42 Ele Vai me Encontrar
Paula desaparece de vista, e me viro para meu outro problema. Kevin está sério. Com os ombros encolhidos, e mantendo as mãos escondidas no bolso da calça. Mesmo que eu queira que meu pensamento diabólico, de que um raio o parta em dois, se torne realidade, ele me olha com calma. As vezes eu só queria que o Kevin, Paula, Alexia e todo esse mundinho nojento deles me esqueçam. Esqueçam que eu existo, e que um dia me conheceram. Eu só queria que um raio pudesse partir todos eles. Respirando fundo eu coloco a garrafa sobre o granito.
— Está pronta pra ir? — pergunta.
— Ir pra onde? — rebato de volta tentando me manter o mais afastada possível dele. — Você só pode tá louco se acha que eu vou sair daqui e ir pra qualquer lugar com você de novo.
Kevin solta um suspiro de leve e incômodo para mim. Desde que me conheço por Emily Oliveira atualmente, toda e qualquer respiração de Kevin tem me aborrecido muito.
— O Thiago não falou pra você? — pergunta. Reviro os olhos tentando imaginar o quê o Thiago não me falou.
— Eu não vou a nenhum lugar com você, Kevin!
— Eu só quero conversar com você — profere quase implorando para que eu possa ouví-lo.
— Você pode falar daí — contraponho bem rapidamente. —, porque eu não tenho nada pra conversar com você! Ah, você tem sorte de eu não sentir mais medo do que você me fez, seu estuprador nojento.
Minhas palavras parecem tê-lo afetado. Kevin desvia o olhar do meu e morde o lábio inferior. A mágoa toma toda a expressão em seu rosto.
— Desculpa, eu não queria fazer aquilo. — Se for para ouvir toda essa ladainha de que não sabia, de que estava bêbado e não tinha noções dos atos, eu vou sumir daqui. Não tenho mais paciência para garotos nojentos como Kevin. — Eu sei que o que eu fiz não tem perdão, mas eu me sinto mau todos os dias — expõe fazendo não com a cabeça e movendo os ombros. — Eu me sinto horrível, eu sou horrível. Eu fui um monstro e não sei mais o que fazer para me sentir melhor.
Pela primeira vez em várias outras sinto que algo em mim quer chorar. Estar na presença de Kevin ainda coloca naquele momento, mas como Kátia me ensinou, eu não posso me entregar... Mas como as minhas palavras dizem, eu devo me entregar a raiva, ao rancor que eu sinto por ele. Como pode olhar na minha cara e me dizer que está arrependido? Ele me quebrou em pedacinhos. De todos que me fizeram mau, Kevin foi o pior. Ele não machucou apenas o meu corpo, ou a minha mente, ele machucou a minha alma, abalou a minha estrutura e me virou do avesso. Depois de muito tempo, eu ainda estou procurando a Emily que ele tirou de mim, e estou encontrando aquela garota aos poucos.
— Você não tem direito se sentir assim — falo olhando para seu rosto virado para o chão. — Você me arrancou de mim... você me matou, Kevin, me violou e desgraçou a minha vida. E eu te odeio, como nunca fui capaz de odiar alguém. — No mesmo momento ele esfrega os olhos rapidamente. Talvez ele esteja mesmo arrependido do que me causou, mas eu não desculpo ele. O sentimento que ele introduziu em mim só me faz cada vez mais ficar distante desse monstro. Ele é um agressor sexual, e odeia estar nesse papel, como eu odeio estar no meu papel de vítima. Mas ser vítima é pior que ser um agressor. — E você quer saber como pode mudar tudo que aconteceu? Então se joga da ponte que encontrar por aí. Nada do que você fizer vai mudar, o que você quebrou em mim.
Por um momento Kevin esconde o rosto sobre a camisa de time que ele está usando por baixo de uma jaqueta preta.
— Você precisa vir comigo. — Kevin seca o rosto com a camisa branca. — Eu preciso te levar para um lugar.
— Será que você não ouviu que eu não vou a lugar nenhum com você?
— Não precisa ter medo, temos seguranças... dessa vez. — Kevin mostra Caique e Nicolas num canto mais afastado do ambiente. Um cão nunca anda sem os outros dois.
— Nem pensar — profiro deixando Kevin para trás.
— O Thiago me pediu pra vir te procurar e te buscar. — Ele tá me zoando? Por que o Thiago faria algo assim comigo? Na boa, não tenho como imaginar ele me fazendo algo assim. — Sei que parece mentira, mas é verdade — completa assim que percebe que conseguiu a minha atenção.
— Chega, Kevin! — sinto meu corpo trêmulo, ele está sentindo Kevin, a fraqueza que ele consegue colocar em mim. — Para de tentar.
— Liga pra ele — pede do outro lado do balcão de granito. — Eu sei que você não acredita em mim, então liga pro Thiago, ele pode te falar.
Esfrego o rosto com as mãos. Se o Thiago fez mesmo isso comigo eu mato ele. Como poderia fazer algo assim? De certo ainda está bêbado, pois ele sabe que eu odeio o Kevin, ele foi o primeiro a saber de tudo que Kevin fez comigo. De todas as pessoas na festa do time, por que ele mandaria justamente o Kevin vir me buscar?
Kevin, tira o celular do bolso e começa por ligar a tela e com apenas um toque ele apoia o celular na mesa a sua frente. Ele tá ligando para o Thiago. Eu imagino que se ele está mesmo ligando para o Thiago, nada do que disse é mentira. Mas é o Kevin, eu não posso simplesmente acreditar em tudo que ele diga, porque ele é horrível, como a Alexia é horrível.
— Oi, filho da puta! — ouço a voz do meu melhor amigo por baixo da música que está mais concentrada lá fora agora. Acho que o Biel vai voltar a cantar agora. Eu só queria poder estar lá com ele e vê-lo cantar para mim, mas abandono a minha raiva momentânea e volto para perto de Kevin.
— É como você disse — diz Kevin para o telefone. — Ela tá de marra.
— Onde ela tá? — pergunta Thi do outro lado da linha.
— Tô aqui — falo o mais alto e mais aborrecida possível. — Por que você fez isso? Você sabe de tudo.
Thi não está mais bêbado como pensei que estivesse, essas duas horas foram o máximo para trazer sua personalidade real de volta, e o firme da sua voz é capaz de transparecer isso para mim. Thiago suspira do outro lado da linha, e então diz:
— Quando você chegar aqui eu te explico. — Um novo suspiro acompanhado de uma pausa densa. — Só segue o malandro até aqui, beleza?
Eu não quero seguir o Kevin para lugar algum, mas se o Thi pediu isso, é porque tem algum motivo. Achei que ele estivesse dormindo, mas que ingenuidade a minha. Ele é o dono do casarão, e sem ele isso seria uma bagunça. Enquanto sigo Kevin pela multidão me pergunto se eu deveria mesmo estar aqui? Se o Thiago está bem, e por que ele não veio me buscar? Por que mandou o Kevin? Mas como ele mesmo disse, vai ter que me explicar direitinho tudo isso.
— Eu sei que você está muito puta comigo — Kevin fala tentando ficar perto de mim, mas cada passo que ele para, eu paro. Trato Kevin como uma mosca chata que está zumbindo no meu ouvido. Eu dei uma oportunidade a Kevin, quando saímos para aquele campo de futebol, ele infelizmente estragou tudo. Mas não é um estrago qualquer, e isso eu nunca vou perdoar. — Eu gosto de você, Emily, gosto muito.
— Foda-se, kevin
— Hey. — ele me para no meio do caminho da sala. Mas no momento que sua mão toca a minha pele eu repentinamente me afasto dele. Então Kevin entende que o que eu sinto por ele vai além de medo, ódio e arrependimento, ele consegue me fazer sentir coisas que ninguém deveria sentir. — Foi mau.
— Não me toca outra vez.
— Tá bom. — Kevin segue em frente e sigo ele com os outros dois andando em nossas costas, como dois guarda costas.
— É aqui. — Por fim Kevin para de frente com uma porta grande de vidro fumê. Nem se eu fosse mais frequente na casa do meu melhor amigo, eu sonharia em entrar nessa parte dela. Bato duas vezes na porta. — O Thiago falou que você pode entrar direto.
Mesmo que eu não saiba o que o Thiago está planejando, e nem porque o Gabriel ainda não voltou a cantar, corro uma parte da porta para o canto, então vislumbro o cômodo daqui mesmo. Por um momento fico só olhando para dentro dele. Daqui da porta, essa parte da casa parece diferente, como se ele não fizesse parte de todo o resto da residência. Meus olhos encontram Thiago quase que imediatamente, e não apenas ele. Pedro, Jon, Tony e Gabriel também estão aqui.
— Boa sorte — deseja Kevin saindo em companhia dos amigos.
Como assim boa sorte? Boa sorte para o quê? Ele é maluco?
— Fecha a porta — pede Thi sentado atrás de uma mesa grande. Fecho a porta ainda analisando esse lugar que tem cara de ser uma biblioteca. Tem uma lareira que faz o fogo crepitar para duas poltronas na sua frente, onde Jon e Tony estão sentados. O Pedro está recostado em umas delas, de braços cruzados e com os cabelos severamente arrumados. Gabriel está sentado na outra mesa de vidro, próximo do Thi. São duas mesas. — É o escritório dos meus pais. — declara ele notando que estou meio perdida.
— Tá rolando uma reunião e eu não fui chamada? — pergunto.
— Você foi chamada, bebê — exclama Tony de onde está. Noto também que, com excessão de mim, ninguém mais está bêbado.
— Por que você mandou o Kevin atrás de mim? — pergunto ao Thiago.
— Porque ele ia ficar atrás de mim — Thiago responde com rapidez. Ele me mostra um sorriso tentando apaziguar o meu nervosismo. — Precisei dar essa chance para aquele filho da puta, ou eu ia ter que quebrar a cara dele.
— Mandando ele pra cima de mim? — pergunto aborrecida.
— Amanhã quando você não tiver mais bêbada, você vai entender — retruca Thi fazendo calma com as mãos. — de boa, não foi por isso que te chamamos aqui.
Não pergunto o motivo de termos nos reunido no escritório dos pais advogados do Thiago. Eu nem imaginava que isso fosse acontecer, talvez se não tivesse deixado meu celular em casa, soubesse porque se reuniram aqui. Olho para a lareira tentando, mas não conseguindo manter a minha pose de durona. Eu deveria conseguir até para meus amigos, mas não dá, eles são praticamente os amores da minha vida. Foi muito errado o que Thiago fez, mas eles são simplesmente como Lucas, eu não consigo ficar brava por muito tempo. Com um leve suspiro libero todo o carbono e todo o rancor da situação de a pouco.
— O que vocês querem? — pergunto me virando para todos ao mesmo tempo.
— A gente ficou sabendo que você quase pulou em cima daquela garota, amiga da Alexia — fala Jon bem acomodado. — Porque ela tava com o Lucas.
Libero um novo suspiro, mas dessa vez bem incômodo. Encontro os olhos do culpado de tudo isso. Antônio sorri para mim tendo toda a convicção que eu sei que ele é o autor de tudo isso. Naquele momento estávamos apenas Penélope e eu, e ela é a namorada dele. Imagino que tenha ficado uma cena cômica.
— E o que tem isso? — quero saber.
— É que você não tá mais conseguindo disfarçar — Biel diz. Desde aquele momento em que ele disse que me apoia com Lucas, se juntou ao grupo do nós juntos... Lucas e eu juntos!
— Disfarçar o quê? — pergunto fazendo a egípcia.
— O que sente por ele — completa Thi. Ele parece alguém muito importante sentado na poltrona de advogado.
— Gente, desde quando vocês fazem isso? — quero saber. Entre eles, o único que pilhava Lucas e eu juntos, era o Thi. Os meninos nunca se manifestaram em nada, alguns deles, como o próprio Pedro se colocou contra Lucas. Agora até ele está na luta pró.
— Em...
— Deixa falar — Pedro interrompe Thiago. — Você ama ele? — pergunta dessa vez para mim. Por um momento perco as palavras, o Pedro sabe que eu amo o Lucas, isso pode ser segredo para todo o restante de pessoas nessa casa, nessa hora, mas para as que estão presentes aqui, a Emily vista pelo resto do mundo é uma completa farsa, podendo chegar a ser uma calúnia até.
— Que pergunta é essa agora, Pê — digo um pouco incrédula e me sentindo confrontada.
— Ama ou não ama? Só responde, tá?
Além de me sentir confrontada por ele, ou por eles, me sinto confrontada por mim mesma. O Pedro está me colocando contra parede. Está me fazendo me jogar contra parede. Não é o Lucas que está me cobrando um declaração dos meus sentimentos, são meus amigos. Então por que eu me sinto travada? O “eu amo ele”, está na ponta da língua, e por mais que palavras sejam fáceis de serem proferidas, essas parecem ser muito complicadas. Nas férias, eu não consegui declarar o meu amor por ele em voz alta, mas me perdi tão bem naquela semana que saiu tão naturalmente que seus olhos reluziram. Talvez eu precise me perder para conseguir me encontrar daquele modo outra vez.
— Iiih, agora não tem como fugir, fofinha — Observo uma versão de mim aparecer perto de Pedro. A emoção está quase sorrindo por ser a emoção. Eu me entreguei a ela nas férias, e ela está tentando me possuir agora.
— O que foi? — indaga Pedro me olhando com atenção. — Travou?
— Eu... — não dá, não estou conseguindo... — Você sabe, Pedro.
— Ele sabe mesmo? Não sei não. — pergunta a outra eu com sarcasmo.
— Cala a boca! — mando para a emoção.
— Hey, calma, esquentadinha — pede Thi, no mesmo momento a emoção começa a rir da minha cara. — Nós só queremos entender o que está acontecendo.
— É o mesmo esquema do carro — diz ela para mim enquanto gira o indicador no ar. —, só você pode me ver. Então, vai com calma, esquentadinha!
— O que aconteceu com você? — pergunta Pedro. Como assim o que aconteceu comigo? Não sei onde ele quer chegar. — Você não é a mesma pessoa que eu conheci em fevereiro. Tá muito mudada.
— Pedro...
— Só responde pra mim, tá bom? — diz como se fosse o meu psicólogo. —Você ama o Lucas?
Seguro minha cabeça e puxo meus cabelos. O que está havendo comigo? É apenas um sim ou um não, por que é complicado admitir isso em voz alta? Por que? Eu não posso mentir, ele sabem que sim, sabem do que eu sinto pelo Lucas. Enquanto meus olhos reviram para todos os lados. No momento em que me sinto perdida, de alguma forma submersa nos meus próprios sentimentos, a minha cópia se transforma. Ela passa da garota debochada para a minha versão puramente malvada. A sensação se aproxima de mim sem que meus amigos a notem, e a cada passo em minha direção eu sinto vontade de correr, de fugir, de fazer qualquer coisa menos estar aqui perto dela. Só que eu não consigo, meus pés não se movem. Ao mesmo tempo que sinto meu corpo inundado de sentimentos, fora apertar os meus cabelos, não há outro manifesto, e os meus amigos também não se preocupam.
— Só deixa eu te mostrar... uma coisa. — A sensação é única que sabe o que está acontecendo comigo. Ela sente essa bagunça de sentimentos em mim. Agora que já estamos próximas, ela traz sua mão até a a minha testa e toca com dois dedos. Nesse momento cada respiração minha não é um torpor, é uma recordação.
— Tem um monte de caras nessa porra de praia, se ela quer um homem pode escolher qualquer um! — brigou Lucas na primeira vez que nos conhecemos.
Suspiro fundo.
— Por mais que eu não saiba quem é Fabrício, não tô nenhum um pouco ofendido — Quando ele apareceu na minha mesa na segunda feira depois daquele final de semana. — Só me diz se ele é bonitão, aí eu posso me sentir lisonjeado.
A nuvem passa diante dos meus olhos, e eu me vejo outra vez naquela manhã:
— Eu amo você... Eu te amo de uma forma que... sei lá, nunca senti isso por ninguém.
— Eu te amo... Emily — O festival das flores. — Eu tento de todos os modos te esquecer, mas não tá dando
E por fim:
— Eu tenho sonhado com você por muitos anos. — Quando ele me contou tudo sobre seus sonhos comigo, sendo o Fabrício. — Eu tô tão assutado com isso. Eu me apaixonei por você.
Fecho os olhos no momento que sinto que foi demais. Eu não lembrava que vivemos tantas coisas. Tanto boas quanto ruins. Ele tava lá comigo, me fazendo bem ou me fazendo mau, mas sempre foi ele. Era o meu jogador que sempre se arrepende, que sempre se declara quando acha que é o momento certo, e sempre faz burrada na tentativa de se livrar do sentimento que está nos destruindo aos poucos. Uma lágrima corre meu rosto sentindo meu coração acelerado, me perguntando como ele tem passado por tudo isso. Eu não me permiti sentir, e ainda continuo me negando a ser aquela mesma garota outra vez. Eu a afoguei, eu a matei no fundo do que eu sou, ou do que eu me tornei. Agora, esse toque da sensação a trouxe do túmulo para me fazer sentir, me fazer enxergar que ela tinha vida quando eu a matei, ela respirava com dificuldades, mas ainda era ela, e eu fui insensível e acabei me livrando dela e todos os traumas que a fizeram perder a consciência de quem um dia foi. Meu choro se torna algo mais profundo, e as novas lembranças do Lucas me fazem soluçar.
— Não, não precisa chorar — diz Pedro para mim. Thi atravessa a mesa do escritório e me envolve em seu braços. Deixo que ele me afague e diga que vai ficar tudo bem, mas talvez não fique tudo bem nunca. Eu o machuquei, eu tentei matar o garoto que está presente no Lucas, o ser que me ama, como matei a mim mesma. E agora eu consigo ver que todas as burradas que ele fez, e que eu tentava ignorar julgando, foi a forma que ele encontrou de manter esse amor vivo dentro dele.
— Tá tudo bem, tudo bem. — Thiago acaricia meus cabelos me deixando molhar sua camisa que colocou depois do banho mais cedo. — Você tá bem.
— Thiago...
— Agora não, Pedro — Thi retruca em minha defesa.
— Nós precisamos fazer isso, lembra?
— Eu disse agora não, Pedro! — Thi solta meio furioso.
— Tá tudo bem, Thi — manifesto. Eu fui a insensível aqui, e não o Pedro. Thiago me solta, mas fica ao meu lado. Antes de olhar para Pedro, vejo que a sensação está sorrindo. É algo estranho, ela nunca sorri, ela é minha personalidade fria e completamente apática com todos a minha volta, inclusive comigo.
— Eu sou ela — declara, e nisso aumenta mais a minha vontade de chorar. A sensação, a garota que me mandou tirar a minha própria vida diversas vezes, ela sou eu... ela é a garota que eu afoguei em mim. — Eu sou você. — E por fim as outras duas versões minhas aparecem lado a lado. — Nós somos vocês.
Assinto e entrego a minha atenção a Pedro.
— Pergunta outra vez — peço a ele.
— Okay — ele parece mais orgulhoso agora. — Você ama o Lucas?
Enquanto a força negativa mantém os meus lábios calados, e me impõe um peso enorme sobre os ombros. A dormência nas minhas veias me fazem olhar para a sensação no final de contas. É nesse momento que sinto uma sensação diferente, a dormência, mas não do medo da dor, mas é uma dormência que me faz querer me libertar de tudo isso.
— Eai? — indaga como se ela fosse a autora da pergunta.
— Eu amo o Lucas — declaro alto e em bom. — Eu amo ele, Pedro — digo como se eu precisasse disso, como se essas palavras me fizessem respirar.
— Finalmente — fala Pedro com um sorrisinho presunçoso nos lábios. Os outros estão alegres, e além de me sentir orgulhosa de mim mesma, sinto que o orgulho deles por mim, fazem tudo melhor. Porém, outra figura se revela dentro do ambiente. Lucas se levanta de onde Thiago estava sentado antes. E toda a coragem que estava em mim se transforma em algo novo puramente estranho. Eu o amo muito, mas a sensação que está livre na minha corrente sanguínea é medo.
— Não... — me perco nas palavras vendo Thi passar seu olhar de Lucas para mim. — Não acredito que vocês foram capazes disso.
— Foi malzão — pede Jon se levantando da poltrona e vindo até mim. — Foi o único jeito de você se declarar para ele. Se você soubesse que ele tava aqui, não iria falar.
— Pedro! — Finalmente reconheço meu sangue ferver. Ainda estou incrédula de que consegui admitir em voz alta os meus sentimentos por ele.
— Não olha pra mim, não tenho nada haver com isso — refuta Pedro em sua defesa.
— Tony — falo na tentativa de achar o autor dessa toda essa segunda festa.
— Não fui eu também — retruca com as mãos livres no ar.
Então a única pessoa capaz de fazer isso foi ele mesmo. Eu não queria acreditar que o Thiago fosse capaz de algo assim, mas nós sabemos que além de todos, ele é o mais capaz. Fora que o Thiago estava andando muito com o Lucas, não acham?!
— Fui eu mesmo — assume assim que meus olhos encontram os seus. — Nós sabemos que vocês precisavam.
— Não assim...
— Se tinha outra forma de fazer a garota mais durona falar sobre os sentimentos dela pelo cara, eu desconheço.
Me volto para Lucas que ainda está de pé do outro lado da mesa de um dos pais do Thi. Os olhos dele estão cheios e quase chorando, mas paralisado, me fita e não pisca. Uma lágrima desce pelo lado do rosto. Eu também estou emocionada por vê-lo. Mas agora aqui, eu me sinto a mesma insensível que tentou matar a sensação, que tentou matar o cara que faz burrada por não saber como lidar com os próprios sentimentos. Me sinto uma assassina além de me colocar as outras toneladas de todas as culpas que o fiz sentir durante esses últimos meses.
— A gente vai sair agora — profere Pedro na tentativa falha de quebrar a nossa ligação. — Conversem sem arrancar o rabo, beleza?! Estamos do lado de fora.
Queria que eles pudessem ficar comigo, mas não protesto a atitude. Eu não me sinto pronta, eu não estou pronta para essa conversa. Agora eu sei que teremos que discutir sobre tudo que Lucas acabou de ouvir, mas é algo que me deixa sensível. É bem diferente, assumir os nossos sentimentos em voz alta e ter que conflitá-los. Thi toca em meu ombro e sai. Biel beija meu rosto e segue os outros que saem um a um. Não sei o que dizer. Lucas está ali parado, e eu não faço a mínima ideia do que falar.
— Ficou muito bem em você — diz assim que a porta é fechada atrás de mim. — O boné, ele fica bem legal em você.
Mas como a garota durona ainda está no comando, solto em resposta:
— Você dançou com a Paula. — Lucas seca o rosto no mesmo momento. — Você beijou a Paula. — engulo em seco permitindo o ciúmes tomar conta de mim. — Por quê?
Seus lábios formulam novas palavras que não são proferidas. Lucas engole em seco e tento imaginar que ele está procurando a melhor forma de tentar me explicar o que realmente aconteceu. Sempre foi assim, ele causa alguma burrada e eu preciso saber para não ter que socar a cara dele.
— Não era nada demais. — Luke caminha em minha direção, mas logo eu me afasto dele. Eu sei que vocês devem estar se perguntando sobre o que eu sinto por ele. E se eu refizer essa pergunta: por que eu ainda sinto medo dele? A garota que ocasionalmente eu encontrei em mim ainda sente medo de Lucas. O garoto percebe o meu afastamento e para. — Eu só queria saber como o Fabrício se sentia perto dela, beleza? Era só isso, eu juro.
— Você beijou ela.
— Ela me beijou — admite. É verdade, eu estava lá e posso falar com convicção. — Mas não significou nada pra mim. Nada significa mais que você pra mim. — O efeito do álcool ainda me causa um torpor, como se tudo isso fosse um sonho, como se nada disso estivesse acontecendo, como se a maconha no carro da Penélope me levasse para um universo paralelo, onde nada aconteceu. Lucas não é um sinônimo de perigo, mas eu ainda sinto medo dele. — Acredita em mim, por favor. Meu amor, eu amo você. — Fico calada sentindo o seu toque calmo em minha pele, a ardência me toma o corpo por completo. — Eu tô tão feliz... — declara com a voz pesada por estar mesmo muito feliz. Sua voz, sua energia, sua presença muda o ar, de alguma forma me faz sentir uma coisa agradável. — Você disse que me ama... e... — faz outra pausa sem saber qual palavra colocar. — E eu também amo você.
— Por que ela? — pergunto ainda tentando me livrar desse sentimento. — Por que a Paula?
— Não pensa assim. — Luke se aproxima mais de mim. Seu rosto está tão próximo que sinto o seu hálito de álcool, e seu bom cheiro de Malbec. Ouso subir os olhos e encontrar os seus bem próximos dos meus. — Ela não é nada pra mim. Nenhuma delas. — Lucas coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha, e aproveita para acariciar meu rosto. — Eu não consigo gostar de outra pessoa. Eu tentei, tentei muito mesmo. Mas ninguém é igual a você. — Eu quero beijar ele, quero sentir sua boca e seu corpo no meu. Quero poder sentir que ele é real, e que sua declaração é para mim. Contudo, mesmo que eu ame Lucas de forma louca, ainda tem essa barreira que nos mantém distantes. — Hey, hey — Ele puxa a minha atenção outra vez. — Eu preciso de você, e mais ninguém.
Ele é tão lindo, é tão meigo. Como pude ficar longe dele por tanto tempo. A minha mudança me cegou, e não deu a oportunidade para ele se explicar quando descobrimos o joguinho da Alexia. Engulo em seco desejando seus lábios nos meus, mas seus olhos possuem um brilho especial, não é o brilho esverdeado de sempre, estão tingidos de alegria. Assim como Lucas mantém sua mão no meu rosto, afago seu rosto e vou acariciando sua pele. Ainda estou incrédula que tudo isso possa ser real, me acostumei a ser sozinha, a odiar o Lucas e mantê-lo longe que agora tudo parece estranho.
— Você é tão... maravilhoso — exclamo vendo um sorriso nascer em seus lábios. — Eu amo você... — Agora além de sorrir, ele chora de felicidade. — Mas não posso. — Então ele fica confuso. — Eu não posso, Lucas.
— O que você não pode?
— Ficar com você. — retiro sua mão do meu rosto com carinho e antes de soltá-la eu a beijo. — Eu te machuquei demais, e eu não mereço você.
O que antes era alegria se torna uma expressão sombria em seu olhar. Eu me afasto de Lucas, mas ainda ficamos de frente um para o outro.
— Você tá ouvindo o que tá dizendo? — pergunta. — Amor, você me merece, me merece muito.
— Não, Lucas — retruco rapidamente. Os prantos voltam a molhar meu rosto nesse momento. — Eu não mereço você. E ainda se merecesse, eu não tô pronta.
— Não fala isso, por favor — pede tentando se aproximar novamente de mim, mas eu preciso manter ele longe. Fecho os olhos me sentindo a pessoa mais horrível do mundo. Eu não quero mais machucar o Lucas, mas ainda assim eu estou ferindo ele. E quem é culpado disso? O Thiago... não, ele não é. Ele acordou o que estava escondido em mim. — Emily, nós estamos tão pertos agora. Não volta atrás.
— Eu não voltei atrás, Luke — meus dentes estão colidindo na boca. Agora o medo que eu sentia de Lucas passou a ser o medo da escolha que eu estou fazendo. Eu sei que isso pode me fazer perdê-lo para sempre. Mas eu estou perdida. Eu não posso ficar com o Lucas estando quebrada. — Eu tô perdida, Lucas. Antes de voltar a ser sua, eu preciso ser minha outra vez.
— Mas você pode se encontrar estando comigo — diz. Nego com a cabeça, eu não quero machucar mais ele, quero que ele seja feliz. Se estou perdendo o Lucas dizendo isso, talvez eu consiga conviver se ele for feliz.
— Não, Lucas — mando no momento em que ele tenta me beijar. Eu não quero provar o que me vicia. — Eu quero muito você, mas não posso ter você enquanto não for eu.
Se tem algo que eu não gosto em mim, é a capacidade de ferir alguém. A capacidade de ferir o Lucas. Antes de passar por aquela porta a garota decidida que eu era, fazia estragos com ele sem ao menos ligar paras as consequências. O Lucas era o cara absolutamente errado nas escolhas, nas companhias e na vida. Eu não me dava a oportunidade de analisar o meu eu, o que eu fazia com ele e como o Lucas reagia a isso. Agora eu mudei outra vez, tanto que ele é o meu maior desejo nesse momento. Mas se eu for continuar soltando bomba atrás de bomba na vida dele, é melhor ficarmos como estamos.
— Então é isso? — indaga com a voz chorosa.
Fico em silêncio pensando se é isso mesmo que eu preciso fazer. Eu preciso, mas não quero. Eu não estou abrindo mão dele, isso jamais. Eu só preciso encontrar a garota que era feliz perto dele e ressuscitar ela.
— Eu preciso de um tempo — falo como forma a não deixar ele, mas não dar uma certeza.
— Quanto tempo?
— Eu não sei — respondo assim que tento fazer as contas na mente, porém, algo em mim não consegue dar uma resposta exata.
Lucas vem até mim outra vez, mas dessa eu não me retraio e muito menos me afasto. Segura meu queixo com carinho e me faz olhá-lo nos olhos.
— Eu vou te esperar — declara. Quando a lágrima desaba em seu olhar sinto meu coração sendo partido em pedacinhos pequenos. — Eu vou esperar você, leve o tempo que for. Eu amo... — Passa a língua nos lábios. — você. — Em seguida permito que Lucas me abrace, que ele me aperte com a força que for necessária para me grudar nas suas entranhas, como percebi que ele está grudado nas minhas. Tiro o boné para evitar que me atrapalhe de sentir seu cheiro. Seus braços me esquentam, e é um calor tão bom. Não é igual o do Thiago ou Gabriel e dos meninos. O calor do Lucas tem um amor diferente por mim, me faz querer que os próximos dias voem para que eu possa estar com ele outra vez.
Se força para secar o rosto assim que me solta. Olho para ele que está tocado assim como eu, então coloco o boné em sua cabeça.
— Isso é seu — digo e ele sorri com fragilidade.
— Fica melhor em você. — Devolve para mim. Mas como sei que ele não vai querer o próprio boné de volta então o deixo aqui. Lucas abaixa mais o rosto e beija a minha boca rapidamente, e sai. Assim que começa a se afastar um frio estranho começa a me inundar, como se ele fosse a minha única salvação disso. Lucas sai sem fechar a porta. Fico procurando por ele, esperando que ele volte. Ele me beijou, ele despertou algo muito maior em mim com esse beijo. Eu já estava fraca, e agora eu me sinto totalmente tomada por isso. Eu quero, quero muito ele, mas não posso ter ele. Não é o momento certo. Eu errei tanto, agora eu preciso me redimir. Ele já trilhou o seu caminho, já sofreu e chorou, já se machucou e se feriu demais por minha causa. Agora é a minha vez de pagar a minha penitência.
Pedro passa pela porta com uma expressão de aflição com a mão direcionando por onde Lucas se foi antes.
— Acabei de ver o Lucas saindo triste — exclama me olhando e procurando por respostas.
— É... não voltamos — refuto olhando a entrada como se ele fosse passar a qualquer momento.
— Eu tô besta — diz. — Emily, você é burra ou só se faz?
— Emily — outra voz me chama, e consigo olhar para a sensação que parece gostar da companhia do Pedro.
— Você vai deixar ele assim depois de tudo que ele disse pra você? — Pedro continua me criticando. Ele deve imaginar a conversa que tivemos, que Lucas se declarou muito, e me pediu para ficar com ele. Mesmo reconhecendo que eu sou a insensível melodramática da situação, ele ainda tá fazendo questão de me jogar isso na cara. — Você vai deixar ele sozinho para qualquer garota pegar ele? — Porque tudo tem que envolver sempre outra garota?
— Ele tá certo. — Pedro resmungando como um velho turrão quando a minha atenção mesmo está focada na emoção. — Você quer se encontrar então vai atrás dele. — Sinto os prantos ardendo nos olhos e permito que saiam tentando imaginar para onde foi o Lucas a essa hora. O Pedro está falando que é bom mesmo eu chorar, pois eu mereço. Depois de tudo negar o amor da minha vida assim? — Vai atrás dele — sensação continua a pedir. — Escuta bem, ele é você. Pode ser difícil imaginar que você o machucou e que precisa se perdoar, e eu sei que estamos perdidas. Mas se tem alguém que pode nos achar é o Lucas.
— Eu não tenho certeza — digo para ela e Pedro ao mesmo tempo.
— Pode ser difícil, mas se dê a chance de sentir outra vez — pede Pê.
— Se entregue, outra vez — completa a emoção.
O calafrios do medo corre pelo meu corpo como uma corrente elétrica, mas eu já sinto medo. Outras lembranças nossas vão me invadindo e me causando uma fraqueza extrema. A primeira vez que eu conheci a sua família, ou quando me mostrou sua coleção que chama de tesouro, e quando expôs a morte do irmão. Onde eu estava com a cabeça quando disse a mim mesma que eu poderia viver sem ele? Pois nesse momento para mim, não existe vida sem ele.
— Lucas! — chamo.
— Vai atrás dele — manda Pedro.
Saio correndo pela porta e pela sala. No meio da multidão de adolescentes bêbados procuro Lucas, mas ele não está aqui. Então corro para onde os sem nomes voltaram a tocar para a multidão. Como são muitas pessoas, fica difícil analisar todas, mas observo que nenhuma delas é ele também. Procuro na cozinha e nos outros cômodos da casa. Estou indo tão rápida com medo de ele ter se encontrado outra vez com a Paula, e assimilo a hipótese de ele estar ficando com aquela louca. Começo a praguejar para mim mesma, como a me amaldiçoar de tê-lo deixado ir daquele escritório. Um simples sim naquele momento mudaria tudo, mas eu fui dura e medrosa, eu fui muito eu atualmente. E depois de analisar todas as partes e não encontrá-lo, só me resta a última opção, fora da casa. Deixo o ambiente seguindo pelo sereno da noite procurando por ele. O jardim está vazio, e parece ser um lugar onde o Lucas ficaria num momento como esse.
— Lucas! — chamo-o procurando o amor da minha vida por todos os cantos. Porém, seguindo em frente, encontro alguém bem diferente dele... Alexia.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro