19 Um Grande Poder De Conquista
A felicidade não deixou os lábios do Lucas pelo resto da tarde, e a noite ele ainda estava com a frase, meu carro, na boca. Fez planos e planos, e enquanto me beijava me dizia que gostaria de me levar para passear, me dar carona para o trabalho depois do colégio, e coisas assim. Eu tive que lembrá-lo que agora o meu pai o odeia, e nossa relação é proibida e sem nenhuma benção dele. Tenho certeza que ele já estaria mau se por acaso meus pais tivessem mais contato. Quando entramos para a sala eu perguntei a ele onde guardaria o carro, e Lucas soltou um suspiro de incômodo, e juro que vi o brilho desaparecer dos olhos dele. O quintal dele é grande, mas não tem uma cobertura. E vamos concordar, um carro ficar pegando chuva, vento e sol não é a melhor coisa do mundo.
Quase a sete da noite e estamos nós dois aqui sentados no tapete de camurça. Depois das três da tarde eu recebi uma mensagem da dona Mariana me pedindo para esperá-la na sala de estar. Enfim hoje é a noite pela qual esperamos por muito tempo. Finalmente vamos fazer uma sessão de filmes do River Phoenix! Primeiro vamos ver garotos de programa, e depois conta comigo. E se conseguirmos ficar acordadas por mais tempo, veremos também o peso de um passado. Aguento Lucas dizendo que essa coisa toda de sessão River Phoenix é uma baboseira. Ele está bem aqui, sentado comigo no tapete, e até que consegue ser mais dramático e reclamão que o Fabrício! O Fabrício ao menos, em algum momento ele desistia. O Lucas fala e fala e não para.
— Você sabe que eu beijo muito melhor que esse cara — argumenta ao seu favor. — Sabe que pode me beijar, e ele não. — Reviro os olhos e peço mentalmente para que minha sogra desça logo porque se o Lucas não calar a boca em um minuto, eu vou ter que fazer isso por ele! — Pode fazer coisas bem melhores comigo — solta em tom audacioso.
— Eu já tô te beijando demais desde sábado — contra argumento. — Então cala a boca, e vamos ver o filme, morô?!
Vejo a boca perfeita dele formando algo para rebater, mas felizmente dona Mariana adentra o recinto, e acaba com qualquer argumento dele. Ela não está muito diferente do comum, mas os cabelos estão por cima dos ombros. Dona Mariana nunca usa o cabelo por cima do ombros, são sempre impecáveis atrás das costas.
— Eu pedi uma pizza para nós — diz e se senta no sofá, Lucas volta a se animar. — E vamos ver os filmes do River! — comenta entusiasmada. Então é a vez dele de revirar os olhos. — Mas antes de começar a sessão quero falar com vocês dois.
— É mais alguma surpresa, com certeza — manifesta Lucas.
— Como sabe? — indaga minha sogra.
— Você sempre faz a mesma cara quando vai fazer uma surpresa.
— Mais uma? — pergunto.
— Uuuhuum — responde com mais felicidade ainda. Dona tira uma almofada do sofá e então nos mostra dois envelopes severamente iguais e de meia cor. Entrega um para Lucas e para mim. — Abram — pede. Lucas começa a rasgar o dele logo de imediato e eu levo mais um pouco de tempo olhando para dona Mariana, e então ela me pressiona arqueando a sobrancelha. O envelope do rapaz já está quase todo em pedaços, e eu tento abrir o meu com a máxima delicadeza possível. Mas antes que eu consiga tirar a carta de dentro o Lucas desdobra a dele, e diz:
— Um cartão. — Está meio confuso.
Perco a paciência e rasgo em pedaços pequenos todo o envelope por acabar com minha calma. E também desdobro a minha carta.
— Um cartão — repito. E juntos, nós olhamos para dona Mariana.
É claro que estou surpresa. Não esperava isso dela. Analiso ele com detalhes girando ele na mão, e olho novamente para minha sogra. Eu espero que ela tenha uma boa resposta para nos dar um cartão bancário.
— É, são dois cartões vinculados com a minha conta corrente. — Tá de brincadeira! — Eu fui resolver isso no banco hoje depois de sair do estacionamento com o José.
— Dona Mariana...
— Eu sei que você vai dizer que não pode aceitar, Emily. — E não posso mesmo. — Você sabe a quantia em dinheiro que eu tenho no banco? — Fico quieta, pois não sei.
— Até o início do ano eu sabia — Luke diz por mim.
— Eu tenho muito dinheiro — ela continua. — O que eu não tenho é tempo para gastar tudo. — Tempo tem, mas não gosta de ficar sem trabalhar, penso. — Todo esse patrimônio que eu consegui foi exclusivamente para o Fabrício, Emily. Tudo isso um dia ia ser de vocês. — Dele. — Mas ele se foi antes e tudo ficou. Depois que ele morreu ter tudo isso não fazia mais sentido, eu não tinha mais porque lutar. — engulo o nó que começa a se formar na garganta. — Mas mesmo assim foi o trabalho que me manteve forte. Vou continuar trabalhando e crescendo, Emily. Mas o dinheiro vai ficar no banco parado se eu não tiver com quem dividir ele.
Isso ela tem razão. Se a dona Mariana não parar em nenhum momento de trabalhar para aproveitar a vida com todo o máximo que ela pode proporcionar, ele vai continuar lá. Mas e os outros? E a família de dona Mariana? Fito-a a meia luz da sala de estar e acabo me perguntando onde estão os familiares dela. Uma vez perguntei sobre a família dela para Fabrício, mas ele disse que ela não gosta de falar disso, e para não entrar no assunto apenas diz que não tem família e ponto final. Agora seria o momento certo para perguntar onde estão todos esses familiares, mas acabo ficando calada por respeito a essa vontade.
— Se eu não posso gastar o meu próprio dinheiro, vocês podem — argumenta feliz. Eu fico constrangida de aceitar esses pedidos de dona Mariana. Ela tem sempre uma surpresa na manga. É uma viagem aqui, um concursinho básico ali, e presentes caros e luxuosos lá. E acabo ficando sem saber como devolver cada um deles. Isso me deixa sem o que pensar. — Os cartões tem total acesso livre a minha conta, se vocês precisarem não peçam, usem. E cada carta tem uma senha.
O som da carta do Lucas se desdobrando outra vez toma o ambiente. Ele a lê mais atentamente dessa vez com os olhar e em seguida volta para a mulher. Diferente de mim, Lucas não parece estar nenhum pouco constrangido. Talvez por seus sonhos com Fabrício, ele seja acostumado a ser surpreendido por ela o tempo todo. E eu, bom eu também já deveria ser acostumada com isso. Desde que me conhecia como namorada do Fabrício, era muito bem beneficiada com isso tudo.
— Eu aceito — diz Lucas para ela. O encaro com a sobrancelha arqueada, e ele se volta a mim. — Eu aceito mesmo, Emy. Eu vou precisar muito agora para poder guardar meu carro em um lugar seguro até construir uma garagem pra minha Emily. — questiono-o com o olhar. — O carro, ele vai se chamar Emily porque tem que ter o nome da gata mais bonita do mundo.
Olho serrado na direção dele para não mostrar que isso me tocou. Não consigo conter o suspiro com um sorrisinho presunçoso em seus lábios. Acho que Lucas notou que conseguiu me arrancar suspiros.
Eu até aceito que ele diga que eu sou a garota mais bonita do mundo, mas colocar o meu nome naquele Mustang é muito exagerado.
— Você aceita, Emy? — dona Mariana pergunta com as mãos por cima do colo.
Olho para ela ainda pensando se devo ou não. Eu já aceitei muito presente na vida. Entre eles um notebook que está na casa da minha mãe, um tênis de dança de mil e quinhentos reais que também está na casa da minha mãe. Todas aquelas viagens com hospedagens em hotéis cinco estrelas. Agora ela quer me dar diretamente um cartão vinculado a conta dela com uma quantia sem limites em dinheiro. Então, Emily? Agora eu me pressiono. O Lucas tem um investimento útil, uma garagem para o carro dele. E o meu? Eu não tenho investimento nenhum por enquanto. Eu só quero investir em melhorar a cada dia, mas para isso eu não preciso de dinheiro, então:
— Aceito — digo em meio a outro suspiro. — Fazer o quê, né?
Acho que eu nunca vi alguém fazer uma festa por alguém dizer que vai gastar o seu dinheiro, mas dona Mariana é a primeira. Se tem uma coisa que eu admiro muito nessa mulher é a sua grande generosidade e o tamanho do coração que cabe no seu corpo pequeno e gordinho. Ela sempre quer ajudar, e sempre se importa com todo mundo.
— Tem mais — diz se aconchegando mais no sofá. Mais? Sério. Mais o quê? Quase pergunto. — Eu incluí vocês dois no meu inventário. — tá de brincadeira! — Antes era só você, Emily, mas com as recém descobertas, eu imagino que o Lucas deva fazer parte.
O Lucas é mais uma vez o seu poder de conquista. Mas tem algo muito mais importante nisso. Primeiro que sim o Lucas tem todo esse poder de conquista, mas para alguém conseguir conquistar Mariana a ponto de ela ceder um cartão bancário, e incluí-lo no inventário não faz parte de toda essa arte da conquista. Ela gosta mesmo dele, e ainda mais depois de descobrir que ele é o cara com quem o Fabrício sonhou a vida toda. E eu? Sinceramente, no lugar dela, faria a mesma coisa.
— Mas…
— Sem mais, Emily — ela me interrompe. — Se não fosse pelo Lucas, você já seria a minha maior herdeira. — Lucas também é pego de surpresa por saber que agora faz parte de um inventário extenso de bens internacional.
— Mas você ainda nem estar próxima da morrer — ele comenta o que me passa pela nossa cabeça.
— Ninguém sabe o dia de amanhã, Lucas querido — Acho que ela é a única mulher que conseguiu tirar a fala dele por tantas vezes em tão pouco tempo. — E eu gostaria mesmo de deixar para vocês. Você merece, Emily. Sempre foi a melhor pessoa da vida do meu filho. E o Lucas, por ensinar ele através de sonhos. E creio também que a família de vocês precisem.
— Eu trabalho, Mariana.
— Mas um dia, não vai mais precisar. — Outra coisa que vocês tem que saber sobre dona Mariana, é que discutir com ela, é como dar soco em ponta de faca. Ela vai respeitar sim a opinião, mas não a ponto de não impor o que ela acha que é certo.
— Então, tá — digo para acabar com a discussão.
Mariana sorri com a minha aceitação.
O Lucas fica super feliz com isso. Quando ela foi receber a nossa pizza, eu disse a ele que não vou gastar nada desse dinheiro, e que vou batalhar para ter o meu próprio patrimônio. Um dia, quando dona Mariana não estiver mais aqui, eu até penso em assumir o lugar dela. Mas por enquanto eu só penso em terminar os meus estudos e fazer algum curso preparatório, e me esforçar bastante na loja de cds. O Lucas vai com certeza usar, mas ele garantiu que só vai usufruir na construção da garagem para o Mustang, que coloca um sorriso nos lábios dele sempre que fala o nome dele, que é o meu nome.
Ele se aproxima de mim e encosta a testa com a minha e me diz o quanto está feliz. Ele tem uma energia diferente de sempre, e ela não é negra ou fria. Realmente ele está muito feliz, e isso me deixa muito feliz também. Beija o topo do meu nariz, e então dona Mariana volta com a pizza e algumas tigelas e talheres.
Conseguimos ver os três filmes. Dona Mariana e eu, no caso. O Lucas acabou adormecendo no final de garotos de programa. Me deitei no tapete, e ele continuou a reclamar pelo tempo que levou o nosso jantar, e depois de comer quatro fatias sozinho, ele se colocou por cima de mim e ficou procurando defeitos no filme. Perguntou que tipo de retardado se deita no asfalto quente? Ele disse isso no momento em que River se deita no asfalto e começa a dormir ali mesmo, e foi daí para pior. Eu até tentei debater com ele, e dizer que esse foi o melhor filme do ator, mas dona Mariana falou o como River Phoenix revolucionou os cinemas nos anos 80 e 90. Com ela, Lucas não pode protestar, então e ele prestou atenção na sessão até que sua respiração ficou profunda por cima do meu peito. Não preciso dizer o quanto ele me encanta quanto está adormecido. Nem parece o cara que fica com ciúmes do River Phoenix o tempo inteiro. Mas tudo bem.
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