10.2
Eu me lembro de anos atrás quando alguém me disse que eu deveria ter cuidado com o amor... Eu fui descuidado, eu esqueci, eu esqueci.
- James Arthur.
Recebi a mensagem do Tom, pedindo para encontrá-lo na casa do Jacob. Parecia ser urgente, pela forma como ele usou as exclamações. Não estou preparada para voltar naquela casa, não depois do que aconteceu. Jacob me magoou profundamente e mesmo ouvindo boatos de que ele deu um fora na Evangeline hoje, no meio de todo mundo, minha mágoa continuou igual.
Visto uma calça alaranjada, minha cor favorita e pego a primeira blusa que vejo na frente. Uma branca com listras pretas. Calço minhas botas estilo militar e pego o celular, mexendo no cabelo e revirando os olhos por ele estar tão armado. Quase esqueço dos agasalhos. O inverno canadense leva muito a sério o significado dessa estação.
Desço as escadas a toda velocidade e Dalila franze a testa, confusa.
— Para onde você vai com tanta pressa?
— Tom me mandou uma mensagem reunindo o pessoal, parece que é uma emergência.
— Cuidado com esses seus amigos — ela aconselha, como uma mãe protetora.
Sorrio e a abraço apertado. Amo essa mulher. Dou um beijo em sua bochecha e faço menção de sair, mas recordo de uma coisa. Minhas bochechas esquentam e eu coço a garganta, sem saber como perguntar.
— Hm, Dalila — começo e ela me encara, confusa. — Ontem à noite eu ouvi... hm... algumas coisas fora do comum, sabe? Um barulho de cama, como se alguém estivesse pulando em cima.
Dalila empalidece e faz um barulho com a garganta também, dando um sorriso torto.
— Bem, sinto muito por ter escutado esse... barulho — pede, mexendo nos cabelos lisos e curtos. — Seu pai e eu contaríamos hoje à noite, no jantar, mas você já descobriu antes.
— Vocês estão juntos? — pergunto, surpresa e animada com a ideia. Ai meu Deus!
— Sim — ela concorda, mostrando o anel de compromisso.
Dou alguns pulinhos saltitantes, sorrindo tanto que as minhas bochechas doem.
— Eu estou tão feliz por vocês. Tão feliz! Meu pai não poderia ter escolhido uma mulher melhor.
Ela parece aliviada com a minha reação e eu a abraço outra vez. Uma notícia fantástica em meio a todo esse caos. Eu sabia que tinha alguma coisa acontecendo entre eles, desde a primeira semana de aula, quando ela apareceu na cozinha de roupão e se dirigiu a ele de maneira tão íntima.
— Agora preciso ir. Parabéns pelo noivado!
Com um sorriso de canto a canto, saio de casa, pegando a minha bicicleta e o meu capacete, pedalando até a casa de Jacob, que por sorte fica a apenas 4 quadras da minha. Como ele mesmo disse na segunda vez que me deixou em casa. Aquela época foi ótima e nem parece que já se passaram quase 3 meses.
Balanço a cabeça de um lado para o outro, como se isso fosse mudar alguma coisa.
Sinto o vento gelado deixar a ponta do meu nariz dormente, com certeza está avermelhado também. O dia está congelando e não há nem sinal do sol, apenas uma nevasca rasa, como quando garoa, mas ao invés de água no estado líquido, está caindo no estado sólido. Que loucura.
Deixo a bicicleta em um lugar seguro e esfrego uma luva na outra. Por sorte encontrei um par delas na cor laranja, estavam esperando por mim, porque as outras eram todas vermelhas. Vermelho acabou se tornando a cor que eu mais detesto entre todas as cores, passando na frente do verde.
Quando estou prestes a tocar a campainha ouço passos e viro, olhando para trás. Michelle está toda agasalhada, parecendo um pinguim. Não consigo segurar e gargalho alto, chamando sua atenção, que vem até mim.
— Eu sei que estou ridícula, mas não precisa caçoar, Ana — ela diz, rindo também.
— Nem se você estivesse com aquelas roupas bizarras de drogados ficaria feia — elogio e ela abre um sorriso perfeito.
Nós duas rimos e ela toca a campainha, mudando a postura.
— Não acha estranho Tom ter pedido para encontrarmos ele aqui?
— Estranho é apelido. Mais estranho ainda foi eu ter aceitado vir depois do que aconteceu.
— Sim, tem razão. Isso foi ainda mais bizarro. — Ela ri.
A porta finalmente abre e não tinha percebido que minhas pernas estavam dormentes até precisar andar outra vez. Lisa está com um sorriso amigável e diz um "olá!" bem alegre para nós. Respondo na mesma intensidade, já Chelle fica desconfiada.
Lisa pede para a seguirmos e o meu estômago embrulha com o fato de que o verei de novo. Ainda não superei tudo o que houve, assim como o efeito que ele tem sobre mim ainda é exatamente o mesmo.
Paramos em uma porta de correr e a loira a abre, revelando Tom, Jacob e Scarlett sentados em diferentes cadeiras. Franzo a testa e entro no cômodo, junto com Michelle. Nós duas parecemos ser as únicas confusas.
— Sentem aí — Tom pede, levantando-se.
Sento-me ao lado de Scarlett, que sorri para mim. Tom para ao lado de Lisa e é aí que a confusão me toma por completo.
— Acho que todo mundo aqui sabe sobre o diário da Beatrice — Lisa começa, andando de um lado para o outro. — Também sabem sobre Henry e todo o resto.
— O que isso tem a ver com o fato de estarmos todos reunidos aqui? — pergunto.
— Bem — Tom começa, relutante. — O quadro de suspeitos que vocês viram na minha casa, não estava trabalhando nele sozinho. Lisa vem me ajudando há um tempo.
Arregalo os olhos, incrédula. Sinto minhas bochechas ficarem dormentes e o cérebro virar gelatina. Como ele pôde estar trabalhando com ela durante todo esse tempo?
— Como é que é?
— Sei que pode parecer confuso pra vocês, mas explicaremos tudo — a loira garante, mordendo a unha do polegar.
— Então comecem, porque aparentemente vocês se odiavam... — Michelle intervém.
— Pedi a ajuda do Tom quando Henry morreu. Tinha alguma coisa muito estranha acontecendo, mas eu não sabia o que era. Primeiro foi a Trice, depois Louise e em seguida Henry. Estava desconfiada de que alguém no meu círculo de amigos pudesse estar envolvido e Tom sugeriu a mesma coisa.
— Como tínhamos interesses parecidos, resolvemos fazer uma parceria — completa Tom.
— Ele me ajudaria a descobrir algumas coisas e eu ficaria de olho no pessoal. Depois do que Jacob me contou tive ainda mais certeza de que Evangeline está envolvida em toda essa sujeira.
— Como pode ter tanta certeza assim? — pergunta Scarlett, desconfiada.
— Quando Jacob contar para vocês a lembrança que teve, vocês entenderão.
— Por que não contou para nós três, Tom? — Chelle pergunta.
— Fazia parte do plano manter as aparências, não é à toa que o nome e foto de Lisa estavam no quadro de suspeitos. O que não adiantou muito, já que te atacaram na noite de halloween para enviar uma espécie de mensagem.
Tom continua falando, mas não estou mais escutando, porque pares de olhos me prenderam como ímãs, puxando-me para si. Jacob está se desculpando com o olhar e eu sinto vontade de chorar. Chorar por ainda sentir algo por ele. Chorar por ele ainda ter tanto efeito sobre mim. Chorar porque eu ainda o quero.
— Ana? — Tom me chama e eu desvio o olhar.
— Sim.
— Você concorda?
— Com o quê?
— Nós nos juntarmos em uma super investigação — Lisa explica, brincando com os dedos pálidos.
— Não sei se isso daria muito certo — conto, com sinceridade. — Ficarmos juntos depois de tanto ódio levantaria suspeitas.
— Exato — Lisa concorda. — E é por isso que tudo ficará como estava. Cada um de nós em seu respectivo grupo, com seus respectivos costumes, mas com a exceção de nos encontrarmos para reunirmos nossas provas.
Jacob se levanta e caminha até o centro do quarto, respirando fundo. Tom e Lisa se sentam em suas cadeiras e ele umedece os lábios.
— O que contarei para vocês agora morrerá aqui, ok?
Todos confirmam com a cabeça e as palavras que saem da sua boca em seguida me pegam completamente de surpresa.
ᚔᚔ
É um plano arriscado, mas que talvez dê certo. De qualquer forma, precisamos impedir Evangeline antes que mais alguém se machuque e nada melhor do que jogá-la atrás das grades com provas concretas.
Jacob revelou o flashback que teve com a demon queen, contando algumas coisas, mas guardando detalhes de outras, o que foi melhor. Só de pensar nos dois em um momento tão íntimo assim faz o meu estômago embrulhar.
Scarlett e Michelle precisaram ir para casa, porque tinham um compromisso importante, então sobrou eu, Lisa e os rapazes, que estão conversando.
Vejo quando Lisa sorri para eles e se aproxima de mim, colocando as mão no moletom branco. Ela deve ter dezenas deles.
— Você está bem? Não reagiu muito bem quando soube.
— Estou, só não esperava ser pega de surpresa com uma bomba dessas — explico, oferecendo-lhe um sorriso.
— Entendo.
E então, como uma sirene, a dúvida começa a piscar na minha cabeça.
— Se você e Tom estão trabalhando juntos, por que queria o diário da Beatrice naquela noite?
— Queria saber até onde você sabia e se era confiável — ela murmurou, parecendo incomodada.
— Hm... Não sei porque, mas não acredito em você — confesso e ela ri.
— Confiança se conquista com o tempo, McRae e garanto que conquistarei a sua.
Sem dizer mais nada, Lisa se afasta. Algo nessa garota ainda me cheira mal. Toda essa história deles trabalhando juntos parece um problema e por algum motivo sinto que alguém nessa história está mentindo. É uma merda não saber quem.
Pego o meu celular e respondo algumas mensagens da Gabi, que quer saber se eu estou melhor. Desde que lhe contei sobre tudo o que aconteceu entre mim e Jacob ela não me deixa em paz, e eu gosto dessa preocupação dela.
Sinto seu perfume masculino invadir minhas narinas, arrepiando-me e sei que ele está perto, muito perto. Ergo o olhar e vejo Jacob parado na minha frente, mordendo os lábios, deixando-os em uma linha fina.
— Eu sinto muito, Ana — ele começa e eu respiro fundo.
— Você já me disse isso.
— Sinto sua falta — ele murmura, colocando as mãos no pescoço, cansado.
Por um minuto, apenas um minuto, sinto vontade de mandar toda essa mágoa para os ares e dizer que também sinto sua falta, mas além da mágoa o orgulho está intacto. Assim como as memórias. Memórias de sempre que nos beijávamos, ele beijava ela em seguida.
— Sua amizade sempre foi muito importante para mim.
— Eu também gostava da sua — confesso e ele sorri, esperançoso. — Isso até evoluirmos e destruí-la junto com todo o resto.
— Podemos tentar consertar. Só te peço uma chance, escritora.
O velho apelido... Sinto meu estômago dar cambalhotas e fico com raiva dele. Com raiva de mim.
— Quando quebramos um vaso ou amassamos uma foto, tentamos consertá-lo ou remendá-la, mas sempre ficam as imperfeições, lembrando-nos o estrago que causamos — começo — seria a mesma coisa com o meu coração e não acho justo forçá-lo a cicatrizar.
Ele me encara, arrependido, com os olhos brilhantes mostrando toda a sua dor.
— Ana! Jacob! — Tom chama e eu saio de perto dele.
Mesmo querendo perdoá-lo, mesmo querendo beijá-lo e rir de suas piadas sem graça em uma tarde ensolarada no penhasco da Summer Escape, seguro-me para não fazer besteira. Afinal, não posso mais viver assim e mereço coisa melhor. Mereço mais do que ser substituída por um ser humano terrível.
Se caísse em seu papinho outra vez, estaria jogando fora toda a barreira que construí com o tempo. Estaria jogando fora toda a minha luta para ser forte.
— Essa é a última semana de aula antes do recesso por causa dos feriado de ação de graças. Precisamos ser ágeis nessa investigação — Lisa diz e Tom concorda.
— Sem pressa, amigos — Jacob avisa e eu franzo o cenho. — Podemos dar uma festa de Réveillon quando voltarmos, assim ficaremos de olho nela e em todo o resto.
— É uma boa ideia — concordo.
— Perfeito! Precisamos pensar nos preparativos. Dessa festa ela não escapa.
Todos nós sorrimos e trocamos olhares confiantes.
Só não imaginávamos que perderíamos a peça fundamental da nossa investigação. Afinal, toda ação tem sua reação e ninguém nos avisou que mexer no que não deveria traria altas consequências.
Um preço que um inocente precisou pagar e, talvez o fim de tudo.
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