05 | Como assim outro homicídio?
Ninguém sabe o que se passa na minha cabeça, eles acham que eu preciso de ajuda, mas estou me assustando comigo mesma. Eu só quero ficar bem...
- Faith Marie.
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🚨 Alerta de gatilho!!! 🚨
Este capítulo contém crise de ansiedade explícita, destaquei a cena em que acontece colocando em itálico, então se você é sensível a esse tipo de conteúdo, aconselho a pular a cena. Nossa saúde mental em primeiro lugar. Boa leitura!
Uma das melhores decisões que eu já tomei foi ter aceitado fazer parte do jornal da escola junto com o Tom e a Scarlett. É uma distração a mais para a minha mente confusa e todas as minhas preocupações atuais, que triplicaram depois que eu voltei a estudar.
Hoje o céu acordou mal humorado, já que não para de chover e os trovões estão cada vez mais barulhentos. O vento que está entrando através das janelas é congelante e nem o aquecedor está dando conta, o que não é nenhuma surpresa, já que eu sempre soube que o Canadá é o mais próximo do polo norte, — na minha cabeça, claro — que eu vou chegar.
Encolho-me na cama, com o cobertor pesado me embrulhando e contribuindo para a minha insuficiência. São 05:30 da manhã e o céu já está ficando mais claro, o que é bom, eu acho. Daqui a meia hora terei que levantar e me arrumar para a segunda semana no inferno, o que me faz querer morrer.
As coisas não estão tão ruins. Desde que eu entrei para o jornal, sempre tenho algumas matérias para cobrir e ver se dá resultado, quando vejo que não levarão a lugar algum como: "Abby Blake é flagrada aos amassos com o professor de sociologia no armário de limpeza." espero até que a bomba exploda, para que a manchete seja: "Professor é preso por abuso de poder com menor de idade do primeiro ano." Uma grande jogada de marketing, eu diria.
Desde que Jacob e eu nos resolvemos no penhasco, as coisas estão fluindo normalmente. Não é como se tivéssemos virado melhores amigos do dia para a noite, mas posso afirmar que há uma amizade surgindo, porque sempre nos encontramos — querendo ou não — na Summer Escape.
Conversamos, rimos e na maioria das vezes ficamos em silêncio. Quem não gosta dessa aproximação são seus amigos, que vivem soltando piadas preconceituosas o suficiente para me deixarem pensativa por dias. Principalmente Zayn e Evangeline.
Encaro o teto branco do meu quarto, inquieta, angustiada e instável. Lágrimas invadem os meus olhos, causando um nó em minha garganta e não entendo porque existem pessoas assim, porque precisam inferiorizar outros para se sentirem bem consigo mesmo.
As crises estão mais frequentes, o que anda me tirando o sono. Daqui a uma hora completarei 27 horas sem conseguir dormir, e nem é porque eu quero. Se eu pudesse já estava dormindo há séculos, mas só de pensar em voltar para aquela escola outra vez me causa naúseas.
— Faça isso parar, por favor!
Não sei exatamente para quem estou implorando, mas creio que há alguma divindade suprema acima de nós, que talvez me ajude, ou não, porque eu não tenho tantos méritos por ser uma boa menina. Pelo contrário, estou sempre dando razão para as pessoas que me acham insuficiente, porque eu também me acho insuficiente.
Levanto-me da cama, tentando ignorar o frio, mas mal percebo, porque o que estou sentindo nesse momento é pior do que os meus dedos dormentes. Meu coração aperta e as lágrimas me sufocam. Tento respirar fundo, mas não consigo. Me sinto uma inválida, incapacitada. Que merda.
Encosto-me na parede, e tento recuperar a minha respiração, mas a minha mente me deixa maluca.
Tento me manter em pé, mas as vozes na minha cabeça, que me dizem ser tão insignificante que nem mesmo a minha própria mãe me quis, estão me matando por dentro. Arrasto o meu corpo contra a parede lentamente, até me sentar no chão, completamente abalada.
Encolho-me ali, com os meus pensamentos me torturando, querendo que isso passe. Minha respiração está começando a oscilar e as mãos não param de tremer. Não entendo como me deixei chegar a esse ponto, porque não coloquei um ponto final nessas crises quando tive a chance, porque fui tão orgulhosa e recusei a consulta com o psicólogo. Talvez seja medo.
Enterro o rosto entre as mãos e deixo as lágrimas rolarem, para ver se a pressão em meu peito diminui, mas não está adiantando muito. Flashes do meu passado me assombram e o medo do futuro me esmaga, como se eu fosse uma formiga indefesa.
Continuo nessa mesma posição, com a sensação de que morrerei a qualquer momento me perturbando. Tentando resistir, puxo os meus próprios cabelos, atordoada. Não consigo mais respirar pelo nariz, então a boca agora é a minha única opção.
Começo a arranhar os meus braços, tentando fazer a dor cessar de alguma forma, não suportando a pressão em meu peito e os meus próprios pensamentos, querendo sair do meu corpo por alguns segundos.
O alarme toca e eu não tenho forças para desligá-lo, não mais. Ouço quando a porta se abre e o meu pai me chama, até que ele para e respira fundo, uma respiração trêmula e preocupada.
— Está acontecendo outra vez? — ele pergunta, agachando na minha frente e eu assinto com a cabeça. — Ah, meu Deus!
Meu pai me abraça e eu o abraço também. Não quero ser um peso morto para ele, jamais desejei isso, mas é assim que eu me sinto. Em breve farei 18 anos e ainda não consigo superar essas crises, o que me faz permanecer na adolescência, prendendo o meu pai a mim por ser uma idiota.
— Respire fundo — ele sugere e eu tento.
Ele grita o nome da Dalila, que aparece em meu quarto preocupada. Meu pai pede um copo de leite morno para ela, que sai apressada em direção a cozinha. Odeio isso. Odeio quando isso acontece. Odeio! Odeio! Odeio!
— Me desculpa — balbucio.
— Shhh. A culpa não é sua, meu amor.
Resolvo não dizer mais nada, apenas fico calada e tento me controlar.
ᚔᚔ
Não sei como, nem da onde tirei forças para vir até a escola, mas aqui estou eu. Enquanto o senhor Adams está dando o seu ponto de vista sobre a literatura inglesa, estou fazendo rabiscos no meu caderno, apoiando a cabeça em uma mão e deixando a minha mente vagar por aí.
Scarlett não veio hoje, o que significa que estou sozinha nessa aula. Exceto pelo Jacob, que está sentado atrás de mim, dormindo.
Estou sem ânimo, afetada pelo que aconteceu de manhã e cansada pelas noites mal dormidas. Conversei com o meu pai e decidimos que eu vou começar a fazer terapia, pelo menos vou conseguir dormir em paz quando o terapeuta passar os remédio certos.
— Agora quero que vocês façam duplas e escolham um dos livros que eu citei agora pouco — o senhor Adams pede e eu suspiro.
Vejo várias pessoas se levantando de seus lugares para se sentarem ao lado dos futuros parceiros, até que sou surpreendida pelo Jacob, que se senta do meu lado, unindo a sua mesa à minha. Evito olhar em seus olhos, mas ele nem parece notar.
— E então, escritora, acho que você será a minha dupla de hoje.
Finalmente encaro os seus olhos azuis, vendo que a sua expressão muda completamente quando ele encara os meus. Com certeza Jacob percebeu que tem algo de errado comigo, porque a forma como ele está me encarando é a mesma forma como o meu pai me encarou pela manhã.
— É, infelizmente — tento brincar e ele sorri.
— Quer conversar?
— Quero que você me ajude a decidir entre Shakespeare e Jane Austen.
Ele me encara por breves segundos e eu tento sorrir, mesmo querendo chorar. Jacob assente e olha para os nomes no quadro, concentrado.
— Concordamos que ninguém supera Shakespeare, certo? — ele pergunta e eu confirmo. — Também concordamos que entre ele e Jane Austen, quem marcou mesmo a literatura inglesa foi ele. Certo?
— Falando assim, até parece que você entende de livros — debocho e ele ri. — Na minha opinião, os dois marcaram a literatura de vocês, mas de formas diferentes.
— Tanto faz. Vamos ficar com "Sonetos" de Shakespeare, até porque "Orgulho e preconceito" já está saturado.
— Não concordo, mas vamos ficar com Shakespeare mesmo.
Jacob me mostra o seu sorrisinho convencido e se levanta, pegando um giz e riscando a opção 1, anotando os nossos nomes do lado. Ele aponta com as mãos para o que fez, fazendo uma pose engraçada, arrancando-me uma risada.
— Bom, vamos começar — ele diz, pegando o caderno e se preparando para anotar as nossas futuras ideias.
De repente, todos ouvimos um disparo, e de barulhenta, a sala vira um verdadeiro funeral. Encolho-me e troco olhares assustados com Jacob, que está tão pálido quanto a folha de papel do seu caderno. Alguns alunos estão gritando, outros estão paralisados e outros desmaiaram.
— Ataque terrorista? — pergunto em um sussurro e Jacob me encara.
— Não são comuns por aqui, mas nunca se sabe quando alguém irá se revoltar.
— Tenham calma e continuem sentados! Não sabemos o que aconteceu ou onde foi — o senhor Adams ordena e todos se encolhem em seus próprios lugares.
O professor deixa uma garota responsável pela sala, enquanto sai para investigar o que aconteceu. Não ouvimos mais disparos, não ouvimos mais gritos, não ouvimos mais nada. Estamos em pânico, com as respirações presas na garganta e o medo embrulhando nossos estômagos.
Minutos depois, o professor entra na sala outra vez, pedindo para pegarmos nossos materiais e seguí-lo até a quadra onde os rapazes treinam. Levanto-me com as pernas trêmulas e seguro os livros contra o peito, caminhando até a saída. Jacob está logo atrás de mim, com uma das mãos apoiadas em meu ombro, dizendo que está aqui e que tudo ficará bem.
No caminho para a quadra, ouvimos o som das sirenes e vemos o sangue espalhado pelo piso do corredor dos armários. A porta do laboratório de arte está fechada, mas dá para notar que o sangue está saindo pela fresta de lá. Sinto a bile subir pela garganta, nem imaginando o que aconteceu ali dentro.
Chegamos até o ginásio, onde estão centenas de alunos espalhados pelas arquibancadas e até no próprio gelo da quadra. Vejo Michelle e Tom acenando para mim e encaro Jacob, que me oferece um sorriso reconfortante e diz que verá como os amigos estão. Sigo até onde os meus amigos estão e me sento entre eles.
— Vocês também ouviram o disparo?
— Estávamos no laboratório do lado — Michelle conta, com os olhos arregalados.
— Será que foi algum ataque terrorista? — pergunto e eles negam com a cabeça.
— A minha teoria era que alguém tinha se revoltado, trouxe uma arma para a escola e estava planejando matar todo mundo, mas pelo o que eu soube, só teve uma vítima — Tom comenta, com a mão no queixo. Ele está bem calmo, o que é admirável em uma circunstância como essa.
Olho para onde Jacob está, junto com os seus amigos, mas percebo que eles estão paralisados, como se soubessem exatamente o que aconteceu. Noto que está faltando uma pessoa do seu grupinho, o garoto de cabelos longos, e o meu estômago embrulha.
— Foi outro homicídio — afirmo e eles me encararam confusos.
— Como assim outro homicídio?
— Olha a reação dos amigos do Jacob. Está faltando um deles, então tem a hipótese dele ter sido o culpado ou a vítima — respondo, olhando para o Tom, que percebe onde eu quero chegar.
— Ah, meu Deus! Não foi acidente na casa da demon queen, foi proposital, assim como hoje — Tom junta os pontos, chocado.
— Não estou entendendo nada — conta Michelle.
— A garota que morreu, a tal Louise que foi empurrada da escada, ela conhecia o grupinho do mal — Tom revela. — Conhecia o Zayn...
— Está insinuando que alguém daquele grupo está por trás disso? — pergunto, espantada.
— Estou afirmando que ninguém é o que parece ser...
Desvio o olhar outra vez para o grupinho do Jacob, mas dessa vez, é Zayn quem está me encarando e consigo notar algo perturbador em seu olhar.
"Ninguém é o que parece ser..."
Ah. Meu. Deus.
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