Capítulo 4
O tilintar das gotas de chuva contra o vidro da janela localizado no quarto andar daquele prédio de doze andares removeram Matheus do seu sono. Abriu os olhos devagar para acostumar com a claridade ainda rarefeita do dia que amanhecia mais cinza na cidade de São Paulo. O relógio digital marcava seis horas e sete minutos. Ele iria despertar apenas dali há oito. Normalmente ficaria irritado com essa interrupção. Porém ao lembrar da conversa não tida com a sua namorada na noite anterior sentiu-se aliviado de estar com esses minutos a sua frente, talvez seriam o suficientes para evitar tal sacrifício.
Deixou a cama com o máximo de cautela e correu apresado para o banheiro fazer sua rotina matinal. Quando retornou para o quarto Marina já havia desperto e preparava o café da manhã. Se encontraram no corredor. Um indo em direção a pequena cozinha e outro ao banheiro ainda cheio de vapor. Mal trocaram os olhares nesse percurso, foi quando Matheus soube que estava em maus lençóis. Engoliu um pedaço de pão e bebeu um pouco do café fumegante tomando cuidado para não queimar a boca. Da porta da entrada apenas gritou um até logo sem esperar qualquer resposta. Marina era assunto para mais tarde.
O trajeto até a Avenida Paulista onde ficava localizado seu escritório de Engenharia Civil e Arquitetura levava pouco mais de uma hora se tivesse sorte do trânsito não estar caótico, porém com aquela chuva intensa que se manifestava seria missão praticamente impossível estar onde deveria antes das oito e meia, dessa forma teria pouco tempo para se preparar para a reunião agendada para às noves. Desvantagens de se morar em uma metrópole como aquela.
O trânsito, a reunião e tão pouco sua com conversa com Marina no final daquele dia era o que lhe tomava a mente e sim o que pretendia fazer assim que seu expediente de trabalho terminasse, ir ao encontro de Amanda e descobrir toda a verdade sobre o filho que lhe acompanhava. Ele precisava saber quem era o pai daquele garoto, apenas depois dessa revelação teria paz em sua consciência. A preocupação era tamanha que nem percebeu quando Alexandre enfiou a cabeça para dentro de sua sala lhe trazendo para a realidade.
— Pronto para a reunião?
— Estou indo logo atrás de você.
Assim que a viagem terminou Alexandre e Matheus deram seguimento aos seus estudos. Alexandre cursaria engenharia civil e Matheus seguiu os passos do pai e se matriculou em arquitetura, ambos, estudantes da USP e agora sócios de muito sucesso nesse ramo graças aos bons relacionamentos do pai de Matheus. Caio foi único que não seguiu pelo mesmos caminho, mas teve de abaixar a cabeça e fazer o curso escolhido pelo seu pai: direito. O homem queria ter um filho advogado e para a surpresa de todos o rapaz pegou gosto pela coisa e se saiu muito bem nessa profissão o que revelava muito da sua personalidade manipuladora.
— Aconteceu alguma coisa? — Alexandre percebeu pela postura dispersa do amigo que algo estava errado, ou ao menos lhe incomodando — Brigaram novamente? Olha sei que não é da minha conta, mas você não está nada feliz com ela, será que não está na hora de seguir em frente? Vocês dois estão se enganando. E sabemos que você não casará e terá filhos com ela.
— Não. Ainda! – Matheus suspira e pela primeira vez naquela manhã olhou o amigo nos olhos — Consegui evitar uma briga até agora, mas ela virá. Talvez eu faça isso, termine tudo. No momento estou preocupado com alguns projetos, apenas isso.
— Quais projetos? Algum em conjunto?
— Não. Esse é só meu.
— Se precisar de uma opinião é só pedir, ok?
— Sei que posso contar você, se não deslanchar irei sim, obrigado.
— O que achou dessa reunião que tivemos? Eles querem mudanças bem importantes no projeto inicial, confesso que estou com o pé atrás.
— Teremos que avaliar as possibilidades e informaremos para eles se serão possíveis, não ficaria preocupado com isso nesse momento.
Ficaram por horas conversando sobre esse projeto o que acabou sendo bom para Matheus que não percebeu as horas passando, quando se deu conta estava perto do momento que mais esperou. Ir de encontro a Amanda e ter todas as suas suspeitas sanadas. Nem se despediu de Alexandre, apenas desligou as luzes do seu escritório e partiu.
xXx
Se não fosse a chuva que caia Amanda e o filho teriam aproveitado melhor aquele dia. A manhã já estava tomada pela entrevista que teria de dar em um programa matinal de bastante repercussão e após o almoço com alguns executivos da editora pela qual era publicado seus livros, a tarde estaria livre.
— E finalmente nossas férias começaram. Viva! — Miguel gritava entusiasmado.
— Isso mesmo! Estamos livres! Pena que hoje está chovendo, mas podemos ir até a Pinacoteca o que acha? — Amanda sentia–se realizada em ver a alegria no rosto da pessoa que mais amava em sua vida.
— Uma ótima ideia!
A tarde que tiveram juntos foi muito agradável. O menino gostou muito da ida até a Pinacoteca e visto obras incríveis, lamentaram pela chuva que caia pois os seus arredores ficaram impossibilitados de serem explorado. Voltaram exaustos para o hotel, Amanda desejava desesperadamente por um banho quente e demorado, porém ao receber as chaves em suas mãos ficaria sabendo pela boca do recepcionista que deveria ter de adiar momentaneamente seus planos.
Um homem a aguardava. O recepcionista apenas moveu sua cabeça e seguindo o sinal feito pode observar Matheus distraído com uma revista num canto daquela recepção. Repuxou os lábios e apertou os olhos. Aquela visita lhe intrigava e ao mesmo tempo lhe incomodava. Como ele poderia saber onde estava hospedada e que raios o trazia até ali? Já havia se passado tantos anos e tudo que ela gostaria era de manter o passado onde ele estava.
— Filho sobe. Preciso conversar com aquele homem em particular, tinha até me esquecido que ele viria hoje para fazer essa entrevista.
— Tudo bem. — Miguel deu de ombros, já estava mais que acostumado com o ritmo da mãe — Posso pedir algo para comer? Estou faminto!
— Claro que pode! O que desejar. — deu-lhe um beijo na testa e esperou até que sumisse de sua vista e só assim seguiu para o encontro do homem do seu passado.
Matheus a observava ao longe. Aguardando o momento do seu reencontro, o qual esperou por muito tempo e que achou que nunca fosse acontecer. Ele a viu caminhando em sua direção com o semblante pesado e percebeu que sua presença ali não era bem vinda.
— Olá, Matheus! Surpresa te encontrar aqui.
— Peço desculpas por aparecer assim sem avisar, achei que se avisasse talvez não me receberia.
— Era uma possibilidade. Mas o que devo a honra dessa visita.
— Poderíamos ir para um lugar mais reservado para conversar?
— Podemos, vamos até o restaurante do hotel, lá tem um canto mais reservado e poderemos conversar lá.
Amanda seguiu na frente com Matheus alguns centímetros atrás. Ela foi direto para a mesa mais ao canto longe de todos. Sabia que a conversa que teriam não era nada fácil e os ânimos podiam ficar exaltados. Ela sabia por que ele estava ali e dessa forma seguiu sem rodeos.
— Sei o que você está fazendo aqui, e sinceramente não sei o que te dizer. Sim há uma possibilidade de Miguel ser seu filho, como há uma possibilidade dele ser filho do Alexandre e do Caio.
Matheus escutava aquelas palavras sendo ditas com surpresa. Não esperava que ela entraria assim tão fácil naquele assunto. Havia se preparado para a resistência e o que recebia em troca era o contrário. Amanda seguiu:
— Eu não queria que vocês soubessem, pelo simples motivo de que não quero saber qual de vocês é o pai dele. Porque o pai dele foi durante muito tempo o João, meu falecido marido.
— Como assim não quer saber? Eu quero e tenho o direito de saber. Você não me deu escolha, não me deu oportunidade de ser o pai dele. Amanda quando você ficou assim egoísta? E por que sumiu daquele jeito?
— Você não sumiria? O que foi aquela noite? Eu me sinto suja até hoje! — havia um olhar de repulsa para Matheus — Por anos não consegui me olhar no espelho, e ainda descobri que estava grávida. Você não imagina o caos que foi lá em casa. Voltei da viagem mais cedo do planejado e dali uns meses descubro que estou grávida eu nem sabia o que dizer para meus pais, afinal eu nem sabia qual de vocês poderia ser o pai dele. Eles quase me botaram para fora, só voltaram a falar comigo, quando viram o rostinho do Miguel.
— Passou por isso porque quis. Qualquer um de nós três iria te dar suporte. Pelo amor de Deus! — Matheus tentava segurar sua ira e ao mesmo tempo controlar seu tom de voz — Alexandre era apaixonado por você. Ele moveria o oceano por sua causa, eu também não deixaria você sozinha, nem Caio apesar de ser como ele é.
— Não me fale de Caio! A culpa toda é dele! Aquelas porcarias que ele colocou em nossas bebidas, sabe o que me dá mais raiva? Eu não consigo lembrar nitidamente de tudo, só alguns flashs. A única coisa de que me lembro, é acordar nua ao lado de vocês três. O que você podia esperar de uma menina de 17 anos? Eu fui criada de um jeito que aquilo jamais seria aceitável. Surtei e fugi. E vocês também nunca me procuraram.
— Caio teve sim a sua parcela de culpa, mas nós sabíamos o que ele tinha feito e bebemos mesmo assim, não posso culpa-lo por tudo. E realmente nenhum de nós gostou de acordar ali daquele jeito. Na verdade nunca tocamos nesse assunto, e não é só você que não lembra o que aconteceu de fato. Mas você nunca teve a curiosidade de saber quem é o pai do Miguel?
— Claro que tive! Mas tenho medo dessa verdade, tenho medo dele ser do Caio. Por isso prefiro não saber.
— Mas agora você sabe que não pode mais ser assim.
— Não vejo o porque. Eu criei ele sozinha até os seus cinco anos. Foi ai que me casei com João e fomos felizes por nove anos. Esse é o pai dele, você não tem o direito de tirar isso dele. Miguel não tem culpa dos nossos erros do passado.
— Concordo com você que ele não tem culpa, mas ele precisa saber a verdade. Afinal ele tem um pai vivo e se eu for esse pai, estarei presente na vida dele de agora em diante. E Amanda eu vou ter que ir atrás da verdade, não queria levar isso para justiça, mas se for esse o caminho que você queira então assim o será.
— Não! Não quero isso. Preciso pensar. Me dê um tempo?
— Esse é o meu cartão, me liga amanhã para combinarmos um encontro de todos.
— Farei isso, e se me der licença, preciso subir e colocar minha cabeça em ordem.
— Está certo. Também preciso. Afinal isso não mudará somente a sua vida, mudará de todos nós. Vou esperar a sua ligação.
Amanda abandou a mesa de forma derrotada. Houve um tempo em que achou que isso poderia acontecer, mas os anos foram passando e com ele à certeza de que o que aconteceu naquela noite havia ficado soterrado em suas lembranças e que de certa forma reinventou a história da concepção de Miguel.
Relutou durante anos para ir à São Paulo. Algo dentro dela dava sinais de que a verdade viria à tona assim que seus pés tocassem aquele pedaço de asfalto. Estava certa. Não tinha como se esquecer o que havia se passado naquele lago no Chile, apenas tinha como deixa-lo adormecido e agora Matheus exigia a verdade e Amanda não estava assim tão disposta em dar. Miguel seria arrastado para a sua maior vergonha, tinha muito medo do que ele pensaria sobre ela. As consequências de seus atos estavam vindo à tona de uma forma desagradável como era de se esperar.
xXx
E agora Amanda? O que você vai fazer?
Se gostaram do capítulo não esqueçam de deixar aquela estrelinha, comentários são super bem-vindos! E até sábado!
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