Davies

Kimberley tinha suas tranças loiras amarradas em fitas vermelhas. Uma em cada lado do rosto. Eu gostava do cheiro dela. Tinha cheiro de chiclete de morango.

Ela sempre me dava "oi" e eu respondia baixinho para os outros meninos não verem. Ela não era minha namoradinha e eu não queria que eles pensassem isso.

- Você quer? - ela estendeu a mão, oferecendo seu pacote de chips de batatas.

Eu neguei com a cabeça, porém, eu estava morrendo de fome. Eu já tinha comido as quatro bolachas que minha mãe colocou na minha bolsa.

- Tudo bem, então - ela disse sorrindo.

Ela foi brincar com outras meninas. Eu não tinha amigos.

Na aula, aprendemos quais animais tinham escamas. A senhora Rudolf olhou pra mim, pediu que eu ficasse em pé e perguntou o nome de algum.

- Lagartixa - falei.

- Escolha interessante. Eu não disse nada sobre elas. O que sabe sobre as lagartixas?

Eu olhei as crianças a minha frente. Eu não queria que elas me olhassem. Toda vez que a senhora Rudolf me perguntava alguma coisa, elas me olhavam.

- Elas têm escamas e... elas colocam ovos e comem insetos. Não são perigosas e elas podem escalar paredes - eu disse um pouco envergonhado - E... e elas vivem até oito anos. E quando algum bicho as ataca, elas soltam a cauda e fogem. E a calda fica se debatendo - concluí.

- Oh, isso é interessante. Como sabe de tudo isso?

- O meu amigo, o senhor Mitchell, me deu uma revista que fala tudo sobre os repteis.

- E você adquiriu um bom conhecimento. Estou orgulhosa de você. Turma, que tal bater palmas para o amiguinho?

Eu me sentei e apertei forte a minha boca para segurar o sorriso. Eu estava feliz.

Quando terminou a aula, Kimberley disse que não teria mais medo de lagartixas. Eu fiz aquilo. Eu tirei o medo dela. Alguns meninos passaram correndo e ela olhou para mim.

- Vamos apostar corrida? Está vendo o poste? Quem chegar por último é o cocô da lagartixa.

Ela começou a correr e depois, eu corri também. Corri bem rápido e quando eu fui passar por ela, ela entrou na minha frente e eu a derrubei. Eu não queria ter feito aquilo.

- Sai de perto dela! - eu ouvi a mãe da Kimberley gritar.

Ela estava brava comigo?

- Oh, meu Deus... Você a derrubou!

Eu continuei calado. Eu sempre ficava assim quando um adulto estava bravo comigo. Eu tinha minha mão tremendo e andei para trás, com medo.

- O joelho dela está sangrando. Você a machucou, seu infeliz.

- Eu caí, mamãe.

- Ele a derrubou!

- Não! Não derrubou!

Ela olhou de novo para mim, com o rosto vermelho e apontou o dedo.

- De qualquer maneira, mantenha-se longe. Não quero minha filha perto de qualquer um de vocês, Lewis. Você deve ser só mais um garoto briguento que será igual ao avô e o pai. Certamente, vai fazer igual a eles. Coitadas das mulheres! Você é mais um Lewis que nasceu para machucá-las.

Continuei parado enquanto ela ia embora.

Kimberley olhou para trás e acenou. Eu não acenei para ela. Eu não podia, porque eu estava tremendo.

Eu vi o senhor Mitchell atravessando a rua, então eu corri e o abracei.

- Davies, o que aconteceu?

- Eu machuquei a Kimberley. Eu sou um Lewis e todos os Lewis, machucam alguém.

Eu nunca mais falei com Kimberley, nem com qualquer outra criança.