UMA ORQUESTRA DE NATAL: A NOITE ENCANTADA
A cidade estava iluminada de uma forma nunca antes vista. Havia muita coisa enfeitando a entrada. Um tapete vermelho enorme estendido sob a escada do lado de fora, inúmeros feches de luz, rosas das mais belas possíveis. Tudo organizado para a ocasião mais do que esperada.
Os fotógrafos e curiosos se concentraram apenas em uma parte da escada, e era a parte em que passaria alguns dos representantes mais famosos da academia de música "Bonevir". E eu estava lá, aguardando, ansiosamente, aquela passagem. Como eu gostaria de conversar com o Tony Abreu. Ele tem um carisma inigualável, e a sua música é de uma beleza absurda. E a suavidade de Regina Denis? Não tem comparação, ela leva os seus dedos macios, belos, de forma lenta, que parece beijar as teclas do piano.
Sem dúvidas, eu fazia parte do grupo de curiosos, só não estava concentrado no mesmo lugar, do lado "certo", pois não havia mais espaço. Mas eu ainda conseguia enxergar, mesmo que de longe, a passagem desses músicos incríveis. E, se desse sorte, até poderia tirar uma foto com zoom.
Do lado em que estou não há tantos fotógrafos, na realidade, tem uma sim, mas acho que ela está um pouco perdida desse lado.
— Está precisando de ajuda? Ela parece um pouco enrolada com as coisas, mas eu também estaria. Quem consegue andar de boas com um salto dessa altura e uma escada desse tamanho? Não consigo nem imaginar. — Por que acha isso? Por acaso foi a minha cara de desesperada que deixou tão óbvio assim?
Acho que poderia ficar sem essa pelo resto da noite. Eu preciso mesmo parar de achar que todo mundo consegue ouvir uma oferta de ajuda de forma tranquila, sem achar que é uma ofensa, ou coisa assim. Eu gosto de ajudar as pessoas, e não me importo de ser ajudado. Na real, eu adoraria ser, pelo menos uma vez, a pessoa que recebe a ajuda, e não a que oferece.
— Não, eu só pensei...
— Que sou uma menina indefesa que precisa ser ajudada por um homem.
— Nossa! Isso foi bem chato. Mas, tranquilo. Que bom que está tudo bem por aqui. Nesse caso, acho melhor eu seguir.
Eu estava pronto para seguir com meu caminho, aquele péssimo início de diálogo não poderia estragar a minha noite encantada. Dei as costas, coloquei as mãos no bolso da minha calça social preta, e continuei subindo as escadas, dessa vez assoviando. Há que se dizer que aquela escada parecia não ter um fim. Quanto mais eu subia os degraus, mais faltavam degraus para que eu chegasse até o ponto perfeito. O ponto em que eu conseguiria observar a entrada triunfal definitivamente.
Tudo estava da forma que deveria estar, até uma voz gritar "ei". No começo pensei que não fosse comigo, então ignorei. Continuei subindo, até que ouvi, bem baixinho "eu quero ajuda". Talvez fosse melhor apenas continuar o meu trajeto, aquilo podia não ser para mim. Mas eu tenho esse lado que não consegue ver ninguém com mais de 4 sacolas na mão, que já quer sair carregando junto. Então, como quem realiza os passos de uma dança, me virei e olhei para a moça, que estava quase nos últimos degraus daquela escada.
— Me chamou? — Perguntei, mas segurando um sorrisinho de lado que poderia não cair bem para a moça estressada.
— É, chega aqui.
Confesso que esperava mais do que um "chega aqui", mas eu curti. Curti tanto que desci saltitante, como se a minha vida fosse um musical e aquele fosse um acontecimento que ficaria marcado nesse show. Não o evento, quer dizer, isso também, mas aquela conversa estranha no meio da escada.
— O que deseja? — Perguntei sem cometer o mesmo erro de perguntar se a pessoa precisava de ajuda.
— Acho que fui meio grossa com você, e essa não era a minha intenção. É só que... Poxa! Parece que o tempo todo as pessoas querem nos convencer de que não conseguimos fazer nada só, e que somos completamente dependentes de outras pessoas, e essas pessoas, consequentemente, são homens, fortes, valentes, que conseguem mover um poste com seus braços malhados. Isso é tão estúpido.
Uau! Eu não esperava um desabafo assim, mas eu achei tão necessário, porque ela precisava colocar aquilo para fora, e o fato de ser eu a pessoa a ouvir é curioso, talvez isso seja um acontecimento para se lembrar. Existe um propósito para todas as coisas, e eu estar ali, bem daquele lado da escada, foi um.
— Mover um poste? Essa foi boa. — Gargalhei.
— Fala sério! — Disse a menina quase se revoltando novamente.
— Não, mas eu estou rindo por uma única razão. Acho que não consigo mover nem o sofá lá de casa. A minha mãe...
A minha mãe fala que eu devia ser como o Maykon, meu irmão mais velho. Ele passa a maior parte do tempo dentro de uma academia. Ele é formado em Educação física, e trabalha como professor, mas sempre gostou de praticar exercícios, independente do curso. E eu acho importante praticar exercícios, acho necessário até, e tenho muito orgulho dele. Mas a minha praia é outra, eu gosto mesmo é de outra prática que salva a minha vida. E estou prestes a viver um pouco dela.
— Ia dizer alguma coisa? — Questionou a moça, que tinha os olhos castanhos claro.
O seu cabelo castanho cobriu parte do seu rosto, o vento deu uma força, e havia um brilho no seu olhar. Era um olhar doce, mas muito profundo. Escondia um mistério, sem dúvidas, e muita revolta também. Era um olhar forte e marcante.
— Na verdade...
Chegou o momento! As pessoas se agitaram, alguém gritou um nome que eu conhecia, e eu só conseguia, a partir daquele momento, pensar em uma coisa: a orquestra. Procurei o celular no bolso, me desesperei por não tê-lo achado, esqueci completamente da moça que precisava de ajuda, e acabei perdendo a chance de tirar a foto com zoom das minhas inspirações musicais.
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