CAPÍTULO 02 ✨
Saio do elevador diretamente no andar da presidência, segurando minha pasta de couro preto com a mão esquerda e meu café com leite com a direita.
Ao me aproximar da grande roleta que dá acesso às salas do andar, sou abruptamente impedido por dois seguranças que se colocam à minha frente. Meu cenho franze imediatamente.
— B-bom dia — gaguejo, sentindo o constrangimento tomar conta de mim. — O que aconteceu?
— Desculpe, senhor Beaumont, mas seu avô proibiu sua entrada em todo o prédio — explica um deles. Pisquei, sentindo meu coração disparar no peito. — Sinto muito.
— Tudo bem — murmuro, tentando manter a calma enquanto viro nos calcanhares. Sinto os olhares desconfortáveis atrás de mim enquanto volto em direção ao elevador com passos largos.
Despejo o café no lixo e pego meu smartphone do bolso, procurando o número do meu avô na agenda. Coloco no viva-voz enquanto o toque ecoa pelo interior do elevador, e ele atende no quinto toque.
— Bom dia, querido neto — ele cumprimenta, despreocupado, enquanto aperto o botão para o estacionamento e respiro fundo.
— O senhor me proibiu de entrar na minha própria empresa? — pergunto, irritado, enquanto o elevador desce. — Fui barrado no andar da presidência, todo mundo ficou me encarando.
— Ah, que situação terrível. Tenho uma novidade para te contar — responde ele, com um desdém que me atinge em cheio. — Seus pais estão cancelando algumas reuniões. Vão chegar em Washington no próximo fim de semana.
O desespero toma conta de mim assim que ouço aquelas palavras, meus pais estão vindo para cá. E, dessa vez, estarei completamente sozinho. Sem ninguém para intermediar, sem meu avô para aliviar as críticas que inevitavelmente virão. Sinto um nó na garganta.
— Por que o senhor está fazendo isso comigo? — solto, quase gritando, sem me importar em disfarçar o pânico. — Está me torturando de propósito?
Ele ri, como se estivesse ouvindo a melhor piada do dia.
— Isso não é tortura, Killian — responde com um tom despreocupado, mas firme. — Só quero ver você feliz, conhecer pessoas novas. Quem sabe até… se apaixonar pela sua esposa.
Reviro os olhos, mesmo sabendo que ele não pode ver minha reação. O que ele espera, que eu vá encontrar o amor da minha vida no intervalo entre uma crítica e outra de meus pais?
— Amor não se compra, nem se acha tão fácil por aí — retruco, ainda indignado. — E o senhor sabe que eu odeio surpresas desse tipo!
Ele apenas ri novamente, como se minha situação fosse a coisa mais engraçada do mundo.
— Oh, Killian, precisa relaxar mais.
— Como posso relaxar? — murmuro, encostando a testa no metal gelado e fechando os olhos. — Eu vou ter que me casar com uma desconhecida!
A linha fica em silêncio por alguns segundos, e então ouço uma risada baixa e satisfeita.
— Então é isso! Você finalmente aceitou o casamento! — O tom de comemoração do meu avô é tão animado que quase posso vê-lo sorrindo do outro lado.
Xingo a mim mesmo mentalmente. Como deixei escapar aquilo? Cedi fácil demais. Mas a ideia dos meus pais chegando antes do Natal me deixa em pânico total. Diante dessa opção, enfrentar uma completa desconhecida parece… suportável. Melhor do que lidar com os dois.
Engulo em seco e, resignado, encosto novamente a cabeça no metal, tentando absorver a situação em que me meti.
— Ótimo, então está decidido! — diz meu avô, empolgado. — Agora só falta você vir para cá. Já providenciei tudo para sua chegada em Ottawa, aqui no Canadá. Estamos te esperando!
Sinto meu estômago afundar enquanto ele continua.
— E, é claro, vamos preparar o casamento mais lindo que você e sua futura esposa poderiam ter. Tudo como manda o figurino!
Minha cabeça gira com a ideia de um casamento planejado sem que eu sequer tenha visto a noiva. Ottawa? Casamento lindo? Isso está se tornando um pesadelo maior do que eu imaginava. Mas, por algum motivo, sei que discutir só vai fazer meu avô se irritar ainda mais.
Desligo a chamada, sentindo o peso do silêncio preencher o elevador enquanto ele finalmente chega ao estacionamento. Saio, cabeça baixa, e caminho até meu carro. Cada passo me lembra do absurdo disso tudo. Casar à força… uma realidade que eu nunca imaginei para mim. Lá no fundo, eu ainda tinha esperança de encontrar alguém. A pessoa certa, sabe? Mesmo sendo um tímido incurável e completamente incapaz de dar o primeiro passo com qualquer mulher que fosse.
Entro no carro, fecho a porta e apoio as mãos no volante. Respiro fundo, mas é inútil. A sensação de sufoco ainda está lá, e me deixo cair sobre o volante, debruçando-me ali, como se pudesse me esconder de toda essa situação.
Martirizo-me pelo que sou, por ser tão retraído, por essa fobia social que me impede de agir. Se eu fosse mais confiante, mais solto… provavelmente já teria uma namorada. Não precisaria de um casamento arranjado, nem dessa pressa absurda do meu avô para que eu me case com uma completa desconhecida.
Fecho os olhos, deixando o silêncio do estacionamento me envolver, tentando aceitar o caminho que aparentemente já foi decidido por mim.
Dirijo para casa em silêncio, apenas o som do motor preenchendo o vazio ao meu redor. Minha mente está presa na mesma ideia: meu futuro sendo decidido por outras mãos.
Assim que chego, entro e subo direto para o quarto, ignorando os olhares curiosos dos empregados. Tranco a porta e deixo escapar um longo suspiro, sentindo o peso de tudo cair sobre mim de uma vez só. A única coisa que quero agora é o silêncio.
Passo o dia inteiro isolado, deixando o celular vibrar e ignorando as batidas suaves na porta. Sei que estão preocupados, mas não consigo enfrentar ninguém. Preciso desse tempo. Fecho os olhos e deixo o silêncio tomar conta, tentando encontrar alguma paz em meio ao caos.
(...)
Acordo sobressaltado com batidas fortes na porta, acompanhadas por uma voz grossa e familiar me chamando repetidamente.
— Killian! Abra essa porta agora! — A voz insiste, incansável, reverberando pelo quarto.
Respiro fundo, ainda meio atordoado pelo sono e pela confusão mental que ficou do dia anterior. Conheço bem essa voz autoritária, impossível de ignorar.
— Abre a porta, porra — Me levanto da cama me sentindo um trapo, caminho até a porta a destrancando.
Um furacão loiro atravessa o limiar, suas mãos alcançando minha nuca, me fazendo franzir o senhor.
— Vamos para Ottawa? — Pergunta e deposita um beijo na minha testa e deixa uma risada amarga escapar antes de passar por mim a passos largos — Sabe Lian, eu já comprei uma cobertura no centro da cidade.
— Até você, Elliot? Não vê que isso é um desastre? — Pergunto o indignado e meu amigo me olha com dúvida — Irei me casar à força.
— Pelo amor de Deus Killian, você vive me enchendo o saco porque deseja ter uma namorada, agora tem a chance de ter uma esposa e está com essa cara — Cruzo meus braços enquanto o observo com tédio — Quem sabe ela seja a mulher que você tanto procura.
— O que? Claro que não! Amor não é assim — Gesticula com minhas mãos e meu amigo se aproxima e apoia suas mãos nos meus ombros — Seremos infelizes.
— Você precisa parar de ser pessimista. — Elliot me dá um tapa na cabeça e se afasta, apontando para mim. — Sabe quem é sua noiva?
— Não. Meu avô não me contou quem é a “felizarda”. — Cruzo os braços enquanto Elliot se joga na minha cama. — Espero que ela seja gentil.
— Está animado para a lua de mel? — Ele ri, e eu respiro fundo, encarando o idiota.
— Qual é, Killian? Estou brincando!
— Você realmente pediu transferência para Ottawa? — pergunto, e ele respira fundo antes de responder.
— Claro que sim. Lembra da nossa promessa, seu idiota? — Ele cruza os braços, e eu deixo escapar uma risada.
— Por que está rindo?
— Já percebeu que você me persegue para onde eu vou? — provoco, com um sorriso de canto.
— Agora que você será um homem casado, poderá tomar uma cerveja comigo. Vai perder a virgindade e experimentar sua primeira bebida alcoólica. — Pego o chinelo e lanço nele, que gargalha.
— Eu ainda não transei porque não quis, não porque não pude. — Dou de ombros, e ele balança a cabeça. — Elliot, saia. Preciso tomar um banho e comprar uma passagem para o Canadá o mais rápido possível.
— Não será necessário. Vamos no meu jatinho particular. — Bate palmas e se coloca de pé — Inclusive saímos em uma hora.
— Você não tinha vendido esse jato? — pergunto, observando-o girar o anel no dedo anelar direito. — Comprou outro?
— Comprei. — Ele suspira e se deita de costas na minha cama. — Minha mãe me deu de presente.
— No dia em que sua mãe parar de sustentar você, quero só ver como vai sobreviver. — Ele faz um gesto com a mão, me mandando ir embora. — Elliot, você já está velho. Nós estamos velhos. Precisamos do nosso próprio dinheiro, do nosso próprio trabalho.
— Eu já tenho uma profissão, esqueceu? — Ele tira um pacotinho de chicletes do bolso e sorri de lado. — Sou detetive particular.
— Um dos piores. Só atuou em dois casos, nunca conseguiu provas suficientes, e ainda foi demitido. — Dou de ombros enquanto ele mastiga o chiclete.
— Faz parte. E vou trabalhar pra quê, se minha mãe banca todos os meus luxos? Sou um “nepobaby”. — Reviro os olhos e vou em direção ao banheiro.
Não adianta tentar colocar juízo na cabeça do Elliot. Ele odeia tudo que não envolva festas, mulheres e bebidas. É um acomodado, a mãe faz todas as vontades dele, o que só o deixou ainda mais mimado e preguiçoso.
A água quente escorre pelo meu corpo, relaxando meus músculos enquanto tento afastar a tensão que cresce no peito. O vapor cobre o banheiro, abafando o silêncio ao redor. Passo as mãos pelo rosto, tentando organizar os pensamentos, mas é impossível ignorar o peso do que me espera amanhã.
Termino o banho, me seco rapidamente e saio. De volta ao quarto, noto que Elliot sumiu. Provavelmente está na cozinha, ele adora os bolos que as minhas cozinheiras fazem. Suspiro e vou até o closet, puxando uma camisa escura e um jeans, algo casual.
Enquanto me visto, minha mente se fixa no que está por vir, conhecer minha futura esposa, alguém que eu nem sei quem é, escolhida pelo meu avô sem ao menos me consultar. “Prometido em casamento…” Essa ideia me irrita. Meu destino traçado sem que eu pudesse escolher, jogado na direção que ele decidiu.
A cada peça de roupa que visto, sinto o peso dessa decisão nas costas. Dou um último olhar no espelho, antes de sair do quarto.
— Senhor Beaumont, vamos arrumar suas malas. Em breve, as levaremos para o carro — diz a governanta, com um sorriso gentil.
— Obrigado — respondo, assentindo enquanto passo por ela. Ao lado dela, duas outras empregadas observam em silêncio.
Minha equipe já está acostumada ao meu jeito reservado. Desde que foram contratados, deixei claro que sou uma pessoa mais calada, que evito conversas desnecessárias. Então, eles sabem que não é pessoal é apenas meu jeito.
Caminho pelos corredores da mansão, onde o silêncio reina absoluto. As paredes são decoradas com obras de arte cuidadosamente selecionadas, molduras douradas e tapeçarias que dão ao ambiente uma elegância sombria. O chão de mármore reflete a luz suave dos lustres, que pendem como jóias do teto alto, cada detalhe meticulosamente pensado pelo meu avô. Ao atravessar os cômodos, o eco dos meus passos é quase tranquilizador.
Vou em direção à cozinha, e a quietude que domina o restante da casa se dissolve assim que me aproximo. Vozes e risadas preenchem o ambiente, aquecendo o ar como se fosse um espaço à parte da mansão.
Na cozinha, encontro Elliot sentado à mesa, com um grande pedaço de bolo à sua frente. Ele está no centro da atenção das empregadas, que sorriem e riem de algo que ele acabou de dizer. Uma delas cobre a boca com a mão, tentando conter o riso, enquanto outra parece encantada, com os olhos fixos nele.
Elliot, claro, sabe como entreter. Ele gesticula animado, falando sobre alguma aventura exagerada, enquanto aproveita cada garfada do bolo. Ao me notar na porta, ele apenas me lança um sorriso despreocupado antes de voltar a atenção para a próxima história.
— Bom dia, senhor Beaumont. — Sorrio brevemente em cumprimento e aponto para Elliot.
— Pare de incomodá-las e vamos logo. — Ele suspira, voltando a comer o bolo. — Vocês continuarão trabalhando normalmente, não precisam se preocupar em procurar outro emprego. Quero mantê-las na minha equipe aqui em Washington.
— Que alívio! Pensei que seríamos mandadas embora. — Eu nego com a cabeça, me aproximando das três mulheres, todas com o uniforme padrão.
— Posso não ser muito comunicativo, mas tenho muito apreço por todas vocês. — Ele gesticula com as mãos, e elas se entreolham, sorrindo.
— Também temos muito apreço por você. Espero que seja feliz em Ottawa. — Concordo com um sorriso e sinto uma mão no meu ombro.
— Vamos? — Elliot pergunta, e eu faço que sim com a cabeça, acenando para as três enquanto sou puxado para fora pelo meu amigo.
Ao sair de casa, olho para a porta sendo fechada por Elliot. Coloco meus óculos escuros e sigo em direção ao carro, onde ele coloca algumas coisas no porta-malas.
— Preparado? — pergunta Elliot, enquanto respiro fundo e desço os degraus da escadaria, sendo seguido pelo meu amigo que masca um chiclete. — Uma vida nova te espera, caro amigo.
Elliot apoia as mãos nos meus ombros e dá alguns pulos, parecendo uma criança de dez anos.
Que a vida em Ottawa seja tão tranquila quanto aqui em Washington. Eu não sei lidar com o caos.
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