Capítulo 15
Dedico este capítulo á três pessoas:
Lays, Victor e Lavínia.
Vocês me fazem acreditar que tudo é possível ao lado de pessoas incríveis.
E aos demais leitores, sou muito grata por começar o ano com vocês S2
-Joyce Anne.
***
É tão fácil julgar as pessoas, tão simples, direto e instantâneo. Julgamos pelas vestimentas, pelo cabelo, pela cor da pele, maneira de falar, sotaque e até mesmo lugar de origem. Perdi as contas de quantas pessoas já julguei automaticamente e tenho certeza de que já me julgaram inúmeras vezes.
Eu estava acostumada a me sentir julgada, pois sentia olhares em mim o tempo todo, como se houvesse uma folha grudada em minhas costas com uma frase ridícula, porém ninguém possuía coragem para tirar esse papel ou me avisar, apenas observavam e acreditavam que o que estava escrito era verdade. Pensei que seria apenas isso: Lidar com a vida, tentar não ser massacrada pelo olhar das pessoas ou tentar ignorar com as coisas que eu vivia.
Entretanto, houve uma vez, foi diferente de todas as outras e eu não consegui me esquecer, pois em vez de olhares curiosos, eu vi o olhar de alguém que parecia me conhecer por dentro. Eu já tinha ouvido falar d’Ele, mas quando mirei naqueles olhos... Foi como uma flecha certeira, atingindo-me em cheio... Eu nunca mais fui a mesma.
***
Meu nome é Charlie, tenho 18 anos e sou a menina mais confusa de todo o universo (Sim, exagero também é uma das minhas habilidades).
Moro com o meu irmão, Matheus, só que ele odeia quando eu o chamo assim, então o chamam de Téo. Acredito que ninguém na faculdade desconfie de que ele é meu irmão, afinal ele tem vergonha de mim e finge que não me vê durante as aulas.
Nossos pais morreram em um acidente de carro quando eu tinha 10 anos, todos nós estávamos no carro, porém apenas eu e o Matheus sobrevivemos. Até hoje o Matheus parece me culpar pelo que aconteceu, pois era o meu aniversário e eu insisti de joelhos que nossos pais me levassem para o zoológico, a questão é que nunca conseguimos chegar lá.
Morávamos com a nossa tia Lena até o Matheus fazer 18 anos, ele é 2 anos mais velho que eu, então na época ele ficou responsável por mim, pois por mais que me odiasse, a tia Lena fazia qualquer pessoa querer pegar as malas e fugir para outro estado.
Eu trabalho em uma cafeteria depois das aulas, para pagar a faculdade e ajudar o Matheus com o aluguel. Até hoje eu não sei com o que ele trabalha, mas não parece coisa boa, pois ele nunca responde nada que eu pergunto á respeito.
-Será que dá para você sair da minha frente?- Matheus passa por mim bruscamente e quase leva o meu braço junto com ele.
Tento arrumar minhas coisas antes de ir para a aula, não gosto de ficar aqui com ele em casa, é desconfortável até para beber água.
-Você poderia ser um pouquinho mais gentil... – sussurro para mim mesma, porém ele acaba ouvindo.
-E você devia achar um rumo para a sua vida- ele diz com raiva- Você já tem 18 anos, não preciso mais ficar carregando esse fardo.
-Você é meu irmão... – olho para ele- Não quero desaparecer da sua vida, querendo ou não você é a única pessoa que eu tenho...
-Eu não seria o único se você não tivesse insistido em ir para aquele zoológico idiota- ele diz ríspido.
-Eu só tinha 10 anos!- meus olhos tenham segurar as lágrimas- Como eu poderia saber?!
Ele ignora o que eu digo e sai, batendo a porta com mais força do que devia.
[...]
Enquanto eu caminho pela rua, um vento frio acaba me fazendo tremer. Enquanto eu visto o meu casaco, percebo as marcas nos meus pulsos. Eu costumava fazer cortes quando eu tinha uns 16 anos, porém as cicatrizes nunca saíram totalmente e eu apenas tento escondê-las. Hoje em dia eu não faço mais isso, não porque eu estou bem, mas porque não me estava aliviando coisa alguma.
Coloco as mãos nos bolsos do casaco e encontro um papelzinho dobrado em formato de borboleta, me lembro do dia em que o encontrei na minha mesa.
No dia da troca de turmas, eu esbarrei com uma garota de cabelos encaracolados e ela acabou vendo as marcas nos meus pulsos. Saí rápido de lá, pois eu não queria que ela pensasse que eu era apenas uma garota dramática. Ela tentou ir atrás de mim outras vezes, mas eu sempre fugia...
Porém, houve um dia em que eu senti uma fagulha se acendendo em meu coração novamente.
Eu tinha tido um dia terrível e quase fui demitida, não consegui me segurar e chorei no banheiro da faculdade, pois parecia que as coisas nunca mudariam. Já fui em psicólogos, todos diziam que eu devia deixar o passado para trás e aproveitar os momentos, mas ficava difícil fazer isso com o irmão que eu tinha, e eu não queria deixá-lo sozinho.
Meus pais sempre acreditaram em Deus, mas eu não gostava de ir para a igreja e nem o Matheus, porém eu não entendia porque Deus tinha permitido aquilo, era meu aniversário... Para mim, Deus era só um conto de fadas, mas no fundo eu gostaria que Ele fosse real para que os meus pais estivessem em um lugar bom.
Naquele dia todas essas lembranças vieram e me massacraram, mas quando eu voltei para a minha sala eu encontrei um papelzinho dobrado em formato de borboleta, eu abri e li:
“Eu estou com você, nunca vou te abandonar... Você é única para mim e eu sempre estarei ao seu lado, independente do que aconteça.
-Deus”
Eu senti algo estranho dentro de mim ao ler aquilo, não era algo ruim, apenas... Diferente. Pela primeira vez eu senti que alguém se importava pelo menos um pouco comigo, e eu sabia quem tinha deixado a borboleta na minha mesa.
[...]
Alguns dias depois, encontrei outra borboleta em uma janela, só que dessa vez possuía o número de uma das salas da faculdade, eu sabia quem tinha feito a borboleta, então eu fui até lá.
Quando eu entrei, vi jovens com violões, prontos para receberem pessoas, que a propósito ainda não haviam chegado. Descobri que o nome da menina era Jasmim e que seus três amigos se chamavam Lucas, Clara e Enam.
Pensei que tudo se tratava de um culto ou uma reunião religiosa, mas eu me enganei, foi algo diferente do que eu imaginava quando eu era criança, pois eu comecei a sentir uma corrente elétrica passando por todo o meu corpo, cicatrizando sentimentos que estavam me perturbando naquele dia. Comecei a chorar, sem saber o porque de estar chorando, então eu me lembro que a Jasmim falou várias coisas para mim.
Eu não me sentia pronta para acreditar em nada, não queria acreditar, mas se Deus existia, eu gostaria que Ele esperasse até eu me sentir preparada. Jasmim disse algo que eu nunca consegui esquecer:
-Essa é a única certeza que você pode ter na vida: Deus sempre estará com você, sempre.
[...]
Nos dias seguintes, eu continuei indo aos cultos da faculdade e eu sempre saía feliz de lá, mesmo sem entender. Por incrível que pareça, ás vezes eu ficava tão feliz que nem o mau humor constante do Matheus me abalava.
Então eu ganhei um presente, dois na verdade, um deles foi uma bíblia linda que Jasmim me deu. Haviam várias coisas escritas nas bordas das páginas, papéis e post-its, aquilo me deixou muito feliz, pois eu não recebia presentes desde a morte dos meus pais.
[...]
Depois que eu soube da punição deles, resolvi me oferecer para ajudá-los com as matérias que perderiam, mas assim que ela saiu eu comecei a pensar novamente no que havia acontecido no culto, aquilo me deixava com dúvidas e completamente curiosa. Então eu ouvi uma voz, como um sussurro dizendo:
- Eu sou o seu Pai, nunca a abandonarei... Tenha coragem, Eu estou com você...
Senti todo meu corpo arrepiar e caí de joelhos naquele corredor vazio da faculdade, tendo a certeza do que eu realmente queria: Jesus.
Eu bolei um plano com os demais membros do culto, menos com os nossos quatro líderes. Se eles não podiam estar nos cultos conosco, levaríamos os cultos até eles.
Assim fizemos, foi incrível, pois pela primeira vez em muito tempo, senti eu tinha amigos de novo.
[...]
Assim que eu voltei, abri a bíblia que eu havia ganhado e eu não consegui parar de ler. A Jasmim tinha me aconselhado a começar pelo novo testamento, para que eu conhecesse mais sobre Jesus. Li tanto que nem vi o sol nascendo, eu havia virado a noite e não me arrependi em momento algum, pois eu sentia como se Deus estivesse ao meu lado me explicando o que eu ia lendo na bíblia e as anotações que a Jasmim fez eram ótimas.
Leio sobre ser perseguida por causa do nome de Jesus, isso me preocupa, pois o Matheus não vai gostar nada dessa história de Deus aqui em casa.
-Por que você está com a mesma roupa de ontem a noite?- Matheus pergunta.
Olho para as minhas roupas e por mais que ele esteja com uma cara horrível eu não consegui tirar o sorriso dos meus lábios.
-Eu não dormi- apenas respondo, ainda sorrindo, parecendo uma boba, mas uma boba muito feliz.
-Por que você está com essa cara?- ele arqueia uma das sobrancelhas.
-Nada- digo tentando disfarçar.
Então ele puxa a bíblia da minha mão e faz uma cara de indignação que me assusta bastante.
-Não acredito nisso!- ele grita- Você está virando uma fanática agora?!
-Não sou uma fanática, isso é real...
-Tá brincando comigo?- Ele diz jogando a bíblia.
Eu a recolho rapidamente, não quero que estrague. Meus olhos se enchem de lágrimas.
-Vai embora daqui... – ele diz baixo.
-O que?- me viro espantada- Só por que eu estava lendo?
Ele se exalta novamente dizendo:
-Acha que eu quero Deus aqui? Ele não cuidou dos nossos pais, não cuidou de nós!Você é um fardo para mim, já tem 18 anos, pode ir embora!
Dessa vez eu não consegui segurar as lágrimas, entrei em desespero.
-Não Matheus- choro- Por favor, você é meu irmão... – digo em soluços.
Ele então diz:
-Vai parar com essas baboseiras então?- pergunta sério- Promete nunca mais pronunciar esse nome ou ler esse livro?
-Eu... – começo a dizer- Não posso... Eu amo a Deus, não posso deixá-lo.
-Pois bem... – Ele cruza os braços- Você tem até as 19:00 para sair daqui.
Tento me aproximar dele, chorando, porém ele me empurra e eu caio. Fico no chão sozinha, chorando, sem saber para onde ir.
Matheus havia saído e eu apenas fiquei ajoelhada no chão chorando:
-Por favor, me ajude Senhor...
Em meio aos soluços, respirei fundo e por mais que estivesse sozinha ali, eu não me sentia sozinha, eu sentia Ele ali comigo. Não acredito que meu irmão me expulsou, não acredito que ele não tenha nenhuma consideração por mim... Mas eu ainda o amo.
No fim da tarde, recolhi o pouco que eu tinha, coloquei um duas bolsas, peguei minha bíblia e fui para o único lugar que eu sabia que eu seria bem recebida, alguém em quem eu podia confiar.
Bati na porta, ainda chorando, já estava de noite quando eu resolvi ir até lá, mas vi que estavam em casa. Então a porta se abriu:
-Jasmim... – larguei as bolsas no chão e ajoelhei chorando, ela me abraçou e ficou preocupada.
-Vai ficar tudo bem... – ela dizia.
[...]
Expliquei tudo o que tinha acontecido, os amigos dela estavam lá e os pais dela também, assim como uma garotinha ruiva. Contei á eles toda a minha história, desde o acidente dos meus pais até o acontecido de hoje.
Chorei em cada momento, mas Jasmim não deixava de me abraçar e os pais dela me consolavam o tempo todo, assim como Clara, Lucas e Enam.
-Ele não devia ter feito isso com você... – A mãe dela diz bem triste com a situação.
-Não deveria te culpar pela morte dos seus pais, como você iria saber?- O pastor David, pai da Jasmim, falou.
-Você tem algum lugar para ficar?- Clara perguntou preocupada.
Balancei a cabeça negativamente.
Lucas traz uma caneca com chocolate quente e se assenta perto de mim.
-Eu já tenho 18 anos- digo- Trabalho em uma cafeteria perto da faculdade, mas se eu usar o dinheiro para pagar o aluguel, não conseguirei pagar a faculdade. Antes eu só ajudava o Matheus com o aluguel, mas ele pagava a maior parte.
Deixo algumas lágrimas escaparem novamente, Clara segura uma das minhas mãos e diz que vai ficar tudo bem.
-De maneira nenhuma você vai abandonar a faculdade- A mãe da Jasmim fala decidida- Você vai morar aqui conosco!
Me espanto.
-Morar?- digo- Eu não quero incomodar, morar aqui traria gastos á vocês, não posso fazer isso...
Digo me levantando, pronta para sair.
-Fique... - Jasmim segura meus ombros, com um olhar cheio de compaixão.
-Sabemos que é difícil- O pastor David diz- Você foi muito corajosa, mesmo em pouco tempo acreditando em Deus, não o negou, mesmo que isso custasse tudo a você. Fique conosco, não será um incômodo, mas uma benção. Fique aqui, sem tempo determinado.
Não consigo segurar as lágrimas e os abraço. Obrigada Senhor, por cuidar de mim.
-Sei que perdeu seus pais e seu irmão te rejeitou- Jasmim diz com os olhos cheios de lágrimas- Mas se não se importar, queremos ser como uma família para você...
-Seria o maior presente que alguém poderia me dar... – digo sorrindo.
Então eu sinto alguém cutucar o minhas costas. A garotinha ruiva, Amaya, me entrega uma carta.
-Há alguns dias eu tive a oportunidade de ter uma visão na qual Jesus estava comigo e me dizia coisas importantes para cada um de vocês, eu não sabia o momento certo de entregar, mas acho que esse momento é agora. Conversei com eles sobre tudo o que aconteceu, mas acredito que não posso dar a carta de todos ainda, Jesus vai me dizer quando. - ela diz- A sua está aqui Charlie.
-Vamos dar um tempinho para você querida, acredito que seja algo entre você e Deus- Júlia, mãe da Jasmim, diz- Tome um banho quente, se acalme e nós vamos fazer um jantar incrível.
E foi exatamente isso que eu fiz.
Jantamos, rimos, conversamos e ouvimos as piadas ruins de Enam. Fazia tempo que eu não me sentia bem assim, tempo que não passava junto de uma família. Deus me fez sentir algo que eu nunca mais havia sentido: Amor.
Me senti amada, protegida e acima de tudo, senti que eu tinha um Pai.
[...]
A casa tinha um quarto de hóspedes bem aconchegante. Jasmim tentou me animar me ajudando a guardar tudo e disse que decoraríamos o quarto.
-Obrigada por tudo- digo abraçando-a.
-Estaremos sempre aqui para você- ela sorri- Você é minha irmã agora e Deus está cuidando de tudo.
-Eu sempre quis ter uma irmã- dou um sorriso.
Quando todos estão dormindo, me sento na cama e abro o envelope, não consigo descrever os sentimentos que estou sentindo em cada palavra dita, apenas tento decidir entre chorar e sorrir:
“Querida filha, eu sei que o que sente agora é difícil de se compreender, pois quando se perde algo ou alguém, se torna quase impossível acreditar em um futuro onde tudo vai ficar bem. Quero que você saiba que eu amo você, cada detalhe seu foi pensado com grande amor. Você se deixou levar pela dor todos esses anos e se negou a acreditar que eu estava ao seu lado, porém, isso não me impediu de cuidar de você, pois ainda que você tente se esconder, eu sempre saberei exatamente onde você está e sempre estarei curando as feridas do seu coração pouco á pouco, porque um filho pode esquecer que é filho, mas eu nunca me esqueço de ser Pai. Tudo parece ter desmoronado, mas eu sou especialista em fazer grandes coisas mesmo em situações como esta, porque eu quero o seu bem. Eu serei a sua família, seu Pai, seu Amigo, seu Consolador, serei Aquele que te ama, que te guarda e te dá forças. Não desista, pois eu sempre estarei aqui, ainda que não possa me ver, sempre estarei aqui. Deixe o passado para trás, pois estou de livrando da culpa e do medo e te oferecendo a minha paz e o meu amor. Eu te amo mais do que você pode imaginar...
-Jesus.”
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