15.2
Aí vem um perigo para este clube. Quando começarmos, nós não iremos parar!
- Thousand Foot Krutch.
Ana tem agido de forma estranha nesta manhã. Ao começar pela mensagem que me enviou, perguntando se o juiz Gutemberg havia sido o responsável pelo caso da Beatrice.
Agora, é notável que ela não está nada bem e que não dormiu esta noite. Seus olhos estão emoldurados por olheiras escuras e ela parece estar de ressaca, o que é mais estranho ainda, principalmente se considerarmos que essa aula é de literatura — sua favorita —, mas ela está dormindo.
— O baile de inverno está chegando e como faço parte do comitê de organização, sinto-me na obrigação de comunicar os trajes decididos pela equipe — diz o senhor Adams, pressionando a caneta para quadros contra o queixo rechonchudo.
Toco em Ana algumas vezes, para que acorde antes de levar uma advertência, mas a brasileira apenas resmunga.
— Como o tema é inverno, os trajes precisam representar essa estação gelada. Peças escuras, azuis, sombrias, que lembrem a melancolia desta estação. Nada de chegar com um vestido rosa, Delfini — ele brinca com a garota de cabelos cor de rosa, que revira os olhos.
— Pensei que fariam um baile de máscaras — Scarlett comunica, chamando a atenção da sala.
— Houve uma mudança. A escola preferiu fazer apenas o baile de inverno, deixando as máscaras para outra ocasião.
— Uma pena...
— De fato — ele concorda, caminhando em minha direção, intrigado.
O senhor Adams para em frente a carteira de Ana, que está com a cabeça baixa, enterrada nos braços cruzados sobre a mesa. Seus cabelos volumosos cobrem todo e qualquer vislumbre de seu rosto, a única coisa que confirma seu sono é a respiração tranquila.
— Senhorita McRae!
Ana ergue a cabeça lentamente, assustando-se com a figura à sua frente.
— A senhorita está bem?
— Na verdade, não. Será que eu poderia me retirar da sua aula hoje, senhor Adams?
Ele confirma com a cabeça, aparentemente preocupado. Engraçado. Se fosse qualquer outro aluno teria ganhado um sermão terrível e uma advertência, juntamente com a ficha para a detenção. Falo isso por experiência própria. Porém, Ana é sua aluna preferida por compartilhar da mesma paixão por literatura.
A brasileira reúne seus pertences e sai da sala, deixando-me ainda mais preocupado. Checo as horas e fico aliviado por faltarem apenas 20 minutos, não me importando com as ameaças do senhor Adams, indo atrás da escritora.
Vejo-a dobrando o corredor que dá acesso ao jornal da escola, seguindo-a.
Abro a porta sem pedir permissão e a encontro com a cabeça pendendo para trás, parecendo estar exausta.
— O que aconteceu?
Ela se sobressalta, arregalando os olhos e os revirando em seguida. A brasileira tira a camiseta social de dentro da saia, dobrando suas mangas. Incrivelmente atraente.
— Você me assustou.
— Você está me assustando. Primeiro aquela mensagem sem sentido de madrugada, depois, quando chego na sua aula favorita, você está dormindo e de ressaca — observo e ela ri.
— Não estou usando drogas, se é isso que quer saber.
— Ana, isso não tem graça — repreendo-a, aproximando-me dela e segurando seu rosto.
A garota suspira, encarando meus olhos, com uma expressão indecifrável.
— Tem a ver com os assassinatos. Tenho uma teoria de quem são as assassinas, só preciso de provas — ela confidencia, desviando o olhar e eu fico imóvel.
— Como assim as assassinas?
Ela se levanta, passando a mão pelos fios encaracolados e afrouxando a gravata. A cada dia que passa essa garota fica mais atraente, como pode?
Ana pega um documento, entregando-me, mas tudo o que consigo pensar é em beijá-la. Exatamente o que faço.
Puxo a cintura da brasileira, que estremece, colocando a mão disponível em sua nuca e unindo nossos lábios em um beijo intenso, cheio de desejos não revelados. Ana suspira, rodeando meu pescoço com seus braços, puxando meus fios curtos, levando-me à loucura.
Sinto todo meu corpo clamar pelo dela, mas enfio na minha mente que estamos em ambiente escolar, o que não é nada fácil.
Ela se afasta, com um sorriso cansado, sentando-se em cima de uma das mesas e eu finalmente crio coragem para abrir o documento, arregalando os olhos ao constatar suas palavras.
— Isso só pode ser brincadeira — sussurro.
— Antes fosse. Felizmente, tenho argumentos que comprovem parte dessa teoria. A outra parte ficou com Tom, para sua investigação.
Concordo com a cabeça, lendo as informações enquanto ela me explica passo a passo, até receber uma mensagem de seu parceiro de investigações pedindo para que o encontre no Beb 's às 19h. Engraçado. Foi a lanchonete que levei Ana pela primeira vez.
ᚔᚔ
O lugar continua idêntico ao que me recordava. Não venho aqui desde quando trouxe Ana, porque achei melhor deixar que algumas lembranças caíssem em esquecimento, especialmente na época em que estávamos distantes.
Passamos pela porta de vidro, que anunciou nossa chegada e vimos Tom acenando em uma das mesas mais próximas ao fundo. Rodeio os ombros de Ana com meu braço, como de costume, e juntos seguimos até onde nosso amigo está.
— Achei que não viriam mais.
— Nem um pouco dramático — brinca Ana e ele ri.
Acomodamo-nos nas poltronas acolchoadas negras. Gosto desta lanchonete porque me lembra os filmes preto e brancos que Chris gostava de ver.
Tom está observando o cardápio e Ana também.
— Ana me contou as descobertas de vocês, que foram ótimas, então não se preocupe comigo.
O garoto me encara por cima do que estava lendo, avaliando-me de cima a baixo e sorrindo.
— Espero mesmo que você seja confiável, Jacob, porque — direcionando seu olhar para Ana, ele continua: — uma amiga me disse uma vez que a paixão nos cega e talvez nos leve à ruína.
Ana entende o recado, balançando a cabeça negativamente, para afirmar em seguida, reflexiva.
— Descobriu alguma coisa na sua investigação de hoje a tarde? — a brasileira mudou de assunto.
— Sim, mas antes de começar a contar o pouco que descobri, vou pedir algo para comer, estou morto de fome.
— Quer comer o quê? — pergunto para Ana, que encara o cardápio.
— Você vai pagar?
— É claro.
— Que bom! Eu até faria o drama de pagar e todo o resto, mas comida grátis é meu forte, principalmente vinda do namorado rico — ela brinca.
Franzo a testa, encarando-a surpreso e Tom faz o mesmo, como se ela tivesse acabado de falar que estava bolando algum atentado terrorista. A brasileira desvia o olhar de mim para ele, mais de duas vezes, soltando uma gargalhada.
— Desde quando vocês oficializaram algo, senhorita McRae? — Tom questiona, com seu olhar afiado.
— Não oficializamos. Era brincadeira para ver a reação de vocês e descontrair um pouco.
Ainda estou a encarando atentamente, sem saber o que dizer. Sei que estou completamente apaixonado por ela, assim como sei que não conseguirei ficar longe da brasileira, mas a palavra "namoro" ainda gela meu estômago, mesmo que eu não queira.
Cada momento, manipulação, dúvida, que passei com Jullie voltam à minha mente. A sensação de buscar sua aprovação para tudo. Suas crises de ciúmes sem motivo. Como quis interferir em cada passo da minha vida. A forma como me abandonou em momentos que eu mais precisei.
— ... como não, Jacob? — A indignação de Tom me traz de volta para esta mesa com eles.
— Como?
— Estava perguntando para Ana se já comeu beaver tails e ela me perguntou se era literalmente um rabo de castor. Como nunca apresentou o melhor doce do mundo para ela?
Ele ergue uma sobrancelha indignada e eu dou risada, dando de ombros.
— Tudo bem. Vamos comer essa oitava maravilha do mundo — ele avisa, pedindo três beaver tails.
Ana me encara, como se tentasse ler minha expressão ou o motivo pelo qual fiquei tão calado depois da brincadeira sobre o namoro. Não quero falar sobre isso agora, mas em algum momento precisaremos conversar. Contei tudo para ela no dia em que me questionou, exceto sobre meu relacionamento conturbado com Jullie.
— Você tá bem?
— Sim. Só pensativo — tranquilizo-a, sorrindo.
— Ok — ela concorda, relutante. — O que é esse rabo de castor?
Tom e eu damos risada.
— É o melhor doce do mundo, típico daqui do Canadá. Uma massa crocante e adocicada, com um leve gosto de canela. O recheio fica ao seu critério, então pedi alguns de chocolate e outros de Oreo — ele explica.
— Parece ser bom, tirando a parte da canela.
— Agora que já pedimos o que comer, você pode começar a compartilhar sua descoberta — sugiro.
Tom me encara e abre um sorriso, concordando com a cabeça.
— Contatei a família da Louise, a garota que caiu da escada. Falei com a avó dela, que nunca superou a morte da neta. Nenhum diário dessa vez, amigos, mas ela me contou algo bem interessante.
Acomodo-me melhor na cadeira, apoiando os cotovelos na mesa e cruzando os dedos para apoiar a cabeça em cima, prestando atenção.
— A família inteira não aprovava seu envolvimento com o bad boy Zayn Gonzales, mas ela não deu ouvidos. Segundo a avó dela, um dia o garoto chegou acompanhado com uma jovem morena e muito bonita para conversar com o juiz Gutemberg. Fora isso, ela só sabe o que aconteceu quando a neta veio a óbito.
— Coitada — lamenta Ana e concordamos com a cabeça.
— Zayn com uma garota morena... Evangeline?
— Mostrei a foto da demon queen e ela disse que era ela mesmo. Foi quando perguntei se haviam câmeras pela casa e ela me contou que sim, mas as filmagens ficavam trancadas em arquivos — ele conta, bebendo um gole do café que a garçonete nos entregou.
— Calma! Se haviam câmeras, elas podem ter filmado Zayn e Evangeline no dia — Ana avalia.
— Bingo! E adivinhem só quem irá pegar essas filmagens em mãos na semana que vem.
— Não brinca! — digo, sorrindo de canto a canto.
— Não sei como você consegue essas coisas, mas você deveria ser detetive e desistir do jornalismo — Ana avisa e ele ri.
— É, andei pensando nisso.
— Se conseguirmos as filmagens só precisaremos interrogar o senhor Gutemberg.
— O que não será fácil, já que ele se aposentou e entrou em depressão depois da morte da filha — opina Tom.
Ana murmura um "droga" e eu suspiro. Estamos no caminho certo, mas ainda falta muito para conseguirmos colocar a megera na prisão.
— Quando eu colocar as mãos nas filmagens estaremos um passo à frente, isso eu garanto. Tenho um plano em relação a isso.
— Você e seus planos mirabolantes — Ana brinca.
Os beaver tails chegam, interrompendo nossa troca de ideias e meu estômago se agita. Nem havia notado que estava com tanta fome assim. Ana escolhe o de oreo, mordendo e fechando os olhos, apreciando o sabor.
— Meu Deus! Isso é muito bom. Por que não me disseram que a massa era idêntica a de um pastel doce?
Tom confirma com a cabeça, mordendo o seu.
— Nem lembrei desse detalhe.
— Posso provar o seu? — pergunto para Ana, que me oferece o doce.
— Não. De outro jeito.
Sem entender, ela franze a testa e eu a beijo, fazendo-a rir depois.
— Vocês são nojentos.
— Vai me dizer que nunca fez isso — duvido, encarando-o e ele ri.
— Conta logo o resto do seu plano, Tom Holmes — Ana pede.
Tom limpa a boca com um guardanapo, seguido pelas mãos, pegando seu celular. Ele mexe em algo na tela e nos mostra o gravador de voz. Vejo Ana franzir a testa e ele aperta o play, que inicia a conversa que teve com a avó de Louise.
— Vou montar uma emboscada para a megera.
Ana e eu nos entreolhamos, com a pergunta implantada em nossos olhos:
Será que daria certo?
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