Capítulo 53 - Reunião de cúpula
O teatro do centro de Robson está quase lotado. A maioria dos representantes políticos, comerciários, fazendeiros e servidores públicos da cidade ocupam as cadeiras antigas de madeira com estofado vermelho do auditório com arquitetura estilo vitoriana.
O dono do hotel está agitado andando de um lado para o outro tentando recepcionar a todos. Livy nos reconhece assim que entramos e se esquiva por trás das cortinas vermelhas e pesadas do palanque onde Nolan Murray aguarda com olhar ansioso atrás de um púlpito de madeira.
Sentamos na última fileira de assentos. Estou entre Will e Hunter. Uma vez ou outra, Hunter comenta algo em meu ouvido, Will desencosta da cadeira e nos encara carrancudo. A implicância que começou a nutrir por Hunter chega a ser infantil. E Hunter parece se divertir com isso.
Enlaço minha mão na de Will transmitindo-lhe uma mensagem silenciosa. Ele acena a cabeça e relaxa na cadeira.
Ross caminha pelo tapete vermelho do centro do salão. Mastiga o costumeiro palito de dentes e veste um macacão jeans desbotado e sujo de alguma coisa marrom gosmenta.
_ Chefe. _ Entra na fileira de cadeiras a nossa frente.
Hunter apenas acena a cabeça.
Ross gira o pescoço em nossa direção.
_ Também foram convidados? _ Faz uma careta e funga.
_ Sim, nós fomos, Ross. _ Respondo o óbvio.
Will o observa com a mão fechada na boca e o cotovelo apoiado no braço da cadeira.
_ Podemos conversar após isso?_ Aproveito a oportunidade.
Ross nos observa desconfiado.
_ Está bem. _ Concorda e vira para frente.
_ Boa tarde a todos. _ Nolan testa o microfone que faz um som estridente de microfonia incomodando nossas audições.
O dono do hotel vai em seu auxílio e o ajuda com o aparelho.
Nolan seca a testa com o antebraço.
_ Ele parece nervoso. _ Hunter sussurra.
_ Também estaria se estivesse no lugar dele. _ Will responde.
_ Ouçam. _ Ergo a mão para que prestem atenção.
_ Desculpem. _ Nolan limpa a garganta antes de continuar. _ Acredito que estejam se perguntando o porquê foram convidados para essa reunião. _ Sorri desconfortável.
_ Fale logo o que tem para dizer, Murray! _ Harold se levanta na primeira fileira.
_ Diferente de você, precisamos trabalhar. Nosso tempo é curto. _ O barbeiro da cidade concorda logo ao lado de Harold.
_ Silêncio! Antes de mais nada, ouçam o que ele tem a dizer. _ O dono do hotel vem em defesa de Nolan.
Nolan apoia as mãos no púlpito. Abaixa a cabeça por um tempo. Os ombros se movimentam como quem respira fundo algumas vezes. Ergue a cabeça e encara a plateia.
_ Entendo perfeitamente a impaciência de vocês. Na verdade, duvidei de que alguns viriam.
Nolan passeia o olhar pelo auditório detendo-se alguns segundos em nossa direção.
_ Essa reunião tem como objetivo principal, trazer um pedido de perdão coletivo em nome de meu pai.
_ Isso é demais para mim... _ Will ameaça se levantar.
Mantenho-o sentado tocando em sua coxa.
_ Ele só pode estar de brincadeira! _ Hunter reclama inquieto também na cadeira.
_ Vamos ouvir o que ele tem a dizer. Não custa nada. Se estiver armando, só vai prejudicar a si mesmo. _ Tento acalmar aos dois homens bufando ao meu lado.
_ Talvez não acreditem, mas eu não sabia do envolvimento de meu pai no acidente da mina. _ Nolan continua.
_ Acidente não! Crime! _ Harold corrige. _ Seu pai, Oliver e Ava são todos assassinos.
Nolan torce a boca e afirma com a cabeça.
_ Conheço meu pai e seus métodos. Mas nunca imaginei que chegasse ao ponto que chegou. _ Nolan respira fundo. _ Não conhecia esse lado obscuro dele.
_ E você acha que um pedido de perdão do assassino dos pais de família, filhos, netos e sobrinhos dessa cidade vai reparar a dor que sentimos? _ Uma senhora grita do meio da plateia.
Nolan fecha os olhos.
_ Não. Eu não acho. A perda que tiveram foi irreparável. Nada pode amenizar essa dor. E não estou aqui a pedido de meu pai. Como sabem, ele está internado. E o estado dele é bem delicado. _ Nolan explica.
_ Que morra, esse infeliz. _ Hunter resmunga.
_ Vim por vontade própria, como o filho do homem que deveria proteger e defender a cidade, mas falhou. Mesmo que se recupere, ele será destituído do cargo de prefeito. O vice-prefeito estará assumindo. Não pretendo seguir carreira política. Quero sair da cidade depois que tudo acabar. _ Nolan parece prestes a desabar.
_ Primeiro terá que provar de que não esteve envolvido nos crimes de seu pai. _ Outra mulher se manifesta.
Nolan apenas olha em direção à voz, mas não retruca.
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_ O que acham? Ele parecia estar sendo sincero. _ Comento após descer a escadaria do teatro.
_ É difícil acreditar que o filho não sabia de nada. Nem ao menos suspeitava? _ Hunter coloca as mãos nos bolsos.
_ Não acho impossível, afinal tem a mesma idade que a gente. Na época, estava fora da cidade estudando e o pai no inicio da carreira política. _ Will conclui.
_ Hunter! William! _ Nolan desce a escadaria apressado. _ Peço aos dois apenas cinco minutos em particular, por favor.
Os dois se entreolham e depois afirmam com um aceno de cabeça.
_ Espere-me na picape. _ Will me dispensa beijando minha testa.
_ Acha isso seguro? _ Sussurro.
_ Não se preocupe. Já volto. _Segue ao lado de Hunter por uma porta lateral indicada por Nolan.
Observo os três homens com olhar perdido. Sem saber o que fazer.
_ O que foi? O namoradinho foi ao banheiro? _ Ross surge em minha frente sorrindo com um palito de dentes mastigado no canto da boca.
Alguns fiapos chegam cortar os lábios.
_ Nossa, como consegue fazer os comentários mais desagradáveis?
_ Aha, deixe de frescura. Fale logo, o que quer comigo? _ Ross coça a virilha em pleno saguão sem o mínimo pudor.
Em nome de um bem maior, venço a vontade de me afastar.
_ Will gostaria de conhecer o sobrinho. _ Vou direto ao ponto.
Ross põe as mãos no bolso do macacão e balança para frente e para trás nos calcanhares.
_ Agora o imbecil quer saber da criança?
_ Ele não tinha conhecimento da existência do sobrinho, Ross. Sabe muito bem disso. Will acaba de recuperar parte das lembranças que perdeu com a explosão e o irmão falecido não teve tempo de contar sobre a gravidez de sua irmã.
Ross olha ao redor.
_ Por que ele mesmo não veio falar comigo? O covarde precisa que a mulher venha em sua defesa?
_ Will e Hunter estão com Nolan. Foram chamados para conversar em particular. Isso está me deixando agoniada. _ Esfrego os braços.
Ross cospe o palito moído no chão.
_ Por que não contou isso antes, sua lerda?!_ Empurra minha testa com um dedo.
_ Tire a mão de mim, seu nojento!
_ Diga logo para onde levaram meu chefe!
_ Por ali. _ Indico a porta lateral em que entraram.
Ross vai atrás.
_ Senhorita Tremblay?! Como vai? _ O vigia e atendente do Gazeta de Robson se aproxima.
Encaro-o um pouco atordoada.
_ Vai dizer que esqueceu de novo?! Wilfred Fisher. Do Gazeta. Encontramo-nos no hospital outro dia.
_ Claro que não esqueci de você. Só estava distraída. Como tem passado Wilfred. _ Meus olhos não param de circular pelo saguão em busca de algum sinal de Will e dos outros.
_ Sabia que seu nome foi citado na última reunião da diretoria do Gazeta? Em breve, a senhorita receberá um convite formal do nosso redator.
_ Convite? E para o que seria? _ Uno as sobrancelhas intrigada.
_ Ora, a senhorita é jornalista. O Gazeta precisa de gente jovem com ideias inovadoras. Além do mais, suas referências são as melhores. Sobrinha do melhor jornalista que tivemos. Alexander Tremblay fez história no Gazeta.
_ Nossa, isso é inesperado. _ Por alguns minutos distraio-me das preocupações com a possibilidade de uma proposta de emprego para trabalhar em Robson e me estabilizar de vez na cidade canadense.
Aos poucos, o saguão vai esvaziando até que só restam funcionários circulando pelo local. Saio para a calçada e encosto na picape. Pouco tempo passou desde que Will, Hunter e Nolan se reuniram para ter uma conversa em particular, mas para meus nervos parece que passaram horas.
Finalmente a porta de vidro se abre. Mas quem sai é Livy sozinha. Ela me encara por poucos segundos, abaixa a cabeça e caminha apressada pela calçada.
_ Livy? Ei! ei! _ Seguro-a pelo braço quando tenta escapar sem responder.
_ Solte-me! _ Luta comigo.
_ Onde está Nolan e os outros?
_ Estão lá dentro conversando. Nem adianta tentar tirar alguma informação de mim. Não me deixaram participar da conversa.
_ Mas está tudo bem? Notou se estavam alterados.
_ Não estavam brigando se é isso que quer saber.
_ Ah, menos mal. _ Solto o braço da garota.
Ela pensa um pouco antes de voltar a falar.
_ Ele não tem culpa de nada. _ Suspira. _ Não tem culpa do pai que tem.
_ Não temos certeza de nada, Livy. Melhor se proteger e não se envolver. Sei que gosta de Nolan, mas precisa se cuidar.
A garota nega com a cabeça.
_ Sei que não leva a sério meus sentimentos. Meu pai age da mesma forma. Mas todos vão se surpreender quando partirmos juntos dessa cidade...
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