Capítulo Dois
Percy Williams:
Saí do hotel apressado, quase tropeçando em meus próprios pés, e chamei o primeiro táxi que vi. Entrei no carro rapidamente, sentindo o peso do constrangimento da noite anterior ainda pulsando em mim. Passei o endereço para o motorista e, enquanto ele dirigia, vi meu reflexo no retrovisor. Foi então que notei os chupões marcados no meu pescoço. Minhas bochechas esquentaram violentamente, e o desconforto tomou conta de mim.
Eu fiz isso.
Suspirei profundamente, tentando ignorar a sensação de vergonha que queimava minha pele. Tudo o que eu conseguia pensar era em como iria xingar o Rony por me deixar sozinho naquela festa. Ele e a Dana tinham praticamente me forçado a ir, só para me abandonarem logo depois e curtirem os momentos deles. E lá estava eu, perdido, bebendo mais do que deveria.
Olhei de relance para o motorista e notei que ele me lançava um olhar divertido pelo retrovisor.
— Pelo visto, a noite foi selvagem, hein? — ele comentou, com um sorriso maroto.
Eu dei um sorriso tímido, apenas concordando com um aceno de cabeça. Não tinha energia para explicar nada, e o simples fato de ele ter notado me fez querer desaparecer ainda mais.
Ficamos em silêncio pelo resto da viagem, e depois de meia hora, vi que estávamos chegando à área mais comentada da cidade. A mansão da família Potter estava localizada na última fileira de uma zona residencial que abrigava apenas os ricos e influentes. As casas eram enormes, ostentando riqueza e poder em cada detalhe da arquitetura.
— Chegamos, rapaz — o taxista disse, parando na frente da imponente mansão.
Agradeci, paguei a corrida e saí do táxi, com as pernas ainda pesadas de cansaço. Caminhei em direção à entrada da mansão, arrastando os pés e sentindo cada músculo protestar. Ao entrar na sala de estar, fui recebido pelo som de risadas alegres que vinham de dentro.
— Eu preciso ir embora, pare de me beijar por trás assim! Isso é golpe baixo! — ouvi uma voz feminina, claramente de Dana, enquanto risadas suaves de Rony seguiam, logo acompanhadas por um beijo estalado.
Fechei a porta com força, o som ecoando pela sala, e mesmo com a cabeça latejando pela ressaca, foi impossível não sentir uma satisfação ao ver a expressão de choque no rosto dos dois.
Dana Wilson, a famosa modelo que foi descoberta aos quatorze anos por um caçador de talentos, estava ali com Rony, tão sorridente e despreocupada. Ela sempre foi talentosa, nascida em uma família de empresários que impulsionou sua carreira, mas era o brilho natural dela que a fez deslanchar no mundo da moda.
— Dana Wilson e Rony Potter, como ousam fazer safadeza no meio da sala de estar? Que coisa vergonhosa de se ver! — brinquei, rindo, enquanto os dois me olhavam com diversão.
— Não me julgue, seus chupões estão bem à mostra — Dana respondeu, apontando para o meu pescoço.
Eu mostrei a língua e me joguei no sofá, tentando ignorar o calor que subia pelas minhas bochechas.
— Achei que nunca mais iam voltar a ficar juntos, depois daquela cena ridícula que o Rony fez quando estava bêbado, dizendo que você era tão bela quanto a Monalisa e, logo depois, vomitando no seu vestido — falei, com um sorriso travesso.
Dana riu, revirando os olhos, mas logo olhou para Rony com carinho.
— Eu o perdoei. Aquilo foi algo que ele não podia controlar. Mas fiz com que ele prometesse nunca mais beber tanto em festas. — Ela sorriu amplamente, levantando a mão para mostrar a aliança reluzente. — E, além disso, ele me pediu em namoro ontem à noite, por isso desaparecemos por alguns minutos da festa.
Rony, orgulhoso, acrescentou:
— Aliança em prata reta, cravejada com pedras de zircônia — disse, com um sorriso satisfeito, enquanto se afastava de Dana e se voltava para mim. — Mas agora me diz, onde você se meteu? Depois que conversamos, fomos te procurar e você simplesmente sumiu. Pelo visto, sua noite foi... interessante.
— Quem era o cara? — Dana perguntou, sentando no sofá à minha frente, com Rony se acomodando ao lado dela. — Tinha alguns que eu notei te olhando com bastante interesse.
Senti meu rosto queimar de novo e desviei o olhar.
— Ah... foi só alguém que eu encontrei na festa — murmurei, tentando minimizar a situação, mas o olhar curioso dos dois me fez corar ainda mais. Dana apontou para os chupões com um sorriso malicioso, e eu sabia que não tinha como escapar dessa.
— Amigo, foi sexo casual, e dos bons pelo que parece — Dana disse, rindo animada. — Ainda mais considerando o que você me contou sobre como já fazia um bom tempo desde seu último relacionamento... E nem teve nada casual nesse meio-tempo! — Ela bateu as mãos, animada. — Me conta tudo, vai! Quem foi que fez isso com você?
— Não foi nada demais — falei, tentando desviar o assunto com um gesto descuidado. — Só uma noite. Não quero falar sobre isso agora. — Suspirei, querendo encerrar o assunto o mais rápido possível. — Mas, mudando de assunto, ouvi falar que seu famoso irmão e sua sobrinha vão voltar para a cidade depois de tanto tempo longe.
Dana soltou um suspiro.
A história da família de Dana era complicada, um verdadeiro labirinto de perdas, frustrações e segredos. Seu avô materno havia sido um dos pilares das quatro grandes famílias da cidade, mas o destino foi implacável. A morte repentina do tio dela em um acidente de carro foi o primeiro golpe, seguido pela morte de seu avô, vitimado pela hipertensão. Com a queda da fortuna familiar, os bens restantes foram herdados por sua mãe, que, infelizmente, não tinha habilidade para gerenciar as finanças. Pior ainda, sua saúde mental estava em frangalhos. Assim, a herança passou a ser administrada pelo pai dela até que o irmão mais velho atingisse a maioridade.
Não demorou muito até que o casamento de seus pais chegasse ao fim. Sua mãe se mudou para o exterior em busca de tratamento e recuperação, enquanto o pai se afundava cada vez mais na administração da empresa, obcecado pelo trabalho. O ciclo de perdas continuou. A mãe de Dana faleceu, e o pai dela, desgastado pelo esforço e pela pressão de manter a empresa de pé, também sucumbiu. O irmão mais velho assumiu o controle dos negócios quase que imediatamente, mas a relação entre os dois nunca mais foi a mesma.
— Eu ainda acho que o Lohan não deveria escutar os acionistas da empresa. A Gina é esperta demais, vai perceber logo que a gente não aguenta ficar perto um do outro por mais de três minutos sem quase nos esganarmos. — Dana comentou, com uma mistura de frustração e resignação.
Eu olhei para ela, preocupado. Entendia o peso que ela carregava e como a relação familiar podia ser complexa e desgastante. E, de certa forma, isso me fazia refletir sobre minha própria história.
— Nem todas as famílias são próximas — continuou Dana. — Olha para você, por exemplo. Acabou de encontrar o seu outro pai e ganhou um irmão mais novo. E todos te abraçaram de coração, sem forçar nada. Seus sobrinhos te amam, e você tem uma família de verdade, apesar de tudo.
Franzi o rosto, lembrando-me de como minha própria família sempre foi uma confusão. Antes de morrer, meu pai biológico só falava mal de Allan, meu outro pai, enchendo minha cabeça de mentiras sobre como ele seria uma pessoa horrível para se conviver. Fiquei amargurado por tanto tempo, acreditando em cada palavra. Foi só depois que meu pai morreu que a verdade veio à tona, e me senti traído. Uma simples mentira pode moldar o presente de uma pessoa, mas condena seu futuro — e foi isso que aconteceu comigo.
Ainda assim, conhecer os Jones mudou tudo. Quando fizemos o teste de DNA e eles confirmaram que eu era filho de Allan, eles me aceitaram como se sempre tivesse feito parte daquela família. Foi estranho, confuso, mas ao mesmo tempo, eles me acolheram de uma maneira que eu nunca esperei. A relação que criei com eles foi gradativa, mas sincera, e isso me fazia questionar todas as coisas erradas que meu pai havia me contado.
— Isso é muito diferente, Dana. Os Jones são pessoas incríveis. Conforme vou conhecendo eles, me sinto mais parte dessa família — respondi, em um tom tranquilo. — O Allan realmente me ama, e meu irmão é super protetor comigo. Até meus sobrinhos são ciumentos, mas é tudo de um jeito bom.
Rony, que estava ouvindo a conversa em silêncio, interrompeu com um sorriso brincalhão.
— Allan realmente te adora, hein? E sobre o seu irmão, acha que ele vai gostar de mim?
Dana riu, revirando os olhos.
— Sabe, meu irmão nunca foi muito de se importar com quem está ao meu redor. Ele nunca foi de socializar. Nem mesmo com minha cunhada ele conversava muito. Até hoje eu não entendo como eles se conheceram e, de alguma forma, acabaram apaixonados. — Dana suspirou. — Já a Gina... bem, você vai conhecê-la em breve. Ela adora falar, muito.
Olhei para ela, curioso com aquela última afirmação.
— Em breve? — perguntei.
Dana hesitou por um momento, depois soltou a notícia que fez meu queixo cair.
— Meu irmão está planejando fazer uma apresentação para a mídia, junto com a Gina. Vai ser a primeira vez que eles aparecerão juntos em público. — Ela me olhou de maneira um tanto tímida. — E, bom... queria te pedir um favorzinho.
Desconfiado, cruzei os braços.
— Diga.
— Pode cuidar da minha sobrinha no dia do evento? Meu irmão acha que ela só precisa tirar uma foto rápida e depois está liberada. Ela pode ir para outro lugar da festa depois disso, mas eu preciso ficar colada nos meus assessores. Não vou poder cuidar dela — explicou, com um sorriso suplicante.
Suspirei, já prevendo que seria complicado. E, claro, virei-me para Rony.
— E você? — perguntei, sabendo que ele não estava completamente inocente nessa história.
Rony desviou o olhar, claramente envergonhado.
— Bem... eu meio que prometi tirar as fotos da Gina e seguir o irmão dela para conseguir uma boa matéria para a revista... — Ele parecia desconfortável, e os dois se encolheram quando me levantei.
Balancei a cabeça, sem acreditar no que estava ouvindo.
— Então é isso. Vocês dois já tinham planos e decidiram me usar como bode expiatório. — Falei, tentando conter a irritação.
— As crianças gostam de você! — Dana disse, na tentativa de me convencer.
Olhei para ambos, sentindo que não tinha muita escolha. Mas já decidi que, de alguma forma, eles iriam me pagar por isso.
— Certo. Mas saibam que vocês vão me dever uma, e uma grande — declarei, apontando para eles antes de finalmente concordar.
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Gostaram?
Até a próxima 😘
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