69. Coração abalado
Após um ligeiro aperto de mão entre Matthew e Evan, os dois pares de olhos verdes continuavam sobre Emily, acompanhando seu constrangimento e a vontade de sumir de vez dali.
O universo não podia estar lhe pregando essa peça. A mais de cinco anos não o via, não sabia nada sobre seu paradeiro e não mantinha contato com nenhuma pessoa próxima a ele. Como poderia o destino ser tão esperto a ponto de colocá-lo outra vez em seu caminho?
- É um prazer finalmente conhecê-lo, Blake - Matthew quebrou o silêncio desconfortável que aquele acaso deixou - Emily me falou sobre você, mas creio que não deva ter ouvido nada a meu respeito ainda, já que se afastou dela.
Evan, ignorou o comentário ligeiramente sarcástico do rapaz e manteve seu olhar fixo em Emily. Ela por sua vez, fazia de tudo para não ter que encaralá-lo.
- Como vai, Em - o jovem loiro engoliu nervoso.
Ela estava tão bonita e radiante. O corte de cabelo e as mexas deixaram-na ainda mais atraente e com aparência adulta, mas ainda assim, ao seus olhos, ela parecia a mesma menininha doce e meiga, pela qual se apaixonou na adolescência.
Emily obrigou-se a olhá-lo e pode sentir seu coração disparar, como da primeira vez em que o vira - Estou bem - limitou-se a dizer - E você?
- Bem também - disse ele, com a boca se curvando em um sorriso bonito.
Alguns segundos se passaram e eles pareciam hipnotizados diante um do outro, como se todo o resto ao redor deles estivesse parado, como se tudo houvesse congelado e somente eles ainda existissem.
- Vocês dois se conhecem? - indagou Kristen, curiosa, fazendo Emily desviar o olhar até ela.
A menina então lançou-lhe um sorriso sem graça, despertando de seus devaneios e titubeou - Nós... Eu e Evan...
- Emily foi a melhor amiga de minha irmã Olivia, que infelizmente veio a falecer a alguns anos - Evan respondeu por ela, ao ver que se enrolava com as palavras - A propósito, vejo que ainda usa o colar que deu a ela. Sei que Liv, onde quer que esteja, se sente feliz por tê-la conhecido.
A garota levou a mão sobre o pingente de meio coração em seu colo e sorriu involuntariamente - Olivia era e sempre será muito importante pra mim. Prometi a ela que nunca tiraria, honrá-la é o mínimo que posso fazer.
- Sinto muito por sua irmã - disse-lhe Matthew - Emily sempre fala muito dela.
- Eu a conheci em uma das negociações feitas com a Soft Light a muitos anos atrás, em Nova York - confessou James, dando fim aquele momento de apreensão que pairava sobre eles - Tinha apenas oito anos, mas já era muito esperta e bonita.
- Era um doce de menina - completou Kristen - Ficamos consternados ao saber de seu falecimento.
- Agradeço as palavras senhor e senhora Clarke - Evan esboçou um sorriso - Minha irmã faz muita falta.
Os mais velhos voltaram a conversar sobre os assuntos envolvendo a construção, enquanto os três jovens, envoltos naquele clima pesado, continuavam tensos e sem reação.
Matthew entrelaçou seus dedos nos de Emily, segurando-lhe a mão com firmeza, fazendo os olhos de Evan seguirem o trajeto até aquela união - Precisamos ir! - falou.
Emily não podia mover os lábios. O choque que levara ao ver Evan depois de tanto tempo a deixou paralisada. Era bom saber que ele estava bem, que crescia profissionalmente como sempre sonhara. Era notório seu orgulho diante do homem em que Evan havia se tornado.
Não mais usava aquelas camisetas com símbolos de banda, nem calçava seu surrado All Star preto, agora vestia terno e gravata e calçava sapatos sociais. Continuava lindo, mas muito mais maduro.
Diante da demora dela em responder o noivo e seus olhos que não deixavam os dele, Evan arriscou perguntar - Você já está indo? Pensei que poderiamos tomar um café aqui perto, conversar. Volto para Miami na segunda-feira.
- E-eu... - mais uma vez, Emily gaguejou - Nós precisamos mesmo ir.
- Não. Pensando bem... acho podemos ficar mais um pouco - disse Matthew relutante. Pigarreou para não voltar atrás em sua decisão e prosseguiu - Vou com meus pais ver o resto das instalações e você pode ir conversar com seu amigo.
Matthew manteve-se firme. Seus olhos perfuravam os de Evan, mas ele não podia demonstrar sua insegurança. Se tirasse Emily de sua vista, antes que pudessem conversar, talvez nunca se sentisse verdadeiramente segurado ao lado dela.
- Tem certeza? - Emily inquiriu.
Matthew assentiu, olhando dentro dos olhos dela e beijando seus lábios com delicadeza.
Evan desviou o olhar, passando a mão entre os cabelos e conferindo a tela de seu aparelho celular. Não queria sentir-se desconfortável daquele jeito ao ver o afeto que existia entre o casal, mas era inevitável.
Cada célula do seu corpo gritava para arrancá-la dele, mas isso não seria justo, ele havia decidido se afastar, cumprir sua promessa e não mais procurá-la e mesmo que o destino tenha sido o grande responsável por estarem próximos novamente, ainda assim, não podia atrapalhar a vida que ela tinha agora.
Após a despedida carinhosa, Emily deixou Matthew com os pais e acompanhou Evan até um bistrô francês, que ficava no lado aposto ao prédio do futuro hospital. Caminharam lado a lado até o local. Nenhum dos dois disse uma palavra sequer.
Acomodaram-se em uma mesa próximo a janela e Emily mantinha a visão voltada para o lado de fora, enquanto Evan pedia a garçonete dois capuccinos com chocolate e também dois croissant's.
- Acertei o pedido? - sorriu, mas de maneira imediata, seu corpo tencionou, ao ver o semblante fechado e os olhos chamejando com que Emily o fitou.
- O que você quer, Evan? - ela cuspiu as palavras, olhando para ele friamente - Você some por anos e agora que nos encontramos por acaso, você age como se tudo o que aconteceu tenha simplesmente desaparecido?
Ele continuava com o olhar fixo nela. O sorriso continuava aberto, mas por dentro, seu coração parceria se dissipar em milhões de pequenos cacos. Aqueles grandes e expressivos olhos o deixavam sem ação.
- Porque está me olhando assim? - ela indagou.
Evan desviou o olhar para a jovem e bonita garçonete que trouxera os pedidos. Agradeceu a ela e em seguida deu um gole generoso em seu capuccino, para só então responder - Estou lembrando!
Emily juntou as sobrancelhas - Lembrando o que?
- De como nós éramos. De como foi bom os momentos que vivemos - ele baixou o olhar, agora sim, deixando transparecer o semblante cansado e abatido que aquele encontro acarretara - Você não sente isso?
- Olha,eu ralei muito para chegar até aqui, passei por muitas coisas ruins, fiz coisas que não me orgulho nem um pouco, mas finalmente consegui colar todos os pedaços de mim que você quebrou - ela vociferou - E não vou perder a cabeça, só porque você resolveu entrar na minha vida de novo.
Evan estava atônito. Achou que depois de anos, os pais ou a própria Alison teriam revelado a Emily o que havia acontecido enquanto ela permaneceu internada, depois da overdose, mas dado o jeito em que ela falava, parecia não saber.
- Eu estive naquele hospital, Em - confessou - Só Deus sabe o quanto rezei para que se recuperasse e se me afastei, não foi por falta de amor, foi por sentí-lo em demasia.
Emily franziu o rosto, como se não acredita-se nas palavras ditas pelo rapaz. Seria possível que ele estivesse naquela boate e que a visitara no hospital e ninguém havia lhe tido nada? Deixaram-na pensar que estava louca, vendo pessoas que nunca estiveram presentes. Isso era cruel.
Ele levantou-se. Seu semblante agora era indolente - Não estou aqui para atrapalhar nada, só queria poder ficar um pouco ao seu lado, saber como estava. Você, de alguma forma, me trás paz. Adeus, Emily!
Evan se retirou da cafeteria, deixando Emily para trás. A menina ergueu-se rapidamente e o seguiu para fora do estabelecimento.
- Espera! - ela correu até ele - Não vai embora assim. Me desculpa se fui rude, mas eu não sabia de nada disso.
O rapaz parou, diante de seu carro, estacionado em frente a cafeteria e pôs a mão no bolso de seu paletó, em busca de algo - Mas que merda! Onde está essa droga de chave?
- Evan, você está bem? - ela apertou os lábios e pôs a mão na cintura, respirando com dificuldade, por conta da corrida.
- Quando a gente perde algo importante, não dá pra se sentir bem!
- Calma! As chaves com certeza ficaram sobre a mesa - falou ela - Vamos voltar pra lá!
- Não estou falando disso.
As bochechas de Emily ganharam um tom rosado, como das primeiras vezes em que ela e Evan trocaram olhares. Era difícil manter-se distante, parecia que, entre eles, haviam imãs, os puxando para mais perto um do outro.
No impulso, os braços de Evan a envolveram pela cintura, ele a tomou em seus braços, puxou-a para si e colou seus lábios nos dela. Foram poucos segundos, mas o suficiente para mostrar-lhe que ainda existiam fragmentos daquele amor tão puro e verdadeiro.
Emily sentiu-se uma adolescente insegura novamente. Aquela cuja as bochechas coravam sempre que o via. Seu beijo tinha o mesmo gosto de menta e o coração disparava compulsoriamente.
Assim que se separaram, ela sentiu como se alguém os observasse. Girou em seus próprios pés e vislumbrou, ao longe, na calçada do hospital, seu então noivo Matthew. Ele parecia perplexo com o que acabara de presenciar.
O rapaz deu de ombros e tentou se afastar, mas Emily correu até ele, já chorando copiosamente. Não podia acreditar que aquilo realmente estivesse acontecendo. Matthew era um homem bom e não merecia passar por aquilo.
Ele virou-se para ela, esticando as palmas das mãos no ar, impedindo que a garoto o tocasse - Eu sabia. No fundo eu sabia que isso aconteceria - uma lágrima solitária escorreu por sua face - Sou um tolo. Entreguei você de bandeja para ele.
Evan aproximou-se do casal, com os olhos de culpa que não cabiam em si. Não era sua intenção causar problemas a ela, nem ao menos queria tê-la beijado, mas a simples presença de Emily o deixava absorto.
- Escuta, não aconteceu nada entre mim e Emily - ele tentava justificar seu erro - Fui eu que a beijei.
- Cala a boca e fique longe da minha mulher - advertiu Matthew.
Os punhos de Evan cerraram, mas ele aspirou o ar profundamente tentando manter-se calmo. A alguns anos, não seria capaz de suportar calado tamanha afronta, mas com a idade, havia aprendido a se controlar. Deu de ombros e voltou para a cafeteria em busca de suas chaves, deixando o casal se resolver sozinho.
- Vamos voltar, Emily - o tom de Matthew era duro - Quero sair o mais rápido possível desse lugar.
Ela, por sua vez, apenas consentiu, voltando para dentro do prédio. Após se despedirem dos pais, Emily e Matthew adentraram a Lamborghini e começaram o trajeto de volta para Nova York.
Foram mais de duas horas envoltas em silêncio. Ouvia-se apenas o choro baixo de Emily ressoando no interior do veículo. Matthew mantinha suas mãos no volante, com o olhar direcionado unicamente para a estrada.
Já no apartamento, finalmente puderam ter a conversa que adiaram durante a viagem. Emily tentou convencê-lo de que o beijo havia lhe pegado de surpresa e que não havia significa nada, mas lá no fundo, ela sabia que aquilo havia mexido com seus sentimentos.
A conversa não surtiu muito efeito. Matthew continuava magoado, então, em conjunto, decidiram que o melhor a se fazer, era cada um passar o final de semana em sua casa. Emily então voltou para o campus, dirigindo seu carro.
Ao adentrar o dormitório, deu de cara com Claire. A garota assistia a algum seriado no televisor, deitada sobre o sofá azul de camurça.
Os olhos vermelhos de Emily revelavam que algo ruim havia acontecido. Desligou o televisor e sentou-se sobre o sofá, cruzando as pernas abaixo de seu corpo.
- O que ouve com você? - indagou.
Emily sentou-se ao lado da amiga e sem proferir mais nenhuma palavra, se pôs a chorar inconsolável. Claire por sua vez, a envolveu em um abraço caloroso e reconfortante, tentando acalma-la.
Depois de alguns minutos de silêncio e de choro continuo, Emily finalmente conseguiu se estabilizar e contar a amiga o que havia acontecido.
- Dê um tempo pro Matt, deixa ele esfriar a cabeça. Você vai ver que tudo logo vai se ajeitar, afinal vocês estão noivos - ela fitou o olhar choroso e sem emoção de Emily - A não ser que o tal Evan tenha mesmo te abalado de alguma forma.
- Não é nada disso, você não ouviu o que eu disse? Ele me beijou a força - ela franziu o cenho - Matt é meu futuro. Vou me casar com ele e Evan precisa seguir a vida dele.
- Emily, você ama o Matt?
- Mas que pergunta sem sentido é essa?
- Só responda!
- Amo. Claro que eu amo - ela desviou o olhar.
- Não, não ama. Você não consegue dizer isso olhando nos meus olhos.
- Chega desse assunto - ela deixou a sala, indo até um pequeno espaço com microondas - Vou fazer pipoca, escolha um filme e vamos aproveitar a noite.
Claire apenas assentiu, com o controle em mãos, procurava algo no aparelho de tela plana - Que tal Simplesmente acontece?
Emily fez uma careta - Outra vez?
- Letra e música?
- Dá pra não ser romance? Estou tentando esquecer a droga que é a minha vida sentimental - Emily fingiu estar zangada.
Então vamos assistir (500) Days of Summer, assim você vê que tem pessoas piores do que você - Claire mostrou-lhe a língua - Tom Hansen levou um chute, sem nem saber o porquê, mas ele superou, amiga!
- Porque isso é ficção, estamos falando de vida real e nela, eu estou prestes a ser chutada pelo meu noivo.
- Pois tanto melhor, quem sabe assim a sua ficha cai e você para de fingir que não sente nada pelo seu ex e encara de vez que essa história de noivado é pura fachada.
- Porque está fazendo isso, Claire? - Emily inquiriu - Você ajudou Matt com o pedido, por está contra ele agora?
- Não estou contra ele, só acho que você precisa rever seus conceitos, ter certeza do que quer e não apenas pra fugir de algo que pode te machucar.
- Quer saber? Esquece o filme - ela deixou a sala - Vou dormir. Boa noite pra você!
Claire apenas voltou-se para o televisor, sem dizer mais nada e deixou rodar o filme que havia escolhido.
Deitada em sua cama, os acontecimentos do dia passavam por sua cabeça como um flash back de emoções mal resolvidas. Estava claro, depois daquele beijo, que o sentimento estava vívido, mas até que ponto isso poderia definir o rumo que sua vida iria tomar?
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