⊹⊱3⊰⊹
O cheiro da morte está em volta,
E pela noite, enquanto o frio vento sopra,
Ninguém se importa, ninguém sabe
Pet Sematary - Ramones
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Tudo bem, eu admito, realmente me irritou a ouvir gritando que preferia morrer a vir comigo. Me descontrolei, minha aura escapou e um pequeno acidente aconteceu.
Ela preferia morrer...
Quando ela pulou da janela ainda com a pantufa nos pés e a camisola que havia colocado para dormir, eu soube o quanto ela estava realmente assustada.
— Zagreu, se acalme — Evander segurou no meu ombro — é só uma humana. Está assustada.
Suspirei, aquilo era óbvio e ele não precisava nem mesmo me falar.
— Por que eu tenho que me humilhar para que uma humana fique comigo? — forcei o maxilar com raiva.
— Não é por ela, Zagreu... sabe disso, não sabe?
Suspirei, eu sabia bem daquilo.
— Vamos segui-la.
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Não era de fato difícil acompanhá-la, mesmo que ela corresse a toda velocidade que seu corpo frágil permitisse. Ninguém prestava atenção nela, mesmo que ela estivesse terrivelmente malvestida e aparentemente assustada.
Empatia? Zero.
Ela parou ofegante e olhou ao redor, mudei parte da minha aparência para ficar mais parecido a um homem daquele lugar, pelo menos na parte das roupas. Pena que eu não podia me modificar por completo, eu seguiria sendo eu, mesmo que estivesse usando as roupas largas e estranhas dali.
— Tem certeza? — Evander me perguntou preocupado — Irá enganá-la desse jeito.
— Prefere mesmo que eu a force, então? — perguntei revirando os olhos para ele — Eu preciso saber como fazer isso funcionar, e sendo eu mesmo, ela não vai nem querer me ouvir.
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— Você está bem? — perguntei ao me deixar ver por ela. Ela tinha os olhos assustados ainda, mas pareceu perder um pouco o medo inicialmente.
Vários segundos se passaram sem que ela tirasse seus olhos de mim, mas não precisei de muito para ela me contar que estava com problemas. Imprudente... tinha acabado de me conhecer, mas eu teria que tirar alguma vantagem daquilo.
— Eu posso te ajudar — falei de maneira confiante —Eu posso proteger a casa se você quiser, basta apenas pagar pelo meu trabalho.
Claro, eu não precisava do dinheiro dela, mas se eu falasse que faria aquilo de graça, ela sem dúvidas não teria acreditado e se fosse minimamente inteligente, inclusive fugiria.
Ela forçou o maxilar e depois olhou em volta, talvez se dando conta de que estava em uma viela escura com um homem desconhecido, porque seu olhar de repente passou da calma momentânea ao pânico e ela passou reto por mim rapidamente.
Droga, já tínhamos começado mal.
— Acredite em mim — tentei apressar meus passos até ela — Eu posso pegar quem quer que esteja assombrando a sua casa. Sei que lá tem um fantasma. Sei que andam acontecendo coisas estranhas.
Fantasma? Sério que eu estava tão desesperado a ponto de usar essa desculpa? Mas pensando bem, não era ao todo mentira dizer que alguns fantasmas realmente assombravam algumas casas e ela tendo a aura que tinha, eu não duvidava que chegassem alguns muito rápido até ela.
Ela parou por um momento e pareceu pensar antes de se virar.
— Como você sabia disso? — ela perguntou desconfiada, uma desconfiança certamente justificada.
— Eu sou clarividente e consigo guiar os espíritos e fantasmas para o caminho dos mortos — não era necessariamente uma mentira, fazia parte do que eu era no fim das contas — Posso guiá-los para o submundo assim como a sua mãe. Também consigo proteger as pessoas dos espíritos malignos.
— Você é um médium, então? — ela pareceu um pouco confusa.
— Prefiro o termo oráculo, se você não se importar.
— Então, está me dizendo que você é o intermediário que pode nos trazer a resposta dos deuses? — ela cruzou o braço começando claramente a se irritar — Se você tem contato com eles, prefiro que você fique longe, então.
Ela realmente nos odiava. Péssima escolha de palavras as minhas.
— Eu realmente posso te ajudar — falei tentando convencê-la — Você mudou de casa ontem, estava fugindo de alguma coisa, mas há algo errado com a casa... o que está assombrando a casa segue lá e por conta do medo você saiu de casa sem nem mesmo trocar de sapatos ou de roupa.
Ela automaticamente olhou para os pés e para a pantufa cor de rosa que ela seguia usando.
— Eu não sei se posso confiar em você — ela suspirou — Você pode ser apenas um stalker. Me fale coisas que ninguém sabe então...
— Seu nome é Désirée Yu Angelle, você fez vinte anos ontem, e aproveitando, meus parabéns. Seu pai é francês e sua mãe chinesa. Você é estudante veterana de astronomia. Você tem amigos aqui, mas não se sente bem com nenhum deles porque se sente deslocada e por conta disso se sente sozinha às vezes. Você acabou de se mudar para uma casa às pressas por estar fugindo de algo ou alguém, mas não esperava que tivesse um fantasma logo no primeiro dia, apesar de você acreditar que seja aquele que está a sua procura assombrando a casa — me aproximei um pouco mais e falei baixo no seu ouvido — mas há algo que ninguém sabe, nem mesmo seus pais... sua mãe previu o seu destino e previu que esse destino está entrelaçado ao rei do submundo Hades, mas você sabe que não é assim... você sabe que não é ao Hades que está destinada e sabe que mais cedo ou mais tarde, irão te encontrar.
Um arrepio aparente percorreu seu corpo inteiro fazendo-a tremer.
— Você realmente pode me ajudar?
— Eu posso — falei me afastando um pouco.
— Você vai se arrepender, Zagreu — Evander, que seguia oculto para ela me falou baixo — Se ela descobrir que você a está enganando, ela nunca mais vai confiar em você. Vai te odiar ainda mais.
"Ela precisa confiar em mim só até fazermos o ritual, após isso, contanto que cumpramos o nosso papel, o que ela vai pensar ou não de mim não me importa" — pensei, mas não podia simplesmente responder a ele estando visível para ela.
Olhei para ela, ela estava relutante, obviamente, mas no fim ela suspirou derrotada.
— Se puder expulsar aquele demônio da casa, eu pagarei pelo seu trabalho.
Demônio, ela realmente tinha me chamado de demônio... Eu realmente teria que ter muita paciência...
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Pegamos um taxi em um silêncio constrangedor. O homem ao meu lado tinha os olhos fixos em um celular estranho e eu tentei não me sentir incomodada com a sua presença fascinantemente atraente.
Olhei pela janela, mexendo de maneira nervosa os dedos, eu mal notei que eu havia corrido um caminho tão longo.
— Ei... qual é o seu nome? — perguntei me virando para ele. Tinha percebido apenas naquele momento, que nem isso eu havia feito.
Ele parou um tempo, como se estivesse pensando. Talvez não se sentisse tão confortável falando seu nome para mim?
— Louis — ele falou sem tirar os olhos da tela.
— Um nome francês? Que coincidência — sorri de maneira involuntária fazendo-o sorrir fracamente também — Mas é só isso? Nenhum sobrenome? — normalmente as pessoas davam nome e sobrenome por ali e acabei por perguntar.
— Não — ele finalmente virou para mim e por um pequeno momento, seus olhos verdes pareceram duas pequenas chamas. Talvez algum reflexo de uma luz externa — Prefiro não revelar meu sobrenome.
— E por que não? — tentei manter o assunto já que ele parecia disposto a continuar conversando — Isso te torna muito misterioso.
— Então estou fazendo um bom trabalho — ele resmungou e eu achei um pouco de graça na maneira como ele falou.
— E por que você quer ser tão misterioso?
— Porque me faz soar como alguns especialistas em assuntos sobrenaturais daqui — ele estava brincando, claramente estava porque riu baixo de novo.
Quando chegamos na porta da minha casa, havia um homem de óculos fundos olhando para o meu quintal de maneira pensativa. Reconheci o homem das redes sociais como um dos que prometeram ajudar com os amuletos para proteger a casa.
— Senhor — o chamei tirando-o de sua concentração.
— Senhorita, houve uma morte nessa casa — ele falou sem se apresentar — ele está ofendido demais para deixar o mundo humano. Eu vou lançar um feitiço para deixá-lo ir embora.
Um espírito? Olhei para a casa e não senti nada demais, e nem vi espírito nenhum desde que eu tinha ido. Eu pressentia que era algum subordinado de Hades ou até mesmo o próprio Hades, mas por outro lado, ele poderia estar certo e tudo isso podia ser apenas meu medo falando mais alto.
Olhei para Louis e ele franziu a sobrancelha, claramente estranhando o que o homem acabara de dizer.
— Louis? — o chamei para ver o que ele achava daquilo, depois me dei conta de que eu nem o conhecia e não deveria estar me importando com o que ele pensava ou não.
— Deixe-o fazer isso se ele quiser — Louis apenas colocou a mão no bolso da blusa enquanto eu convidava tanto ele como o outro estranho para o jardim da casa.
— Me chamo Gregory — o homem por fim se apresentou — Acredito que a senhorita seja a senhorita Désirée.
Ele me estendeu uma mão e eu a apertei sentindo uma estranha sensação passar pelo corpo, como se de algum modo, minha energia estivesse sendo sugada por aquele toque. Louis apertou os olhos na direção das nossas mãos e pareceu apertar levemente o maxilar. Balancei a cabeça tentando me concentrar, se ele fosse um espírito, eu conseguiria saber e naquele momento ele não me parecia um, mas ele também não tinha o calor de um ser humano.
Imprudente, era isso que eu era. Que mulher deixaria dois homens desconhecidos entrarem na sua casa altas horas da noite? Entrei na casa inventando uma desculpa qualquer e peguei minha arma... era melhor prevenir.
Quando voltei para o jardim, Gregory já havia organizado uma mesa com diversas coisas ritualísticas em ordem. Depois tirou uma espada de madeira taoísta de dentro da roupa enquanto falava palavras incompreensíveis para mim.
Louis estava sério do meu lado, parecia não ver graça nenhuma naquilo, nem dava para definir se ele acreditava ou não no que estava vendo.
— Você consegue entender o que ele está falando? — perguntei baixo.
— Não — sua expressão não mudou minimamente, havia inclusive um certo tom de desdém em sua voz — mas ele está certo sobre uma coisa — ele se aproximou de maneira silenciosa por trás de mim e sua voz roçou no meu ouvido — Seu quintal está de fato sombrio. Pode haver realmente um fantasma essa noite aqui.
— Mas ele não está lançando um feitiço para isso? — nunca quis tanto que minha mãe estivesse presente como naquele momento, se eu tivesse ao menos metade do talento dela, poderia acabar com aquilo tudo rapidamente.
— É um espírito acorrentado — ele falou dando de ombros e se colocou ao meu lado de novo — Gregory não pode vê-lo. Esse espírito está buscando energia... energia de alguém que tem muita para oferecer.
Novamente estremeci. Sem dúvidas estava ali por mim então. Uma brisa gelada passou me fazendo encolher rapidamente o corpo e Louis apenas me olhou de canto de olho.
— Senhorita, você pode descansar segura essa noite — Gregory falou se aproximando — o fantasma não aparecerá mais.
— Obrigada, senhor — falei sem acreditar realmente no que ele havia dito. Algo não se encaixava naquela história.
Eu já tinha visto minha mãe trabalhar diversas vezes e com certeza não era só falar algumas poucas palavras e jogar algumas moedas para o alto que resolvia o problema. Eu não me sentia bem.
— De nada, meu dever é expulsar demônios e fantasmas — Gregory continuou — Mesmo assim, devemos ser prudentes. Ficarei no quintal essa noite. Você e seu namorado não precisam se preocupar com nada.
— Namorado? — olhei para o lado e de repente senti a ardência instantânea no rosto.
Louis tinha um rosto sério e parecia um pouco tenso. Ele apertou os olhos para Gregory, que apenas se sentou em um canto do quintal. Eu só tinha vontade de correr novamente e dessa vez, sem dúvidas não era por conta de nenhuma assombração.
— Apenas vá dormir hoje à noite como de costume — Louis falou sem tirar os olhos do outro homem — Quando der meia noite, desça até a sala e me encontre.
— Acha que eu sou idiota para me encontrar com alguém que eu não conheço no meio da noite? — perguntei na defensiva.
— Acho que você já foi idiota ao colocar dois desconhecidos para o lado de dentro — ele continuou sério — então agora a decisão de fazer ou não o que eu estou falando, novamente precisa ser sua. Esperarei no andar de baixo e se estiver com tanto medo assim, é só manter a arma que está no seu bolso carregada.
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