Os olhos de Amelie continuavam presos aos meus, como se buscassem algum resquício de dúvida no que eu acabara de falar.

Não suportando o peso do seu olhar, levei minhas mãos até o seu rosto e o puxei para mim, grudando meus lábios em sua testa deixando um beijo calmo e singelo, sentindo os braços da garota acolherem meu corpo em um abraço.

— Eu preciso ir. – sussurrei em seu ouvindo.

Desci meu rosto para a curva do pescoço de Amy, sentindo seu cheiro me alcançar – uma corrente elétrica atingiu todo o meu corpo quando as pontas dos dedos da garota deslizaram suavemente pela minha nuca e seu rosto se voltou para mim, ficando rente ao meu.

Nossas testas encostadas uma na outra, nossas respirações se misturando.

— Posso beijar você? – sussurrou.

Fechei meus olhos de imediato, relutando entre o sim e o não. O meu término com Elle ainda era bastante recente, nós não tínhamos cancelado oficialmente o casamento e todas as coisas que o envolviam – e trocar qualquer tipo de afeto público com Amelie nesse momento era arriscado, tanto para mim, quanto para ela.

— Acredite, Amylee, só Deus sabe o quanto eu queria te beijar agora. – sussurrei frustrado. — Mas, porra! Eu não posso. – lamentei. — Não aqui!

Segurei sua cintura e a afastei levemente para trás, notando um sorriso sem graça em seu rosto, mas ainda assim com uma pitada de compreensão, porque Amelie era assim: transparente.

— É, é um pouco complicado. – sussurrou. — Bom, eu também tenho que ir, acho que vejo você mais tarde.

Assenti para a garota e logo ela se virou e começou a caminhar para longe de mim, o seu pequeno corpo viajando pelo espaço esverdeado e concretado da biblioteca. Por um segundo, pude notar seu olhar sorrateiro por cima dos ombros em minha direção e imediatamente um sorriso se apossou dos meus lábios.

Antes que seu corpo pequeno sumisse completamente dos meus olhos, ela se virou e me lançou um beijo no ar, me deixando desconcertado com a sua doçura e me fazendo ter a certeza de que ela era definitivamente tudo o que eu sempre quis.

A tarde na gravadora estava completamente agitada devido às audições.

Todo ano a Miller Music Records organizava uma pequena audição com artistas locais e das redondezas de River Falls, com o intuito de oferecer investimento musical durante dois anos para aquele que mais se destacasse, tanto na parte musical quanto na personalidade.

Éramos conhecidos por sempre fazer bons investimentos e por lançar artistas de grande sucesso como, por exemplo, o nosso último contratado que estava em turnê pela Europa há dois meses. Shaw Fiennes era um artista indie completo e isso se refletia nas bilheterias e nas premiações que ele vinha acumulando.

Shaw havia sido nosso investimento mais certeiro e isso deixava o nome da nossa gravadora ainda mais pesado e cobiçado, fazendo com que as portas das premiações mundiais se abrissem para nós.

Terminei de checar os papéis em minhas mãos e alcancei o telefone na mesa, discando o número 3.

— Brie, preciso que venha até a minha sala o mais rápido possível. – disparei. — Não demore!

Antes que minha irmã pudesse responder, desliguei o telefone e voltei a conferir mais uma vez os papéis à minha frente, tendo a certeza de que não deixei passar nenhum detalhe de cada pessoa que se inscreveu para participar das audições.

Ergui o olhar assim que a porta da minha sala se abriu, encontrando Brie com as suas cópias de papéis em mãos.

— Eu espero que seja realmente importante, porque tem um milhão de pessoas lá fora e preciso organizar aquela fila antes que os outros produtores cheguem aqui.

— É importante! – afirmei. — Preciso que você cancele toda e qualquer coisa que envolva o casamento. Desmarque e cancele tudo! Buffet, prova de terno, visita ao local, tudo, Brie, cancele toda essa merda!

O corpo da garota pendeu para baixo e ela se sentou na poltrona de frente para mim, deixando os papéis sobre a mesa.

— Você e Elle já conversaram sobre isso? – indagou. — Por que eu não posso simplesmente cancelar tudo.

— Sim, você pode, porque eu estou autorizando. Não há nenhum acordo com a Elle. – suspirei. — Ela não vai facilitar as coisas e eu não quero esperar por ela. – confessei. — Eu só quero acabar logo com isso.

— Tudo bem, eu vou dar um jeito nisso. – um sorriso preencheu seu rosto — Agora eu preciso ir, boa sorte na audição.

Observei Brie recolher suas coisas e se retirar da sala apressadamente. Inclinei-me para trás, alcançando o celular em meu bolso e logo buscando o contato de Elle para lhe mandar uma mensagem.

“Estou cancelando tudo que envolva o casamento, você só precisará pedir o reembolso das passagens. Vou tratar para que você receba tudo que gastou até agora, não se preocupe”.

Coloquei o celular sobre a mesa e encostei minhas costas na cadeira de couro macia, passando as mãos sobre os cabelos e me sentindo frustrado por toda essa situação que causei.

Não tardou para que meu celular começasse a apitar, indicando que havia chegado uma mensagem. Sem pressa o peguei e, para minha surpresa, o nome de Amy brilhava no ecrã.

Em anexo, havia uma foto sua bebericando uma xícara de café. Seus olhos indicavam que, por trás da porcelana verde-água, um sorriso sincero e maroto preenchia seus lábios. Observei a legenda com um sorriso no rosto.

“O melhor café dessa cidade é o meu. E você precisa prová-lo”.

Apressadamente digitei uma resposta para a garota.

“É um convite?”.

Meus olhos se perderam na tela e senti uma leve pontada de ansiedade no meu estômago. O tipo de sensação agoniante e, ao mesmo tempo, aconchegante que só Amylee me fazia sentir.

Alguns minutos se passaram até que sua resposta surgisse:

“Só é um convite se você aceitá-lo”.

Relutante suspirei frustrado, digitando uma mensagem de recusa, explicando que hoje era o dia da tão famosa audição capaz de parar River Falls por um dia inteiro, e em resposta também recebi uma mensagem de lamento da garota. Com isso, não tardei em reparar o desencontro do dia de hoje.

“Faça um café para mim, te pego às 18:00. Vamos à praia, hoje tem luau”.

Eu sabia que praia não era um dos lugares favoritos de Amelie, no entanto, estava torcendo para que ela aceitasse o meu convite.

“Praia? Você sabe que não sou uma grande fã de toda aquela areia e água, mas eu levo o café sim (:”.

Sorri para a tela brilhante como se meu gesto fosse atravessar aquele pequeno ecrã e atingir a garota com todo o calor que emanava da minha ação naquele momento.

“Eu não vejo a hora de beijar você, Amelie Bennet”.