Capítulo 11 - Costa Oeste
And I remember thinking
Are we out of the woods?
Are we in the clear?
In the clear yet? Good.
Capítulo 11
Costa Oeste
Eu tinha um endereço. Tia Mary tinha me dado no meu aniversário, caso eu quisesse mandar uma carta para Leanne. Não tinha mandado nenhuma, mas pelo menos o endereço servia para alguma coisa.
Servia para eu ficar de pé na frente do prédio dela sem saber se devia entrar ou não. Queria conseguir preparar tudo que eu diria, tinha passado as cinco horas de viagem pensando nisso, além das duas antes de conseguir um voo no aeroporto. Era como se as palavras estivessem todas em minha cabeça, prontas para serem usadas, mas eu não conseguia ordená-las. Elas se recusavam a se alinhar em frases até que eu estivesse para as falar. E, quanto mais tempo passava ali na calçada, andando de um lado para o outro, mais percebia que não teria saída.
Eu teria que falar o que me viesse à cabeça.
Parei para respirar. Já tinha acabado de passar por uma situação desesperadora - e nem estava falando do pedido de casamento de Max. Tinha tentado usar um dos bondes de São Francisco, só para cair em cima de outras pessoas e não conseguir um segundo de verdadeiro equilíbrio lá dentro até desistir e descer dois quarteirões antes da casa de Leanne. E, para piorar tudo, apesar das ruas parecerem todas bem planas no mapa que eu tinha pego no aeroporto, os dois quarteirões, relativamente curtos, viraram enormes quando eu percebi que teria que subir um morro.
Já tinha sofrido demais para chegar ali, minha ansiedade e desespero aumentando conforme as dificuldades. Sabia agora mais do que nunca que era exatamente lá que eu precisava estar. Só não sabia se Leanne iria concordar.
Antes que tivesse tempo o suficiente para ser covarde, fui até o interfone e toquei. Preferia uma porta. Parecia mais difícil de ela me ignorar.
"Oi?" Assim que ouvi sua voz, uma onda de euforia correu pelo meu corpo. Levei as duas mãos à boca na hora, em um misto de choque e felicidade que parecia mais forte do que eu conseguiria aguentar.
Meu deus! Era Leanne! Era Leanne, minha pessoa favorita no mundo inteiro! Era ela, eu tinha ouvido a voz dela! Como eu a amava! Como estava com saudades! Abençoado o momento em que decidi pegar aquele táxi para o aeroporto!
Engoli minha animação por um segundo. "É a Bridget," falei, segurando minha respiração como se fosse aumentar as chances de ela não me ignorar.
E, por um segundo, achei que ignoraria. Ela ficou em silêncio, mas ainda podia ouvir sua respiração, enquanto a vontade de chorar só pela possibilidade de ela me rejeitar dava sinais nos cantos dos meus olhos.
Mas aí a porta do prédio fez um barulho, indicando que estava aberta. E eu pude respirar aliviada.
Praticamente corri escada acima, mal conseguindo me segurar de felicidade pela hora em que a veria! Estava morrendo de saudades dela, morrendo de saudades da sua voz, da sua cara, de seu humor sempre ácido e sarcástico! Por que eu não tinha vindo três semanas atrás?
Toquei a campainha várias vezes, sabendo que arriscava irritá-la, mas não me importei. Só queria que ela abrisse a porta mais rápido. Vamos, Lea! Eu precisava de você!
Ela não ficou tão feliz assim de me ver. Quando finalmente abriu a porta, me olhava como a pessoa mais inconveniente do mundo. E talvez eu fosse, porque, ao invés de me manter longe, a abracei antes que pudesse protestar.
"Bridget, o que você tá fazendo aqui?" Senti suas mãos puxando meus braços para longe dela.
Não era como se eu esperasse algo diferente, não depois de como ela tinha me ignorado nessas últimas semanas, mas ainda assim fiquei um pouco decepcionada. Me desprendi dela, que teve que me dar espaço para entrar no apartamento, de tão perto que eu estava.
"Eu precisava falar com você," respondi, enquanto ela ia até o sofá e se jogava para sentar, claramente sem paciência para aquela conversa.
Mas não me importava se ela não queria falar comigo. Não me importava que eu ter cruzado o país para aparecer sem avisar a incomodava. Eu sorria de orelha a orelha. Mal conseguia acreditar que era ela na minha frente e precisava me segurar para não a abraçar outra vez!
Fechei a porta atrás de mim e corri para me sentar na sua frente.
"Você não sabe como eu senti sua falta!" Exclamei, fazendo com ela suspirasse fundo. "Não sei se você sabe, mas eu sofri um acidente e perdi minha memória." Claro que ela sabia. Eu mesma já tinha explicado isso várias vezes em mil e-mails e conversas com sua secretária eletrônica. "Para mim, é como se a gente ainda estivesse em oitenta e nove! Como se eu ainda tivesse dezesseis anos! Acredita?"
Seus olhos me observavam como se ela não acreditasse. Parecia buscar algum sinal de que aquilo tinha sido uma mentira que eu tinha criado. Talvez meu sorriso não fosse a melhor prova de credibilidade, mas eu o perdi assim que continuei:
"Mas eu tenho vinte e seis. Nós temos," me corrigi. "E eu não tenho ideia de por que a gente não se fala mais."
Lea abaixou o rosto, balançando a cabeça. "Por que você não pode simplesmente aceitar que tomamos rumos diferentes? Você tem sua vida lá-"
"Mas é exatamente esse o problema! Eu não reconheço nada daquela vida!"
"Bridget-"
"Eu fiz alguma coisa?" Cheguei mais perto dela, quase caindo da poltrona. "É por isso que você me odeia agora?"
Ela respirou fundo. "Eu não te odeio," falou.
Uma pontada de esperança.
Assenti, ainda insatisfeita. Nos poucos minutos que ficamos em silêncio, senti como se o resto da minha vida viesse para cima de mim como uma onda. Meu emprego que eu só tinha conseguido por Max, a falta de amor que era palpável quando eu estava com ele, meus pais separados e aquela vontade incontrolável que eu tinha de largar tudo o tempo todo, só para perceber que eu ficaria sem nada.
"Está tudo errado," murmurei baixinho, sentindo meus olhos lacrimejarem timidamente. "Minha vida é inteira errada," conforme continuava, ia aumentando minha voz, no mesmo volume que meus pensamentos. "Eu nunca quis ser advogada. Eu queria ser o contrário! Você lembra, não? Eu queria lutar por quem precisava que o sistema funcionasse! Não por quem quer tirar os filhos da mãe por pura birra!"
Lea me olhava estranho, escutando como se fosse a primeira vez que soubesse de tudo aquilo, o que me deu medo de quando exatamente nós tínhamos parado de ser amigas. Não podia ser há tanto tempo assim, não é? Já fazia uns dois anos que eu estava naquele escritório.
"Não era para ser assim," continuei, sem precisar de uma resposta sua. "E Max," balancei a cabeça, bufando uma risada engasgada pelas minhas lágrimas, "ainda que ele não fosse já Max Warner, a pessoa que transformou minha vida em um pesadelo constante no que, para mim, aconteceu três semanas atrás, ele é tão..." procurei a melhor palavra, tendo a impressão de que não a encontraria, "inconveniente," completei. "Ele não tem a menor noção do que faz, de quem eu sou. Devia ter antes, mas do que importa? Do que importa se antes eu era organizada, atlética e sociável? Não tem como eu voltar no tempo! Não tem como eu voltar a ser a garota que tinha conseguido se apaixonar por ele! Eu tinha conseguido me apaixonar por ele?"
Precisava muito saber, mas Lea não parecia conseguir me responder.
"Bridge-"
"E todo mundo sabe quem eu sou," a interrompi. "Isso é tão bizarro e, sei lá, até que é interessante de vez em quando essa fama, mas já cansou. Não quero que os garçons saibam quem eu sou quando é a primeira vez que eu apareço na frente deles! Não quero pular todas as filas."
Lea balançou a cabeça para si mesma. "Eu não sou a melhor pessoa para falar sobre isso."
"Claro que é!" Me levantei e comecei a andar pelo seu pequeno, mas adorável apartamento, decorado com móveis e objetos coloridos. "Você me conhece melhor do que ninguém! Me diz, eu amava Max? É por isso que decidi me casar com ele?"
Não esperava uma resposta, não da garota que tinha desaparecido da minha vida. Mas, como se já não soubesse mais guardar segredo, ela praticamente gritou:
"Sim! Você o amava! O suficiente para me trocar por ele."
Minhas pernas amoleceram na hora, me forçando a sentar de volta na poltrona.
"Como assim?"
Ela respirou fundo outra vez. "Eu te explico tudo que você quer saber. Mas, antes, café."
"Nós duas estudamos em faculdade diferentes," ela começou a contar, sentando em um dos bancos da pequena ilha que separava a cozinha da sala. "Eu vim estudar em Stanford, mas você se graduou em Direito na NYU. E, acho que no penúltimo ano, Max a chamou para sair e você aceitou."
"Certo," não sabia como responder, mas queria incentivá-la a continuar.
Ela tomou um gole de café. "Eu não sei como explicar, Bridge. Já passei tempo demais tentando entender. Não sei se foi porque ele já tinha entrado no time profissional, se era porque ele estava ficando cada vez mais famoso, ou era só porque você gostava de pensar que logo ele queria ficar com você," não falei, mas suas suposições me ofenderam um pouco, "só sei que você ignorou todos os meus conselhos e o colegial e aceitou sair com ele. Aceitou namorar com ele. E se casar com ele."
"E por isso você não é mais minha amiga?"
Ela revirou os olhos, não de maldade, mas por uma mania antiga dela. "Depois de eu passar meses sendo obrigada a interagir com ele e só sair com você se ele viesse junto, eu cansei, tá?"
"Mas ele nem é tão terrível assim," o defendi.
"Mesmo que ele tenha virado um príncipe encantado, ele foi a razão de eu e várias outras pessoas do nosso colégio, incluindo você, se sentirem péssimas durante muito tempo. Que bom que ele melhorou, só não o quero na minha vida. E eu era obrigada a conviver com ele," ela parou para respirar fundo, "quando eu voltei para Nova York e fui morar por um tempo com você, foi bem insuportável para mim. Eu achava que seria aquele nosso sonho de nós duas morando em Manhattan, nos matando para conseguir pagar o aluguel, mas sempre juntas. E você desaparecia! Eu não te via durante dias, porque você ficava na casa dele. E você mudou, Bridget," ela olhou pela janela da cozinha, como se as lembranças passassem por sua cabeça. "Você ficou viciada na atenção, nessa fama que você diz ser interessante. Você ficou arrogante com algumas coisas, debochava dos seus colegas do trabalho como se fosse tão superior a eles," ela balançou a cabeça, seus lábios se entortando de desgosto. "Um dia eu recebi uma oferta para voltar para a Califórnia e te fiz escolher. Eu estava disposta a recusar para ficar lá e batalhar por uma vida na costa leste, se você ao menos me desse atenção. Eu te pedi para me escolher, para se lembrar de que eu existia e, no dia em que eu precisava dar uma resposta para eles, você nem apareceu no apartamento. E eu fui embora."
"Eu pareço ser terrível," falei, me sentindo tão mal, que não saberia explicar.
"Não sei o que aconteceu depois," ela respondeu e aí, como se lembrasse de algo importante, completou: "Você perguntou do seu colar de avião de papel, né?"
Minha mão foi instintivamente ao de Thomas, ainda pendurado no meu pescoço, enquanto ela ia ao seu quarto e voltava com dois colares.
"Eu o roubei," admitiu. "No dia em que fiz minhas malas e deixei o apartamento, pensei em deixar o meu, mas aí percebi que você não merecia ficar com ele. Nem com o seu."
Concordei com a cabeça, reconhecendo o meu colar como aquele cujas asas tinham sido pintadas de esmalte rosa por baixo. Se eu tinha feito tudo que ela tinha falado, era verdade. Eu não o merecia.
"Me desculpa," foi tudo que consegui falar, sentindo minhas bochechas pegarem fogo. Não conseguia me lembrar de tê-la abandonado assim, mas a culpa ainda me pesava no peito. "Por ter me tornado essa pessoa e por ter me esquecido de ter cometido o pior erro da minha vida."
Leanne assentiu, pensativa. "Infelizmente, eu não me esqueci."
Na minha cabeça, ela tinha dito que não me perdoaria. De que importava se eu não me lembrava, se, para mim, eu não tinha feito nada de errado? Era ela quem tinha sofrido com meus atos, era ela que precisava decidir como colocar isso para trás.
"Me pede de novo," falei, a fazendo me olhar confusa. "Para escolher entre vocês dois, entre você e Max. Me pede."
Ela bufou uma risada, incrédula. "Não importa mais, Bridget."
"Mas, para mim, importa. Como eu disse, não tenho como voltar no tempo. E como o seu irmão me disse," mencioná-lo me roubava o ar, mas tentei esconder qualquer sinal do que eu sentia por ele, "não tem como eu viver como a Bridget de noventa e nove, nem como a de oitenta e nove. Eu sou uma terceira Bridget, a única que importa agora. E ela quer ter a chance de escolher."
"Isso não muda em na-"
"Só me pede!" Insisti, ainda que sentisse que estava sendo um pouco chata. "Você é a pessoa mais importante na minha vida, Leanne, não consigo nem te explicar o quanto eu amo você!" Meus olhos, em compensação, encheram de água na hora, como se tentassem provar minhas palavras. "Não consigo explicar a felicidade que senti só de ouvir sua voz! Então, mesmo que você não queira me perdoar, e super entendo se não quiser, me deixa escolher. Me deixa te escolher!"
Leanne nunca tinha sido de chorar, mas não ficou imune dessa vez. Teve até que olhar para cima para impedir suas lágrimas e depois, se dando por vencida, desceu do seu banco.
"Você sempre foi uma tonta mesmo," disse, logo antes de me abraçar e deixar que eu chorasse em seu ombro.
Mais algumas xícaras de café, um bolo que nos juntamos para fazer e alguns cookies depois, Leanne e eu estávamos sentadas no chão da sala, um filme qualquer da Meg Ryan passando ao fundo. Como sua colega de quarto estaria fora durante o final de semana, seu quarto já tinha sido oferecido para mim, e eu não tinha a menor pressa de sair dali.
"Não acredito que ele realmente achou que seria boa ideia!" Leanne exclamou logo depois de eu terminar de contar sobre o pedido de casamento. "Como ele é idiota!"
"Tadinho, ele teve boa intenção!" Tentei defender Max, mas aí percebi que tinha esquecido de contar uma parte. "Ele até pediu para turistas segurarem as letras para formar o pedido."
Leanne tinha acabado de pegar sua xícara para tomar um gole, mas explodiu em risadas, quase derrubando o café em cima dela mesma.
"Coitado!" Apesar de eu só colocar lenha na fogueira, ainda sentia um pouco de dó de Max. "Ele tinha boas intenções!"
"Quem diria que Max Warner seria tão patético assim," ela perguntou retoricamente, rindo ainda o suficiente para me dar a impressão de embaralhar as palavras. "Então você vai mesmo terminar com ele? Recusar direto?"
"Ele é uma boa pessoa, é sério. Mas sei lá," peguei um cookie do prato entre nós para esmagar e pensar. "O problema nem é ele. É só que..."
"Ai, meu deus," ela se endireitou para me olhar melhor. "Você gosta de outro cara!" E abriu a boca de surpresa e choque exagerados.
Tive que jogar uma almofada nela.
"Quem é?" Perguntou. "Quem? De quem você gosta, Bridget? Me fala agora!" Parecia uma adolescente mesmo, fosse pela minha mais recente lembrança dela ter sido em oitenta e nove ou só seu jeito.
"Será que dá para você se acalmar?" Pedi, sentindo o frio na minha barriga me deixar enjoada.
Ou talvez fosse a quantidade de doce que nós tínhamos comido.
Lea fingiu estar calma. Respirou fundo teatralmente e então fez a cara mais exagerada de quem estava me esperando responder.
Eu peguei a almofada que tinha jogado de volta para cobrir minha cara. "Seu irmão," falei, a sentindo arrancar a almofada logo em seguida, sem me dar qualquer segundo de proteção.
"Como é que é?!" Ela não estava brava. Ria na maior altura, teve até que se levantar para que pudesse demonstrar claramente o quanto estava inconformada. "Não acredito! Ele sabe disso?" Ela voltou correndo para me encarar. "Ele vai ficar maluco quando souber!" E riu de novo.
Eu escondia meu rosto nas mãos, só deixando espaço o suficiente entre meus dedos para ver sua reação.
"Bridget, você precisa contar para ele!" Insistiu, enquanto eu a deixava falar e não contava tudo. "Ele ainda gosta de você, ele sempre gostou de você! Sério, ele falou para mim em fevereiro que ainda gostava de você."
"Oi?" Me levantei do chão para sentar na cadeira, tirando as mãos do rosto. "Fevereiro, mês passado?" Perguntei, e ela concordou com a cabeça.
"Você precisa contar para ele."
"Ele sabe."
Ela se sentou no sofá. "Como assim, ele sabe?"
"Quer dizer," dei de ombros, como se o assunto não me desse a impressão de estar simplesmente admitindo o segredo mais bem guardado do universo, "não cheguei a falar com todas as palavras o quanto quero largar Max e ter que voltar a morar na casa da minha mãe para poder ficar com ele, mas-"
Fui interrompida pela risada de Leanne. "Isso é tão maravilhoso, cara!" E ria mais um pouco. "Sério, vai falar isso para ele. E me manda uma foto da sua reação."
Balancei a cabeça, apesar de que provavelmente cumpriria seu pedido. "Você acha que ele vai querer ficar comigo?"
Ela forçou uma cara de quem precisava pensar a fundo sobre o assunto. "Deixe-me ver, será que ele vai querer ficar com a garota por quem foi apaixonado durante mais de dez anos? Hm, acho que não."
E fui obrigada a jogar outra almofada na sua cara.
Quando eu tinha dezesseis anos, sonhava com muitas das coisas que tinha agora. Sonhava em não ter o dente enorme e torto, sonhava em ter um apartamento grande e caro, roupas maravilhosas e de marca, em morar em Nova York, além de ter a possibilidade de pegar um voo em cima da hora e não ter que gastar todo o dinheiro na minha conta para isso. Foi tão rápido me esquecer dessas coisas quando percebi que o resto da minha vida estava errado. Em poucos minutos depois de ter acordado no hospital, o que eu achava que era um sonho se transformou em um problema bem maior do que eu achava que conseguiria lidar.
Eu não conseguia sentir meus pés no chão. Estava constantemente perdida, como se o mundo inteiro tivesse se conspirado para me fazer sentir deslocada e inapropriada. E fui eu quem teve que se adaptar, quem teve que aguentar a sensação de que não me pertencia em lugar nenhum, como se vivesse a vida de outra pessoa.
Talvez essa sensação de desolamento tivesse só ajudado a deixar tudo melhor agora, quando eu finalmente sabia que não havia nenhum outro lugar onde preferia estar. Não havia nada que eu preferia fazer a não ser correr em direção ao hospital onde Thomas estava, pronta para falar tudo que carregava no peito.
Ainda não conseguia sentir meus pés no chão. Corria porque tinha a sensação de que estava prestes a voar. E sorria sem parar, finalmente vendo um futuro à minha frente, não mais presa a um presente doloroso ou um passado inalcançável. Não precisava me consolar pensando que nem tudo estava perdido, porque sentia que tudo estava indo exatamente na direção que devia ir.
Leanne tinha praticamente planejado passo a passo comigo na noite anterior do que eu deveria fazer, como falar para Thomas o que eu sentia. E eu tinha acordado o mais cedo que conseguia depois de passarmos a noite inteira vendo filmes, só para pegar o primeiro voo de volta para Nova York. Mais cinco horas no ar e eu ainda não estava preparada.
Mas me sentia leve demais para me importar. Até mesmo no metrô, tinha me sentido leve. Até mesmo quando saí na rua e a atravessei em direção às portas do hospital.
Contrastando terrivelmente com a felicidade que eu sentia em cada centímetro do meu corpo, logo atrás de mim, logo que eu terminava de atravessar a rua, perto o suficiente para que uma mulher me empurrasse para fora do caminho, dois carros se chocaram. Ouvi a brecada como se ela soasse dentro da minha cabeça, enquanto sentia as mãos desesperadas dela me jogando para fora da rua mais rápido. E então, como um tiro, o barulho da batida.
Eu a senti em mim, ainda que estivesse a salvo. Senti que subia pela minha pele, me arrepiando, me contorcendo, como naquela noite. Senti que preenchia minha cabeça, me lembrando de cada segundo, cada detalhe do acidente que tinha me levado ali.
E de quem tinha estado comigo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro