17 Frequências A Mil
O Lucas conserta os cabelos mesmo que estejam em perfeito estado, e limpa a camisa do Queen para não ter nenhuma imperfeição por cima das roupas. Sorri para mim e eu devolvo para passar a confiança que também não tenho. E com cautela e nervosismo adentramos juntos a sala de jantar. Evito contato visual com todos, e permaneço com as mãos juntas abaixo do abdômen, mas a densidade no ar denuncia o quanto isso tudo está pesado. Lucas também está inquieto e não se volta para dona Mariana e companhia, então inspiro coragem e os encaro... ou a ela. Jô e José não estão presentes, a mulher está sozinha. Dona Mariana me olha primeiro porque sou a primeira a encarar. A mesa já está posta com algumas travessas de arroz, macarrão e frango cozido com legumes. E uma taça de vinho tinto repousa ao seu lado.
— Podem se sentar — pede ela notando nossa paralisia. Pego a mão de Lucas e o coloco rapidamente em uma cadeira. — Podem se servir também — exclama quando sento ao lado dele.
— Dona Mariana, perdão — peço por fugir do assunto. — Eu não tô entendendo nada. — E não estou mesmo. Em menos de duas horas ela estava nos expulsando, e agora ela só parece uma mulher derrotada.
— Mariana, Emily — corrige e junta mãos na altura do rosto enquanto nos olha. Diferente do Lucas, ela não parece um nova mulher. Seu semblante está cansado, mas ela tenta me mostrar um sorriso. — Precisamos conversar. Nós três. — Faz uma pausa, e então conclui: — Pedi a Jô para jantar com o José em algum outro lugar para termos privacidade.
— Dona Mariana... — começa Lucas.
— Eu acredito em você, Lucas — Ela o entrecorta. — Acredito em vocês. Acreditei desde o momento que me disseram.
Lucas engole em seco e lambe os lábios. Como ele, eu me sinto impotente, mas dona Mariana acreditando na nossa versão as coisas podem melhorar muito. Porém, no momento, o clima está tão denso que parece que a qualquer momento a casa vai desabar sobre nossas cabeças.
— Eu não queria acabar com a energia boa desse lugar — Luke manifesta como desculpas. Ele está com a cabeça baixa e as mãos apoiadas no colo. — Mas não queria esconder isso de você, achei que seria bom ser sincero. Sabe? — sua voz tá lenta e baixa.
Mariana assente com um gesto apenas, e tenta desfazer o mau clima com um outro sorriso, o que não dá certo já que estamos todos meio magoados. Essa ideia de contar sobre os sonhos do Lucas acabou com nosso primeiro domingo de férias, e acabou com a animação de Mariana. Eu duvido que ela ainda vá querer assistir os filmes do River comigo! Mas que infantil da minha parte estar pensando em filmes agora.
— Eu agradeço por isso. — diz ela em resposta, e logo mais silêncio. — Então você existe mesmo. — Devagar, Lucas se vira para mim com a sobrancelha arqueada, e em seguida para ela. — Lucas. — faz uma nova pausa. — Lucas... Jessica. Lara... — Ela suspira fundo. — Bruno.
Lucas devolve o fôlego com peso, e paralisa. Todos os movimentos do corpo dele começam a falhar. Mas eu imagino o porquê disso tudo. Como ela pode conhecê-los? Minha mãe deve ter mencionado. Minha mãe conhece a dona Lara dos tempos de escola, mas não conhece os filhos dela além do Lucas. Então deve ter alguma outra resposta sensata para a questão de como ela os conhece. Não tem?
— Minha família — Luke responde em murmúrio. — Eles são minha família.
— Eu sei. — Lucas e Mariana trocam olhares pesados. — O Fabrício me falou.
A voz do Lucas se perde e vejo suas mãos tremerem. Com instinto a seguro e pressiono com carinho. Ele está gelado, mas devolve com doçura o meu gesto de amor. Mas em nenhum instante os dois se desligam, e ele pergunta:
— Como?
— Ele também sonhava com você. — Lucas aperta minha mão com força agora, mas não chega a machucar. — Uma vez ele me perguntou se tínhamos um Lucas, Jess ou Bruno na família — dona Mariana conta a medida do que sabe. — Eles são seus irmãos, não são?
Leva um tempo antes de Lucas assentir, e sua respiração fica embargada. Sua mão começa a suar com o nervosismo. Lucas está pálido como se tivesse visto um fantasma.
— Com excessão da Lara que é minha mãe. O Bruno e a Jess sim, são meus irmãos.
— Eu lembro que quando Fabrício tinha nove anos ele me perguntou se tinhamos um Lucas na família. — Ela repete. Eu não acredito que isso é real. Isso é muito novo para mim, e ele nunca tinha me contado sobre esses sonhos. — Ele parou de me contar sobre os sonhos quando percebeu que não era uma coisa normal. Tinha onze anos na época. E quando eu perguntei sobre vocês, ele me disse que tinham parado, os sonhos. — Mariana soluça com um pequeno sorriso. — Ele coçou a nunca e disse com tanta naturalidade. E eu acreditei.
— Mas como? Como é possível? — Luke inquire com a voz falhando. Se ele está atônito, estou eu duplamente estupefata. Lucas sonhando com o Fabrício, e Fabrício com Lucas. E agora tudo se tornou uma confusão só. — Como isso pode acontecer?
Dona Mariana nega com a cabeça para expressar que também não sabe responder essa indagação.
— Ele voltou a mencionar vocês quando tinha treze anos. — Ela respira alto pela boca. — Vou lembrar até morrer daquele dia. Ele se isolou. — Os olhos dela se entregam a suas lembranças, e se perdem. — Não quis falar com ninguém. Meu filho se trancou no quarto, e chorou, chorou e chorou. — Uma lágrima desaba pelo lateral de seu rosto ao lembrar daquilo. — Ele não quis falar com ninguém, só comigo, e nem foi tanto tempo assim. — Luke e eu nos atentamos a cada palavra como se ela nos contasse uma história. E não deixo de recordar esse dia. Ainda éramos apenas amigos na época. Fabrício não apareceu aquele dia no colégio, e quando fui até sua casa, ele não quis me receber. Me mandou embora e, eu saí achando que ele estava bravo comigo, pois um dia antes fiz um show de drama por ele me deixar sozinha e sentar com a Paula. E quando nos falamos pelo telefone ele me acalmou e disse que era coisa dele, que eu não precisava me preocupar. Contou que sentiu minha falta. — Quando ele me deixou entrar no quarto, me abraçou. — o fôlego parece faltar a mulher gordinha. — E a única coisa que ele disse foi... “o Bruno morreu.” — sinto meus olhos apertarem, e Lucas segura a minha mão com as duas. O silêncio começa a tingir o cômodo com o luto nos pegando de surpresa. Lucas continua calado ainda com os olhos postos em Mariana. — “Ele morreu, mãe, ele se foi.”— conclui a mulher.
— Sim — a voz de Lucas vem com um abismo de tristeza. — Dia 18 de novembro de 2015, meu irmão se matou — declara ele e atrai a atenção dela de volta. Acho que o Fabrício não contou essa parte, não disse a ela a causa da morte.
— Eu sinto muito, Lucas.
— Então o Fabrício, sentiu a morte do Bruno? — pergunto matando o silênco que começaria a recair. Lucas me olha e me mostra um sorrisinho tristonho, e eu devolvo com o mesmo semblante. Lucas se curva e se deita no meu peito rompendo o espaço entre as cadeiras. Enterro os dedos em seus cabelos e acaricio sua nuca.
— É, parece que sim — Luke me responde. Beijo o topo de sua cabeça na presença da minha sogra. Nesse momento eu não estou nenhum pouco me importando para o que ela vai pensar em nos ver assim tão próximos. O meu maior desejo agora e arrancar essa lembrança ruim do coração dele, e do coração dela. Eu só não quero vê-los sofrer mais.
— Depois daquele dia. — dona Mariana nega com um gesto. — Ele nunca mais me falou sobre vocês. Eu fiz uma breve pesquisa porque eu não achei aquilo normal. Eram apenas sonhos, e meu filho estava despedaçado. Eu nunca tinha visto o Fabrício tão sem chão como naquele dia. Aquilo me doeu tanto... Eu só queria ver ele bem.
— Eu não cheguei a viver esse momento da vida dele — manifesta Luke. —, mas imagino que se isolar foi a melhor forma dele não te preocupar. — Um pouco silêncio toma o ambiente e minha sogra toma um gole de vinho. — E não precisa se importar, ele te amava — Lucas conta saindo da minha barriga e se consertando na cadeira. — Ele te amava tanto. Pra ele, você era a pessoa mais importante do mundo. — Engole em seco. — E tudo que ele mais queria era te proteger de qualquer merda de ruim que pudesse envolver a vida dele. — Os olhos de dona Mariana se umidecem. — Ele te amava com toda a alma.
— Muito obrigada por isso — ela agradece e seca o rosto com os braços. — Ele também era pra mim a pessoa mais importante do mundo.
— E ele sabia disso — Lucas replica rápido.
Dona Mariana assente com uma tristeza enorme colorindo por cima do batom vermelho nos lábios. A mulher se levanta, e vacilante, caminha até nós dois. Com um semi sorriso ela olha para Lucas, e abre os braços. Lucas olha para ela por um momento, como se pensasse em não aceitar, mas se entrega. Por mais que sejam pequenos os braços de dona Mariana, ela consegue encontrar uma mão com a outra pelo a estrutura física dele. Luke descansa o rosto em seus ombros e Mariana soluça. O corpo do Lucas a esconde de mim, mas ouço seus prantos.
— Me perdoa — pede com a voz chorona. — Me perdoa por mandá-lo embora. Eu estava apavorada, eu achei que você e a Emily estavam brincando comigo. Me perdoem.
— Não, eu que peço perdão — Lucas fala. Dona Mariana o aperta cada vez mais. — Eu só não sabia como contar... — a voz dele está suave pelo clima de toda essa situação. — A Emily tava com medo que você odiasse a gente — solta ele, e um sorriso mais engraçado soa do outro lado.
Dona Mariana o larga e me olha de cima. Ela ainda está triste, mas já não carrega raiva ou qualquer tipo de sentimento ruim nos olhos. Sinto pena dela. Perdeu o filho, e aqui estamos Lucas e eu, tocando com força nessa ferida. Mas ela acredita na nossa versão, pois o Fabrício tinha versão dele. Uma versão que nunca chegou a me contar. Fabi e eu tínhamos sim alguns segredos, mas eu achava que os dele envolvia Paula e como ela se oferecia para ele quando eu não estava por perto. Nunca me passou pela cabeça que ele tinha sonhos com o Lucas. Isso não chegou em meu pensamento nem quando Lucas me expôs os seus sonhos. Eu acredito que eu conhecia o Fabrício, mas saber disso agora é chocante, é como ver com outros olhos, alguém que confiava tudo, que confiava o mundo. Não muda em nada meus sentimentos por ele, mas me pergunto o que mais ele não me contou para se sentir normal?
Dona Mariana abre os braços, mas dessa vez para mim e me entrego sem pensar duas vezes. Minha sogra me agarra pelo pescoço e me aperta me mantendo curvada. Eu não ligo se ela pode estar me machucando. Acho que tenho uma boa hipótese de porque ela é gordinha. Porque dona Mariana tem todo o carinho do mundo guardado em si. Eu nunca vi uma pessoa tão meiga e carismática como ela. Todos os dias o meu amor por essa mulher continua a crescer.
E então me solta. O semblante no seu rosto está melhor depois desses abraços, e o ambiente já se colori instantâneamente.
— Dona Mariana, pode me fazer uma pergunta — expressa Lucas para ela. O seu grave já está mais normal agora, e mesmo triste, ainda é música para meus ouvidos. — Pode me fazer qualquer pergunta sobre ele, e eu vou te responder.
Caminho dois passos a frente para ver Lucas. Ele está lindo e charmoso com a camisa da minha segunda banda favorita. Quero abraçá-lo, quero beijá-lo e quero arrancar toda a dor que ele tem sentido por todo esses anos antes de nos encontrarmos. Eu definitivamente amo esse garoto com todo o meu coração!
— Eu só tenho uma pergunta pra fazer, Lucas. — Os olhos de Lucas se voltam para ela. Ele lambe e o morde o lábio inferior. — Ele sofreu? Naquele dia... O Fabrício sofreu?
A voz dele me invade a mente quase que instantâneo. Meus olhos estão postos em Lucas, mas a visão na minha cabeça e do Fabrício. Ele arfando, resmungando por causa da dor. Ele está me chamando, está preocupado comigo. Recupero o fôlego e o vejo em minha frente. O sangue está cortando pelo rosto dele, e então ele volta a respirar fundo. A dor física se espalha pelo meu corpo inteiro, e a dor emocional vem logo em seguida como facadas sendo cravadas em meu coração. Ela está aqui agora, aperto os olhos e tudo aquilo me volta como uma bomba.
Seis meses atrás
— Fabrício... — chamei entre uma fungada e outra. — Fabrício, Fabrício, não! — pedi com muita aflição. A linha escarlate pingava de seu rosto, e seus olhos estavam fechados. Eu acho que já sabia, pois quando ele fechou os olhos meu coração começou a chorar. Com toda a calma daquela maldita estrada, eu ouvir seu coração bater pela última vez e parar. — Fabi, não! Fabi, acorda! — Fiquei desesperada e comecei a chorar. Toquei no rosto dele e sacudi na esperança de que ele pudesse dar sinal de vida, mas o Fabrício não se moveu, ele não respirou e não me olhou. — SOCORRO! SOCORRO! — berrei. E tentei olhar para todos os lados em busca de ajuda, mas naquela hora da madrugada não tinha ninguém. — Fabrício, meu amor, acorda, por favor! — Minhas lágrimas molharam toda a minha cabeça e o banco do carro onde eu estava presa. — SOCOOOOORRO!!! — Tentei outra vez. Mas ninguém apareceu. — Fabiii!!! — chamei mais uma vez chorando. Durante a hora que eu fiquei presa com ele, fiquei tonta por todo o sangue que me subiu para a cabeça. Mas o pior de tudo foi ter que ver seus lábios tomarem um tom violeta, e seu rosto ficar avermelhado. Ele já não respirava, seu coração já não batia, mas o sangue ainda jorrava gota por gota, e minhas lágrimas contavam o quádruplo de cada gota de sangue dele. Eu nunca vou esquecer daquilo.
Quando o resgate chegou eu não tava lá. Na verdade, eu estava sim, mas eu lembro que em algum momento de todo o tempo que eu fiquei presa com o corpo dele eu desliguei. Eu contei uma hora e meia que ficamos ali naquele lugar, mas o resgate me atendeu um pouco antes das cinco da manhã. Eu estava em choque e tremendo. A imagem dele ainda tinha passe livre na minha mente. Mesmo naquele momento eu sabia que aquilo era uma cena que eu jamais iria esquecer em toda a minha vida.
Tempos atuais
Lucas assente. Dona Mariana suspira fundo e leva mão ao coração. Se esforça para não chorar, mas é impossível não voltar a sofrer. Ela acabou de perguntar e meu coração já está encolhido no peito. Bate com força, mas com a força da angústia.
— Eu não vou mentir pra você e dizer que ele teve uma morte calma — Luke lamenta. — Ele sofreu sim um pouco. Mas não tava nem aí pra dor, ele só queria saber se a Emily tava bem — Lucas me olha e sorri. — Eu senti cada momento daquele acidente, dona Mariana. Eu senti a dor, senti o desespero dele e inclusive senti ele perder a vida. E ele sentiu muita dor. A cabeça dele doeu muito.
— Sim — responde ela desviando o olhar de Lucas. — Os legistas disseram que ele teve um traumatismo craniano. — outra pausa. — Ele bateu a cabeça com a força do impacto.
— Ele não queria morrer, dona Mariana — conta Lucas com muita profundidade. Minha sogra ainda chora como se tudo tivesse acontecido hoje. — Ele não queria morrer. Ele achava que não ia morrer. Mas não tava nem aí para o estado dele, só conseguia ligar pra Emily, era só com ela que estava preocupado. Ele tava com medo de tê-la matado por uma brincadeira idiota. — a voz dele diz embargada. —, mas ele não queria morrer. Ele morreu por querer descansar. Ele quis descansar quando a Emily olhou pra ele. — Lucas desvia o olhar dela e nega com gestos. — Ele achou que se entregar ao cansaço fosse melhor. Mas ele morreu quando viu que e Emily estava bem.
— Então — manifesto com o frio correndo pela espinha. — Seu não tivesse acordado... o Fabrício ainda poderia estar vivo? É isso? — indago temendo a resposta.
— Não é bem assim... — ele começa, mas sua voz vacila, e ele não completa, e nesse momento eu já sinto tudo desmoronar. Meus membros paralisam, e meu coração parece ser abraçado por um arame farpado. Eu o matei. Eu matei o meu namorado. Uma lágrima escorre pelo meu rosto e o controle começa a se esvair. — Emily — chama Lucas, mas a única voz que consigo ouvir agora é a que está na minha mente, e ela me condena pela morte dele.
Começo a tremer, e a minha voz vacila. E então tudo começa a colapsar por dentro. As minhas lágrimas se transformam em um choro descontrolado, inconsolável. Enterro os dedos nos cabelos e olho para dona Mariana, e minha sogra também me encara.
— Me perdoa, me perdoa — peço com o corpo inteiro vibrando. — Eu não queria. — soluço. —, matar ele, me perdoa. — dona Mariana volta a chorar e cobre a boca com a mão.
Meus pés dão dois passos para trás, e Lucas tenta segurar meu braço, mas me desvencilho com muita rapidez.
— Me perdoa — peço outra vez caminhando para trás. Meu choro transforma a imagem deles em grandes borrões, e a de Lucas se aproxima de mim com os olhos pesados.
— Emy — Lucas diz. Mas sou mais rápida e atravesso os cômodos com os berros na minha cabeça falando que eu sou a culpada de tudo. Eu devia ter morrido naquele acidente, não ele. Eu sou a culpada. Me perdoa, Fabrício, me perdoa, meu amor!
— AAAAAAH!!! — coloco para fora toda a dor, sofrimento, arrependimento que corre em minhas veias. — NÃÃÃÃO!!! — corro para a porta de saída, mas Lucas é mais rápido e me segura antes que eu saia. — AAAI!!!
— Emily! — Lucas me abraça com força, me segura contra ele mesmo que eu comece a me debater. — Emily, olha pra mim — pede, mas é inútil. Eu ainda choro, ainda sinto tudo isso me doendo por dentro, me quebrando e me definhando aos poucos.
— Eu quero morrer!!! eu quero morrer! — repito com o prantos molhando todo o meu pescoço. Lucas segura meu rosto com cuidado e apoia por cima dos ombros. — Eu quero morrer, Lucas. Eu quero morrer.
— Você não pode morrer, Emily — diz em resposta.
— EU QUERO MORREEEER!!! — grito com toda a potência que eu consigo. — Me mata, Lucas. Me mata. — soluço fungando e sofrendo.
— Para, Emily, eu não vou te matar! — seu tom é forte.
— Emily. — Esse tom me arranca do limbo. Dona Mariana vem até mim e Lucas me coloca nos braços dela. Eu continuo chorando, e a dor se intensifica cada vez mais por agora ter a total certeza que eu assassinei o meu namorado... eu matei Fabrício. — Emy querida, você não tem culpa. Foi um acidente. — Ela tenta me consolar, porém, nada consegue cessar meu sofrimento. Lucas desaba de joelhos no chão e me olha com uma expressão de derrota total. — Levanta daí! — a mulher fala com autoridade. — Vai até o meu quarto e me traz um frasquinho em cima da cômoda! Só tem ele lá! Agora vai!
Lucas prontamente se recompõe e desaparece com uma velocidade impressionante. Está tudo chorando em mim. Eu quero muito encontrar o controle, mas a decepção, a culpa e o acidente estão pesando em cima de mim. Vejo seus olhos se fechando pela última vez, e essa imagem não me sai da mente. Eu o matei, tirei a vida dele e fiquei com a minha. Como eu pude ser egoísta? Ele se foi por minha causa.
— Dona Mariana, me perdoa — peço chorando por cima do ombros dela. — Eu não queria ter matado ele. Eu amava ele. — fungo. — Eu amava ele... — fungo outra vez, e minha sogra acaricia minhas costas. — Me per... me perd... — soluço. — me perdooa — arrasto a palavra.
— Calma, querida, calma. — Ela me segura de junto dela tentando me acalmar. — Você não tem culpa. Calma, vai passar.
— Eu não queriiia! — finalmente me entrego ao cansaço, mas ainda continuo chorando. — Me perdoa...
Lucas pula os degraus restantes da escada e corre até aqui bem rapidamente. Dona Mariana pega o frasco dele bem rápido e destampa, bate duas vezes na mão para tirar uma cápsula e meu corpo desmorona por cima dos ombros dela. Lucas acaricia minhas costas na tentativa de me dar forças. Ele está muito abalado, não tá chorando, mas está chocado. E não sei como explicar, mas sinto sua angústia, só estou chorando e sofrendo tanto com a minha que não consigo me atentar a ele agora.
— Toma, beba isso. — Dona Mariana coloca o comprimido na minha boca, e com a ajuda do Lucas, tomo um gole de água para ingerir o medicamento. Não sinto nenhuma melhora quando ele me desce pela garganta, meu corpo implora mais e mais pela morte, e meu choro não cessa.
— Deixa — Lucas pede a mãe dele, e dona Mariana passa o lugar. Me esforço para me segurar nele. Agarro o pescoço de Lucas e ele me abraça com toda a força que consegue. — Vai passar. — diz tentando me confortar. Pelo menos no meio de toda essa tempestade, o calor do coração dele esquenta um pouco do meu que está congelando. — Vem comigo. — Lucas me pega no colo sem dificuldades e me carrega para a sala. Escondo o rosto no peito dele e inspiro seu aroma de Blue. O coração dele está acelerado, e a frequência deve estar mil vezes maior que o normal.
— Deita ela aqui — pede Mariana e Lucas me coloca no sofá.
Meu corpo começa a sentir o efeito do remédio uma eternidade depois de ingerí-lo. A sonolência me pega de surpresa e me força a fechar os olhos. Meus pensamentos ainda estão muito embaralhados, mas o cansaço não me permite ter forças para continuar chorando pela culpa e me afoga em um sono que eu não sei de onde vem.
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