu sinceramente não sei.
***
Acordei com minha mãe gritando pelo meu nome. Levantei num pulo com o coração a mil.
Abro a porta.
-A Catarina ligou. Quer falar com você.
Eu demorei um pouco pra raciocinar as palavras dela. Eu estava sem celular. Mas logo lembrei que Catarina tinha o número do telefone fixo da minha casa.
-Eu posso atender? -Falei caminhando até a sala. Pela merda que eu tinha feito meus direitos tinham se reduzido a 0.
-Pode. -Ela disse simplesmente.
Caminhei até o telefone fixo na bancada, perto do sofá.
-Alô? Catarina?
-Lilian! Finalmente! O que aconteceu? Sua mãe parecia chateada no telefone e não me explicou as coisas! Por favor me contaaaaaaaa.
Meu coração se contraiu. Como eu ia contar aquilo para a Catarina? Ela que se esforça tanto na escola, mil vezes mais que eu. Como eu conto para ela que eu sou uma fraude? Que tudo que eu fazia era manipular o sistema de notas terrível da escola? Que eu nunca sequer havia ajudado ela em algum matéria quando ela precisou de notas?
Só naquele momento que eu considerei essas possibilidades, e eu me senti a pior amiga do mundo; e de fato, eu era.
-Olha, é muito complicado. Muito mesmo. Eu não consigo te contar por telefone. Terei que te contar na escola. Pode ser? Volto daqui três dias. Estou suspensa.
-Meu Deus Lily, você quer me matar de curiosidade? Como assim suspensão? Deixe eu ir na sua casa então para gente conversar? Foi por isso que você está sem celular?
-Sim...E duvido minha mãe achar uma boa ideia eu receber amigos agora em casa. Ela provavelmente quer me deserdar. -Falei mais baixo para minha mãe não ouvir, já que ela estava na cozinha que é perto da sala. -Sinto muito, logo volto pra escola, prometo explicar tudo. Avise o Thomas para mim, e pode passar o número aqui de casa, sabe, caso ele precise falar comigo.
-Tudo bem. -Ouvi ela dar um alto suspiro dramático. -Você e Thomas estão...?
-Não sei. Não sei o que temos... Não tivemos tempo de, você sabe, conversar sobre qualquer coisa. Ele parece estar com uns problemas também. -Lembrei das marcas roxos em seu corpo e meu coração se contraiu ainda mais. -Enfim, a gente se vê na escola, viu? Muito obrigada, não fique tão preocupada comigo, você sabe que eu te amo.
-Eu sei Lily, também te amo, mas é inevitável ficar preocupada com você às vezes. Mas ok, eu espero você poder me contar seu grande ato de rebeldia pessoalmente. Beijos, até mais.
-Beijos, até mais. -E ela enfim, desligou.
As palavras de Catarina ficaram na minha cabeça o resto da noite.
"É inevitável ficar preocupada com você às vezes."
Será que eu venho sendo um fardo tão grande para as pessoas a minha volta?
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