J U L I E

— Julie, não precisa fazer isso!

— Eu preciso, o jogo me pediu e eu tenho que obedecer ou… — suspiro — ou o Luke morre.

Uma lágrima escorre em meu rosto e limpo-a seguindo para o cânion. Aqui em Urubici tem vários, então foi péssimo jogar justo nesse lugar.

Cânions são vales profundos. Se você cair, você morre.

O jogo me pediu para me sentar na beirada e tentar descer até que ele me mande parar, então tivemos que trazer o jogo conosco.

Me sentei na beira e respirei fundo ao olhar para baixo. Parece que o espírito sabe que tenho muito medo de altura.

— É muito escorregadio, como eu vou… — eu estava com muito medo.

Fechei os olhos e finalmente tomei coragem.

Me virei e olhei para os meus amigos.

— Amo vocês — saiu como despedida, sem que eu quisesse.

Segurei na borda e comecei a descer. Conseguia escutar a voz da Flynn:

— Ela precisa descer mais? — ela perguntava ao jogo.

Minha amiga gritou um sim para que eu escutasse e passei para o lado e desci mais um pouco torcendo para que eu não caísse.
Tive que descer mais e já estava morrendo de medo, pois não tinha mais para onde eu ir. A única forma de eu descer, era me jogando. Mas sabíamos como isso terminaria.

— Chega! Cansei! — exclama Luke.

Olho para cima e vejo que ele tenta descer. Ele desce para me ajudar, e todos os meus amigos fazem o mesmo.

Eu grito com lágrimas nos olhos para que eles parassem e voltassem para cima. Eles não me escutam ou fingem não escutar.

Senti minhas costas queimar, depois o meu braço. Olhei e vi que tinha vários machucados que não estavam ali antes. Era o espírito. Ele estava irritado, pois não estávamos cumprindo de uma maneira correta o desafio que ele impôs.

As dores e os machucados estavam aumentando, mas nada se comparava com a dor de imaginar meus amigos morrendo por minha causa.

Eu gritava "voltem para cima", mas eles não me davam bola. Continuavam descendo.

Quando senti minhas forças indo embora, e quando achei que fosse cair. A mão de Luke pegou o meu pulso.

— Eu não vou te deixar. Nunca!

Essa é a promessa que fizemos aos 12 anos de idade.

Luke fez uma careta de dor e vi que o espírito também estava o machucando.

— Me solta.

— O quê? Não! Você vai cair.

— Desculpa… — suspiro. — Eu te amo. Como nunca amei ninguém, mas eu vou ter que te deixar — lhe dou um selinho e ele me olha confuso. Aproveito isso e tiro sua mão do meu pulso.

Começo a cair em um vale profundo e fecho os meus olhos para não ver nada, pois não queria morrer com medo.

Já imaginei várias vezes em como seria minha morte, mas nunca imaginei que iria morrer dessa forma.

Com os olhos fechados e lágrimas descendo por elas, consigo escutar os gritos dos meus amigos. Obrigada pelo que fizeram por mim.

Queria dizer isso, mas estava longe demais para que eles escutassem.

Se eu soubesse o que esse jogo iria causar, nunca teria aceitado jogar. Foi a pior decisão que eu tomei na minha vida, mas não precisaria viver com essa culpa, pois no dia primeiro de outubro de 1990 foi o dia que eu morri.

FIM.