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Capítulo 2 - Malu e Zoe

_ Acha que o vestido ficará pronto até o fim de semana? _ Pergunto à costureira que faz os últimos ajustes no vestido longo de renda azul royal confeccionado exclusivamente para meu tipo de corpo, estatura mediana, cintura fina, quadris curvos e pernas bem torneadas.

_ Sem dúvida. Pode ficar tranquila. _ A senhora de meia idade levanta do banquinho de madeira e segue mancando até o balcão de onde traz uma almofadinha em forma de coração com vários alfinetes espetados.

Sem saber o porquê o objeto me provoca certa aflição.

_ O vestido ficou incrível em você, Malu.

Minha melhor amiga desde a infância aplaude de uma das poltronas do ateliê de costura.

_ Também com esse corpo poderia vestir até um saco de batatas que ficaria linda. _ Ela faz careta.

_ Pode parar. _ Movimento-me em frente ao espelho.

Reconheço que estou em melhor forma física no momento. Mas tudo por conta da correria no trabalho. Também tenho me alimentado de forma mais saudável e treinado para liberar o estresse. Indicaram-me o kickboxing e acho que isso vem trazendo resultados positivos.

_ Tente não emagrecer mais essa semana para que não seja necessário novos ajustes de última hora. _ A costureira aconselha.

_ Pode deixar. _ Encaro a senhora de expressão carrancuda pelo espelho.

_ É tão injusto. Enquanto isso, sigo em "guerra" com a balança. _ Zoe bufa e revira os olhos.

_ Já disse para consultar minha nutricionista. Ela é maravilhosa. _ Saio do provador.

_ Já perdi a conta de quantas fui só este ano. Nada funciona, acredite. Praticamente estou vivendo à base de folha e água. Sou quase uma lagarta. _ Zoe esconde o rosto com o antebraço de forma teatral.

_ Exatamente por isso precisa conversar com uma nova nutricionista. Dietas mirabolantes podem te deixar doente. E essa postura derrotista só prejudica seu psicológico. _ Ergo as pernas para sair do vestido com a ajuda da costureira.

_ Eu sei. Mas o clima lá em casa não ajuda muito, você sabe.

Afirmo com a cabeça.

_ Que tal escolhermos um vestido para minha futura madrinha? _ Mudo de assunto de propósito.

Sei que minha amiga vive uma relação conturbada com a mãe e acredito que boa parte da batalha com a balança é resultado da pressão que vem sendo submetida desde criança. A família de Zoe passou por processos dolorosos no decorrer dos anos e a partida do pai levou a família a uma crise financeira que perdura até hoje.

_ Vejamos se há algo que caiba nesse corpinho. _ Zoe pisca e segue para os biombos abarrotados de vestidos...

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_ Acha que seu pai vai insistir por muito tempo com essa rejeição ao seu noivado? _ Zoe termina o mix de frutas que escolhemos em uma de nossas lanchonetes favoritas.

Tiro o canudo da boca e estalo a língua.

_ Conheço Dalmo Brandão. Meu pai é muito teimoso. Essa luta está apenas começando. Ele alimenta uma inimizade com o pai de Gael desde a época em que os dois jogavam em times rivais. O pior é que ele transferiu a antipatia para o Gael.

_ Será que toda essa implicância é tão sem fundamento mesmo?_ Zoe cerra os olhos. _ Conheço tio Dalmo desde criança. Sempre me pareceu tão justo e sensato.

_ Mas ninguém é perfeito. Dessa vez ele não está sendo nem um pouco imparcial.

_ Espero que se entendam logo. _ Zoe me observa com expressão preocupada.

Terminamos nossas bebidas e saímos da lanchonete rumo às calçadas do bairro carioca do Catete onde nascemos, crescemos e moramos até hoje.

Olho para o alto e admiro o esplendor das palmeiras dos jardins do Palácio do Catete. Sempre que podemos fazemos esse trajeto conversando até o trabalho de Zoe. Um pedaço de oásis em meio a agitação da cidade.

_ Prefiro me concentrar em um problema de cada vez. Focarei agora em minha promoção. Minha redatora disse que anunciaria ainda essa semana. _ Esvazio o pulmão de uma só vez.

_ Vai dar tudo certo. Você tem feito um excelente trabalho. _ Paramos em frente ao prédio onde Zoe trabalha.

_ Obrigada. _ Abraço minha amiga. _ Nossas conversas sempre me ajudam a colocar as ideias no lugar.

_ Eu que agradeço pelo vestido. Não deveria gastar tanto comigo. Fico envergonhada de não poder retribuir à altura. _ Zoe ergue a sacola com o vestido que escolhemos para ela usar em minha festa de noivado.

_ Deixe disso. Você merece. Além do mais, usei o cartão de crédito que o senhor Dalmo Brandão me deu. Vai tudo para a conta dele.

_ Malu! _ Zoe arregala os olhos.

_ Não esquenta. Ah, quero te entregar outra coisa. _ Saco um cartão da bolsa.

_ O que é isso? _ Zoe une as sobrancelhas.

_ Um cartão de associado que te dará acesso ilimitado àquela academia nova super moderna que inaugurou aqui perto.

_ Onde conseguiu isso? _ Zoe segura a pequena lâmina plástica como se recebesse um tesouro.

_ Meu pai vive recebendo essas cortesias por ser atleta. A academia deve pertencer a algum desses ricaços que não tem onde colocar dinheiro.

_ Não vão desconfiar se eu aparecer com isso lá? Afinal, deve ser dado somente para clientes vips.

_ Mas você é vip! É minha amiga. E se alguém questionar, ligue-me na hora.

Os olhos de Zoe ficam um pouco vermelhos.

_ Você não existe, Malu. Sabe que não teria condições de pagar um lugar como esse.

_ Por isso estou te dando. Aproveite ao máximo. Tenho certeza de que esse cartão será mais útil para você do que para a maioria cheia de privilégios que frequenta aquele lugar.

Zoe me abraça mais uma vez.

_ Vou aproveitar. Muito obrigada.

_ E lembre-se, se cuide! _ Estalo os dedos antes de me afastar.

_ Vou me cuidar. Prometo.

Jogo um beijo no ar para Zoe e saio andando apressada pelo calçadão.

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