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– Mais forte, Babi! Mais forte!
Intensifico a força que aplico sobre os punhos de Coringa envolvidos em luvas usadas em treino de boxe. O treino de hoje é para melhorar a precisão dos meus socos. Para ser sincera, está sendo um saco; ele está excessivamente chato, cobrando o tempo todo.
– Por dios! – Solto, com ironia, entre fôlegos cortados.
– Ah, muito bem. Treinando italiano e defesa pessoal ao mesmo tempo. Que garota eficiente.
Dou um soco com muita força, zangada com a ironia retribuída por ele e Coringa solta um esguicho de animação logo atrás de um "é desse jeito". Mesmo com todo o esforço físico que estou fazendo, ainda consigo perceber que ele levemente falou com sotaque.
Fazem uma semana que estou treinando cansavelmente, tanto o meu corpo como minha língua. Da forma como eu queria? Não, obviamente, mas pelo menos estou aprendendo a me defender e iniciando uma nova característica da minha vida: ser bilíngue. Não é que já estou falando e entendendo tudo em italiano, mas já sei até pedir um táxi sem passar mico. Graças ao meu "professor" exigente, estou avançando nessas duas coisas.
A única hora que eu tenho para descansar é a noite e, embora eu queira conhecer Milão, pelo menos sob a luz da lua, o cansaço fala mais alto. Depois de longas horas de treino pela manhã e infinitos exercícios de italiano a tarde, eu apenas desabo na cama.
– Será que hoje eu vou aprender a xingar em italiano? – Penso alto.
– O que? Eu jamais ensinaria essas coisas a uma moça tão delicada. – Coringa solta um risinho.
Ele começa a andar pelo tatame e eu tenho que continuar a dar socos, seguindo-o, no entanto, paro por um momento. O meu peito subindo e descendo freneticamente, as mãos pendendo para baixo de tão doloridas e pesada. Coringa vê o meu estado e me dá uma trégua. Ele abaixa a guarda e é aí que eu aproveito a oportunidade. Dou-lhe uma rasteira, levando-o ao chão desajeitadamente.
Coringa não se levanta, apenas fica me olhando e começa a gargalhar. Ele coloca a mão na barriga, talvez doendo de tanto rir, e não me controlo, acabo rindo também.
– Che cazzo. – Ele diz entre risadas.
– Isso foi um palavrão?
– Foi.
Repito o xingamento em italiano, mesmo sem saber a tradução e estendo a mão para Coringa, ajudando-o a se levantar. Sem muito esforço ele fica de pé.
– Ainda sou uma moça delicada pra você? – Brinco.
– Não é mesmo. Você é muito bruta na verdade.
Coringa arranca as luvas e joga no canto da sala, ainda risinho. Ele balança a cabeça e penteia os fios de cabelo com os dedos, tentando coloca-los no lugar.
– O treino acaba por aqui, hoje você vai ter mais tempo para descansar.
– Por quê? – Pergunto.
– Hoje à noite vamos participar de um jantar importante e preciso de você disposta e animada, como noiva do Dom.
Sinto um nervosismo me consumir. Mais um jantar, com muitas pessoas, todas depositando suas expectativas sobre mim. Essa semana que se passou foi muito boa pois não precisei fingir ser a noiva de Coringa na frente de ninguém, na verdade eu nem sai do hotel, a não ser para vir ao centro de treinamento. Vi Anderson poucas vezes, sempre entramos sem falar com ninguém e nos dirigimos a sala de treino.
Somente tive que interagir com Coringa e ele, bom, não é um fator que me oferece ameaça, porque afinal, para ele não preciso fingir.
– Esse jantar é em comemoração à que? Quem tanto estará lá?
Coringa ignora minha pergunta e simplesmente vira as costas. Ele vai pegar uma toalha do cabideiro para limpar o suor.
– Sabe aquele vestido vermelho que compramos no primeiro dia em Milão? – Ele diz, arqueando a sobrancelha.
– Sim. – Confirmo, revirando os olhos com a mudança repentina de assunto.
– Eu quero que você o use hoje.
– Você quer? – Cruzo os braços, irônica. Ele acha mesmo que pode mandar em mim. Pufft!
– Sim. Se não tiver um sapato ou uma bolsa que combine é só me falar que eu compro para você.
– Não vou precisar de nada. Você já comprou muitas coisas, além disso, tenho outros vestidos além desse para usar.
– Mas você vai usar ele. – Coringa se aproxima.
– E se eu não quiser? – Levanto a cabeça, altiva.
– Aquele vestido ficou lindo em você. A noiva do Dom deve estar irresistível.
Coringa já está próximo o suficiente, com um olhar intimidador, como se estivesse tentando acabar com a minha ousadia. Mas ele não sabe quem eu sou. Não esqueci do seu ataque de bipolaridade naquele dia.
– Não foi você que disse que eu não deveria mais usar aquele vestido? – Desafio.
Coringa franze as sobrancelhas e uma pontada de dúvida surge no meio da sua testa.
– Você não entendeu a situação. – Ele explica – Olha, só use o vestido, ok?
Não digo que vou usar, mas também não falo que não irei, apenas entrego o silêncio como resposta. Coringa fica agitado, percebo isso nitidamente. Ofereço um sorriso de canto e lhe dou as costas.
Vou indo em direção a porta de saída da sala de treino e ouço bem baixinho Coringa dizer:
– Gnocca.
Por algum motivo que desconheço, lembro-me que essa palavra significa "gostosa".
[...]
A festa glamurosa é no próprio salão do hotel que estamos hospedados. Coringa vem me buscar às nove horas da noite como combinamos mais cedo, antes da aula de italiano acabar. Felizmente tive muito tempo para me arrumar.
Nós dois pegamos o elevador e paramos no terceiro andar. Ele me leva para um corredor que dá acesso a grande escada, da qual posso enxergar que seu fim dá para um salão.
Ainda aqui em cima, vejo muita gente. Várias mesas estão espalhadas pelo salão, com tecidos na cor creme, louças caríssimas e taças brilhantes sobre elas. Grandes candelabros – serão que são de cristais mesmo? – estão iluminando a festa. Cortinas de seda esconde as enormes janelas de vidro. Pelo visto eu fiz a escolha certo do vestido, resolvi vir com o vestido vermelho que Coringa tanto insistiu, pois era o mais chique do meu closet.
No entanto, achei que seria uma coisa menor, mais íntima, nada comparado a essa megaestrutura. E o mais estranho ainda é quando as pessoas notam que estamos descendo as escadas e começam a aplaudir. Uau! A galera aqui realmente leva esse negócio de Dom a sério. Os olhares curiosos e vez outras animados ou perigosos, no cercam de todos os lugares. Cumprimento em italiano são soltas no ar e eu pego poucos deles.
– Essa é a parte que eu esqueci de te contar. – Coringa fala, quando já estamos passando pelas pessoas no salão, ele vai cumprimentando-as discretamente – Isso não é uma reunião simples, é o jantar do nosso noivado.
Isso é bem óbvio, seu cínico! Por um momento quero explodir gritos na cara de Coringa, porque obviamente ele não esqueceu de contar, apenas não quis. Vim totalmente despreparada para esse lugar. Se antes eu já sabia que seria o centro das atenções, agora é que tenho a plena certeza. Se eu fizer algo errado aqui a culpa é dele.
Apesar do nervosismo e da vontade de fugir, me controlo, afinal, no contrato prometi discrição.
– O que disse, querido? – Interpreto meu papel.
– Eu disse que estamos n...
– Isso eu entendi. – O corto – Só não entendo porque não me avisou antes.
– Eu não queria que você ficasse nervosa. – Ele diz dando de ombros e me olhando divertido.
– Boa tentativa, mas isso não ajudou. Estou nervosa do mesmo jeito.
Coringa não responde, mas sinto sua mão escapar para minhas costas, conduzindo mais rapidamente para um lugar que não sei, ao mesmo tempo em que faz círculos discretos, alisando-me.
Finalmente, ou não, chegamos aonde ele está me levando: ao palco. Começo a soar frio e sinto minhas pernas balançarem. Droga, por que escolhi saltos tão altos?
– Fique tranquila, vai dar tudo certo. Eu vou falar tudo, você só precisa sorrir, ragazza. – Coringa diz, me olhando nos olhos.
Balanço a cabeça confirmando, mas ainda continuo me tremendo de nervosismo. Nesse lugar deve estar quase todo mundo que trabalha pra ele, pelo menos o pessoal do alto escalão, já que é uma festa apresentando o noivado. Eles me olham esperando algo de mim.
Coringa me conduz até o centro do palco segurando minha mão. Uma luz é direcionada para nós e os aplausos acabam.
– Buona Notte. – Coringa deseja boa noite no microfone e dá espaço para eu falar algo.
- Ciao. – Falo a única coisa que me vem na cabeça, um simples "olá".
Afasto-me do microfone e Coringa se aproxima de novo. Ele inicia um discurso em italiano que eu não entendo muita coisa, apenas algumas palavras. Fico aqui, com um sorriso nervoso congelado no rosto. Por um breve momento de loucura, encaro as pessoas lá embaixo, seus olhos ávidos vasculham cada parte do meu corpo e eu tenho a leve impressão de que me encaram com descrença.
Só me dou conta que acabou tudo quando mais aplausos soam pelo lugar. Nós já estamos ao pé da escadinha do placo quando o alvoroço acaba. Noto que passei o tempo todo com a respiração presa. Sinto-me sufocada.
– Eu preciso respirar. – Digo para ninguém em específico e solto a mão de Coringa.
Desvio de algumas pessoas que vieram me cumprimentar. Minha vontade agora é surtar e ir embora. Respira, respira...
Saio do salão e encontro um banheiro qualquer. Começo a respirar fundo várias e várias vezes. Na minha cabeça, só consigo pensar que foi um erro esse contrato, que eu não vou dar conta de fingir nem por uma semana, quanto mais por dois meses. Eu quero voltar pro Brasil, quero voltar para casa!
E quando estou no ápice da minha loucura, a porta do banheiro se abre. Primeiro penso que talvez seja Coringa, mas quando olho, é um velho asqueroso, que apenas a sua cara já demostra a maldade.
– Está ocupado, não tá vendo? – Digo, me esquecendo que talvez ele não entenda o meu português.
Mas o velho não dá nem importância para o meu mal humor, apenas entra no banheiro e fecha a porta atrás de si mesmo com um sorriso sujo.
Estou ferrada... Muito, muito ferrada!
[...]
Decide postar mais um capítulo hoje haha Espero que tenham gostado da surpresa meus amores <3
Até o próximo capítulo!
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